Acórdão nº 4057/13.4TBVCT de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Abril de 2016

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução21 de Abril de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I – Relatório; Recorrentes: - B., LDA (RÉ); - C., SA, (RÉ); - D. (CHAMADA); Recorrida: - E.- SEGUROS, SA (AUTORA); ***** Pedido: E. - SEGUROS, SA, intentou acção declarativa, com processo ordinário, contra B., LDA, C., SA, e COMPANHIA DE SEGUROS F., SA, pedindo a condenação solidária das rés a pagar à autora a quantia total de € 59.775,61, acrescida dos juros, calculados à taxa legal, desde a data da entrada da petição até integral pagamento.

Causa de pedir: Alega a autora que celebrou com a sociedade G., Ldª um contrato de seguro de transportes (mercadorias) tendo por objecto garantir o seguro das mercadorias do comércio da segurada durante o seu transporte desde Portugal para todo o mundo e vice-versa.

Para o transporte, por via rodoviária, das mercadorias adquiridas pela sua segurada de Nola (Itália) para Setúbal, foi contratada a 1ª ré, empresa transitária Torrestir, que por sua vez subcontratou com a 2ª ré empresa transportadora J. Morais, que para o efeito emitiu o documento CMR nº 0054243.

Durante a execução do transporte de Nola para Setúbal, o camião da 2ª ré foi assaltado tendo desaparecido a mercadoria da segurada da Autora. O assalto deu-se quando o motorista do camião parou para dormir num parque que não é fechado nem vigiado, situado junto a uma auto-estrada.

A 3ª ré é responsável enquanto seguradora da 2ª ré e no âmbito de cobertura da apólice de responsabilidade civil nº 1854484.

Acrescenta que procedeu à regularização dos prejuízos através do pagamento da quantia total de € 58.925,61, depois de apurado o valor dos prejuízos efectivamente sofridos pela segurada e descontado o valor da franquia, tendo sido emitido o respectivo recibo de indemnização.

Contestou a ré B., LDA, alegando que não exerce, por si, a atividade de transportador, apenas faz a mediação entre expedidores e transportadores com quem celebra os respectivos contratos de transporte, sendo que, no caso também o transportador não é responsável pela perda da mercadoria transportada que ocorreu por ação de furto, na razão de que os elementos típicos integradores do tipo do ilícito configuram circunstâncias que o transportador não podia evitar e cujas consequências não podia obviar.

Mais contrapôs que o transportador não cometeu qualquer falta de segurança que lhe seja imputável e que tenha de algum modo contribuído para a ocorrência do furto, uma vez que o camião foi estacionado, enquanto o condutor dormia na cabine, em local adequado para pernoitar, destinado a viaturas pesadas, com via iluminação, onde se encontravam estacionados mais de cinquenta veículos pesados para o mesmo efeito e outros tantos veículos ligeiros.

Conclui pela improcedência da ação.

Requereu, ainda, o incidente de intervenção acessória provocada de “D.”, invocando ter celebrado com esta contrato de seguro de responsabilidade civil destinado a garantir a responsabilidade por danos causados no exercício da sua actividade a clientes ou a terceiros, em vigor à data do sinistro, titulado pela apólice n.º B….

A ré C., SA. contestou, sustentando que o caso dos autos é um caso de força maior, já que o furto ocorreu em circunstâncias que o transportador não podia evitar e para as quais não contribuiu culposamente, pelo que está o transportador desobrigado da responsabilidade pela perda total da mercadoria. Caso assim se não entenda, sempre a responsabilidade da ré está limitada nos termos do artº 23º. da Convenção CMR e transferida para a Companhia de Seguros F., SA., ao abrigo da apólice de seguro de responsabilidade civil do transportador sobre mercadorias em trânsito nº. ….

Também a ré COMPANHIA DE SEGUROS F., SA, contestou, arguindo a sua ilegitimidade dizendo que o contrato de seguro que celebrou com a ré C., S.A., não é um contrato de seguro obrigatório, mas antes facultativo. Mediante esse contrato não foi transferida para a ré qualquer responsabilidade de terceiro, tendo-se esta, apenas, comprometido a garantir, dentro de certos limites e condições, a responsabilidade imputável à sua segurada.

No mais, conclui que caso os factos relatados pela autora venham a ser demonstrados estará excluída a responsabilidade da ré por força do estabelecido nas cláusulas k) e m) das Condições Gerais da Apólice de seguro.

A autora replicou.

Foi a ré Companhia de Seguros F. considerada parte ilegítima na ação como parte principal e convidada a ré C. a fazer intervir a Companhia de Seguros F., mas como parte acessória.

A ré C. veio requerer o incidente de intervenção acessória provocada da Companhia de Seguros F..

Foram admitidos os incidentes de intervenção acessória deduzidos pelas co-rés contra a “D.” e a “Companhia de Seguros F., S.A.”.

A Companhia de Seguros F., como parte acessória, apresentou contestação, impugnando a factualidade alegada pela autora. Mais alegou que, caso a mesma se venha a demonstrar, então estará excluída a sua responsabilidade por força do estabelecido nas cláusulas k) e m) das Condições Gerais da Apólice de seguro.

  1. apresentou contestação, sustentando a inexistência de dolo e que a responsabilidade pelos danos verificados é da entidade responsável pelo transporte, a empresa C..

    A autora apresentou réplica às contestações das intervenientes.

    Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença na qual se decidiu julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se, solidariamente, as rés B., Ldª e C., S.A. a pagar à autora a quantia de € 58.925,61 (cinquenta e oito mil novecentos e vinte e cinco euros e sessenta e um cêntimos), acrescida juros desde a data da instauração da acção e até integral pagamento.

    Inconformadas com tal decisão, dela interpuseram recurso as rés “B.” e “C.” e a chamada “D.”, de cujas alegações se extraem, em súmula, as seguintes conclusões: A- Apelação de “ B.”: 1- A sentença a quo aplicou aos autos o disposto nos normativos art. 15° do Decreto-Lei n." 255/99, com suas sucessivas alterações, acrescido do disposto no art. 17°, n.º 1 da Convenção CMR, mais fazendo operar o disposto nos arts. 23° e 29° CMR, em particular, excluindo a limitação de responsabilidade que este último prevê baseada na existência de dolo eventual por parte das rés, em particular, do agente da ré Transportes J. Morais. A exclusão da limitação de responsabilidade prevista no art. 23° da Convenção CMR é um erro de direito no que toca à sua integração e preenchimento da norma, sendo a aplicação da norma ao caso concreto uma decisão errada e que, por isso, deverá ser revertida.

    2- Num quadro de furto de mercadoria transportada, a sentença a quo considerou que o camião foi assaltado quando estava estacionado numa área de serviço de auto-estrada, sendo que o motorista aproveitou a paragem para dormir e pernoitar, num local iluminado e preparado para estacionamento de viaturas pesadas de mercadorias e onde, aliás, várias outras viaturas estavam paradas com seus motoristas a pernoitar. Mais considerou, na sua fundamentação à resposta da matéria de facto que quatro testemunhas distintas afiançaram que, em seu entender, nenhuma outra medida adicional poderia ser tomada para evitar o furto, tendo este evento sido absolutamente imprevisível.

    3- Nos termos do art. 15° do Decreto-Lei n." 255/99 e do art. 500° CCiv., a responsabilidade do transitário é objectiva e solidária com a responsabilidade do transportador com quem tenha sido celebrado contrato de transporte em execução do contrato de transitário.

    4- Neste quadro, a sentença a quo deveria ter aplicado o art. 17°, n." 2 da Convenção CMR aos autos porquanto o furto da mercadoria representa uma circunstância que, no caso concreto, o transportador não lograria evitar, tendo cumprido com todos os seus deveres de cuidado.

    5- Sendo certo que o condutor teria de dormir, parou em trajecto de auto-estrada na ausência de parques específicos para que os condutores de pesados possam pernoitar - cuja existência não foi dada como provada - mais parecendo idóneo o local de paragem considerada a existência provada de vários outros veículos pesados de mercadorias estacionados no local o que demonstra a aparente segurança e imprevisibilidade objectiva de furto.

    6 - Não foi provada a ausência de cadeado na porta do camião, razão pela qual, acrescendo ao exposto, não se pode considerar que tenha ocorrido a violação de qualquer dever objectivo de cuidado necessária para fundar a imputação da comissão do ilícito a título de negligência.

    7- Destarte, deveria ter sido a responsabilidade do transportador afastada por aplicação do disposto no art. 17°, n.º 2 da Convenção CMR, assim se fazendo correcta interpretação e aplicação do direito - art. 639°, n." 2, al. b) CPC.

    8- Caso assim não se entenda, a responsabilidade da recorrente não poderá ultrapassar os limites do art. 23°, n.º 3 Convenção CNIR porquanto não foi preenchida factualidade que integre a previsão dos arts. 24° e 26° da Convenção CMR, razão pela qual não poderão ser exigidas indemnizações mais elevadas do que 8,33 unidades de conta, ou seja, Direitos de Saque Especiais (DSE), por cada quilograma de peso bruto em falta - art. 23°, n.? 1, 23°, n." 3, 23° n." 7 e 24° e 26° Convenção CMR -, ou seja, € 19.332,88 (dezanove mil trezentos e trinta e dois euros e oitenta e oito cêntimos) à data de entrega da encomenda, assim se fazendo correcta interpretação e aplicação do direito - art. 639°, n." 2, aI. b) CPC ..

    9- Em caso algum deveria ter sido feita aplicação aos autos do disposto no art. 29°, n." 1 Convenção CNIR, porquanto não ocorreu qualquer dolo ou negligência grave, requisitos da redacção e jurisprudência britânicas, redacção francesa e portuguesa e jurisprudência lusa para aplicação do mesmo.

    10- A unidade de sentido interpretativa internacional da Convenção CMR visa restringir a obrigação indemnizatória do transportador, a qual só abrangerá a plenitude do valor da mercadoria caso tenham sido cumpridos os procedimentos previstos no art. 24° e 26° da Convenção CM: não foram.

    11- Não há...

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