Acórdão nº 7109/15.4T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelESTELITA DE MENDON
Data da Resolução03 de Março de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Civil do Tribunal da Relação de Guimarães: * B, S.A. veio, ao abrigo do disposto no art. 20º, n.º 1, 23º e 25º do Decreto-lei n.º 53/2004, de 18/03, alterado pelo Decreto-lei n.º 200/2004, de 18/03, requerer a DECLARAÇÃO JUDICIAL DE INSOLVÊNCIA de C., portadora do Bilhete de Identidade n.º …, emitido em …., pelos SIC de Braga, com o número de identificação fiscal n.º …, casada sob o regime de comunhão de adquiridos com D., NIF …., residente em…, Braga, alegando, para o efeito, e, em síntese, que a Requerida tivera intervenção em diversas operações praticadas no exercício de actividade de instituição de crédito, enquanto avalista e que, pendendo contra si diversas acções executivas, não se lograra obter pagamento de qualquer um dos créditos. Mais referiu que esta doara o direito que detinha relativamente a um imóvel e que não lhe eram conhecidos outros bens.

Concluiu, argumentando que a Requerida se encontra em estado de insolvência.

Citada, a Requerida deduziu oposição.

Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento.

Seguidamente foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: IV. DECISÃO.

Face ao exposto, decido julgar improcedente o pedido deduzido pelo requerente B, S.A. contra C..

Custas pelo requerente.

* Desta decisão foi interposto recurso pelo B, S.A que terminou formulando as seguintes CONCLUSÕES:

  1. Salvo o devido respeito, andou mal o douto Tribunal a quo na ponderação e valoração da matéria carreada aos autos e na subsunção dos factos tidos como provados ao Direito aplicável, designadamente no que tange a verificação dos pressupostos que permitiriam a declaração de insolvência da Requerida, vindo, a final, a julgar que pese embora assome o Requerente como credor da Requerida, tendo contra ela pendentes acções executivas, não se verificaria qualquer outro dos factores índices invocados – nomeadamente, a dissipação do património -, e assim declarando improcedente o pedido de insolvência formulado.

  2. Ora, com tal decisão não pode concordar o ora Recorrente, perfilhando um entendimento que tal decisão, fazendo errada aplicação do direito aos factos tidos como provados, faz tabua rasa do disposto no artigo 3.º, n.º 1 e no artigo 20.º, n.º 1, alíneas b) e d), ambos do CIRE, descurando, ademais, os primordiais princípios da boa administração da Justiça.

  3. Desde logo cumpre salientar que o douto Tribunal a quo firmou três temas de prova, concretamente: decidir se o Requerente detém o credito peticionado sobre a Requerida e a sua exigibilidade – v.g., o tema da existência do crédito do Requerente e o tema da assunção pessoal das responsabilidades por parte da Requerida - e, de outra sorte, verificar se a Requerida se encontra insolvente – máxime, o tema da solvência da Requerida -, sendo certo que, em face da posição assumida pelas partes processuais nos seus articulados, sempre resultará pacifico que incumbia ao Requerente o ónus de prova do preenchimento dos factos comprovativos das duas primeiras questões, e impendendo, de outra sorte, sobre a Requerida aqui Recorrida o ónus de prova da sua concreta situação de solvência, assim afastando a comprovação do terceiro tema de prova.

  4. Atentos os factos tidos como assentes pelo douto Tribunal a quo e melhor espelhados na douta Sentença ora em crise resulta evidente que o Requerente provou o que era do seu Ónus, demonstrando que a Requerida não cumpriu (pontualmente) as suas obrigações, pois não procedeu ao pagamento do crédito que aquele deveria receber – circunstância que, inclusivamente, motivou a apresentação de três acções executivas contra a Requerida, as quais ainda hoje se encontram pendentes.

  5. Não logrou, todavia, a Requerida, como era sua obrigação, demonstrar que se encontra solvente; na verdade, a Requerida não carreou aos autos qualquer facto que, ainda que indirectamente, pudesse permitir ao douto Tribunal a quo conhecer e determinar qual a sua capacidade patrimonial, ou seja, quais os seus meios económicos e financeiros, em particular numerário ou bens móveis ou imóveis, para dar satisfação às obrigações vencidas - factos fundamentais em face do ónus de provar a sua solvabilidade.

  6. Na realidade, sobre o concreto tópico dos activos patrimoniais da Requerida, o que resulta outrossim notoriamente (com)provado é que a aqui Recorrida foi, em tempos, titular de uma quota-parte de um bem imóvel, do qual actualmente já não é proprietária porquanto em 03 de Marco de 2012 doou tal quota-parte a um terceiro, seu descendente - Circunstância de facto que permite, na verdade, a concreta asseveração quanto à dissipação de património por parte da Requerida aqui Recorrente! G) Ao arrepio de toda a factualidade tida como provada, e em notória abstracção pelas normas legais aplicáveis ao caso, o douto Tribunal a quo, debruçando-se sobre a questão suscitada pela Requerida na sua Oposição e que se prende com a (alegada) inexistência de dívidas a outros Credores e com as consequências decorrentes de tal singularidade de créditos e de credor, proferiu decisão de indeferimento do pedido de insolvência formulado.

  7. Perspectiva o ora Recorrente que decidiu mal o douto Tribunal a quo, fazendo errada análise e ponderação dos factos tidos como provados e, bem assim, desacertada subsunção dos factos ao direito aplicável, porquanto é incontornável que no caso dos autos não existe uma qualquer singularidade de dívidas, até pela multiplicidade de contratos avalizados pela Requerida perante o Requerente, os quais foram incumpridos e, em consequência do não pagamento pelos respectivos obrigados à dívida, designadamente pela Recorrida, foram judicialmente accionados mediante diversas acções executivas; I) De outra sorte, e salvo o devido respeito, a letra da lei – ou, para o que releve, o seu Espirito! – não faz depender a declaração de insolvência de pessoa singular da existência, ou não, de uma multiplicidade de credores, dado que os factos-índice elencados no artigo 20.º do CIRE, presuntivos da situação de insolvência, são, na sua essência, taxativos! J) Como sobejamente propalado, a questão fundamental para se aferir da concreta situação de insolvência e que, nos termos do n.º 1 do artigo 3.º do CIRE, o devedor “se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas” – impossibilidade tal que não terá de respeitar a todas as dívidas, bastando que as vencidas, pelo seu montante e significado/impacte no passivo do devedor, mostrem a sua impossibilidade de cumprir (pontualmente) a generalidade das obrigações.

  8. Como bem esclarecem Carvalho Fernandes e João Labareda, “(…) para caracterizar a insolvência, a impossibilidade de cumprimento não tem de abranger todas as obrigações assumidas pelo insolvente e vencidas. O que verdadeiramente releva para a insolvência é a insusceptibilidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do incumprimento, evidenciam a impotência, para o obrigado, de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos (…)” (in “Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas anotado”, pág. 72), L) Afirmando igualmente, os mesmos Autores, para o que releva nos presentes autos, que, “(…) pode até suceder que a não satisfação de um pequeno número de obrigações ou até de uma única indicie, só por si, a penúria do devedor, característica da sua insolvência, do mesmo modo que o facto de continuar a honrar um número quantitativamente significativo pode não ser suficiente para fundar saúde financeira bastante (…)”.

  9. Sob este aspecto, e ao arrepio do entendimento acolhido e indultado pelo douto Tribunal a quo para fundamentar a improcedência do pedido de declaração de insolvência formulado pelo Recorrente – tão-somente, a pretensa singularidade de Credor -, defendeu o douto Tribunal da Relação de Coimbra, em aresto prolatado em 28-05-2013 (Processo 1275/12.8TBACB-B.C1, disponível online em www.dgsi.pt) que “(…) Esta impossibilidade [de cumprimento] (…) não exige uma pluralidade de incumprimentos, nem tão pouco uma pluralidade de credores, pressupondo e traduzindo “a ideia de incapacidade económico-financeira do devedor, reportando-se portanto à falta de meios económicos, em particular numerário, ou à falta de meios financeiros da empresa para dar satisfação às obrigações vencidas”. A verificação desta situação de incapacidade de cumprir, consagrada genericamente no art.º 3.º como pressuposto objectivo da insolvência, exige uma avaliação do património do devedor, nomeadamente da existência de meios económicos ou financeiros suficientes para satisfazer as suas obrigações vencidas. (…)”.

  10. Em face do exposto, considera o Recorrente que no caso dos autos ora em crise, atentando o valor global dos créditos do Recorrente sobre a Recorrida, e, sobretudo, as circunstâncias do incumprimento - perdurando por mais de dois anos em relação às datas dos respectivos incumprimentos, sendo de destacar a circunstância de o Recorrente ter interposto três acções executivas contra a Requerida, e que, bem assim, até ao momento nenhuma quantia foi liquidada ao Recorrente - não pode falar-se numa situação transitória de falta de liquidez da Recorrida, que se possa apresentar como eventual ou pontual.

  11. Destarte, a verificação do facto-índice alegado pelo Recorrente – concretamente, o facto elencado na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIRE - seria, em principio, condição suficiente da declaração de insolvência da Requerida, só podendo obstar ao decretamento da insolvência a sua ilisão pela devedora, nos termos do n.º 3 do artigo 30 do CIRE - o que a Requerida desde logo não fez, porquanto não demonstrou ou, sequer, indiciou a Existência de qualquer património com o qual pudesse fazer face às suas obrigações vencidas ou, de outra sorte, evidenciando e comprovando que o seu activo fosse superior ao passivo.

  12. Não obstante, o douto Tribunal a quo, tendo considerado como provado que “A requerida não tem outros devedores para além da...

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