Acórdão nº 726/13.9TBEPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução15 de Setembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Procº nº 726/13.9TBEPS Comarca de Braga Relatora: Maria Amália Santos 1ª Adjunta: Desembargadora Ana Cristina Duarte 2º Adjunto: Desembargador João Diogo Rodrigues * Pedro M, divorciado, residente na Rua J, nº 82, 1.° Dto, Fânzeres, Gondomar, intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo sumário, contra o ESTADO PORTUGUÊS, pedindo a sua condenação, nos termos da Lei nº 67/2007, de 31 de Dezembro, a pagar-lhe uma indemnização pelos danos sofridos, no valor de € 5.000,00, assim como os justos honorários e despesas legais do seu mandatário, num valor nunca inferior a €1.500,00, e ainda uma indemnização por danos morais e pelo sacrifício, num valor nunca inferior a €1.500,00, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal de 4 % ao ano, desde a citação até efectivo pagamento.

Alega para tanto ter sido sujeito, enquanto arguido, a um processo-crime que correu termos no 1.° Juízo do Tribunal Judicial de Esposende sob o nº 306/09, relativamente a factos sobre os quais havia sido já julgado anteriormente no 1.° Juízo do Tribunal Judicial de Valongo (processo nº 353/09, que foi sentenciado a 03/02/2011), sendo que apenas a 31/03/2011 foi concluído pelo Tribunal de Esposende que o A. estava a ser julgado duas vezes pela prática do mesmo crime, após o mesmo, no início da audiência de julgamento, a 09/03/2011, ter invocado esse facto.

Ou seja, não só o arguido tinha sido investigado e acusado duas vezes pela alegada comissão do mesmo crime, como foi sujeito a dois julgamentos, em duas comarcas diferentes, pelo mesmo alegado crime, em clara violação do princípio constitucional “ne bis in idem”, consagrado no artº 29º nº 5 da CRP, no artº 4º nº1 do Protocolo adicional à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e no artº 14º nº 7 do Pacto Internacional sobre direitos civis e políticos.

Mais alega que o facto de ser julgado duas vezes pelo mesmo crime lhe causou ansiedade, cansaço, incerteza, falta de sono, depressão, angústia, preocupações e aborrecimentos e que este segundo julgamento pelos mesmos factos, a nível do registo policial e judicial, se encontrava sinalizado como processo pendente e que podia ser utilizado num outro processo e penalizá-lo.

* Citado o R (com a representação do MºPº), veio o mesmo contestar, alegando não ter sido cometido qualquer erro judiciário, já que no processo 306/09, que correu termos no Tribunal de Esposende, não foi praticado qualquer ato ou proferida qualquer decisão inconstitucional, ilegal ou injustificada, atendendo aos elementos ou pressupostos de facto conhecidos na altura, tendo sido praticados os atos e proferidas as decisões que nos termos da lei se impunham, em função dos elementos de facto conhecidos.

Alega ainda o Mº Pº que o Autor teve sempre conhecimento dos factos que lhe foram imputados em ambos os processos, pelo que, não informando atempadamente os Tribunais Judiciais de Valongo e de Esposende acerca da pendência de dois processos criminais com o mesmo objecto, causou prejuízo ao Estado, dada a prática de actos e a prolação de decisões desnecessárias.

Além disso, não obstante ter tido total conhecimento da tramitação de ambos os processos, não se coibiu de intentar a presente acção, apesar de perfeitamente consciente da falta de fundamento da sua pretensão, tendo omitido, dolosa ou com negligência grave, factos relevantes para a decisão da causa.

Termina pedindo a sua absolvição do pedido e a condenação do Autor como litigante de má-fé, em multa e em indemnização ao Estado Português, nos termos dos arts. 542º e 543º do CPC.

* O Autor veio Responder à contestação do MºPº, refutando as alegações de litigância de má fé, pedindo que esse pedido seja liminarmente rejeitado.

* Considerando que o estado dos autos permitia decidir desde logo os mesmos, sem realização de Audiência de Julgamento - conforme comunicação feita às partes, dando-lhes a possibilidade de se pronunciarem quanto a tal intenção, ao abrigo do princípio do contraditório e da proibição das decisões surpresa -, foi proferida a seguinte decisão: “Destarte e por todo o exposto, julgo totalmente improcedente por não provada a presente acção e, em consequência, absolvo o Réu do pedido. Custas pelo Autor”.

* Não se conformando com a decisão proferida, veio o A dela interpor o presente recurso de Apelação, apresentando Alegações e formulando as seguintes Conclusões (que reproduzimos integralmente): “1ª - O aqui A., discorda totalmente das conclusões do Tribunal "a quo" que indeferiu a sua acção e correspondente pedido.

  1. - O Tribunal "a quo" mormente não concedeu ao aqui A., o seu "dia" em Tribunal no Fórum certo para requerer justiça.

  2. - O Tribunal "a quo", na nossa óptica de e forma errónea e salvo melhor entendimento, não considerou diversos factos que, apesar de necessitarem de prova em julgamento, obviamente, que a serem provados ainda que documentalmente, dariam razão ao aqui A., e levaria inexoravelmente à condenação do Estado Português.

  3. - "Maxime" o facto de o Sr., Procurador da República da Comarca da Maia - Dr. A ter pedido uma certidão, em 28/10/2009, ao processo nº 306/09.3GAEPS.

  4. - Pedido que foi acedido e essa certidão chegou ao processo 353/09.5PWPRT, como não reparou na identidade do objecto processo? 6ª - Como não reparou o procurador do M.P., de Esposende na identidade do objecto processual? 7ª - Assim, o Tribunal "a quo" ofendeu os direitos tutelados pela C.R.P., designadamente no artº 20° nº 4 da C.R.P., ao limitar o acesso do A., ao Direito e aos Tribunais quando não autorizou a continuação do presente processo para julgamento de forma a poder provar os seus argumentos jurídicos e a matéria de facto controvertida, nos termos do artº 595° nºI al., b), 8ª - A estatuição ínsita do artº 595° nº1 al., b) do N.C.P.C., é de utilização extraordinariamente rara pelos Tribunais de 1ª instância, sendo apenas na precisa medida em que existam excepções peremptórias, e sem necessidade de prova suplementar, só devendo ser utilizável e "aconselhável, a regra de que o juiz se abstenha de decidir enquanto no processo não estejam obtidos os pontos de facto articulados, necessários para as várias e plausíveis soluções da questão de Direito" - Ac., RI Coimbra de 29/10/91 in CJ, IV, pág., 124.

  5. - Fundamentalmente se afirma como se pode provar uma dada matéria controvertida a nível fáctico se o Tribunal "a quo" não deixa que se prove tal factualidade em sede própria? No julgamento, assim é impossível ter um acesso concreto aos Tribunais.

  6. - Deste modo impugna-se, em 1° lugar o facto de o Tribunal "a quo" não ter considerado como provado ou não a questão documentalmente inclusa no processo - o pedido de certidão do M.P. da Maia ao M.P., de Esposende que devia ter alertado os mesmos da duplicidade processual.

  7. - Em segundo lugar impugna-se, igualmente, a não autorização de comprovar em sede de julgamento a prova controvertida.

  8. - Para melhor compreensão do que se conclui veja-se o douto Ac., S.T.J., de 12/02/2004, processo nº 03b1414/itij/net - "o despacho saneador, conhecendo do mérito da causa em conformidade com a alínea b) do artº 510º do antigo C.P.C, e tendo neste caso o valor de sentença para todos os efeitos (nº 3), está necessariamente sujeito na sua elaboração, "mutatis mutandis", ao disposto do antigo artº 659º e ao julgamento de facto nele previsto (. . .) a discriminação dos factos que o juiz considera provados (. .. ) não se reduz a uma actividade mecânico-formal (. . .) antes devendo a mesma conceber-se como acto de exteriorização e expressão enunciativa do julgamento de facto. Acto que o Tribunal "a quo" não concretizou.

  9. - Esta limitação do acesso ao julgamento é muito frequente nos processos contra o Estado Português, mas não se acredita "in casu" que tal tenha acontecido.

  10. - Mas o aqui A., está obstinado a ir até às derradeiras instâncias para obter justiça! 15ª - O aqui A., requer a Tribunal da Relação que decida já a presente contenda, nos termos do artº 665° nºs 1 e 2 do N.C.P.C. pois considera que o Tribunal "a quo" já formou definitivamente a sua convicção, independentemente da eventual prova concretizada numa sessão de julgamento.

  11. - Noutro apontamento da matéria de Direito e em seguimento do 1º ponto, o Tribunal "a quo" não decidiu correctamente, na óptica do A., pois existem factos jurisdicionais lesivos dos direitos constitucionalmente titulados do mesmo, na óptica da violação do princípio "ne bis in idem".

    17a - Com efeito, o despacho de acusação que é de certeza um acto jurisdicional pois o M.P., representa o Estado Português – artº 1° do Estatuto do M.P. - "Ministério Público representa o Estado" 18ª - Acresce à citação da excelente tese de doutoramento -...

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