Acórdão nº 2503/15.3T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 06 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelANTERO VEIGA
Data da Resolução06 de Outubro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

Manuel …, intentou a presente ação de processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra “Firma, SA.”, pedindo que se declare que as prestações remuneratórias descritas na petição inicial integrem o conceito de retribuição mensal do autor e, consequentemente, que se condene a ré no pagamento ao autor da quantia de Euros 4 064,38 acrescida de juros de mora, e, com vista a uma possível ampliação/correção do pedido, pede ainda a notificação da Ré para juntar aos presentes autos os recibos de vencimento referidos na p.i., ou documentos análogos onde constem os complementos remuneratórios recebidos pelo Autor, respeitantes a meses que aí discrimina.

Alegou, para tanto em suma, que é trabalhador da ré desde o ano de 1994 e que desde essa data recebe mensalmente, de forma regular e sistemática várias quantias pagas a título de ajudas diversas, sendo certo que tais quantias nunca foram tomadas em consideração por parte da ré para efeitos do cálculo da retribuição do autor. O autor entende que tais quantias revestem a natureza de retribuição e, por isso, os competentes subsídios deveriam ter sido pagos em função desse valor.

Realizada a audiência de partes e frustrada a tentativa de conciliação, foi designada data para realização da audiência de discussão e julgamento e a ré notificada para contestar.

A ré contestou a ação, sendo que o Tribunal, porque a considerou apresentada fora de prazo, determinou a sua devolução ao Ilustre Mandatário.

Foi consignado nos autos que importava dar cumprimento ao disposto no artigo 57º do CPT mas, face ao requerido pelo Autor, determinou-se a notificação da Ré para juntar os documentos requeridos pelo Autor.

- A Ré não juntou os documentos e declarou não os ter.

Esgotadas as diligências para obter os referidos documentos, foi dado cumprimento ao disposto no artigo 57º do CPT.

Seguidamente foi proferida decisão julgando a ação nos seguintes termos: “Pelo exposto, o Tribunal julga procedente a presente ação e, em consequência, decide condenar a ré “Firma, SA.” a pagar ao autor, Manuel …, a quantia de Euros 4 127,26, acrescida de juros de mora vencidos há menos de cinco anos, à taxa legal, até integral pagamento, nos termos supra referidos…” Inconformada a ré interpôs recurso apresentando as seguintes conclusões: I. É entendimento da recorrente que se impõe a modificação da decisão do Tribunal a quo por inegável erro de julgamento.

II. A primeira questão que se coloca é a de saber se o Tribunal a quo podia, por recurso à equidade, reconhecer e condenar a Ré ao pagamento de uma média anual a título de prestações complementares a integrar as férias e subsídio de férias, sem que o Autor tenha alegado (e muito menos provado) as importâncias que recebeu nos anos de 2004, 2005 e 2006.

III. Segundo o estabelecido no art. 5.º do C.P.Civ., cabe ao Autor alegar os factos que integram a causa de pedir, devendo os mesmos ser alegados na petição inicial - art. 552.º, n.º 1, d) do C.P.Civ..

IV. Entende a Recorrente que a aceitar-se a tese do M.mo Juiz a quo é ignorar, sem fundamento, a clássica distinção entre factos constitutivos, extintivos e modificativos do direito sendo que contraria o que vem sendo entendido pela jurisprudência sobre esta matéria.

V. Na verdade, numa ação em que pretende ver reconhecidos créditos salariais, deve o trabalhador alegar e provar os factos constitutivos do seu direito (vide n.º 1 do art. 342.º do Código Civil), ou seja, a celebração e vigência do contrato de trabalho e a prestação de trabalho em determinado período e ainda alegar as retribuições/subsídios que efetivamente auferiu no período em causa, para possibilitar a quantificação das diferenças que lhe sejam devidas, entre outros Ac. do TRE de 08-05-2012 e Ac. STJ de 03-10-2007, ambos disponíveis em dgsi.pt.

VI. Como é sabido os documentos são um simples meio de prova mas não substituem o dever de alegação que recai sobre o Autor e como tal, não é de aplicar à situação em apreço a figura da inversão do ónus da prova a que alude o art. 344.º do C.Civ.

VII. Assim, o Tribunal a quo não podia determinar a inversão do ónus da prova relativamente a conceitos jurídicos, como são a regularidade e periodicidade do pagamento, mas sim a factos.

VIII. Ora, não tendo o Autor alegado os factos, como lhe competia, não podia o M.mo Juiz suprir essa alegação, muito menos, ficcionando uma média remuneratória relativamente aos meses e anos relativamente aos quais nada foi alegado.

IX. Quanto ao abono de viagem, andou mal a sentença recorrida ao considerar que pelo simples caráter de regularidade e periodicidade, tais quantias integram o conceito de retribuição.

X. Refira-se em primeiro lugar que é a própria lei que exclui, do conceito de retribuição as quantias recebias a título de abono de viagem e outras equivalentes, vide arts. 87.º da LCT e 260.º do C.Trab.2003.

XI. Ora, resulta claramente da Cl. 80.º do AE/CTT de 2010, do AE/CTT 2010 (que mantém o estatuído nos anteriores, vide Cl. 147.º e 155.º) que tais prestações têm como fim específico compensar o trabalhador por encargos acrescidos com as despesas em deslocações de casa para o local de trabalho e vice-versa, bem como pelo gasto ou encargo decorrente da utilização, ao serviço do empregador, de meio de transporte próprio, nessa compensação se enquadrando também a deslocação a pé ou em velocípede a pedal, mormente tendo em conta a natureza específica e própria das funções de carteiro.

XII. As caraterísticas de regularidade e periodicidade no pagamento não são de atender quando as prestações têm uma causa específica e individualizável, diversa da remuneração do trabalho ou da disponibilidade da força de trabalho, situação que ocorre – por exemplo com as ajudas de custo, abonos de viagem despesas de transporte e outras equivalentes, devida ao trabalhador por deslocações ou novas instalações feitas em serviço da entidade patronal, salvo se essas importâncias tenham sido previstas no contrato ou se devam considerar pelos usos como elemento integrante da remuneração do trabalhador, o que não sucede in casu.

… XV. Cabendo ao Autor, a prova de que tais ajudas constituem uma forma disfarçada de retribuição, por o seu montante exceder o valor das despesas feitas em serviço, assim decidido no Ac. da Relação do Porto, de 26/06/2000, in BMJ 498, p. 275.

XVI. Ora, não tendo sido alegados e provados factos em conformidade, deveria improceder a sua pretensão neste sentido.

… XIX. No que respeita à questão regularidade e periodicidade, vem sendo entendimento praticamente unânime da mais recente jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça [Acs. STJ de 23.06.2010, 15.09.2010, 16.12.2010 e de 05.06.2012, todos in www.dgsi.pt] que «deve considerar-se regular e periódica e, consequentemente, passível de integrar o conceito de retribuição, para os efeitos de cálculo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal, a atribuição patrimonial que ocorra todos os meses de atividade do ano (onze meses).

… XXII. Por fim, a condenação da Recorrente na integração das prestações complementares no Subsídio de Natal incidiu sobre os subsídios peticionados pelo A., com por via, além do mais, da interpretação dos instrumentos de regulamentação coletiva aplicáveis.

XXIII. Ora, nos termos do disposto na Clª 143ª do AE/CTT de 1981, era devido aos trabalhadores da Recorrente, um subsídio de Natal “igual a um mês de retribuição”, sendo este o conceito adotado pelos diversos intervenientes na outorga do referido AE/CTT.

XXIV. Em consequência, porque aplicável ao caso dos presentes autos, não se aplica à situação neles reportada o disposto no art. 2.º, n.º 1 do D.L. n.º 88/96, de 03.07, na medida em que a vontade das partes outorgantes do AE/CTT era a de que as prestações variáveis não integravam o subsídio de Natal.

XXV. Tratando-se de Cláusulas contratuais temos de lançar mão do estatuído no art. 236.º do C.Civ., no sentido em que a amplitude remuneratória do Subsídio de Natal, há de corresponder à vontade real das partes, outorgantes do referido AE, sendo certo que em mais de 25 anos de execução dos sucessivos Acordos de Empresa, nunca os representantes dos trabalhadores questionaram judicial ou extrajudicialmente a interpretação do acordado.

XXVI. Efetivamente, a posição dos seus trabalhadores ao longo dos anos – designadamente, o não exercício de qualquer direito até recentemente - fez com que a Ré perpetuasse no tempo o mesmo método de cálculo na convicção de que o mesmo era satisfatório para todos.

XXVII. Porém, além do facto de os trabalhadores da Ré, apenas agora vierem massivamente pôr em causa a forma de pagamento deste subsídio, existe outro elemento interpretativo a ter em conta.

XXVIII. Neste sentido afirma Monteiro Fernandes, em Parecer de 31.10.2013, que ora se junta, no qual se pode ler: “XV. Quanto à determinação do montante do subsídio de Natal, já relativamente ao período anterior à codificação, a combinação dos dados legais e convencionais resultava em que deveriam ser adicionados os valores da retribuição base e diuturnidades.

XVI. Com a entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, consolidou-se essa configuração do subsídio de Natal: retribuição base mais diuturnidades”.

XXIX. O M.mo Juiz a quo violou, entre outras e com o douto suprimento desse Venerando Tribunal, os arts. 38.º, 82.º, 83.º, 86.º e 87.º da L.C.T., os arts. 310.º e 561.º C.Civ., o art. 2.º do DL 88/96, art. 236.º o C.Civ. e as normas constantes do AE/CTT.

O autor contra alegou sustentando o julgado e interpôs recurso subordinado, apresentando as seguintes conclusões: A) O regime jurídico da mora constitui o devedor na obrigação de repara os danos causados ao credor, e quando se trata de obrigações pecuniárias, esse ressarcimento corresponde aos juros de mora, à taxa legal, calculados desde o momento da constituição...

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