Acórdão nº 73/12.3GAVNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 02 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução02 de Maio de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

26 Processo 73/12.3GAVNC.G2 Acordam na secção penal do Tribunal da Relação de Guimarães, 1. No acórdão proferido nestes autos com nº 73/12.3GAVNC, o tribunal singular da Instância Local de Valença da Comarca de Viana do Castelo condenou o arguido Nuno D.

pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de coacção sexual, previsto e punido pelo artigo 163.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de dois anos e quatro meses de prisão, de execução suspensa pelo mesmo período, mediante regime de prova e na pena acessória de proibição do exercício de qualquer profissão, função ou actividade que impliquem ter menores sob sua responsabilidade, educação, tratamento ou vigilância, pelo período de três anos.

  1. O arguido interpôs recurso do acórdão e das motivações extraiu as seguintes conclusões (transcrição) : “I-Ao condenar o Recorrente pelo crime de Coacção sexual, nos termos do nº 1 do artigo 163º do Código Penal, o Tribunal de Valença julgou e condenou por factos diversos dos descritos na pronúncia, que imputava ao recorrente o crime de Actos sexuais com adolescentes, nos termos previstos no nº 1 do artigo 173º.

    II-Ao julgar o Recorrente pelo crime de Coacção sexual, o Tribunal operou uma alteração dos factos que não é minimamente subsumível na figura da alteração da qualificação; em causa está, com efeito, uma arquetípica alteração substancial dos factos, tal como a define a al. f) do nº 1 do artigo 1º do Código de Processo Penal e regulada no nº 1 do artigo 359º da mesma codificação.

    III-O artigo 379º, nº 1 al. b) prescreve a nulidade da sentença que condena por factos diversos dos que constavam do despacho de pronúncia.

    IV-A produção da prova levada a cabo pelo douto Tribunal a quo assenta na sistemática e generalizada valoração contra reum das grandes manchas de dúvida que a produção da prova deixou atrás de si.

    V-Para além da declaração inicial da ofendida ..., apresentada no momento da denúncia dos factos e frontalmente negada pelo Recorrente, o Tribunal só teve ao seu dispor depoimentos de testemunhas que não tiveram conhecimento direto dos factos.

    VI-E, por isso, depoimentos que se dividem em dois lados frontalmente opostos e contraditórios; em termos tais, que eles não permitem concluir pela prova, acima de qualquer dúvida razoável, pelos factos indispensáveis à condenação do Recorrente.

    VII-Ao dar estes factos como provados, o Tribunal violou invariavelmente o imperativo constitucional in dubio pro reo.

    VIII-Os factos dados como provados, mesmo suposta a validade da sua prova, nunca permitiriam condenar o recorrente pelo crime de Coacção sexual, por absoluta e insuprível atipicidade dos factos.

    IX-A tipicidade está excluída logo pela falta, tão patente como unívoca, de um dos pressupostos nucleares do tipo objetivo, a violência, com o sentido e alcance que o conceito assume no contexto da incriminação da Coacção sexual.

    X-Só seria possível condenar o Recorrente pelo crime de Coacção sexual à custa de violação frontal e irremível do princípio constitucional da legalidade/tipicidade, nullum crimen sine lege.

    XI-Mesmo que o Recorrente fosse legitimamente condenado por aquele crime contra a liberdade sexual, nunca sobraria espaço para a pena acessória de proibição temporária do exercício da atividade, nos termos da al. b) do artigo 179º do Código Penal.

    XII-Não se pode dizer que entre o recorrente (explicador) e a vítima (explicanda) subsistisse aquela relação de responsabilidade, exigida pela norma sancionatória. Por ser manifesto que um explicando não está sob a responsabilidade ou a educação do explicador.

    XIII-Existe, por outro lado, erro na fixação da matéria de facto prova inserta nos pontos 5º a 11º, inclusive dos factos provados, os quais deviam ter sido considerados não provados e, alíneas a), b) e c) dos factos não provados, os quais deviam resultar provados face à prova produzida em audiência de julgamento em consonância com os documentos juntos aos autos.

    XIV-A prova produzida em audiência de julgamento conjugada com a demais existente nos autos, não permite concluir que o Recorrente praticou os factos dados como assentes nos pontos 5 a 11 da factualidade provada, tendo sido produzida prova da factualidade que o tribunal considerou não provada, isto é, que à data da prática dos factos se encontravam, também, no centro de explicações a companheira e irmão do Recorrente e que, tal Centro de Explicações era um espaço com 3 salas (cada uma usada pelas três pessoas referidas no artigo precedente) juntas umas das outras, sempre abertas ou entreabertas e com um circuito de pessoas consecutivo e abundante.

    XV-A livre convicção ou apreciação não poderá nunca confundir-se com apreciação arbitrária da prova produzida nem com uma impressão gerada no espírito do julgador pelos diversos meios de prova, devendo, antes, ser um processo lógico e legalmente apoiado que o julgador haverá que considerar como provados e como não provados determinados factos.

    XVI-No caso vertente, o tribunal recorrido resvalou para a discricionariedade ou livre arbítrio, o que lhe está impedido.

    XVII-Para fundamentar a matéria de facto que o Recorrente considera, salvo melhor entendimento, erradamente dada como tal (pontos 5 a 11), o Tribunal “a quo” baseou-se, apenas e tão só no depoimento indireto da Assistente, das testemunhas … e … (respetivamente, mãe, irmã e prima da inditosa …), entendendo que as mesmas foram relatar que a … lhes havia dito (e ainda que lhes tenha contado, de verdade) – o tal depoimento indireto – é suficiente com um grau de certeza acima de qualquer dúvida de que os factos ocorreram dessa forma.

    XVIII-Daí que, dando-se aqui como totalmente reproduzido tudo quanto acima se disse sobre os depoimentos de tais testemunhas, a consideração de tal factualidade como provada está errada, devendo, ao invés ter sido considerada não provada.

    XIX-E, relativamente aos factos dados como não provados, abunda da prova produzida nos autos que a mesma devia ter sido dada como provada.

    XX-Relativamente ao facto dado como não provado que o centro de explicações onde o Recorrente prestava serviços como explicador e onde a … se deslocava como explicanda, era um espaço aberto e que a porta do local nunca se encontrava fechada, sendo que muitas vezes até se encontrava aberta para arejamento do espaço, temos desde logo as declarações da Assistente, mãe da ..., prestadas na sessão do dia 28/05/2015, que referiu o acima transcrito que aqui se reproduz na íntegra, em síntese, que a propósito de se ter deslocado ao centro de explicações para deixar a filha ... para uma explicação, fugindo-lhe a boca para a verdade, referiu expressamente que o Recorrente não estava e que estava o irmão na sala ao lado com a porta aberta como já era habitual.

    XXI-E a testemunha Olga S., companheira do Recorrente e explicadora no mesmo centro de estudos que ele, mas da disciplina de Português e relativamente a quem todas as testemunhas (mesmo as de acusação) referiram que na verdade também dava ali explicações, portanto, indubitável conhecer perfeitamente o local, no seu depoimento prestado no dia 18/06/2015, que supra também se transcreveu e que se reproduz na íntegra.

    XXII-E, a tal propósito depôs também a testemunha José P., irmão do Recorrente e explicador no mesmo centro de explicações que ele e a sua companheira (reconhecido por todas as testemunhas como tal), na sessão de julgamento de 18/06/2015, cujo depoimento se transcreveu supra e que se dá aqui por totalmente reproduzido.

    XXIII-Ainda a propósito da descrição do local (centro de explicações) e as portas dos gabinetes se encontrarem normalmente abertas, depôs a testemunha Maria T., na sessão de julgamento de 18/06/2015, proprietária de um estabelecimento comercial de … do mesmo centro comercial onde se situa o centro de explicações do Recorrente, amiga deste e que com frequência ia àquele centro, tendo tido o filho como explicando lá, e cujo depoimento se transcreveu supra e que aqui também se dá por reproduzido.

    XXIV-Também a testemunha Maria P., ouvida na sessão de julgamento de 18/06/2015, mãe de um menino que foi explicando do Recorrente, e cujo depoimento também acima se transcreveu e aqui dá-se por integralmente reproduzido.

    XXV-E, também a tal propósito, a testemunha L…, explicanda do Recorrente, prestou depoimento na sessão de 18/06/2015, e cujo depoimento acima se transcreveu e aqui se reproduz.

    XXVI-Por sua vez e ainda sobre tal factualidade, depôs a testemunha Margarida R., na sessa do dia 18/06/2015, cujo depoimento também se transcreve supra e aqui se reproduz.

    XXVII-E, ainda sobre a mesma materialidade, depôs a testemunha Margarida B., na mesma sessão de 18/06/2015, cujo depoimento também se transcreveu acima e também se dá aqui por reproduzido.

    XXVIII-Ora, resulta inequívoco da prova supra transcrita: · que o Centro de Explicações onde o Recorrente dava explicações era um espaço relativamente pequeno, localizado num primeiro piso de um centro comercial.

    · A porta de entrada era de vidro, seguia-se um corredor cujo final fazia um “U”, de um lado tinha a sala do Recorrente, em frente a da sua companheira e ao lado, a de seu irmão.

    · Tais portas eram tão juntas umas com as outras que os aros das mesmas portas tocavam entre si.

    XXIX-Mais resulta assente, que os três gabinetes funcionavam, habitualmente, com as portas abertas ou entreabertas mas nunca fechadas (a própria Assistente refere, como acima se transcreveu, que numa das idas ao centro de explicações, o Recorrente não estava e ela deparou-se com o irmão dele, no seu gabinete, com a porta aberta, como era habitual – palavras da própria).

    XXX-E ainda que, dada a exiguidade do espaço, era audível de uns gabinetes para os outros, sons mais elevados.

    237.º-Mais se conclui que nesse centro de explicações as pessoas – alunos, explicadores, encarregados de educação – circulavam de forma livre, com respeito mas com confiança, e todos os assuntos eram tratados com o explicador diretamente – pagamentos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT