Acórdão nº 440/12.2TBBCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Fevereiro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

M, viúva, residente na rua da Aldeia, n.º 93, 4750-466 Galegos (St.ª Maria), Barcelos, intentou a presente acção declarativa, sob a forma ordinária, para investigação de paternidade, contra C, casado, residente na rua Dr. Francisco Torres, n.º 57, 3º Esq., 4750-160 Barcelos, pedindo que se declare que este é o seu pai e que tal facto seja averbado ao seu registo de nascimento.

* Alegou para tal que nasceu no dia 01/12/1949, tendo sido registada apenas como filha de A, solteira, com 36 anos de idade e natural da freguesia de Galegos, Santa Maria, Barcelos. Porém, alega que também é filha do Réu e é por ele perfilhável, dado não haver entre ambos relações de parentesco ou de afinidade que obstem a tal.

Mais refere que o seu nascimento ocorreu no termo da gravidez da sua mãe e como consequência das relações de cópula havidas entre ela e o Réu, com quem mantinha uma relação de proximidade e amor, publicamente conhecida, nunca tendo tido a sua mãe, durante a relação com o Réu e, nomeadamente nos primeiros 120 dias dos 300 que precederam o seu nascimento, relações sexuais de cópula com qualquer outro homem que não aquele.

Mais refere que o Réu sempre teve para consigo atitudes que normalmente os pais têm para com os filhos, nomeadamente, questionando-a se está tudo bem, se precisa de alguma coisa e inclusive concedendo-lhe a bênção quando a Autora a solicitava, como era costume na época, tendo Réu chegado a propor à mãe da Autora irem residir para Angola, onde este lhes proporcionaria o sustento para ambas, o que não se concretizou devido à oposição dos avós maternos da Autora.

Refere ainda que esta situação era conhecida e comentada por todas as pessoas amigas e conhecidas, da freguesia de Galegos (Santa Maria) e arredores, já que todas sabiam que a autora é filha do Réu e onde sempre foi apelidada de “gata”, “gatinha” em virtude do apelido de família do Réu, conhecidos por “gatos”.

* Requereu a produção antecipada de prova pericial, que foi admitida, por despacho de fls. 23.

* O Réu apresentou contestação, por excepção, invocando a caducidade do direito da A. e por impugnação, dizendo que nunca ocorreu qualquer relação sexual de cópula completa entre o Réu e a mãe da Autora.

Concluiu pela procedência da excepção da caducidade e consequente absolvição do pedido, bem como pela total improcedência da acção.

* A Autora replicou, concluindo como na petição inicial e pedindo a improcedência da alegada excepção.

* Agendada a realização do exame pericial o Réu faltou sempre, tendo sido determinada a fls. 91 a deslocação do Instituto de Medicina Legal á residência do Réu. Este por requerimento de fls. 97 e ss. veio recusar a realização de tal exame.

A fls. 110 foi proferido despacho a deferir a recusa e pedir a devolução da zaragatoa.

* Tramitados os autos foi proferida decisão que julgou totalmente procedente a excepção de caducidade do direito à acção e, consequentemente, julgou improcedente o pedido de investigação da paternidade formulado nestes autos pela A., absolvendo o réu do mesmo.

* Não se conformando com a decisão proferida, veio a A. dela interpor o presente recurso de Apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

  1. A Apelante vem interpor recurso da Douta Sentença, que julgou totalmente procedente a exceção de caducidade do direito à ação de paternidade e que jugou totalmente improcedente o pedido de investigação de paternidade por si formulado.

  2. Para tal, fundamentou o tribunal “a quo” a sua decisão no facto de a Autora não ter intentado a ação dentro do prazo estalecido no n.º 1 do artigo 1817º, por remissão do artigo 1873º do Código Civil, ou seja, durante a sua menoridade ou nos dez anos posteriores à sua menoridade ou emancipação.

  3. Fundamentando ainda que não se provou que um ano antes da propositura da ação o Réu deixou de tratar a Autora como filha, uma vez que o Réu logrou fazer prova da inexistência de qualquer facto superveniente nos três anos anteriores à propositura da ação, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 1817º.

  4. Assim, segundo a convicção do Tribunal a quo, tendo a Autora nascido a 01 de dezembro de 1949, a ação de investigação de paternidade deveria ter sido proposta até ao dia 30 de abril de 1967, data em que a Autora atingiu a sua maioridade. Ou então, deveria ter sido proposta nos dez anos posteriores, ou seja, até 01 de dezembro de 1977.

  5. Entendeu por este motivo, a Mma Juíza a quo, que o direito da Autora de intentar a ação de investigação de paternidade caducou e consequentemente julgou totalmente procedente a exceção de caducidade e absolveu o Réu C do pedido aduzido pela Autora.

  6. Salvo o devido e merecido respeito pela posição sufragada na douta sentença ora em crise, não pode a Autora conformar-se com este entendimento e entende que a mesma padece de vícios porquanto para além de proceder a um incorrecto julgamento da matéria de facto, em virtude da inversão do ónus da prova operada, não extraiu de forma correta as consequências jurídicas da matéria de facto apurada no decurso da audiência de julgamento.

  7. Nos presentes autos a A., na sua petição inicial tentou tão-só fazer a prova direta do vínculo biológico, alegando como causa de pedir a sua descendência imediata do R em relação à mesma. Requereu a prova antecipada de prova através da recolha de material biológico para elaboração de exames ao ADN.

  8. O R. faltou às diversas diligências e sempre protelou a realização do referido teste alegando motivos de saúde. Tendo em conta este facto, foi requerida a realização do exame hematológico na sua residência. Vindo este recusar perentoriamente alegando a violação do seu direito fundamental de reserva à vida privada.

  9. Nesta sequência a Mma. Juiz a quo, no seu douto despacho, junto a fls. 99, devidamente transitado em julgado proferiu o seguinte “tal declaração por parte do R. será devidamente tida em conta a seu tempo”.

  10. Desta feita, o R. impossibilitou a realização dos exames hematológicos devido às suas constantes ausências, violando, assim, o dever de cooperação com vista à descoberta da verdade, tendo culposamente impedido a prova da sua paternidade, conforma estipula o artigo 471º, n.º 2 do CPC.

  11. Pelo que bem andou o Tribunal a quo ao ter proferido despacho com a cominação ao R. da inversão do ónus de prova. Isto porque, o citado artigo 344º, nº 2 estabelece que há inversão do ónus da prova quando a parte contrária tiver culposamente tornado impossível a prova.

  12. Com a sua conduta, o R. impossibilitou de facto, a prova do facto a provar, a cargo da A., por não ser possível com o mesmo grau de certeza e probabilidade obtê-la através das testemunhas que por esta arrolada, que apesar de terem o conhecimento direto de que efetivamente existiu entre a mãe da A. e o R. Constantino uma relação amorosa, não têm a mesma força probatória que um exame de ADN. A realização dos exames hematológicos realizados à A. e ao R. permitiriam determinar com segurança a filiação biológica existente entre ambos.

  13. O motivo invocado para a recusa por parte do R., de que reside numa zona movimentada da cidade de Barcelos e que a deslocação de uma equipa do Gabinete Médico Legal iria dar azos a comentários na vizinhança, não é por si só capaz de configurar uma situação de desrespeito pelos seus direitos fundamentais, plasmados na CRP e nos termos das do artigo 471º, nº 3, al. a) e b) do CPC.

  14. O R. limitou-se a alegar imperativos de consciência, sem mais.

  15. A recusa do réu, tornando impossível a prova do vínculo parental, determina a inversão do ónus da prova, nos termos dos artigos 344º n.º 2 do C. Civil e 471º do CPC, devendo ser o réu a demonstrar, através de meio de prova tão significativo como o ADN, que não é o pai da investigante. O que não fez. Este não fez qualquer prova de que não era o pai.

  16. E neste ponto, peca a douta sentença ora em crise. Uma vez que, para além de dar como não provados, factos cuja prova sobre os mesmos foi amplamente produzida, em nada se referiu ao facto de que o R. não ter logrado fazer prova de que não era pai.

  17. De que servirá então o mecanismo de inversão do ónus de prova? Se não beneficiar a parte a quem competia ab initio? R) Por sua vez, a Recorrente, conseguiu provar, através de prova testemunhal, que entre a sua mãe, A e o R. C existiu efetivamente uma relação amorosa secreta e que a sua mãe, à data dos factos, não tinha nenhum relacionamento com outros homens.

  18. Bem feitas as contas do período legal de conceção, a A. que nasceu em 01/12/1949, só poderia ter sido concebida entre Fevereiro e Março do mesmo ano. E nessa altura o R. ainda se residia na aldeia, tendo apenas iniciado o serviço militar em 02/04/1949.

  19. A Recorrente entende que o Tribunal a quo não deveria ter dado como não provados, os factos constantes nas alíneas a), b), e), g), h), i), j) e l), dos factos não provados.

  20. As testemunhas arroladas pela A., em especial, as testemunhas RD e MM depuseram de forma isenta e credível e os seus depoimentos revelaram-se isentos, coerentes e espontâneos e para além de se basearem nas mais válidas e sólidas razões de ciência (perceção e conhecimento direto dos factos), foram prestadas de forma clara, firme, serena e desinteressada, em termos de deverem merecer toda a credibilidade.

  21. Do depoimento da testemunha RD não restaram dúvidas de que esta presenciou factos determinantes sobre o relacionamento que existiu entre sua mãe e o R. Pelo que contrariamente ao que entendeu a Mma. Juíza a quo, o Tribunal deveria ter dado como provados as alíneas a), b), e), g) dos factos não provados.

  22. Ficou amplamente provado que o R. deixou de contactar a sua filha um ano antes da propositura da ação. Do mesmo modo, ficou amplamente provado que foi pelo facto de o R. ter deixado de a tratar como filha que a Recorrente intentou a presente ação. Pelo que o Tribunal a quo deveria ter dado como provado os factos constantes nas alíneas i), j) e l) dos factos não provados.

  23. Com o depoimento da testemunha MM, que relatou ao...

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