Acórdão nº 3508/13.4TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 12 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelANABELA MIRANDA TENREIRO
Data da Resolução12 de Julho de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I—RELATÓRIO Alberto A instaurou acção declarativa, constitutiva, com processo comum, contra M, S.A., pedindo a) -Se declarem nulas as deliberações tomadas no Conselho de Administração da Ré, em 28 de Outubro de 2013, ou, se assim se não entender, b) -Se declarem anuláveis e anuladas as mesmas deliberações.

Alegou, para tanto, ter o Conselho de Administração da Ré deliberado a destituição do Autor do cargo de administrador das sociedades “M - Representações Têxteis, SA” e “N, SA.”, totalmente dominadas pela Ré, quando, nos termos da lei - art. 403.°, 1, do CSC - a destituição de qualquer membro do conselho de administração é da competência exclusiva da Assembleia Geral.

Contestou a Ré, afirmando que, por se tratar de sociedades inteiramente dominadas pela Ré, passaram a competir ao Conselho de Administração da sociedade dominante, sua única accionista, todas as competências do colégio de sócios das sociedades dominadas.

* Proferiu-se sentença que julgou a acção totalmente procedente e declarou nulas as deliberações tomadas no Conselho de Administração da sociedade M, S.A., em 28 de Outubro de 2013, vertidas na acta n.º 4, copiada de fs. 44 v.o a 49, nomeadamente sob os n.ºs 1 a 5 de fs. 46 v.o.

* Inconformada com a sentença, a Ré interpôs recurso, terminando com as seguintes CONCLUSÕES 1. A questão de Direito que trazemos à esclarecida reflexão de V. Exas e que constitui objecto do presente recurso consiste, ao contrário do que se escreveu na douta sentença recorrida a sua fls. 2/47, no seguinte: -no quadro de uma relação de domínio total em que tanto a sociedade dominante como a sociedade dominada são anónimas, qual o órgão da sociedade dominante que tem competência para tirar deliberações unânimes por escrito na sociedade dominada e em que termos? 2. São três as modalidades que os accionistas de uma sociedade anónima têm ao seu dispor para deliberarem, conforme decorre do disposto nos Artigos 53º, 54º e 373º do CSC: assembleias gerais regularmente convocadas; assembleias gerais universais e por meio da tomada de deliberações unânimes por escrito; 3. No caso dos autos, face ao disposto no Artigo 53º, n. 2, do csc e ao teor do contrato de sociedade, nada limitava a Recorrente na escolha por qualquer daquelas modalidades ou forma de deliberação enquanto accionista única da MTB, sendo pois inteiramente livre para deliberar a destituição do Recorrido com justa causa pelo modo, dentro dos três possíveis, que tivesse por mais adequado; 4. A deliberação unânime por escrito, enquanto modalidade ou forma de deliberar, assenta na expressão por escrito de uma vontade concordante da colectividade accionista, representando um modo simples, expedito e seguro de um ente colectivo manifestar ou exprimir a sua personalidade jurídica; 5. Inexiste qualquer razão de qualquer ordem para que aquela modalidade ou forma de deliberar não esteja disponível ao accionista único de uma sociedade anónima e, ainda quando este seja, também ele, uma outra sociedade anónima, para que esta decida por escrito sobre os destinos daquela, exercendo por este meio (deliberações unânimes por escrito) as competências que cabem à respectiva assembleia geral; 6. As normas dos Artigos 53º, nº 2 e 54º, nº 1 têm de ser interpretadas no sentido de que também nas sociedades unipessoais poderem ser tiradas deliberações unânimes por escrito, enquanto forma de expressão escrita da vontade do sócio único; 7. A superveniência da Directiva 89/667/CEE e do Decreto Lei 257/96, que transpôs aquela para a ordem jurídica interna veio a dotar o Código das Sociedades Comerciais do seu actual Artigo 270º-E, constitui um lugar paralelo de grande relevo que impele o intérprete com mais força ainda para o resultado interpretativo já acima proclamado e que deste modo resulta reiterado e até melhor fundamentado; 8. Se o sócio único de uma sociedade for, não uma pessoa singular, mas uma pessoa colectiva, a diferença reside tão só na circunstância de encontrarmos no plano superior, não uma pessoa singular por natureza omnipotente, mas um ente corporativo, dotado de uma estrutura organizativa própria, em que o exercício das competências que por Lei lhe cabem se mostra repartido pelos diversos órgãos que o compõem, nos termos que resultarem do respectivo figurino societário.

9. Sendo uma sociedade anónima accionista única de uma outra sociedade anónima decide aquela, por escrito, no exercício das competências que cabem à assembleia geral desta, através do seu conselho de administração, por ser este o órgão competente - é o que sucede via de regra e é o que sucede no caso dos autos em consequência de a Recorrente ser uma Sociedade Gestora de Participações Sociais e por virtude do disposto no Artigo 10º do seu contrato de sociedade; 10. De tal modo que a deliberação que este conselho tome constitui ela mesma a deliberação unânime, ainda que, internamente, tal deliberação não tenha sido tomada por unanimidade.

11. Claro é que se a sociedade dominante tiver um administrador único, é só este quem, enquanto administrador da sócia dominante, toma a deliberação unânime por escrito; Quando, diversamente, a administração seja colegial, como é aqui o caso, é por maioria que se forma a deliberação unânime.

12. A unanimidade exigida pelo disposto no Artigo 54º do CSC refere-se, assim, ao conjunto dos accionistas da sociedade em que é tirada a deliberação e não evidentemente aos membros do conselho de administração da sociedade (totalmente) dominante, quando esta decida por escrito enquanto accionista única; 13. Neste circunstancialismo, está bom de ver que qualquer acto escrito praticado pela sociedade dominante (a accionista única) através do seu conselho de administração é apto a ser havido como correspondente ao exercício das competências que por Lei ou pelo contrato de sociedade caibam à assembleia geral da sociedade dominada; 14. No caso sub judice a Recorrente, de entre as diversas formas que tinha ao seu dispor para expressar a sua vontade enquanto sócia da MTB, optou por exercer a competência reservada por Lei à assembleia geral desta - a de destituição do Recorrido do cargo de administrador desta com invocação de justa causa - através de uma decisão escrita sua, rectius, de uma deliberação unânime por escrito tirada pelo seu Conselho de Administração, vislumbrando-se que esta modalidade de deliberação foi até a que mais garantias de defesa concedeu ao Recorrido, posto ter participado de todo o processo decisório que veio a culminar com a deliberação tirada; 15. O disposto no art. 53º, nº2 do CSC impõe que sejam havidas como equiparadas ou equivalentes tanto as deliberações de destituição tomadas em assembleias gerais, como as tomadas em assembleias gerais universais, como ainda as tomadas mediante deliberações unânimes por escrito.

16. É este entendimento que em uníssono é sufragado por toda a nossa doutrina de que são exemplo Autores como Engrácia Antunes, Paulo Olavo Cunha e Maria Augusta França, acima citados em texto, e que foi ainda sufragado por decisão proferida pela Instância Central recorrida, em sentença tirada escassos dias antes da sentença de que ora se recorre e em processo em que as partes são as mesmas e em que a factualidade é inteiramente coincidente no que interessa para a decisão a proferir nos presentes autos; 17. Decidindo como decidiu, a sentença recorrida violou o disposto nos Artigos 53º, 54º, 373º, 403º e 405º todos do Código das Sociedades Comerciais.

Juntou sentença proferida no mesmo Tribunal sobre a mesma questão , em sentido contrário ao decidido no presente processo.

* O Autor contra-alegou nos seguintes termos : I. A Recorrente enuncia a questão de Direito objecto do seu recurso de forma errónea, quer do ponto de vista formal, quer do ponto de vista material ou substantivo.

  1. A questão de Direito submetida à apreciação é a de saber se a competência para destituir o A. administrador da administração das sociedades anónimas MTB e NGS, inteiramente dominadas pela Ré, é da competência do Conselho de Administração da sociedade dominante, sua única accionista, ora Ré, ou se tal competência cabe à Assembleia Geral das referidas sociedades.

  2. A competência para destituir qualquer membro do Conselho de Administração é exclusiva da assembleia geral da sociedade, não podendo, sob pena de nulidade, tal deliberação ser tomada pelo conselho de administração - artigos 403°, n.º 1 e 411°, n.º 1 alínea b) do C.S.C ..

  3. O artigo 411°, n.º 1 do C.S.C. assume natureza imperativa, considerando nula a deliberação do conselho de administração da Recorrente, no tocante à destituição do A. de administrador das sociedades M, SA e N, SA.

  4. Tal entendimento não pode ser posto em causa pelo facto de se tratar, como sucede in casu, de deliberação tomada em conselho de administração da sociedade dominante, respeitante à destituição de administrador da sociedade totalmente dominada.

  5. No caso de sociedades em relação de domínio total, as competências do colégio de sócios são exercidas pelo sócio único.

  6. E nunca pelo conselho de administração do sócio único.

  7. A desnecessidade de convocação formal de uma assembleia geral, constituindo-se esta por vontade do único sócio não dispensa a efectiva tomada de uma decisão pelo sócio único.

  8. A irregularidade não fica sanada pelo facto de a deliberação (e não decisão) tomada no conselho de administração da Ré ter sido passada ao livro de actas da assembleia geral da MTB, já que as actas têm de ser escritas no livro do próprio órgão e não no livro de outro órgão de outra qualquer sociedade.

  9. A relação de domínio total não exclui a autonomia e a personalidade jurídica distinta de cada uma das sociedades; XI. Mantendo cada uma destas sociedades os seus órgãos próprios, com competências próprias e exclusivas.

  10. A sociedade dominante só pode dar instruções ao órgão de administração da sociedade dominada, relativamente a matérias da competência deste órgão e tendo por objecto a gestão da...

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