Acórdão nº 16/15.2GEVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelAUSENDA GON
Data da Resolução21 de Novembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: No processo comum singular nº 16/15.2GEVCT da Instância Local, Secção Criminal, da Comarca de Viana do Castelo, o arguido (…) foi julgado e condenado por decisão proferida e depositada em 18/02/2016, na pena de 70 dias de multa, à taxa diária de 5 euros, pela prática, em autoria material, de um crime de gravações e fotografias ilícitas, p. e p. pelo art. 199º, nº 2, alínea b), do C. Penal.

*Inconformado com a referida decisão, o arguido interpôs recurso, formulando na sua motivação as seguintes conclusões: «I - Os factos dados como provados não permitem sustentar a imputação ao arguido do crime previsto e punido no artigo 199º, nº 2, alínea b), do Cód. Penal.

II - As fotografias aludidas no item 3º dos factos provados não permitem identificar a pessoa retratada: na primeira fotografia, apenas se consegue visualizar as pernas da pessoa fotografada; na segunda fotografia apenas é possível vislumbrar um braço.

III - O direito à imagem, enquanto representação que a pessoa transmite para o exterior, é-nos dado primacialmente pelo rosto ou semblante da pessoa, pois que é isso que a identifica, que permite distingui-la dos demais e que outros também o façam.

IV - O direito à imagem inclui também as partes destacadas do corpo da pessoa, para além do rosto (o cabelo, as mãos, os dentes), desde que, naturalmente, por essas partes destacadas se possa reconhecer a pessoa objeto da imagem.

V – As fotografias em causa nos autos não permitem identificar quem é a pessoa nelas retratada, nem, sequer, se essas fotografias dizem respeito à mesma pessoa.

VI - A publicação dessas fotografias não pode ser considerado como ofensa ao bem jurídico “direito à imagem” da assistente, que nenhum dano ou lesão sofreu por não ser possível identificá-la como a pessoa nelas visada.

VII - Fica assim excluída a tipicidade da conduta imputada a arguido, o que impõe, consequentemente, a absolvição do arguido pela prática do crime.

VIII – Acresce que, a alínea b), do nº 2, do artigo 199º do Cód. Penal reporta-se às fotografias “(referidas) na alínea anterior”, ou seja, às fotografias de “outra pessoa”, exigindo-se, em qualquer dos casos, que a captação da fotografia e / ou a sua utilização tenha ocorrido contra a vontade do visado.

IX - A letra e o espírito da norma incriminadora dizem-nos que a utilização da fotografia pré-existente apenas tem relevância criminal caso essa fotografia tenha sido captada ou tirada contra a vontade do visado.

X - Isso mesmo nos é inculcado pela remissão da alínea b) para a alínea a), que se reporta às fotografias de “outra pessoa”, estando assim excluídos da factualidade típica os casos em que alguém se fotografa a si próprio (por não se tratar de fotografia de “outra pessoa”), não sendo também típica a utilização dessa fotografia, ainda que contra a vontade do retratado.

XI - No caso dos autos, não se apurou quem tirou as fotografias (a assistente, o arguido ou qualquer outra pessoa) e / ou se essas fotografias foram tiradas com ou sem o consentimento da assistente, pelo que não se pode considerar a sua posterior utilização como tipicamente relevante, à luz da letra e do espírito contido na norma incriminadora.

XII - Pelo exposto, os factos provados não permitem subsumir a conduta imputada ao arguido à factualidade típica do crime de gravações e fotografias ilícitas, previsto e punido no artigo 199º, nº 2, alínea b), do Cód. Penal, pelo que o arguido deve ser absolvido da prática desse crime.

Conclui que «deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, revogando-se, na sequência, a douta sentença recorrida e substituindo-a por uma outra decisão que absolva o arguido do crime pelo qual vem condenado, com as legais consequências.».

O Ministério Público apresentou resposta à motivação, pugnando pela improcedência do recurso, alegando em suma, que a decisão proferida está devidamente fundamentada, não padece de qualquer contradição entre si, nem mesmo com a solução jurídica acolhida, limitando-se o recorrente a contrapor a sua convicção à convicção formada pelo tribunal a quo sem que lhe assista, todavia, qualquer razão em qualquer das situações elencadas.

Neste Tribunal, a Exma. Sra. Procuradora-Geral adjunta emitiu douto parecer sustentando que o recurso deve ser julgado improcedente, por se encontrarem verificados todos os elementos que integram a tipicidade do ilícito.

Foi cumprido o art. 417º, nº 2, do CPP.

*Na medida em que o âmbito dos recursos se delimita pelas respectivas conclusões (arts. 403º e 412º, nº 1, do CPP), sem prejuízo das questões que importe conhecer oficiosamente, por obstarem à apreciação do seu mérito, no recurso suscita-se a questão de saber se a factualidade provada não contêm todos os elementos integrantes do ilícito por cuja autoria o arguido foi condenado.

Importa apreciar tal questão e decidir. Para tanto, deve considerar-se como pertinentes ao conhecimento do objecto do recurso os factos considerados provados na decisão recorrida e respectivo enquadramento jurídico (transcrição): «1- O arguido teve uma relação de namoro com a assistente, (…), entre Novembro de 2013 e Novembro de 2014, relação que decorreu normalmente; 2- Após o termo da relação, arguido e assistente trocaram mensagens entre si, através dos...

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