Acórdão nº 1963/12.9TJVNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 25 de Maio de 2016

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução25 de Maio de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I- Relatório 1- António M, e esposa, Manuela C, residentes na Rua C, freguesia de Ribeirão, Vila Nova de Famalicão, instauraram a presente acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra Jorge A, residente na Rua V, Ribeirão, Vila Nova de Famalicão, alegando, em breve resumo, que este último lhes vendeu, através da empresa construtora, em Março de 2009, o prédio urbano onde habitam, descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Famalicão sob o nº 2548 e inscrito na respectiva matriz sob o artigo 5149° da freguesia de Ribeirão.

Sucede que, desde, pelo menos, o ano de 2011 que têm vindo a aparecer diversos defeitos de construção no referido prédio.

Por isso, solicitaram ao Réu a reparação de tais defeitos, mas o mesmo recusou-se a fazê-lo, alegando que o prédio não era dele, nem o tinha vendido.

Viram-se, por isso, obrigados a solicitar um orçamento para a eliminação dos mesmos defeitos, com o que terão de despender a quantia de 9.300,00.

Pedem, assim, que o R. seja condenado a pagar-lhes esta quantia de 9.300,00€, para reparação e eliminação dos danos, defeitos, vícios e anomalias existentes no citado imóvel.

2- Contestou o R., começando por arguir a sua ilegitimidade para esta demanda, uma vez que responsável pela reparação dos defeitos indicados pelos AA. é a sociedade que lhes vendeu tal prédio e não ele próprio.

É verdade - continua- que celebrou com essa sociedade um contrato promessa de compra e venda reportado ao dito prédio. Porém, volvidos alguns meses, viu-se forçado, por motivos pessoais, a desistir de tal contrato promessa, em execução do qual já tinha entregue, a título de sinal, o montante de 25.000,00€.

Por isso, de modo a não perder esse valor, acordou com a referida sociedade que encontraria um comprador para o referenciado imóvel, que o substituísse no negócio prometido. E, assim, depois de ter entrado em contacto com os AA., acordou com eles que os mesmos iriam adquirir o prédio em causa, pelo preço que já estava estabelecido. E assim sucedeu. Cedeu-lhes a sua posição contratual e a escritura de compra e venda do imóvel em causa foi outorgada entre os AA. e a sociedade que dele era proprietária.

Daí que nenhuma responsabilidade lhe possa ser imputada na reparação pretendida pelos AA.

Consequentemente, pede a sua absolvição da presente instância, por ilegitimidade processual da sua parte, ou, subsidiariamente, a improcedência da acção.

3- Os AA. replicaram refutando estas pretensões.

4- Seguiu-se o saneamento do processo, no âmbito do qual foi julgada improcedente a excepção de ilegitimidade invocada pelo R..

5- Mediante alegação de que os defeitos inicialmente apontados se agravaram e que surgiram novos defeitos, foi ampliado o pedido no sentido do R. ser condenado a pagar a quantia de 41.389,50€ para a reparação e eliminação dos danos, defeitos, vícios e anomalias já mencionados.

6- Concluída a instrução e a audiência final, foi proferida sentença que julgou a presente ação improcedente e absolveu o R. do pedido.

7- Inconformados com esta sentença, dela recorrem os AA, terminando as suas alegações recursivas com as seguintes conclusões: “I) Deveria ter sido considerada provada a seguinte matéria: - O Réu vendeu aos Autores, através da firma construtora, em Março de 2009, o prédio melhor identificado no ponto 1 (al. a) dos factos não provados); - Todas as negociações foram mantidas entre Autores e Réu, com intermediação da Imobiliária ERA. (14º da resposta).

- As entregas que os Autores lhe fizeram (ao Réu) foram para pagamento do preço do imóvel e não para pagamento de obras e da cessão de posição contratual. (20º da resposta).

- Tendo (o Réu) sempre agido, perante os Autores, como dono e legítimo possuidor do prédio identificado no art. 1º da Petição Inicial. (25º da resposta).

II) Sobre tais matérias pronunciou-se a Autora mulher, em declarações de parte, (sessão de 16/3/2015 das 00:10:29 às 00:19:57 e das 00:35:38 às 00:36:39). De tal depoimento resulta que toda a negociação conducente à compra da casa foi feita com o Réu Jorge A: “... foi tudo contratado com o Sr. Jorge A ...”; “... apresentou-se sempre como dono ...”; “... O contrato-promessa com o Sr. Jorge A foi feito na Era ...”; “... os cheques foram entregues directamente ao Sr. Jorge ...”; “... a LCM escrituraria directamente para nós, mas o Sr. Jorge, como dono, terminava a casa ...”; “... eu nunca falei com ninguém da LCM ...”; “... foi no acto da escritura que apareceu lá uma senhora, de quem não sei o nome ...”; “... não conheço ninguém que estivesse ligado a LCM ...”; “... para o Sr. Jorge não perder o direito à casa eu pagava o distrate ao banco e ele terminava a casa, e só depois eu lhe dava o restante dinheiro ...”.

III) Sobre os factos referidos na conclusão I), prestou ainda depoimento Carla S (sessão de 16/3/2015 das 00:01:46 às 00:12:28), que disse em suma: “... O Sr. Jorge era um cliente que estava a vender umas moradias ...”; “... na altura ao angariar a casa da D. Manuela, angariou outra ao lado também, o Sr. Jorge era proprietário ...”; “... nunca conheci ninguém da LCM ...”; “... para fazer visitas, para o que fosse era com o Sr. Jorge que ligava ...”; “... era ele que vinha lá abrir a porta, foi ele que mostrou, foi ele que disse que era o proprietário, foi ele que me assinou ...”.

IV) Sobre tais factos foi ainda inquirida Zulmira M (sessão de 16/3/2015 das 00:11:20 às 00:13:51 e das 00:14:53 às 00:15:37), fluindo também deste depoimento que a Autora, na altura da compra, lhe havia logo dito que ia adquirir a casa ao Réu. Para além disso, por várias vezes, viu o Réu, já depois da outorga da escritura, a orientar as obras para acabamento da casa. Sabia ainda que este tinha medo de ficar sem a casa, pelo que queria fazer a escritura, acordando com a filha que depois lhe acabava a casa.

  1. Ainda sobre a matéria em apreço foi ouvida a testemunha Maria A (sessão de 30/4/2015 das 00:00:51 às 00:01:14, das 00:01:48 às 00:03:34, das 00:07:08 às 00:13:53 e das 00:14:34 às 00:05:39), resultando do seu depoimento haver sido o Réu a colocar o imóvel à venda na Era. Disse também que os Autores nunca foram contactados, via Era, pela LCM antes do dia da escritura, e ainda, que todo o negócio foi discutido com a Era e com o Réu. Nem a própria Era conhecia alguém da LCM, e o único contacto que houve com esta sociedade foi para marcação da escritura. Confirmou que em todos os documentos assinados pelos Autores e pelo Réu se faz referência a este, como proprietário.

    VI) Ora, dada por provada a matéria vertida quer em a) dos factos não provados, quer o alegado em 14, 20 e 25 da resposta à contestação, facilmente se verifica que entre Autores e Réu foi celebrado um contrato inominado que a Doutrina e a Jurisprudência batizaram como “ajuste de revenda”.

    VII) Na verdade, cada vez mais os contratos promessa relativos a imóveis são utilizados como instrumentos de especulação imobiliária e de investimentos tendentes à realização de mais-valias. Logo que a obra esteja concluída, o especulador cede a sua posição, realizando com isso uma mais-valia. Entre este adquirente e o promotor imobiliário é depois outorgada a escritura de compra e venda que transmite o direito de propriedade sobre o imóvel.

    VIII) Da materialidade fáctica alegada e assente nos presentes autos é indesmentível estarmos perante um contrato inominado de ajuste de revenda que implica obrigações mútuas de ambas as partes que não se extinguem com a outorga do contrato de compra e venda celebrado entre os Autores e o promotor imobiliário.

    Assim, tendo o Réu ajustado a revenda aos Autores do imóvel em apreço, é manifesto que as suas obrigações contratuais para com estes se mantêm autónoma e independentemente da outorga da escritura de compra e venda.

    IX) Deste modo, tendo sido ajustada a revenda entre Réu e Autores é aplicável a este contrato, por analogia, o disposto no art. 913º e ss. do Código Civil, porquanto os Autores lograram provar a existência dos defeitos e vícios que alegavam.

  2. Mas ainda que se mantivesse inalterada a matéria de facto dada por provada, mesmo assim a acção deveria proceder, devendo o Réu ser condenado nos pedidos. Ora vejamos: Está assente em dois dos factos provados, o seguinte: - Por contrato denominado de contrato promessa de compra e venda, celebrado em 9/5/2008, os Autores declararam prometer comprar ao Réu, e este declarou prometer vender-lhes o prédio supra referido, pelo valor de 174.000,00€ (Cento e Setenta e Quatro Mil Euros).

    XI) Quer à data da outorga do contrato promessa - 9/5/2008 -, quer à data da celebração da escritura pública de compra e venda - 6/3/2009 - e como decorre da matéria assente, a propriedade do imóvel adquirido pelos Autores, encontrava-se registada a favor da sociedade LCM, SA (sociedade que viria a ser...

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