Acórdão nº 1252/16.0T8VNF-C.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução22 de Setembro de 2016
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO O B. Banco, SA, requereu, em 22-02-2016, no Tribunal Judicial de Braga, a declaração de insolvência de C., divorciado, invocando, como causa de pedir, que este se encontra impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas (artº 3º, nº 1, do CIRE).

Para tanto, alegou, como fundamentos (segundo a petição e os documentos para que nela remeteu) (1): -o requerido, em 2006, constituiu-se (juntamente com sua esposa) fiador e principal pagador, renunciando expressamente ao benefício de excussão prévia, das obrigações decorrentes de dois contratos de mútuo com hipoteca (sobre imóvel adquirido pelo preço de 190.000€) celebrados em 29-09-2006 mediante os quais o requerente emprestou ao filho daquele (D.) e sua cônjuge as quantias de 150.000€ e 70.000€, respectivamente; -não tendo sido pagas as prestações em dívida decorrentes de tais contratos, o Banco instaurou execução judicial nº 2135/12.8TJVNF para sua cobrança coerciva contra ambos os mutuários, a co-fiadora e, bem assim, o aqui requerido (co-fiador); -nesta execução, relativamente ao activo deste (requerido co-fiador C.), apurou-se a existência de quatro fracções autónomas; -contudo, sucede que tais imóveis já estão onerados com diversas hipotecas e penhoras cujos valores excedem amplamente o seu valor patrimonial e cuja venda não será possível (devido à crise imobiliária) ou, sendo-o, ocorrerá (por essa mesma razão e também face às regras adjectivas) por valor muito inferior ao patrimonial; -no âmbito dessa mesma execução judicial nº 2135/12.8TJVNF, os executados não pagaram as quantias em dívida nem nomearam outros bens ou direitos à penhora, nem, por seu lado, o ora requerente/exequente conseguiu, apesar de porfiadas diligências, apurar a existência de quaisquer outros bens ou direitos penhoráveis e suficientes para satisfazer o crédito; -logrou, apenas, numa execução fiscal que, em simultâneo, foi instaurada contra o referido mutuário e dono do imóvel hipotecado e em que foi ao concurso de credores reclamar os seus créditos (então no valor de 223.228,47€, ou seja, o mesmo reclamado naquela petição executiva), obter, por via da adjudicação que lhe foi deferida de tal imóvel pelo valor proposto de 163.510€, a redução do seu crédito em 155.020,02€ (uma vez que à sua frente foram graduados outros no valor de 8.489,98€), só este ficando efectivamente pago; -deste modo e não obstante, em 11-02-2016, o valor do seu crédito restante, emergente dos ditos dois contratos, cuja responsabilidade o requerido co-afiançou, ascendia ainda a 91.678,75€, não perspectivando recebê-lo; -mesmo a pensão que o requerido aufere do Centro Nacional de Pensões já se encontra penhorada à ordem de seis processos executivos contra ele em curso até perfazer o montante global de aproximadamente 136.826,29€.

Daí concluiu o requerente que estão preenchidos os factos indiciários da situação de insolvência previstos nas alíneas a) e b), do nº 1, do artº 20º, do CIRE: suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas e falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.

Juntou documentos pertinentes.

Uma vez citado, o requerido deduziu oposição, na qual concluiu que a acção deve ser julgada improcedente e do respectivo pedido absolvido, uma vez que o Banco não tem fundamento para pedir a insolvência e o seu crédito se encontra integralmente pago através da adjudicação do imóvel hipotecado.

Para explicitar a sua defesa, confirmando os factos relativos ao património apurado e garantias a que o mesmo já está afecto, alegou/argumentou, se bem entendemos, que: -o Banco aceitou como garantia hipotecária dos dois mútuos, cujo montante máximo (registado) poderia ir até um total de 311.300€, o referido imóvel porque sabia e considerou que ele (pelas finanças avaliado, já em 2012, em 234.250,00€) tinha (e tem) um valor de mercado superior ao garantido; -apesar de a execução 2135/12.8TJVNF ter sido instaurada em 21-06-2012, a respectiva penhora só teve lugar em 27-01-2015 (por motivos que desconhece mas apenas imputáveis ao requerente Banco…), o que possibilitou que as Finanças se antecipassem tendo-o penhorado em 17-04-2014 e adjudicado àquele credor (conforme acima descrito); -se tal tivesse ocorrido antes naquele outro processo, a adjudicação não poderia ter sido feita, como foi, ao requerente, por menos de 199.112,50€ (85% do valor patrimonial base, ou seja, de 234.250,00€); -por isso, o requerido ficou prejudicado na diferença: 199.112,50€ - 163.510€ (valor por ele proposto) = 35.602,50€; -daí que “a posição ora assumida pelo requerente consubstancia, assim, um abuso de direito”; -acresce que o imóvel adjudicado ao requerente pode por ele ser vendido pelo valor de cerca de 250.000€, que é o de mercado, ou, pelo menos, pelo valor patrimonial referido (234.250€), suficiente para cobrir o valor em dívida pelo requerido; -não sendo assim, os mutuários continuam devedores de parte do empréstimo contraído para sua aquisição, apesar de da respectiva propriedade já não disporem e o mutuante permanecer ainda como correspectivo credor, embora sendo já dono do imóvel; -tal implica enriquecimento sem causa; -não é, pois, verdade que se verifique uma situação de o Banco estar impossibilitado de recuperar um seu crédito (ou de o requerido lho pagar).

Tendo o contestante requerido a realização de uma perícia incidente sobre o valor do imóvel, que foi indeferida, foi-lhe, no entanto, deferida, já em audiência de julgamento, a junção de um documento que constitui um relatório da avaliação por ele particularmente mandada realizar ao mesmo (2), tendo aquela prosseguido com a inquirição de duas testemunhas.

Por fim, foi proferida sentença que, com fundamento na alínea b), do nº 1, do artº 20º, do CIRE, declarou a insolvência do requerido.

Este, porém, não se conformou e dela interpôs recurso para esta Relação, instruído com as respectivas alegações que rematou com as seguintes conclusões: “a. Perante a prova produzida nos autos, deveriam ser dados como provados os factos constantes das alíneas N e R da matéria de facto não provada.

  1. Assim, o facto da alínea N deveria constar dos factos provados com a seguinte redação: “O imóvel dado como garantia ao contrato referido em A. tem o valor patrimonial de € 234.250,00 e o valor de mercado de € 274.774,10”.

  2. O facto da alínea R deveria constar dos factos provados.

  3. Devem ser aditados aos factos provados, os seguintes (alegados pelo recorrente e por ele provados): “O requerente, B. Banco, S.A., aceitou o imóvel, que lhe veio a ser adjudicado, como garantia do pagamento de um valor que poderia ascender a € 311.300,00, constituindo sobre ele duas hipotecas”; “Os imóveis que se situam na zona do que foi adjudicado pelo recorrido e semelhantes a este estão a ser vendidos por valores semelhantes”; “Trata-se de uma casa para habitação tipologia T3, com dois pisos, área total do terreno de 606 m2, área de implantação do edifício de 232,79 m2, área bruta de construção de 359,57 m2, área bruta privativa de 309,88 m2, com piscina e acabamentos de luxo”.

  4. A alteração supra referida (quer a passagem dos factos não provados para os provados, quer o aditamento à matéria de facto provada), fundamentam-se na seguinte prova produzida: Depoimentos das duas testemunhas ouvidas, supra transcritos; Os documentos 02, 03 e 04 juntos à contestação; O documento junto pelo recorrente na audiência de julgamento (relatório de avaliação do imóvel).

  5. Este último documento foi junto sem oposição do recorrido e sem que este o impugnasse, pelo que, e seguindo a nossa orientação jurisprudencial, os factos nele contantes, e em especial, o valor do imóvel, devem ser considerados admitidos por acordo, g. E, sendo assim, a sua prova está excluída da livre apreciação do Mmo. Juiz, conforme previsto no nº 5 do Art. 607º do CPC.

  6. Peca, também, a sentença, por ter omitido totalmente a referência à prova documental, não se pronunciando o Mmo. Juiz sobre os documentos juntos, nem sobre a razão por que lhes terá retirado força probatória, i. Violando, assim, o dever, previsto no nº 4 daquele mesmo artigo do CPC, de analisar criticamente as provas.

  7. Retirou, também, relevância ao depoimento da testemunha do recorrente, Carla, alegando, para o efeito, que o mesmo “não foi relevante para a descoberta da verdade, dado que esta não demonstrou conhecimento de causa em relação aos factos que afirmou, designadamente, não mostrou conhecimentos que justifiquem valorar-se o seu depoimento quanto ao valor do imóvel em causa nos autos”.

  8. Salvo o devido respeito, foi errada esta apreciação do julgador porquanto esta testemunha revelou ter conhecimento direto dos factos, por conhecer o imóvel em questão (é irmã do mutuário e filha do recorrente) e por ser proprietária de um muito semelhante, que se situa duas casas acima, m. Tendo afirmado, de forma perentória que não venderia a sua casa por menos de € 275.000,00 (cfr. depoimento supra transcrito).

  9. Quanto à fundamentação de direito da douta sentença recorrida, ficou, a mesma, comprometida, desde logo, porque não se encontra devidamente fundamentada a decisão de inexistência de abuso do direito e de enriquecimento sem causa.

  10. Ora, nos termos do disposto nos Arts. 608º - 2 e 154º - 1 e 2 ambos do CPC, o julgador não só deve resolver todas as questões que lhe tenham sido submetidas pelas partes, como devem fazê-lo de forma fundamentada, não podendo simplesmente, e salvo raras exceções, aderir aos fundamentos alegados pelas partes.

  11. Não o tendo feito, a sentença é nula.

  12. Ficou também comprometida pelo facto de o Mmo. Juiz não ter dado como provados factos que, na opinião do recorrente, o deveriam ter sido, conforme supra alegado, designadamente, o valor do imóvel.

  13. A prova deste facto necessariamente...

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