Acórdão nº 2221/12.4TAGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelARMANDO AZEVEDO
Data da Resolução19 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1.

No processo comum, com intervenção de tribunal singular nº 2221/12.4TAGMR.G1, do Tribunal Judicial a Comarca de Braga, Juízo Criminal de Guimarães, J1, em que é arguido L. P.

, demandante cível R. F.

e demandada cível X, Companhia de Seguros, SA, todos com os demais sinais nos autos, foi o arguido condenado, por sentença lida e depositada em 10.04.2018, nos seguintes termos [transcrição]: 1.

Absolver o arguido L. P., pela prática do crime de ofensa à integridade física grave p. e p. pelo art.º 144.º, al. a) do C.P. de que vinha acusado.

  1. Condenar o arguido L. P. pela prática de um crime de ofensa à integridade física grave por negligência p. e p. pelo art.º 148º, n.º 3 Código Penal na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa à taxa diária de €6,00 (seis euros) euros.

  2. Condenar o arguido nas custas do processo, fixando-se em 03 UCs a taxa de justiça, e demais encargos do processo.

    *2.

    Não se conformando com tal decisão condenatória, dela interpôs recurso a demandada X, Companhia de Seguros S.A., extraindo da respectiva motivação, as seguintes conclusões [transcrição]: I.

    Por, com a sentença recorrida, a recorrente se ver onerada com a presunção prevista no artº 623º do CPP, apesar da decisão de a remeter para os meios civis aquela mantem interesse e legitimidade para este recurso.

    II.

    Ao remeter a recorrente e recorrido civil para os meios civis a sentença recorrida incorreu na nulidade do artº 379º/2 do CPP, por violação do artº 82º/3 do CPP, devendo a mesma ser suprida, conhecendo-se do pedido civil.

    III.

    Ao não elencar como provados ou não provados os factos alegados nos artºs 5, 11, 12, 17, 18, 19, 20, 21, 23, 24, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40,41, 42, 45, 46, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55 a 70, inclusive, 79, 80, 81, 83, 84 e 85 da contestação da recorrente, que aqui, por economia, se dão por reproduzidos, violando o artº 374º/2 do CPP, a sentença incorreu na nulidade prevista no artº 379º/1, alínea a) do CPP, devendo a mesma ser suprida, elencando-se aqueles factos e como provados, face depois ao a seguir alegado.

    1. Ao remeter a recorrente e recorrido civil para os meios civis e ao não elencar, como provados e não provados, os factos da contestação da recorrente acima indicados, a sentença recorrida interpretou e aplicou os artºs 82º/3 e 374º/2 do CPP em violação dos princípios do acesso à justiça e da tutela jurisdicional efectiva, previstos no artº 20º da Constituição da República Portuguesa, no que aquela sua interpretação e aplicação se mostra ferida de inconstitucionalidade e, como tal, de nulidade, devendo a mesma ser suprida nos termos antes já pedidos.

    2. Por não elencar factos que integrem qualquer ilícito criminal e não alegar as normas estradais violadas pelo arguido a acusação pública violou o artº 283º/3, alíneas b) e c) do CPP, mostrando-se, como tal, nula, como, oportunamente denunciado pela recorrente e aqui deverá ser reconhecido.

    3. Por não condenar o arguido com base em factos concretos – os únicos são os dos nºs 4, 5, 6 e 12 da sentença e apontam para a culpa exclusiva do demandante – mas apenas com base em meras conclusões – as descritas sob os nºs 10 e 11 da sentença - o tribunal recorrido incorreu na nulidade prevista nos artºs 374º/2 e 379º/1 do CPP, devendo, como tal, a sua decisão ser revogada e substituída por outra que absolva o arguido e a recorrente dos pedidos.

    4. Os factos dos artºs 5, 11, 12, 17, 18, 19, 20, 21, 23, 24, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 42, 45, 46, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55 a 70, inclusive, 79, 80, 81, 83, 84 e 85 da contestação da recorrente, que aqui, por economia, se dão por reproduzidos, foram provados pelos seguintes meios de prova: a- inspecção ao local, em sede da audiência de julgamento de 27.02.2018; b- auto de participação de acidente de viação, feito pela GNR, no inquérito; c- auto de exame directo ao local feito pela GNR em 18.09.2012, no inquérito; d- relatório fotográfico feito pela GNR na data do acidente, no inquérito; e- fotografias do local juntas aos autos, no inquérito e com a contestação da recorrente; f- depoimento em 04.01.2018 da testemunha D. S., da GNR, autor do auto de exame directo e das fotografias supra, que, em tudo, confirmou; depoimento em 06.02.2018 da testemunha D. L., da GNR, autor do auto de participação supra, que, em tudo, confirmou (ambos os depoimentos testemunhais, que confirmaram expressamente os factos supra, gravados no sistema de gravação do tribunal, conforme actas das audiências indicadas, que aqui se dão por reproduzidas, a saber, respectivamente, ao minuto 0-23:42 e ao 00:06:10, sendo todos ao factos sucessivamente confirmados ao longo de todos aqueles depoimentos/gravações), todos os documentos supra não impugnados por nenhuma das partes, confirmados, em audiência, pelos seus autores e, como tal, com força probatória plena. Ao não os dar como provados a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento, devendo ser alterada, dando-se aqueles ditos factos por provados.

    5. Com base nos factos nºs 4, 5, 6 e 12 da sentença – mas também, embora sem necessidade, dos supra constantes da contestação da recorrente - deverá imputar-se a culpa e responsabilidade exclusivas na produção do sinistro sub juditio ao próprio condutor do ZJ, aqui demandante e recorrido civil, por violação dos artºs 24º/1, 25º/1, al. c), 27º/1 do CE e do artº 24º, sinal C 13, do Decreto Regulamentar 22-A/98, de 1 de Outubro, e dos artºs 483º e 487º do CC e, como tal, por se dever considerar que foi a sua manobra ou conduta estradal, de excesso de velocidade e falta de destreza, a única manobra provada e causal do acidente. Ao não o reconhecer a sentença recorrida fez uma errada aplicação das normas de direito por ela invocadas, as dos artºs artºs 3º/2, 12º e 30º do CE, e a do artº 148º/3 do CP, e violou as normais legais acima indicadas, incorrendo, assim, em erro de julgamento que deverá levar à sua revogação e substituição por decisão que absolva o arguido e recorrente dos pedidos contra eles formulados.

    TERMOS EM QUE o presente recurso deverá ser julgado procedente, alterando-se e revogando-se a sentença recorrida conforme atrás concluído e absolvendo-se o arguido e a recorrente dos pedidos, com o que se fará JUSTIÇA ! 3.

    O M.P., na primeira instância, respondeu ao recurso interposto pela demandada, tendo concluído nos seguintes termos [transcrição]: 1. Não padece a douta sentença de qualquer nulidade por omissão de pronúncia, nos termos 379º, n.º 1, al. c) do Código de Processo Penal.

  3. A douta sentença deu como provados, na sua essencialidade, os factos da acusação, que apresenta uma versão oposta àquela que foi apresentada na contestação da demandada. O Tribunal ao dar como provada uma das versões determina que, necessariamente, a outra fique prejudicada, sendo desnecessário ou supérfluo dá-la como não provada.

  4. Basta uma pequena leitura da douta sentença, para percebermos que nela se encontram elencados os factos praticados pelo arguido e que constituem a violação ou infracção de normas estradais.

  5. Não padece de nulidade a acusação pública, tal como não padece a douta sentença.

  6. A recorrente pretende pôr em causa a forma como o Tribunal se convenceu da verificação dos factos que considerou provados, isto é, pretende sindicar o uso que o Tribunal fez do princípio da livre apreciação da prova – artigo 127º do Código de Processo Penal.

  7. Porém, o Tribunal a quo fez correta apreciação da prova, de forma crítica e com recurso às regras da experiência comum, convencendo-se da verificação dos factos conforme o princípio da livre apreciação da prova.

  8. Não se verifica qualquer erro de julgamento na apreciação feita pelo Tribunal a quo.

  9. Não padece a douta sentença de qualquer vício, tendo o Tribunal a quo decidido de acordo com a lei e o direito.

    Nestes termos, deverá ser negado total provimento ao recurso apresentado pela demandada e mantida, na íntegra, a douta sentença recorrida.

    Este é o entendimento que perfilhamos.

    Exªs, porém, farão a costumada justiça.

  10. O ofendido / demandante cível R. F. respondeu ao recurso, pugnando pela falta de legitimidade da demandada cível para recorrer quanto à parte penal da sentença recorrida, devendo, por isso, ser rejeitado o recurso nessa parte. Caso assim se não entenda dever o recurso ser julgado improcedente.

  11. Nesta instância, o Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto, não se pronunciando sobre o recurso na parte civil, emitiu parecer no sentido de que o recurso pela demandada civil quanto à matéria criminal deve ser rejeitado.

  12. Foi cumprido que foi o disposto no artigo 417º nº2 do CPP e não foi apresentada resposta.

  13. Após ter sido efectuado exame preliminar, foram colhidos os vistos legais e realizou-se a conferência.

    Cumpre apreciar e decidir.

    II- FUNDAMENTAÇÃO 1- Objecto do recurso O âmbito do recurso, conforme jurisprudência corrente, é delimitado pelas suas conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, sem prejuízo naturalmente das questões de conhecimento oficioso (1) do tribunal.

    O nº 1 do artigo 412º do C.P.P. estabelece que “A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido”.

    Nas conclusões do recurso, o recorrente deverá, pois, fazer uma síntese das razões da sua discordância relativamente à decisão recorrida, tal como se encontram delineadas na respectiva motivação.

    Assim, considerando o teor das conclusões do recurso interposto pela demandada civil, as questões a decidir são: - Da alegada indevida remessa das partes civis para os meios civis relativamente ao pedido de indemnização civil formulado nos autos; - Da inconstitucionalidade dos artigos 82º, nº3 e 374º, nº 2 do CPP por violação do artigo 20º da CRP; - Nulidade da decisão recorrida por falta...

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