Acórdão nº 247/16.8T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução20 de Outubro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

O MºPº junto do tribunal do Trabalho, propôs ação declarativa de reconhecimento da existência de contrato de trabalho com processo especial regulada nos artigos 186.º-K e seguintes do Código do Processo do Trabalho, contra a Ré, Sociedade B… S.A., id. nos autos, alegando, relativamente a C… id. nos autos, fisioterapeuta, que o contrato que vincula a referida fisioterapeuta à ré é, pelas características em que é exercida a atividade, um contrato de trabalho e não de prestação de serviços, devendo, portanto, ser assim reconhecido.

Citada a ré, esta contestou, alegando que o contrato que a vincula à referida enfermeira é um contrato de prestação de serviços, não existindo na relação estabelecida as características próprias de um contrato de trabalho.

Pugna pela improcedência da ação.

Foi citada C… que veio aderir aos factos apresentados pelo Ministério Público.

Realizado o julgamento foi proferida decisão reconhecendo a existência de um contrato de trabalho celebrado, em 31/05/2010, entre C… e a ré.

A ré inconformada interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões: I. A Recorrente não concorda com a resposta dada à matéria de facto constante dos pontos H, I, Q, R, S, T, W, X, GG, 4, 6, 7, 8, 9 e 11 da sentença e em geral com o facto de o Tribunal ter concluído pela verificação dos indícios de laboralidade, constantes das alíneas a), b), c) e d) do n.º1 do artigo 12.º Código do Trabalho e, bem assim, pela existência de um contrato de trabalho celebrado entre Recorrente e C… II. De facto, e tendo por referência a prova (documental e testemunhal) produzida impõe-se a alteração da decisão à matéria de facto vertida nesses pontos, os quais enfermam de um erro de julgamento na apreciação da prova que, sobre os mesmos, foi produzida, impondo-se que a decisão seja alterada.

  1. Em conformidade, entende a Recorrente que a decisão recorrida viola o disposto no artigo 1154.º do Código Civil, impondo-se, pois, a solução oposta.

  2. No entendimento da Recorrente os meios de prova produzidos nos autos e sua necessária apreciação crítica impõem uma resposta diferente à matéria de facto dos pontos H, I, Q, R, S, T, W, X, GG, 4, 6, 7, 8, 9 e 11 constantes da sentença.

  3. Todos os referidos pontos podem consistir em indícios suscetíveis de revelar a existência dos elementos típicos e integradores de um contrato de trabalho subordinado ou, pelo contrário, ser reveladores da prestação de um trabalho autónomo, pelo que devem ser avaliados num juízo global, de acordo com a relação estabelecida entre as partes.

  4. Através do depoimento das testemunhas António … e Carlos… ficou demonstrado nos autos que: a. Os equipamentos e instrumentos de trabalho da Recorrente além de volumosos e de se encontrarem necessariamente ligados à rede elétrica, tinham um custo elevado, razão pela qual a Recorrente tinha obrigatoriamente que disponibilizar os meios necessários à realização dos tratamentos médicos dos seus doentes; b. O horário de trabalho era alterado consoante a conveniência e a disponibilidade dos prestadores de serviços, inclusive C…alterou o seu horário de trabalho coordenando-o com o mestrado que frequentava; c. Os prestadores de serviços podiam faltar sem qualquer justificação e alterar as marcações dos seus utentes para outros dias; d. Os tempos para execução dos tratamentos podiam variar consoante o doente, não se encontrando, assim, prédeterminados ou fixados pela Recorrente; e. C.. auferia uma remuneração variável, em função do número de horas trabalhadas, razão pela qual a mesma tinha necessariamente que registar os seus tempos de trabalho; f. A atividade prestada pelos fisioterapeutas e em concreto por C... era feita com total autonomia, limitada apenas à prescrição médica, mas sem quaisquer ordens, direção ou instruções da Recorrente; g. No caso de situações anómalas, como por exemplo uma queimadura num utente, os fisioterapeutas podiam falar com o Fisioterapeuta Coordenador ou diretamente com o médico, a fim de ser prestado o devido acompanhamento ao utente; h. Todos os prestadores de serviços podiam faltar e tirar férias quando quisessem, sendo necessário apenas comunicar as ausências à Recorrente para organização das marcações dos utentes; i. Quando faltavam ou marcavam férias não recebiam; j. A formação dada pela “A” não era obrigatória; k. O uso de farda encontrava-se inserido no cumprimento das obrigações legais e regulamentares a que todos os fisioterapeutas estavam obrigados; l. A Recorrente nunca exerceu poder disciplinar sobre C...e demais fisioterapeutas; m. C...prestava atividade para outras entidades e fazia domicílios por conta própria; n. C...tinha consciência da natureza do contrato celebrado com a Recorrente como sendo um contrato de prestação de serviços.

  5. O depoimento das testemunhas António... e Carlos...conciliado com os documentos juntos aos autos, em especial os documentos juntos pela Segurança Social e pela Autoridade Tributária que comprovam a inscrição da C...na Segurança Social e Finanças como trabalhadora independente e a prestação de atividade para outras entidades, determinam uma resposta diferente aos pontos H, I, Q, R, S, T, W, X, GG, 4, 6, 7, 8, 9 e 11 constantes da sentença.

  6. Resultou provado nos presentes autos que C...exerce a sua atividade com autonomia, comunicando à Recorrente a sua disponibilidade para prestação dos seus serviços e registando os tempos de trabalho para pagamento dos seus honorários.

  7. Mais ficou demonstrado que C...não prestava atividade à Recorrente de forma exclusiva, exercendo a sua atividade para outras entidades.

  8. Nesta conformidade, deveria, pois, ter sido dada como provada a matéria constante dos pontos 6, 7, 8, 9 e 11, ou seja, que: a. “6) C...regista os seus tempos de trabalho, para posterior verificação e pagamento de honorários.

    1. 7) C…exerce as suas tarefas de forma que entende conveniente, fazendo o planeamento da sua atividade, dando apenas indicações das condições necessárias ao exercício das suas funções e para coordenação com o serviço da ré e demais colaboradores.

    2. 8) É C...que comunica à ré a sua disponibilidade e os tempos de trabalho que pretende, podendo durante a atividade efetuar as pausas que entender, desde que, tal não prejudique o serviço.

    3. 9) Os tratamentos e exames são marcados em função da disponibilidade da prestadora.

    4. 11) C...trabalha para outras entidades, como é o caso da “Clínica de Reabilitação de …”.” XI. É falsa e controversa a matéria considerada provada constante das alíneas H, I, Q, R, S, T, W, X, GG da sentença proferida.

  9. Conforme resulta do depoimento prestado pelas testemunhas António... e Carlos..., bem como da prova documental junta aos autos é falso que Marta...tivesse um horário de trabalho estabelecido pela “clínica…”, bem como que os turnos e horários fossem previamente determinados pela Recorrente.

  10. Note-se que ambas as testemunhas referiram que o horário era estabelecido de acordo com a disponibilidade dos prestadores de serviços e que no caso concreto de C...a mesma chegou a alterar o seu horário, de forma a coordenar o mestrado que frequentava, isto é conforme a conveniência e a disponibilidade da fisioterapeuta.

  11. É igualmente falso que C...exercesse as mesmas funções e em condições iguais aos trabalhadores da Recorrente, desde logo, porque a referida prestadora não estava sujeita ao poder disciplinar da “Clínica...”, ou seja, não tinha que prestar contas à Recorrente em caso de faltas, o exercício da sua atividade não era controlado ou sujeito à fiscalização e instruções da Recorrente, pelo contrário, era totalmente autónoma e independente, não tinha que preencher um mapa de férias, não estava obrigada ao dever de assiduidade, razão pela qual não corresponde à verdade que C...prestasse atividade em moldes iguais aos funcionários da Recorrente.

  12. C...tinha autonomia para falar sobre um utente diretamente com o médico em situações anómalas, como reações inesperadas aos tratamentos, sendo falso que recebesse instruções de trabalho por parte da Recorrente.

  13. A Meritíssima Juiz a quo desconsiderou por completo o depoimento destas duas testemunhas, bem como a demais prova documental junta aos autos, em contraposição com a valorização excessiva dos depoimentos prestados pela testemunha Dra. “C”, Inspetora da ACT que depôs de forma parcial, e pelas testemunhas Maria... e Carla... que notoriamente têm interesse no desfecho da presente ação, uma vez que também em relação a estas testemunhas correm ações intentadas pelo Ministério Público, com os mesmos fundamentos e pedido, apreciando, assim, incorreta e injustamente a prova produzida.

  14. Considerada a matéria de facto provada, e sendo procedente o pedido de reapreciação da prova no que diz respeito a matéria dos pontos H, I, Q, R, S, T, W, X, GG e 4, 6, 7, 8, 9 e 11 da sentença nos termos invocados no presente recurso, entende a Recorrente que deverá ser reconhecido o contrato celebrado entre a Clínica... e C...como sendo um contrato de prestação de serviços, improcedendo na totalidade a ação intentada pelo Ministério Público.

  15. Entende a Recorrente que a sentença recorrida não fez a correta aplicação do direito, limitando-se a seguir a presunção de contrato de trabalho prevista no artigo 12.º do Código do Trabalho, sem contextualizar com a prova produzida e violando o disposto no artigo 1154.º do Código Civil.

  16. A distinção entre contrato de trabalho e contrato de prestação de serviços assenta em dois elementos essenciais: o objeto do contrato e o relacionamento entre as partes (subordinação ou autonomia).

  17. O artigo 12.º do Código do Trabalho estabelece uma presunção de laboralidade, cujos indícios nem sempre constituem características de subordinação ou de autonomia, devendo proceder-se a um juízo de ponderação sobre a sua globalidade.

  18. Nas cinco alíneas do n.º 1 do artigo 12.º do Código do Trabalho relacionam-se as bases da presunção.

  19. Na alínea a) indica-se como característica o...

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