Acórdão nº 185/10.8TBPTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelFRANCISCO CUNHA XAVIER
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACÓRDÃO DA 2ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I – RELATÓRIO 1. CONSTRUÇÕES J & FILHOS, LDA., intentou acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra AUTO P, LDA., e R, UNIP., LDA., pedindo que seja decretada a resolução do contrato celebrado entre a A. e as RR. e, em consequência, que se condene as mesmas a pagarem-lhe solidariamente: a) O valor de 1.817,97 € referentes ao preço do motor e seu transporte; b) Os juros vencidos sobre tal importância, à taxa legal, que computam 113,76 €; e c) Os juros vincendos a igual taxa, até integral pagamento; d) A indemnização inerente a 350 dias de paralisação do veículo, no valor de 3.500,00 €; e e) Os juros à taxa legal, sobre a quantia referida na alínea anterior, contados da citação e até integral pagamento; 2. Para tanto, invoca, em síntese, que: - é proprietária de um veículo ligeiro misto, marca “Opel”, modelo “Campo”, que está destinado ao serviço de transporte de trabalhadores e materiais para e das obras que lhes estão confiadas; - no mês de Julho de 2008 o motor do aludido veículo sofreu uma grave avaria; - o sócio gerente da A., através de um seu conhecimento em Lisboa, conseguiu encontrar um motor usado compatível, propriedade das ora rés, tendo acabado por adquiri-lo a estas pelo preço de 1.500.00 €, acrescido do valor do transporte até Ponte de Lima, que ascendeu à quantia de 317.97 €.

Acrescenta que o motor foi entregue na oficia onde se encontra o veículo, no dia 31/07/2008, que no dia seguinte e antes de proceder à sua montagem no veículo, foram efectuados testes ao motor, dos quais se concluiu que o motor não estava em condições de funcionamento, e que tendo o representante da A. entrado logo em contacto com as RR., informando-as das avarias detectadas no motor, estas aceitaram as referidas avarias, prontificando-se a proceder à substituição do motor.

Alega ainda que as RR. vieram buscar o motor no dia 4 ou 5 de Agosto de 2008, assumindo os defeitos e avarias do motor que venderam à A., mas que jamais procederam à substituição do mesmo, mantendo em seu puder o que lhe haviam vendido.

Deste modo, invocam o direito à resolução do contrato, com as legais consequências, e o direito à indemnização pelos danos decorrentes da imobilização do veículo.

  1. Regularmente citada, a 1ª R. AUTO P, LDA., admitindo a venda o motor, contestou que o mesmo padecesse de quaisquer defeitos, a denúncia destes e seu reconhecimento, bem como o levantamento do motor.

    Relativamente à 2ª R. R, UNIP. LDA., a A. veio desistir da instância, o que foi homologado por despacho de fls. 41.

    Foi elaborado despacho saneador, com selecção da matéria de facto assente e controvertida.

  2. Instruído o processo procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, após o que foi elaborado o despacho de resposta à matéria de facto (cf. fls. 135 a 140) e proferida sentença, na qual, “por caducidade da respectiva acção”, decidiu-se julgar improcedente a acção, absolvendo-se a R. dos pedidos.

  3. Inconformada recorreu a R., pugnando pela alteração da decisão, nos termos e com os fundamentos seguintes: 1.ª A fl. 4 da decisão sobre a matéria de facto, o Mmo. Juiz “a quo” afirma que “(…) enquanto à luz das regras da experiência se afigure fortemente verosímil que a autora tenha efectivamente dado conta dos defeitos ao vendedor (…)”; 2.ª Tal afirmação parece-nos insofismável da sua convicção, no sentido de considerar e ter assente que, de facto, a denúncia foi efectuada, não obstante, na sua decisão, assim não ter vindo a considerar; 3.ª A verdade é que o motor fornecido pela ré e recorrida não se encontrava em condições de funcionamento, como se demonstrou pelos testes que se fizeram antes de o montar no veiculo a que se destinava (n.º 10 dos factos provados, fl. 4 da sentença); 4.ª Verdade é também que a ré jamais entregou à autora um outro motor de substituição, o que determinou que a viatura na qual deveria ser montado ficou sem circular desde 01 de Setembro de 2008 (nºs. 11 e 12 dos Factos Provados, fl. 4 da sentença); 5.ª Do conjunto destes factos terá resultado, salvo erro de entendimento, a convicção do Mmº Juiz expressa pela afirmação de que considera fortemente verosímil que a autora tenha efectivamente dado conta dos defeitos ao vendedor, pese embora a decisão proferida não corra nesse sentido, o que foi fatal para a pretensão deduzida; 6.ª Existe, pois, quanto a nós e salvo o devido respeito, contradição entre os fundamentos e a decisão ou, pelo menos, a mesma contém a aludida obscuridade que a torna ininteligível; 7.ª Mas considera, também, o Mmº Juiz, que a primeira testemunha, SMAML (…) atestou que, passados alguns dias, veio um camião levantar o motor – vide fl. 4 da decisão sobre a matéria de facto; 8.ª Ora, considerando-se atestado tal facto, dele emergem necessariamente outros, de eminente importância para a decisão da causa, que são os seguintes:  Que a denúncia foi, na realidade, efectuada pela autora (por isso vieram recolher o motor);  Que não teria sentido ao abrigo das regras da experiência comum, que a mesma denúncia tenha sido efectuada junto de pessoa diversa da ré vendedora; e,  Que a denúncia foi efectuada mal se detectou a avaria do motor, o que decorre do facto de a sua recolha ter ocorrido apenas uns dias depois da sua entrega; 9.ª A resposta ao quesito 10º da Base Instrutória não poderá ser a de “Não provado”, mas sim outra em que se refira, por exemplo, “Provado que uns dias após a entrega do motor, um camião veio recolhê-lo”; 10.ª De tudo resulta que se demonstrou que a Autora efectuou a denúncia a que se refere o art. 916º do Cód. Civil, pelo que, não se verifica a caducidade da acção e a sua consequente improcedência com os fundamentos invocados na sentença recorrida e isto, não obstante a acção só ter sido apresentada em juízo em 19.02.2010, isto é, após o decurso do prazo de seis meses contados da denúncia, previsto no art. 917º do Cód. Civil; 11.ª É que, tendo como certo que a denúncia foi efectuada pela compradora à vendedora e que foi esta que recolheu o motor num dos dias seguintes, significa que aceitou a falta de conformidade (por isso o recolheu), o que impediu a verificação da caducidade, de harmonia com o disposto na parte final do nº 2, do art. 331º, do Cód. Civil; 12.ª A definição de consumidor a que se refere a al. a) do art. 1º B do Decreto-Lei nº 67/2003 de 08/04, deve ser entendida no sentido de que está em tal condição todo aquele que não adquira o produto com vista a retirar dele um benefício comercial, uma mais valia, um lucro. Isto é, todo aquele que, numa palavra, é o consumidor final do produto adquirido; 13.ª Ora, foi precisamente nessa qualidade de consumidor final, que a A. adquiriu o motor à ré, pese embora para o incorporar num veículo afecto à sua actividade, mas não para obter dele qualquer lucro, beneficio ou mais valia; 14.ª O que significa que, ao contrato de compra e venda celebrado entre recorrente e recorrida, é aplicável a disciplina do Decreto-lei nº 67/2003, de 08/04, tendo-se aqui por reproduzido tudo o que atrás se disse quanto à denúncia da falta de conformidade efectuada pela recorrente à recorrida; 15.ª Do que, a autora dispunha do prazo de dois anos, previsto no nº 3, do art. 5º A, do predito diploma, para instaurar a correspondente acção, prazo que, como se vê, foi observado.

    16.ª A douta sentença recorrida, padece do vício da nulidade, de harmonia com o disposto na al. c), do nº 1, do art. 615º, do CPC (ver conclusão 6ª supra), bem como, viola as disposições dos arts. 913º e seguintes do Cód. Civil e do Dec. Lei nº 67/2003, de 08/04.

    TERMOS EM QUE E nos demais de direito que V. Exªs., Venerandos Desembargadores, melhor e doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via disso, ser revogada a sentença proferida, substituindo-a por outra que condene a ré e recorrida nos pedidos formulados, com as legais consequências.

  4. ...

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