Acórdão nº 114/12.4PBBBG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelDOLORES SOUSA E SILVA
Data da Resolução11 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em Conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.

Secção Criminal.

I-Relatório.

No Processo Comum Colectivo n.º 114/12.4PBBGC da Instância Central da Comarca de Bragança – Secção Cível e Criminal foram submetidos a julgamento os arguidos André P.; Miguel E.; Jorge R.; André B.; Jorge T., melhor identificados no acórdão de fls. 690 e ss. dos autos.

O acórdão de 27 de Abril de 2015, depositado no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo: «Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes que constituem o Tribunal Colectivo em julgar a acusação parcialmente provada e procedente, nos termos sobreditos, e, consequentemente: A.

  1. Como co-autor de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º/2-e) C. Penal, em reincidência, nos termos dos arts. 75º e 76º C. Penal, condenam o arguido André P. nas penas de prisão parcelares de 4 (quatro) anos (factos em relação a Antónia E.) e de 3 (três) anos (factos em relação a Manuel F:).

  2. Em cúmulo jurídico, condenam o arguido André P. na pena única de 5 (cinco) anos de prisão efectiva.

    B.

  3. Absolvem o arguido Miguel E. Aleixo da prática do crime de condução sem habilitação legal que lhe era imputado. Mas, 2. Como co-autor de dois crimes de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º/2-e) C. Penal, com a atenuação especial da pena advinda do art. 4º do DL nº 401/82, condenam o mesmo arguido nas penas de prisão parcelares de 1 (um) ano e 8 (oito) meses e de 10 (dez) Em cúmulo jurídico, condenam o arguido André P. na pena única de 5 (cinco) anos de prisão efectiva.

  4. Em cúmulo jurídico, condenam o arguido Miguel E. na pena única de 2 (dois) anos de prisão, suspensa na sua execução por igual prazo, com regime de prova e condicionada ao pagamento, em seis meses após o trânsito, de 150 € (cento e cinquenta euros) ao lesado Manuel F: e 350 € (trezentos e cinquenta euros) ao casal Fonseca C.

  5. Absolvem o arguido Jorge R. da prática de um dos dois crimes de furto qualificado (referente á casa sita no nº …) que lhe era imputado; mas, 2. Como co-autor de um crime de furto qualificado p. e p. pelo art. 204º/2-e) C. Penal condenam o arguido Jorge R. na pena de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual prazo e mediante a condição de pagar, em seis meses, após o trânsito, 500 € (quinhentos euros) ao ofenido Félix.

    D.

    Como autor de um crime de receptação dolosa, do nº 1 do art. 231º C. Penal, condenam o arguido André B. na pena de 2 (dois) anos de prisão efectiva.

    E.

    Como autor de um crime de receptação dolosa, do nº 1 do art. 231º C. Penal, condenam o arguido Jorge T. na pena de 3 anos de prisão suspensa na sua execução por igual prazo, mediante a condição de pagar 500 € (quinhentos euros) à lesada, em seis meses após o trânsito.

    *Ordenam a restituição ao arguido André P. dos objectos elencados no ponto II.D).4 e ao lesado Manuel F: a pulseira referida em II.D).5.

    *Custas criminais pelos arguidos, fixando-se a taxa de justiça em 3 Ucs, cada um, sendo a do arguido Lima reduzida a metade pela confissão.

    » Inconformado com a decisão, o arguido André P. interpôs recurso, apresentando a motivação de fls. 727 e segs., que remata com as seguintes conclusões: «I -Nos presentes autos, foi o arguido André P. Almeida condenado pela prática de dois crimes de furto, p. e p. pelo artigo 203.º n.º 1 do Código Penal.

    II - Contudo, não pode o Arguido conformar-se com tal decisão, pelo que se impõe uma decisão oposta.

    III - Na douta sentença são dados como provados factos que o arguido considera incorrectamente julgados — artigo 412.º n.º 3 a) C.P.P. — nomeadamente que: • 1) Na tarde do dia 3 de Março de 2012 os Arguidos André P., Miguel E. e Jorge T. encontraram-se no café ..., (...) explorado pela mãe do Arguido André B..

    • 2) Aí o Arguido Jorge R. indicou aos arguidos André P. e Miguel E. duas vivendas sitas na Estrada... que pertenciam a emigrantes franceses e que se encontravam desocupadas, tendo os três acordado em assaltarem juntos nessa mesma noite a vivenda sita no Km 1 e os arguidos André P. e Miguel E. acordaram assaltarem juntos a outra vivenda sita no n.º….

    • 3) Na concretização do plano, nessa mesma noite, os arguidos André P. e Miguel E. em comunhão de esforços e intenções, dirigiram-se à residência de Amílcar e Antónia F., sita na Estrada... n.º .. em Bragança () • 4) Aí chegados, os dois arguidos estroncaram as fechaduras das portas da garagem e de acesso ao interior da residência e entraram nesses espaços, que percorreram à procura de bens de valor.

    • 5) Ainda nessa mesma noite, os arguidos André P., Miguel E. e Neiva (...) dirigiram-se à residência de Manuel F. sita na Estrada..., km 1, os arguidos forçaram a janela da marquise, partiram o vidro da janela interior, abriram-na e entraram por aí para o interior da residência, que percorreram à procura de bens com valor.

    1V — Existem provas nos autos que impõem uma decisão diversa da recorrida — art. 412.º n.º 3 b) — nomeadamente a apreensão dos objetos ao Arguido André P. e as impressões digitais deixadas nos objetos.

    V - A sentença baseia-se na livre apreciação da prova (artigo 127.º C.P.P), invocando, para o efeito as regras da normalidade da vida e da experiência ou senso comum, o que, com o devido respeito, nos parece, no caso concreto, bastante insuficiente para condenar o arguido.

    VI -A livre convicção do Tribunal não pode confundir-se com a íntima convicção do julgador, impondo-lhe a lei que avalie as provas com sentido de responsabilidade e bom senso.

    VII -Contudo, este recurso da matéria de facto não se destina, obviamente, a postergar o princípio da livre apreciação da prova, que tem consagração expressa no C.P.P., nem se espera que o Tribunal da Relação faça um novo julgamento de facto.

    VIII - Pois, como escreveu o Prof. Germano Marques da Silva “o recuso em matéria de facto não se destina a um novo julgamento, constituindo apenas um remédio para os vícios do julgamento em primeira instância” (Forum Iustitiae, Maio de 1999). Analisando o caso concreto: IX — Relativamente aos testemunhos apresentados apenas se pode concluir que efectivamente o Arguido se encontrava na posse dos objetos furtados.

    X — Tendo viajado com eles e vendido alguns.

    XI — Ninguém conseguiu provar, que o Arguido se introduziu nas residências.

    XII — Igualmente ninguém provou que o Arguido tinha consciência que estava assinar um auto de apreensão dos bens furtados.

    XIII — Assim, a factualidade dada como provada não encontra suporte na prova produzida em audiência de discussão e julgamento, não decorrendo da mesma a prática de qualquer acto, pelo recorrente, subsumível ao tipo legal de crime pelo qual foi condenado.

    XIV — Em suma, não existe prova que permita ao tribunal condenar o recorrente, pelo que se impõe a sua absolvição.

    XV— Pelo menos, deve considerar-se que ficou sempre a dúvida sobre as circunstâncias nas quais o Arguido praticou os factos impondo-se da mesma forma a absolvição, de acordo com o princípio do in dubio pro reo.

    XVI - Como é sabido o princípio in dubio pro reo, é um princípio de prova, que se identifica com o princípio da presunção de inocência do arguido, constitucionalmente consagrado, no art. 32.º, n.º 2, da CRP, e que, conforme nos ensina Figueiredo Dias, impõe que o julgador valore sempre a favor do arguido um non liquet, na decisão de factos incertos.

    XVII — Pelo que, fica desprovida de razão a condenação devida pela indemnização.

    XVIII— Uma vez que esta só se justifica pela reparação de um dano inicialmente produzido. Termina pedindo que seja dado provimento ao recurso, determinando a modificação da matéria de facto dada como provada e, em consequência, absolvendo o recorrente da prática dos crimes pelos quais foi condenado, bem como da consequente indemnização civil.»*Admitido o recurso a fls. 751 e 752.

    O Ministério Público junto do tribunal a quo ofereceu a sua resposta na qual formulou as seguintes conclusões: «- O recorrente, no que versa sobre a matéria de facto, não especificou as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida, nem as passagens que funda a impugnação, antes remetendo para a prova que no seu entender foi incorrectamente apreciada, com violação do disposto no art. 412º, n.º3 e 4 do C.P.P., pelo que não é de se conhecer da impugnação quanto à matéria de facto.

    - A valoração da prova efectuada pelo Tribunal a quo não é merecedora de qualquer crítica ou correcção, em obediência ao princípio da livre apreciação da prova ínsita no artigo 127.º do código de processo penal, que fez no Acórdão a descrição dos factos provados e não provados essenciais à caracterização do crime e suas circunstâncias juridicamente relevantes, sem factos inócuos, irrelevantes para a qualificação do crime ou para a graduação da responsabilidade do arguido.

    - Não houve violação do Principio “in dubio pro reo”.

    Termina pedindo que o recurso seja julgado não provido e improcedente, mantendo-se, em conformidade, a decisão recorrida.»*Nesta Relação, o Excelentíssimo Procuradora-Geral Adjunto emitiu douto Parecer no sentido da improcedência do recurso.

    Foi cumprido o artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal.

    Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

    * II- Fundamentação.

  6. É pacífico que, para além das matérias de conhecimento oficioso [v.g. nulidades insanáveis, da sentença ou vícios do art. 410º n.º 2, do citado diploma legal], são apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar [v. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, Tomo III, 2ª ed., pág. 335 e Ac. do STJ de 20/12/2006, Processo n.º 06P3661, in dgsi.pt].

    Assim, no caso em apreço, são as seguintes as questões a decidir: - Impugnação da matéria de facto.

    - Violação do princípio da livre apreciação da prova e do princípio in dubio pro reo.

    *2. Factualidade.

    Segue-se a enumeração dos factos provados, não provados (a motivação será oportunamente reproduzida).

    «II- A) Factos provados.

    Com relevo para a decisão, resultaram provados os...

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