Acórdão nº 334/12.1IDBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelALCINA COSTA RIBEIRO
Data da Resolução12 de Julho de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em Conferência na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO 1.

Por sentença proferida em 17 de Abril de 2015, o tribunal de Fafe decidiu: A.

Condenar o arguido António D., pela prática de um crime de Fraude Fiscal p. e p. no art.103.º, n.º 1, b) com referência ao art.6.º, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à quantia diária de € 20,00 (vinte euros); B.

Condenar ainda o arguido no pagamento da taxa de justiça que se fixa em 3 UCS (art.º 513.º, n.º 1 e 514.º do Código de Processo Penal e art.ºs 8.º, n.º 5 e tabela III anexa do Regulamento das Custas Processuais); C.

Condenar a sociedade arguida “N… Lda.”, pela prática de um crime de Fraude Fiscal p. e p. no art.103.º, n.º 1, b), com referência ao art.7.º, ambos do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, na pena de 300 (trezentos) dias de multa, à quantia diária de € 6,00 (seis euros); D.

Condenar ainda a sociedade arguida no pagamento da taxa de justiça que se fixa em 3 UCS (art.º 513.º, n.º 1 e 514.º do Código de Processo Penal e art.ºs 8.º, n.º 5 e tabela III anexa do Regulamento das Custas Processuais).

  1. Inconformado com a condenação, dela recorre o arguido, António D., formulando as Conclusões que, a seguir, se transcrevem: «1. A douta sentença recorrida assenta num pressuposto errado: o Arguido - na qualidade de administrador de insolvência - estava obrigado a apresentar declarações periódicas de IVA.

  2. Na douta sentença recorrida não poderia deixar de constar dos factos provados que: a arguida N....Lda encerrou para efeitos de IVA em 02/02/2009, pois tal resulta provado por documento junto aos autos na audiência de discussão e julgamento realizada em 26-03-2015.

  3. Mesmo que a arguida N....Lda não tivesse encerrado para efeitos de IVA em 02/02/2009, o que só por mero dever de patrocínio se admite, nunca o Recorrente teria a obrigação de entregar declarações periódicas.

  4. Nos termos do artigo 65 do C.I.R.E. com a deliberação de encerramento da atividade do estabelecimento extinguem-se necessariamente todas as obrigações declarativas e fiscais, o que deve ser comunicado oficiosamente pelo Tribunal à Administração fiscal para efeitos de cessação de actividade.

  5. Nos termos do artigo 51 n.º 1, alínea c) do C.I.R.E. são dívidas da massa Insolvente as dívidas emergentes dos actos de liquidação e partilha da massa insolvente.

  6. A liquidação em sede de processo de insolvência constitui a prática de um acto isolado, sujeito ao pagamento de IVA no final do mês seguinte ao da conclusão da operação.

  7. No caso sub judice a operação é a liquidação em sede de insolvência.

  8. Na operação de liquidação em sede de insolvência a Massa Insolvente suporta custos e despesas com IVA dedutível.

  9. Só no final da operação de liquidação é que existe a obrigatoriedade do arguido proceder ao pagamento do imposto devido pela prática de acto isolado, apresentando para o efeito o documento de cobrança mod. P2 devidamente preenchido com o IVA recebido e com o IVA dedutível, entregando ao Estado a respectiva diferença.

  10. O recorrente conforme demonstrou através do documento junto em 19 de Fevereiro de 2014 e da informação prestada pela Autoridade Tributária, de fls 252, que revela o pagamento de Iva ao Estado no montante de 25.177.34 Euros (vide artigo 13 dos factos provados) 11. Este e só este era o IVA devido e foi entregue atempadamente.

  11. Atendendo a que o recorrente percebeu que o entendimento do Tribunal a quo era diferente do entendimento que resulta da Lei entendeu por bem entregar a diferença entre o montante entregue e os 31.000 Euros (5.822.66 Euros), conforme resulta do artigo 14 dos factos provados 13. O Recorrente foi obrigado a atuar contra o interesse dos credores e da Massa Insolvente. De facto, ao entregar a totalidade do IVA recebido sem deduzir o IVA dedutível com as despesas de liquidação da massa insolvente, prejudicou os credores em benefício do Estado (tese que parece ser sufragada na douta sentença recorrida) 14. Foram notória e erroneamente dados como provados os factos que constam dos artigos 8, 9 e 12 dos factos provados, que aliás estão em contradição insanável com os factos 13 e 14 dos factos provados 15. Não se pode dar como provado que o arguido não entregou 31 000€ de IVA ao estado (artigos 8, 9 e 12 dos fatos provados) e depois dar como provado que entregou essa mesma quantia ao estado (13 e 14 dos fatos provados) 16. O Recorrente não se apropriou de quaisquer quantias a título de IVA. As quantias estiveram na posse da massa Insolvente e foram entregues ao estado no momento definido pela Lei, isto é, no final da operação de liquidação 17. O Recorrente não tinha a obrigação de entregar a declaração periódica, nem o montante de IVA recebido, antes da liquidação no processo de insolvência, não havendo -pois - qualquer prejuízo para o Estado 18. Mesmo que a douta sentença recorrida perfilhasse outro entendimento quanto ao momento em que está obrigado a entregar à Fazenda Nacional o montante de IVA apurado 19. nunca o mesmo estaria a cometer qualquer crime pois nunca houve qualquer intenção, qualquer dolo, nem sequer qualquer apropriação das quantias em causa.

  12. A douta sentença recorrida violou o disposto no artigo 65 e 51 n.º 1, alínea c) do C.I.R.E.

  13. Violou igualmente o disposto mo artigo 46 do C.I.R.E. , pois na douta sentença recorrida não se distingue a arguida N....Lda da Massa Insolvente de N....Lda 22. O Arguido nada tem a ver com a arguida N....Lda nem com os atos que a mesma prática, pois como resulta do n.º 2 dos factos provados a mesma é representada por Fernando M.

  14. Estando o regime da administradora da insolvência definido no CIRE e Portarias com esta atinentes, é este que define com precisão os seus direitos e deveres que não se confundem com os órgãos sociais de uma qualquer sociedade, não podendo ter a qualidade de representante legal conforme parece resultar do entendimento das finanças. A ser aceite tal entendimento estaríamos perante um grave e injustificado atropelo a todo o regime legal instituído do administrador da insolvência, que em última análise inviabilizaria a própria figura do administrador de insolvência.

  15. Por outro lado, a situação de insolvência de uma sociedade acarreta para esta uma total exclusão do comércio jurídico quando não existe qualquer plano de insolvência como ocorre no caso em apreço».

  16. Ministério Público, em primeira instância respondeu fundamentadamente ao recurso interposto, concluindo pela manutenção do decidido.

  17. O Digno Procurador-Geral Adjunto, nesta instância, secundando os argumentos aduzidos em primeira instância, manteve a posição referida em 3.

    5 – Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2,do Código de Processo Penal e colhidos os vistos legais, nada obsta ao conhecimento de mérito do Recurso.

    II – A SENTENÇA RECORRIDA A primeira instância julgou a matéria de facto da seguinte forma: «A - Factos Provados: Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos com relevância para a descoberta da verdade material: 1. A empresa arguida iniciou a sua actividade de "branqueamento e tingimento", (CAE …) em 15 de Novembro de 1991, e encontra-se enquadrada em imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) no regime geral de determinação do lucro tributável e, para efeitos de imposto sobre o valor acrescentado (IV A), no regime normal de periodicidade trimestral; 2. À data dos factos, o sócio e gerente da empresa arguida era Fernando M.; 3. Pelo 3° Juízo deste Tribunal Judicial de Fafe, correm termos os autos de insolvência de pessoa colectiva com o n.º 61S/08.3TBFAF, em que é requerente a empresa "S…, Lda." e requerida a empresa arguida, a qual foi declarada insolvente, por sentença proferida a 09 de Abril de 2008 e transitada em julgado a 09 de Junho de 2008; 4. Nessa sentença foi nomeado como administrador da insolvência Paulo A., o qual veio a ser substituído na Assembleia de Credores, realizada a 19 de Junho de 2008, na qualidade de administrador de insolvência pelo ora arguido António D.; 5. No âmbito das suas funções de administrador de insolvência e em representação da massa insolvente, o arguido António D. vendeu os bens móveis apreendidos no âmbito de tal processo de insolvência, a 08 de Julho de 2009, à empresa "P…, Lda.", NlPC …, com sede na Rua P…., Porto, conforme fatura e documentos de fls. 41 a 56, pelo preço global de € 155 000 (cento e cinquenta e cinco mil euros); 6. Mais tarde, a 13 de Julho de 2009, a empresa "Pl…. Lda.", que não tinha qualquer dívida para com a massa insolvente da empresa arguida, vendeu à empresa "Ci…., Lda.", NIPC …, com sede na P…, Porto, os mesmos bens, pelo preço global de € 160 000 (cento e sessenta mil euros); 7. As empresas "Pl… Lda." e "Ci…., Lda." têm em comum o gerente Pedro R., que também é Presidente da sociedade "Co… S.A.", NlPC …., cujo técnico oficial de contas é o ora arguido António D.; 8. O IVA que o arguido liquidou e recebeu dos seus clientes, no montante de € 31 000,00 (trinta e um mil euros), pela venda que efectuou dos bens pertencentes à massa insolvente, a 0·8 de Julho de 2009, à empresa "Pl… Lda.", não foi entregue à Fazenda Nacional, como o arguido sabia estar obrigado a fazer.

  18. O arguido actuou, em representação da massa insolvente da empresa arguida, não tendo entregado o montante do imposto exigível, a título de IV A, no montante de trinta e um mil euros; 10. O arguido bem sabia que o IV A em causa era pertença da Fazenda Nacional, a quem deveria ter sido entregue, e que não era sua pertença, nem da massa insolvente da empresa arguida; 11. No período de Junho de 2009 a Abril de 2010 foram apresentadas declarações periódicas de IVA mensais pela sociedade arguida com o valor de 0,00 euros de imposto a favor do Estado; 12. O arguido sabia igualmente que ao não entregar tal montante no prazo legal e ao não fazer constar na declaração periódica enviada relativa ao mês de...

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