Acórdão nº 15/15.4T8BGC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Dezembro de 2016

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução15 de Dezembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães APELANTE: B. SEGUROS APELADOS: C. e D.

Comarca de Bragança, Instância Central, Secção do Trabalho – J1 I – RELATÓRIO Frustrada a tentativa de conciliação, C. e marido D., residentes na … intentaram a presente ação especial emergente de acidente de trabalho contra B. Seguros – SUCURSAL EM PORTUGAL, com sede na Rua …, pedindo que se declare o acidente sofrido por seu filho E. como de trabalho e consequentemente se condene a Ré a pagar-lhes:

  1. A pensão anual e vitalícia no montante de 1.060,50€ (a cada um dos beneficiários) até à idade de reforma, e a partir da idade da reforma na pensão anual e vitalícia no montante de 1.414,00€ a partir de 6/01/2015 nos termos do preceituado nos artigos 61º n.º 1, n.º 2 e n.º 3, artigo 57º n.º1 alínea d) da lei 98/2009 correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual.

  2. Essa pensão deverá ser paga adiantada e mensalmente até ao 3.º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual.

  3. Aos subsídios de férias e Natal, no valor de 1/14 cada da pensão anual, são respectivamente pagos nos meses de Maio e Novembro, nos termos do preceituado no artigo 72º da Lei 98/2009 de 4 de Setembro.

  4. Às despesas de funeral com transladação no valor de 3.689,14€ e) Indemnização pelos períodos de IT´S no montante de 252,62€- artigo 48 n.º1 e 50 da lei 98/2009.

  5. Ao valor de 130 € correspondente à deslocação efectuadas ao Tribunal de Trabalho em Bragança, virtude de não existirem transportes públicos capazes de transportar os A. até Bragança que possam chegar em tempo útil às diligências nesse tribunal; g) A importância correspondente a juros vencidos contados à taxa legal sobre as importâncias vencidas e que se forem vencendo até integral pagamento; Alegam em resumo que são os progenitores de E., que sofreu um acidente de trabalho em 17/12/2014, no exercício da sua profissão de trabalhador agrícola, ao serviço do seu empregador, em consequência do qual sofreu lesões que lhe determinaram a morte, ocorrida em 5/1/2015. O sinistrado era solteiro e estava integrado no agregado familiar dos AA., com quem vivia em economia comum, contribuindo regularmente para a economia familiar, já que os seus pais não têm outro rendimento para além de uma pensão vitalícia que a A. mãe aufere por acidente de trabalho de montante não superior a €234,00. A responsabilidade infortunística do empregador encontrava-se totalmente transferida para a R. seguradora por meio de contrato de seguro de acidentes de trabalho. O sinistrado auferia a retribuição diária de €16,83 e mensal de €505,00.

    Regularmente citada, a Ré Seguradora contestou, defendendo em síntese, que o sinistrado E. não se encontrava a realizar qualquer tarefa determinada pelo seu empregador ou por qualquer representante deste no momento do acidente e que este ocorreu por acto voluntário e temerário daquele, realizado em favor de terceiro, não estando, por isso, coberto pelas garantias do seguro, além de que resultou exclusivamente de comportamento imprudente e negligente do próprio sinistrado e da privação do uso da razão por parte deste proveniente do consumo de substâncias sedativas e hipnóticas.

    * Os autos prosseguiram os seus ulteriores termos tendo por fim sido proferida sentença, a qual terminou com o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, julgo totalmente procedente, por provada, a presente acção e, em consequência, condeno a R. B., Sucursal em Portugal a pagar aos AA. C. e D. as seguintes prestações: - Uma pensão anual e vitalícia, a cada um, de €1.060,50 (mil e sessenta euros e cinquenta cêntimos), desde o dia 6/01/2015, a pagar adiantada e mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 da pensão anual e sendo os subsídios de férias e de Natal, no valor de 1/14 da mesma pensão, pagos, respectivamente, nos meses de Junho e de Novembro, sem prejuízo da sua eventual remição obrigatória, nos termos do art. 75º da NLAT; - A quantia de €130,00 (cento e trinta euros); - Juros de mora, à taxa legal, desde a data do respectivo vencimento, ou seja, desde 6/01/2015 quanto à pensão por morte e desde a citação quanto às despesas de deslocação.

    Custas pela R..

    Notifique.

    Registe.

    Fixo à causa o valor de € 23.187,39.

    Cumpra o disposto no art. 137º do Cód. Proc. Trabalho.

    Notifique os AA. beneficiários para, no prazo de 10 dias após o trânsito em julgado da presente sentença, vir aos autos declarar se pretendem a remição obrigatória da pensão fixada nestes autos, atento o disposto no art. 75º nº 1 da NLAT.” Inconformada com esta decisão, dela veio a Ré interpor recurso para este Tribunal da Relação de Guimarães, apresentando alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1ª – O presente recurso incide, prima facie, sobre o julgamento da matéria de facto, mais concretamente a resposta dada ao facto constante do art.º 42º da base instrutória.

    1. - A resposta do tribunal a quo ao art.º 42.º da base instrutória foi: “Provado apenas o que consta da alínea F) da matéria de facto assente”. Contudo, tal facto deve passar a “Provado” (cfr. artigo 640.º n.º 1 do C.P.C.).

    2. - A resposta art.º 42.º da b.i. deverá ser modificada com base no depoimento produzido pelas testemunhas Márcio e Soares, que assistiram aos factos.

    3. – Do depoimento destas duas testemunhas resulta que o sinistrado sugou, com força e repetidamente, o gasóleo do depósito da máquina, tendo acabado por ingerir gasóleo do tubo e ainda que o sinistrado apenas parou o movimento de sucção do gasóleo após ingerir uma elevada quantidade de gasóleo, quando se sentiu mal.

    4. – A exacta passagem do depoimento da testemunha Márcio que impõe uma decisão diversa da recorrida é a compreendida entre o min. 13.40 e o min. 14.30 e a do Soares situa-se entre o min 16.45 e o min 18.15.

    5. - Os depoimentos destas testemunhas conjugados entre si, confirmam, na íntegra, o facto do art.º 42.º da douta base instrutória, o qual deverá ser dado como provado.

      A FALTA DE QUALIFICAÇÃO DO EVENTO COMO UM ACIDENTE DE TRABALHO TIPIFICADO NA L.A.T.

    6. - Face aos factos provados, não ocorreu um típico acidente de trabalho, nos termos constantes na Lei n.º 98/2009, de 4/9, não havendo, por isso, lugar a reparação. 8ª – A versão dos factos alegada na douta p.i. “faliu” por completo, pois “as testemunhas presenciais desmentiram a versão dos AA. de que o sinistrado recebeu ordens expressas de Soares para auxiliar o maquinista no procedimento de remoção do ar da mangueira do gasóleo, nem sequer que este tivesse solicitado qualquer auxílio aos trabalhadores presentes para tal tarefa” – vide despacho de resposta aos quesitos de fls .

    7. - Provou-se que foi o próprio sinistrado quem interpelou de forma repetida o maquinista José para que este o deixasse tentar sugar o gasóleo.

    8. - O sinistrado não se encontrava a executar uma tarefa determinada pela sua entidade patronal, que nessa altura não orientava o E.. 11ª - Provou-se ainda que o sinistrado tinha como tarefa específica, “retirar do solo as pedras sobrantes” e foi contratado unicamente para esse fim, 12ª - Face à matéria de facto dada como provada não existe nexo causal entre a tarefa de sugar o gasóleo da Bulldozer e as funções que o sinistrado exercia.

    9. - O art.º 8º n.º 1º da Lei 98/2009 de 4 de Setembro (L.A.T.) delimita o conceito de acidente de trabalho sendo ainda unânime o entendimento de que “Independentemente de ocorrer ou não no tempo e no local de trabalho, o que relevará fundamentalmente para que um acidente possa ser considerado como de trabalho é que o trabalhador se encontre, no momento da sua verificação, sob a autoridade da entidade empregadora, se encontre a executar um serviço ou tarefa por ela determinado” – cfr. ARC de 16/12/2015, Proc. n.º 235/13.6TTLRA.C1, disponível em www.dgsi.pt .

    10. - A tarefa de sugar gasóleo não foi determinada pela entidade empregadora do sinistrado e, decisivamente, encontra-se desligada das funções para que foi contratado.

    11. - Aquando do sinistro, do acto de sugar o tubo, o sinistrado não se encontrava sob a autoridade da sua entidade empregadora. Não foi por causa das funções que exercia naquele arroteamento que o sinistrado ingeriu gasóleo.

    12. - A tarefa de “sangrar” a Bulldozer não foi determinada pela sua entidade empregadora, nem por qualquer representante da mesma, e não cabia nas funções que o sinistrado exercia naquela empreitada agrícola.

    13. – A visão da Exm.ª Sr.ª Juíza a quo, não é sustentável do ponto de vista jurídico.

    14. - Por um lado, os Autores não alegaram uma relação de dependência entre as funções que o sinistrado desempenhava e tarefa que o maquinista da Bulldozer executava.

    15. - Por outro lado, não resulta dos factos provados a existência de relação de dependência jurídica entre as tarefas do manobrador da máquina e a específica tarefa desempenhada pelo sinistrado. A questão é, neste caso, jurídica.

    16. - Por último, esta construção foi até contrariada pelo depoimento da testemunha José– cfr. min. 18.13 e min 19.45 do seu depoimento gravado.

    17. - Face à matéria de facto dada como provada, deverá entender-se que o sinistro em discussão nos presentes autos não configura um acidente de trabalho, tal como tipificado na Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro.

      SEM PRESCINDIR – DESCARACTERIZAÇÃO POR NEGLIGÊNCIA GROSSEIRA 22ª - Mesmo que se entenda que o evento en cause configura um acidente de trabalho, sempre o mesmo se mostra descaracterizado, uma vez que se deveu à negligência grosseira do próprio sinistrado – art.º 14.º n.º 1 al. b) da Lei n.º 98/2009, de 4/9.

    18. - Do rol de factos provados resulta que o sinistrado, ao sugar o combustível da mangueira de uma forma inadvertida, adoptou um comportamento temerário em alto grau que conduz inevitavelmente à descaracterização do sinistro. Trata-se de um comportamento de risco, mesmo risco de perder a vida, como se viu.

    19. - O movimento de sucção de uma mangueira onde corre um combustível (gasóleo) é um acto de elevado perigo, que não pode ser confundido com o acto de...

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