Acórdão nº 445/16.4T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução22 de Setembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.

I -RELATÓRIO O Ministério Público intentou a presente ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho contra B., S.A., com sede …, pedindo que a ação seja julgada procedente por provada e consequentemente que seja reconhecida e declarada a existência de um verdadeiro contrato de trabalho subordinado celebrado entre a Ré e a trabalhadora C., fixando a data do seu início em 1 de setembro de 2011.

Para tanto, alegou em resumo que a Autoridade para as Condições do Trabalho – Centro Local do Ave, no dia 4/12/2015, pelas10h19m, na sequência de fiscalização de rotina às instalações da Ré constatou a Srª Inspetora … a existência de indícios de utilização indevida de contrato de prestação de serviços por parte da Ré, nomeadamente no que respeita à relação contratual que mantinha com a C., residente em ….

Assim, embora a Ré e a Fisioterapeuta C. tenham outorgado no dia 1/09/2011 aquilo a que apelidaram de contrato de prestação de serviços, celebrado de forma verbal, a verdade é que esta sempre trabalhou para a Ré de forma subordinada, pelo que se está na presença de um contrato de trabalho, desde o início da relação contratual.

* Citada a Ré apresentou contestação alegando em resumo, que o contrato celebrado com a C. configura um contrato de prestação de serviços, livre e voluntariamente celebrado entre as partes.

Conclui assim a Ré pedindo a improcedência da ação com a sua consequente absolvição do pedido.

* Notificada a C. que poderia aderir ao articulado apresentado pelo Ministério Público, apresentar articulado próprio e constituir advogado, veio a fls. 73 apresentar requerimento, nele declarando que adere aos factos alegados pelo Ministério Público.

* Designado o dia 14/04/2016 para julgamento e aberta a audiência para realização de audiência de partes, no referido dia, o Mm.º Juiz tentou a conciliação das partes nos termos do disposto no artigo 186º-O do C.P.T., tendo de seguida o Senhor Procurador da República e o Mandatário da Ré declarado que encetaram conversações com vista a negociar os termos do acordo do contrato de trabalho da Trabalhadora C., tendo o Mm.º Juiz proferido o seguinte despacho: “Uma vez que as partes iniciaram negociações com o objectivo de celebrarem um contrato de trabalho, fica sem efeito a audiência de julgamento para hoje agendada e que irá prosseguir com a eventual homologação da transacção que irão celebrar, no dia 9 de Maio de 2016, pelas 11.00 horas Notifique.” No dia 9/05/2016, foi aberta a audiência, constando da respetiva ata o seguinte: “Aberta a audiência de partes pelo Mmo Juiz de Direito e cumpridas as formalidades legais, foi tentada a conciliação das partes, nos termos do disposto no artº. 186º - O do Código de Processo do Trabalho, objectivo que não foi conseguido.

Contudo, pelo Exmo. Senhor Procurador da República e Ilustre Mandatário da entidade patronal, foi pedida a palavra e, sendo-lhes concedida, no uso da mesma requereram a suspensão da instância por 10 dias, nos termos do disposto no art. 272.º, nº 4, do C.P. Civil, uma vez que continuam com conversações com vista a negociarem os termos do acordo. * Seguidamente, o Mmo Juiz de Direito proferiu o seguinte: DESPACHO Face ao requerido pelas Partes e nos termos disposto no do artigo 272.º, nº 4, do Código do Processo Civil, suspensão da instância por 10 dias, designando-se para a realização da audiência final o dia, 19 de Maio de 2016, pelas 11:00 horas, na eventualidade das partes não chegarem a acordo. Notifique.” No dia 19/05/2016, pelas 11.45 horas foi aberta a audiência, constando da respetiva ata o seguinte: “Presentes: A Trabalhadora, o Digno Magistrado do Ministério Público, o legal representante da Ré Sr. …, o Dr. … e as testemunhas arroladas pelo Ministério Público. Não compareceram as testemunhas arroladas pela Entidade Patronal a apresentar.

* Reaberta a audiência de partes, quando eram 11:45 horas (a esta hora em virtude de terem sido demoradas as conversações entre o Ministério Público, Trabalhadora e Empregadora), pelo Mm.º Juiz foi pela Drª … pedida a palavra e, sendo-lhe concedida requereu a junção aos autos de procuração outorgada pela Trabalhadora que o Mm.º juiz examinou, rubricou e cuja junção ordenou aos autos.

* Após, pelo Mm.º Juiz, cumpridas as formalidades legais, foi tentada a conciliação das partes nos termos do disposto no artº 186.º-O do C.P.T.

De seguida, a Trabalhadora e Empregadora declararam que chegaram a acordo nos termos das seguintes cláusulas: Primeira A Trabalhadora, melhor esclarecida, declara que desde 01/09/2011 até 31/12/2013 trabalhou na Ré vinculada com um contrato de prestação de serviços, continuando desde 01/01/2014 até hoje integrada como trabalhadora nos quadros da empresa, com a categoria de fisioterapeuta.

Segunda A Ré aceita e reconhece o ora declarado pela sua trabalhadora e nomeadamente que esta se encontra vinculada à Ré mediante Contrato de Trabalho desde 01/01/2014. Terceira Custas a cargo da Empregadora.

* Seguidamente, o Mm.º Juiz proferiu a seguinte: SENTENÇA Nos presentes autos de Acção Reconhecimento Existência de Contrato de Trabalho que C. intentou contra B., SA, Trabalhadora e Empregadora celebraram a transacção que antecede, cujo teor se dá aqui por reproduzido.

A transacção é objectiva e subjectivamente válida, porque disponível o seu objecto e porque nela intervieram as próprias partes.

Assim, por as partes terem capacidade e o objecto da transacção ser legal, nada tenho a opor (artigo 52º, nº 2 do CPT).

* Custas a cargo da empregadora Fixa-se o valor da acção 2.001,00 €.

Comunique à A.C.T. (Autoridade Para as Condições do Trabalho).

Registe e notifique.

* Da sentença que antecede foram os presentes devidamente notificados, do que disseram ficar cientes, após o que o Mm.º Juiz declarou encerrada a audiência. Para constar se lavrou a presente acta que lida vai ser assinada.

O Mm.º Juiz de Direito,” * Inconformado com a decisão dela veio o MINISTÉRIO PÚBLICO recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, tendo formulado as seguintes conclusões: A- Analisando o regime legal condensado na Lei nº 63/2013, de 27 de agosto, que veio alterar a Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro e o C. P. Trabalho, observamos que o escopo, essencial e exclusivo, intencionalmente querido pelo legislador e por ele explicitado no art.º 1.º foi o de instituir mecanismos de combate à utilização indevida do contrato de prestação de serviços em relações de trabalho subordinado.

B- Com o mecanismo instituído o legislador não visou apenas combater a precariedade de emprego: caso a acção seja julgada procedente, o empregador não só terá de garantir aos colaboradores, com efeitos retroactivos e também para o futuro, os mesmos direitos que a lei confere aos trabalhadores vinculados por contrato de trabalho sem termo (tais como pagamento de férias, subsidio de férias e Natal, trabalho suplementar, etc.) como terá de se confrontar com uma contingência fiscal e contributiva, designadamente a liquidação de taxa contributiva prevista para o regime geral dos trabalhadores por conta de outrem.

C- Sendo o Ministério Público a única entidade com legitimidade para propor esta acção e fazendo-o em representação do Estado e, fundamentalmente, na prossecução de interesses e finalidades de índole colectiva (designadamente, para a defesa da legalidade democrática, nos termos da Constituição, do correspondente Estatuto e da lei - artigo 1.º do EMP), surgindo, nessa medida e em termos adjectivos, a defesa por essa magistratura dos interesses privados do “trabalhador” num plano acessório e mediato, é inevitável que a posição do Ministério Público prevaleça sobre a posição desse “trabalhador”, quando da sua intervenção formal ou informal nos autos, dado os interesses particulares que este defende não se poderem sobrepor aos objectivos e resultados de cariz público que são perseguidos pelo Estado, através desta acção especial e da sua propositura pela referida magistratura.

D- Nessa medida é juridicamente irrelevante a transacção formulada nos autos, uma vez que a concordância da Trabalhadora não pode obstar ao prosseguimento da acção, subvertendo em absoluto a filosofia que presidiu à criação desse novo tipo de acção.

E- Por isso, não podia a transacção ser homologada.

F- A douta decisão recorrida violou, por erro de interpretação o disposto nos artigos 1249º do Código Civil, 1º da Lei 63/2013, de 17 de Agosto, 15º-A da Lei 107/2009 de 14 de Setembro, 52º e 186º-K do CPT, e artigo 289º nº 1 do Cód. de Processo Civil.

G- Normativos legais esses que deverão ser interpretados e aplicados com o sentido e alcance que se retira da presente alegação.

H- E consequentemente ser revogada a decisão de que se recorre e substituída por outra que considere ilegal a transacção alcançada e ordene o prosseguimento dos autos com a designação da audiência de...

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