Acórdão nº 67/14.4TBMNC-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Janeiro de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE SEABRA
Data da Resolução07 de Janeiro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório: i). Banco B… S.A. deduziu execução em apenso contra os executados, C… e D…, juntando, para o efeito, como título executivo, duas letras de câmbio e alegando, em síntese, ser legítimo portador, como endossado, dos referidos títulos de crédito, o primeiro, emitido em 28/6/2011, no valor de € 7. 915,00 e, o segundo, emitido em 9/5/2011, no valor de € 2. 230,00, letras essas sacadas pelo dito C… e aceites pela aludida D…sendo que as mesmas lhe foram endossadas por aquele C… no âmbito de uma operação de desconto bancário.

Mais alegou o Exequente que, apresentadas as letras a pagamento nas respectivas datas de vencimento, não vieram as mesmas a ser pagas pelos executados.

Nessa sequência, regularmente citada, veio a co-executada, D…, deduzir embargos de executado, alegando, em síntese, ter comprado ao dito C…, várias alfaias agrícolas, acordando com este que as mesmas seriam pagas em prestações mensais, tendo, para o efeito, assinado em branco várias letras em número igual ao das prestações de pagamento do preço da venda, sendo que, não obstante foi pagando tais prestações, contando com a devolução das aludidas letras, o que não aconteceu, razão pela qual o exequente a contactou para pagar o montante nelas exarado.

Alegou ainda a executada ter havido, pois, abuso no preenchimento das letras por parte do referido executado, uma vez que aquela procedeu ao pagamento a este da dívida do preço das alfaias agrícolas antes mencionadas.

Mais impugnou a executada a assinatura no lugar de sacador nas letras dadas à execução, pugnando pela invalidade do saque, e, ainda, impugnou também a assinatura constante do verso dos aludidos títulos pelas quais terá sido constituído o endosso, o que também geraria a invalidade deste.

ii). Foi realizada audiência prévia e na sua sequência, após ter sido posta a possibilidade de decisão de mérito sobre a oposição deduzida, com o posterior debate entre as partes, foi proferido saneador-sentença que julgou improcedentes por não provados os embargos, com o consequente prosseguimento da execução.

iii). Inconformada com a aludida sentença, veio a executada Maria Fernanda interpor o presente recurso, nele apresentando as seguintes conclusões recursivas: 1ª. Tendo improcedido totalmente a sua oposição à execução, a Executada/Opoente vem recorrer do saneador/sentença que assim decide; pois tal decisão é-lhe desfavorável e o valor da oposição é de €11.256,35; tendo assim legitimidade e sendo recorrível a decisão, por o valor ultrapassar a alçada do tribunal da 1ª instância.

  1. O saneador/sentença é nulo, nos termos da alínea d) do nº 1 do artigo 615º do C.P.C., por falta de pronúncia quanto à questão da impugnação das assinaturas do endosso, no verso das duas letras, que constituem título executivo, e consequente inexistência/invalidade dos endossos.

  2. Na verdade, tais assinaturas foram impugnadas pela Recorrente e não se deu como provado que fossem genuínas e da autoria do sacador.

  3. Sem prescindir, nos termos do artigo 374º nº 2 do Código Civil, tendo sido impugnadas as assinaturas dos endossos, as mesmas não se podem considerar genuínas, a menos que se faça prova disso.

  4. Como não se fez prova, não existe, ou pelo menos não é válida, a declaração do endosso e o Recorrido não tem os direitos que invoca na execução, pois eles decorrem desse mesmo endosso.

  5. Pelo que não pode ser considerado legitimo portador da letra, nos termos do artigo 16º da LULL (norma violada pela decisão em recurso) e, em consequência, deve proceder a oposição à execução.

  6. Ainda sem prescindir, depois de ter descontado, mensalmente, uma multiplicidade de letras, aceites pela Recorrente, nos valor de € 305,00; subitamente, a Recorrida parece ter descontado as duas letras, que aqui são título executivo, nos valores de € 7.915,00 e € 2.230,00! 8ª. Isto quando atribuía, ao sacador/endossante, um grau de risco de 10 pontos negativos e 12 pontos negativos 9ª. As instituições de crédito estão obrigadas, nos termos dos artigos 74º e 75º do Regime Geral das Instituições de Crédito, a deveres de diligência, lealdade e respeito consciencioso dos interesses confiados, e, no que respeita em concreto ao Recorrido, no cumprimento do disposto no artigo 77º-B do Regime Geral das Instituições de Crédito, o mesmo adoptou um código de conduta, que designa por “ Código Deontológico ”, onde estabeleceu, no n º 2 do artigo 3º, o dever de os seus colaboradores tomarem todas as medidas para prevenir e frustrar práticas ilícitas.

  7. O Recorrido está vinculado a todos estes deveres.

  8. A apresentação de letras, com valores tão anormais, teria de ter chamado a atenção do Recorrido e deveria, no cumprimento dos deveres a que estava vinculado, ter perguntado ao sacador/endossante a razão da ingente alteração nos valores das letras, deixado registada tal razão e, não fosse ela satisfatória, recusado fazer o desconto das mesmas ou aceitar o seu endosso.

  9. Em vez de cumprir os seus deveres, o Recorrido fez o desconto das letras e aceitou o seu endosso, demonstrando uma grande falta de cuidado e comportamento temerário, na busca de proveitos, sem qualquer consideração dos seus deveres.

  10. Tendo o Recorrido facilitado, em violação descuidada dos seus deveres, a fuga do sacador com os montantes das letras, não pode agora vir exigir tais montantes e fazer a Recorrida sofrer todos os danos da situação; pois ao atuar assim, o Recorrido incorre em abuso de direito, na modalidade de tu quoque.

  11. Nos termos do artigo 334º, é ilegítimo vir exigir, à Recorrente, o montante em causa, pelo que deve proceder a oposição e extinguir a execução quanto àquela.

Assim, concluiu a recorrente pelo decretamento da nulidade da decisão recorrida ou pelo procedimento integral da oposição à execução, absolvendo a recorrente da mesma.

* Não foram oferecidas contra alegações.

* Após os vistos legais, cumpre decidir.

* II. Fundamentos: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo o Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. arts. 635º, n.º 3, e 639º, nºs 1 e 2, do NCPC.

No seguimento desta orientação, cumpre fixar o objecto do presente recurso.

Neste âmbito, e em função das aludidas conclusões recursivas, as questões a decidir são as seguintes: a)- nulidade da sentença por omissão de pronúncia; b)- legitimação do banco exequente enquanto portador da letra e à luz do preceituado no art. 16º da LULL.; c)- abuso de direito do exequente ao efectuar o desconto da letra exequenda.

* * III. Fundamentos de facto: Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos: A). Por requerimento executivo apresentado em 31/1/2014, o Exequente, Banco B…, S.A. deu à execução duas letras de câmbio, a saber: - Letra de câmbio datada de 9/5/2011, com vencimento no dia 20/6/2011, pelo valor de € 2. 230,00, dela constando, no lugar do sacador, o nome do executado, C…, no lugar, do aceite, o nome da executada, D…, bem como o valor de € 2. 230, 00; - Letra de câmbio datada de 28/6/2011, com vencimento no dia 29/5/2012 pelo valor de € 7.915,00, dela constando, no lugar do sacador, o nome do executado, C…e, no lugar do aceite, o nome da executada, D….

B). No lugar do endosso em ambas as letras de câmbio mencionadas em A), consta, no lugar do endossado, a identificação do exequente, Banco B…, S.A. e a menção “ sem despesas ”.

C). As letras de câmbio aludidas em A) foram apresentadas a pagamento pelo exequente ao sacador e à aceitante, ou seja, aos executados, C… e D…, não tendo estes procedido ao respectivo pagamento.

D). A Executada, D… assinou em branco as letras de câmbio aludidas em A) no lugar do aceite e entregou-as ao executado, C….

* * IV. Fundamentos de Direito: 4.1. Da nulidade da sentença por omissão de pronúncia: A primeira questão suscitada pela Recorrente reporta-se...

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