Acórdão nº 205/14.7T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução17 de Novembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO O autor B. intentou, em 17-10-2014, no Tribunal de Chaves, acção declarativa de condenação, com processo comum, contra os réus C. e D..

Formulou o pedido de que sejam estes condenados: a) a reconhecerem que, em 25 de Setembro de 2010, comprou a viatura automóvel marca Mercedes Benz, matrícula ..-CS-..; b) a reconhecerem que é o único e exclusivo dono dessa viatura; c) seja ordenado o levantamento da penhora sobre a mesma (em que figura como sujeito activo o primeiro réu e como sujeito passivo o segundo réu), registada em 24-11-2010 (com o número de ordem 5227), e cancelado o respectivo registo; d) seja ordenado o cancelamento de todos os registos ou inscrições que porventura venham a ocorrer sobre a referida e identificada viatura automóvel, realizados por todos aqueles que venham a adquirir direitos a partir dos RR; e) Sejam os RR condenados em custas.

Alegou, na petição, em síntese, que: -no exercício da sua actividade de compra e venda de veículos, em 25-09-2010, comprou, para revenda, a referida viatura a … (com stand em Rio Tinto), pagando-lhe o preço e dele a recebendo, bem como as chaves e documentos, designadamente a declaração de venda assinada pelo proprietário anterior; -este, por sua vez, havia-a adquirido, também para revenda, ao 2º réu D.; -porém, o autor não procedeu logo ao registo conservatorial da compra; -quando, em Dezembro de 2010, já tinha acordado vender a viatura a um tal …, em nome do qual a mesma chegou a estar “averbada” no registo, deu-se conta que ela havia sido penhorada, em 24-11-2010, à ordem do Processo nº 1975/10.7TBFAF, do 3º Juízo do Tribunal Judicial de Fafe, a favor do 1º réu C. (sendo sujeito passivo o 2º réu D.); -além disso, quando, em 03-10-2011, circulava com ela no Porto, foi a mesma apreendida, pela PSP, à ordem do processo 618/10.3PAVNF, pendente no Mº Pº de VN de Famalicão (com fundamento em furto, segundo o documento junto a fls. 14), processo este que entretanto, segundo soube em Abril de 2014, terminou, diligenciando por que a mesma lhe fosse entregue; -nesse mês, surgiu um cliente interessado em comprar-lha, pelo que, por exigência deste, tratou de registar a propriedade do veículo em seu nome na Conservatória, o que, segundo o documento junto (fls. 13) ocorreu em 30-04-2014, mantendo-se, porém, o registo da penhora; -desde que acordou com o tal …, de Rio Tinto, a compra e, assim, a propriedade e posse lhe foram transmitidas, até que tal viatura foi apreendida no processo 618/10 referido, continuou a praticar com ela e sobre ela actos expressivos daquela titularidade, que a penhora a favor do 1º réu ofende mas que pretende defender; -embora o registo de tal aquisição a seu favor seja posterior ao da dita penhora, sobre este prevalece aquela.

Contestando, o 1º réu C., alegou que era credor do 2º réu D. e, por isso, contra ele intentou a acção executiva nº 1975/10 no âmbito da qual foi penhorado, em 24-11-2010, o veículo em questão, encontrado registado em nome daquele, conforme documento junto, por isso nada sabendo do mais. É, pois, parte ilegítima. De resto, impugnou por falsidade ou desconhecimento, pugnando pela sua absolvição, da instância ou do pedido, e condenação do autor como litigante de má-fé.

O 2º réu D. não contestou.

Subsequentemente, foi, com data de 29-04-2016, proferido saneador-sentença (fls. 75 a 82) que, além de ter absolvido ambos os réus da instância quanto ao pedido expresso na alínea d) e julgado improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva do réu contestante, culminou na seguinte decisão: “… julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, decide-se:

  1. Condenar os Réus C. e D. a reconhecer que o Autor B. é proprietário do veículo automóvel de marca Mercedes Benz com a matrícula ..-CS-..

  2. Absolver os Réus C. e D. do demais peticionado; C) Absolver o Autor B. do pedido de condenação como litigante de má- fé; D) Condenar o Autor B. e os Réus C. e D. no pagamento das custas processuais em partes iguais.

Registe e notifique.“ O autor não se conformou e interpôs recurso para esta Relação, alegando e concluindo: “1º O Tribunal “ a quo”, julgou, desde já, improcedentes os pedidos formulados nas alíneas A) e C) do petitório inicial, isto é, o Tribunal “ a quo” julgou improcedente o pedido formulado pelo A de ver os RR condenados a reconhecerem que o A, em 25 de Setembro de 2010, comprou a viatura automóvel marca Mercedes Benz, matricula ..-CS-.., bem como, julgou, igualmente, improcedente o pedido formulado pelo A de ver decretado o levantamento da penhora sobre a viatura automóvel matricula ..-CS-.., que tem como sujeito activo o primeiro R e como sujeito passivo o segundo R e foi registada em 24 de Novembro de 2010, com o número de ordem 5227 e cancelado o respectivo registo, absolvendo os RR do pedido, no que a estes concerne.

  1. Estriba, em síntese, o Tribunal “ a quo”, a sua decisão na circunstancia de, no seu dizer e salvo o devido respeito, “ (…) no que tange à compra invocada no art.º 2.º) da petição inicial, incumbia ao Autor alegar a subsequente cadeia de factos aquisitivos derivados, o que naufraga de forma cristalina.

  2. Por outro lado, no sentido de concluir e decidir nos termos em que o fez, escreve, ainda o Tribunal “ a quo” “(…) concomitantemente, aferindo-se que o registo de propriedade titulado pelo Autor é subsequente ao registo de penhora, enuncia-se que o mesmo tampouco alegou a matéria fáctica imprescindível para sustentar a aquisição do mesmo em data pretérita à penhora, premissa indeclinável para a aquilatação da oponibilidade ou inoponibilidade da aquisição. Destarte, demanda-se a sucumbência dos pedidos de levantamento da penhora e de cancelamento do registo.” 4º O contrato de compra e venda de veículo automóvel é meramente consensual (art.219 do CC), sendo um contrato com eficácia real ou contrato real, porque a transferência da propriedade dá-se por efeito dele e a obrigatoriedade do registo é declarativa.

  3. A validade do contrato de compra e venda de veículo automóvel não depende do registo, por não ter natureza constitutiva, mas antes enunciativa.

  4. Qualquer documento/ declaração escrita de venda exigida para efeito de registo de um qualquer veículo, não representa a formalização do contrato, tanto mais que é exigida, para efeitos de registo, precisamente e apenas quando o contrato é verbal.

  5. O veículo automóvel inscrito no registo em nome de um determinado sujeito constitui presunção de que existe e pertence ao titular inscrito, nos precisos termos definidos no registo ( art.7º CRP, aplicável por força do art.29 do DL nº54/75 de 12/2 ).

  6. Nos presentes autos a titularidade do veículo matricula ..-CS-.., encontrava-se inscrita a favor do 2ºR, D., desde 23 de Setembro de 2009.

  7. Encontrando-se a viatura matricula ..-CS-..inscrita a favor do aludido D., presume-se a existência do direito de propriedade a favor do dito D. na referida data.

  8. Nos termos do art.º 1316 do Código Civil, o direito de propriedade adquire-se, além de outros modos, por contrato, sendo que a aquisição do direito de propriedade, no caso do contrato, ocorre nos termos referidos no artigo 408 do CC, no momento da celebração do dito contrato.

  9. O A estribou a aquisição do seu direito de propriedade sobre a viatura automóvel que vem identificada, no contrato verbal de compra e venda outorgado em 25 de Setembro de 2010, que vem alegado e identificado.

  10. O referido contrato verbal de compra e venda tem eficácia real, porque a transferência da propriedade se dá por efeito dele (arts.408 e 874 do CC) e, a validade do contrato de compra e venda de veículo automóvel não depende do registo, por não ter natureza constitutiva.

  11. O A adquiriu a propriedade da referida viatura automóvel em 25 de Setembro de 2010.

  12. Por se tratar de uma aquisição derivada, ao contrário do que, salvo o devido respeito, se escreve na sentença recorrida, o A alegou a subsequente cadeia de aquisições desde o titular cujo direito de propriedade se encontrava inscrito no registo automóvel, o R, D., até ao A, sendo certo que se o direito de propriedade se encontrava inscrito na Conservatória do Registo Automóvel a favor do dito …, presume-se que existia na pessoa deste transmitente á data em que o A adquiriu, não necessitando, por isso, o A de provar a cadeia de transmissões anteriores ao dito….

  13. Como ressalta da petição inicial, no âmbito do contrato verbal de compra e venda, o A alega que adquiriu a dita viatura a …, que por sua vez o havia adquirido ao 2º R, D., estando o direito de propriedade sobre a referida viatura inscrito a favor deste na Conservatória do Registo Automóvel, presumindo-se, por isso, a sua existência à data da aquisição do A, estando, assim, este, dispensado...

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