Acórdão nº 1448/17.7T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Novembro de 2018
Magistrado Responsável | JORGE TEIXEIRA |
Data da Resolução | 15 de Novembro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães.
I – RELATÓRIO.
MARIA, divorciada, residente na Rua … Braga, veio intentar contra A. N.
, divorciado, residente na Rua … Braga, a presente acção declarativa comum, tendo pedido que o réu fosse condenado a pagar-lhe o valor mensal de 125,00€, a contar desde 08 de Maio de 2013, e enquanto o réu se mantiver a habitar na fracção melhor identificada no art. 6.º da petição inicial, e até à venda da aludida fracção ou até ao trânsito em julgado da decisão a proferir na acção de divisão de coisa comum, atendendo ao facto que ocorrer em primeiro lugar.
Subsidiariamente, pediu que o réu fosse condenado a deixar o imóvel livre de pessoas e bens a fim de o mesmo ser colocado no mercado de arrendamento, repartindo-se entre autora e réu o produto do arrendamento, devendo o réu ser condenado a pagar-lhe uma renda/compensação correspondente a 125,00€ desde 08 de Maio de 2013 e até à desocupação do imóvel.
Para fundar a sua pretensão, alegou que o réu, pelo menos desde 12/12/2012, se manteve no uso e fruição exclusiva e gratuita daquela que foi a casa de morada de família de ambos, casa esta que foi entretanto objecto de partilha, tendo sido adjudicada a ambas as partes, em regime de compropriedade, pelo que entende assistir-lhe o direito a perceber metade dos rendimentos que o imóvel estaria apto a produzir.
Tendo sido citado, o réu não apresentou contestação (vide despacho de fls. 41), na sequência do que, a fls. 41, foram considerados confessados os factos articulados pela autora e, tendo-se ordenado a notificação a que alude o art. 567.º, n.º 2, do CPC, não foram apresentadas alegações.
Prosseguiram os autos com a realização de uma tentativa de conciliação, que veio a frustrar-se.
Realizado o julgamento, foi proferida sentença em que, respondendo à matéria de facto controvertida, se decidiu julgar totalmente improcedente a presente acção.
Inconformado com tal decisão, apela a Autora, e, pugnando pela respectiva revogação, formula nas suas alegações as seguintes conclusões: “I – Vem presente recurso interposto da Douta sentença que julgou totalmente improcedente o pedido que julgou totalmente improcedente o pedido da A., que consistia na condenação do R., seu ex-marido, ao pagamento de um valor mensal de 125,00€ a contar desde 8 de Maio de 2013, o qual corresponderia a metade do valor locativo do imóvel até à venda da fracção ou trânsito em julgado da decisão a proferir na acção de divisão de coisa comum.
II - Considerou o Tribunal a quo que não assiste à Autora o direito a peticionar uma compensação como contrapartida pelo utilização exclusiva por parte do Réu da sua quota parte na fracção, porquanto o Réu não privou a Autora de utilizar a coisa comum e não se verificam também os pressupostos do enriquecimento sem causa, pelo que inexiste fundamento legal para impor ao Réu a obrigação de pagar à Autora uma compensação pelo facto de estar a utilizar de modo exclusivo o imóvel.
III - Ora, não pode a Autora conformar-se com tal decisão. E desde logo porque a Autora, por acordo no processo de divórcio conformou-se com a utilização exclusiva da fracção por parte do Réu apenas até à data da partilha, não tendo o Réu qualquer título ou acordo que o legitime a utilizar o imóvel a partir de 8 de Maio de 2013, data em que a Autora instaurou o processo de inventário, o qual veio a ser decidido por sentença de 24 de Maio de 2016.
IV - Vedar a Autora o direito a receber uma compensação por parte de alguém – neste caso o ex-marido – que utiliza a metade da fracção que lhe foi adjudicada, é, no mínimo cortar-lhe o seu direito de propriedade e o direito ao arrendamento.
V - O Réu conhece que a utilização lícita da fracção cessou no momento da partilha do bem imóvel, porquanto o acordo de utilização da casa de morada de família apenas concedia ao Réu essa utilização lícita até à partilha.
VI - A partir desta data o Réu não usa licitamente a fracção, devendo ser reconhecida à Autora o direito a receber uma compensação por parte do Réu pela utilização exclusiva da fracção.
VII - E a gratuitidade consentida pela Autora quanto à utilização da fracção por parte do Réu cessou com a partilha, não devendo o Tribunal ficar alheio à questão suscitada pela Autora, cuja improcedência lesa gravemente os seus direitos, não podendo escudar-se o indeferimento da sua pretensão no facto de se afirmar que também a Autora poderia utilizar a fracção – sabendo-se que o Réu ali habita.
VIII - Se o Réu tivesse de arrendar outro imóvel também pagaria renda ao seu senhorio pela utilização do mesmo, como acontece actualmente com a Autora.
IX - Acresce que a decisão proferida pelo Tribunal a quo é em tudo injusta, pois não se sabe por quanto mais tempo se vai prolongar essa gratuidade, lesando-se assim gravemente a Autora e os seus direitos a perceber os frutos da sua quota- parte no imóvel.
X - Violando-se assim os princípios decorrentes da cessação da comunhão de direitos advenientes do património comum do casal, e em consequência o disposto nos artigos 1403º, 1404º, 1406º, 1793º do Código Cível e 931º.
*Os Apelados apresentaram contra-alegações concluindo pela improcedência da apelação interposta.
*Colhidos os vistos, cumpre decidir.
*II- Do objecto do recurso.
Sabendo-se que o objecto do recurso é definido pelas conclusões no mesmo formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso, as questões decidendas são, no caso, as seguintes: - Apreciar se em razão do uso exclusivo da casa de morada de família por um dos ex-cônjuges do imóvel que constituiu a casa de morada de família confere ao outro o direito a uma contraprestação por essa utilização do imóvel.
*III- FUNDAMENTAÇÃO.
Fundamentação de facto.
A factualidade dada como provada e não provada na sentença recorrida é a seguinte: Factos provados.
Factos Provados (por confissão ficta e bem ainda em atenção ao teor dos documentos de fls. 8 a 16):
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A autora e o réu foram casados no regime de comunhão de bens adquiridos, encontrando-se divorciados desde 12 de Dezembro de 2012, na sequência de acção de divórcio que correu os seus na 1.º secção- J1 – do Tribunal de Família e Menores de Braga sob o número de processo 688/11.7 TMBRG.
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A autora e o réu tinham bens comuns a partilhar.
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Por se mostrar frustrada a possibilidade de partilha extrajudicial, a autora instaurou, em 08 de Maio de 2013, por apenso ao processo referido em A), o processo de Inventário para partilha de bens do casal, o qual deu origem ao apenso A daquele processo.
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Como “Verba n.º 1” dos bens imóveis da Relação de bens constante do processo de inventário, está descrita a fracção autónoma designada pela letra “M”, sita na Rua …, União das Freguesias do (...), concelho de Braga, composta por 1.º Andar Direito, traseiras, T2, com terraço e garagem com entrada pelo n.º 20 e uma dependência para arrumos no sotão, inscrita na matriz predial urbana sob o n.º (...).
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Na Conferência de Interessados ocorrida em 26 de Junho de 2014, aquela verba n.º 1 foi adjudicada a cada um dos membros do ex-casal partilhante, na proporção de metade.
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À data o imóvel tinha o valor patrimonial de 46.340,00€ G) Foi elaborado o mapa da partilha e foi adjudicado a cada um deles, para pagamento das suas meações no património comum, o valor de 23.170,00€, mapa este que foi homologado por sentença de 24 de Maio de 2016, adjudicando-se aquela verba na proporção de metade à autora e ao réu para pagamento dos seus quinhões na meação comum.
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Tal sentença transitou em julgado em 29.06.2016.
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Em 12 de Dezembro de 2012, na Audiência de Discussão e Julgamento do processo de divórcio, por acordo entre as partes, foi atribuído ao réu o uso e fruição exclusiva da casa de morada de família que era bem comum do casal até à partilha.
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A casa de morada de família constituía a verba 1 dos bens imóveis na relação de bens apresentada no processo de Inventário para partilha dos bens comuns do casal.
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O réu habita e usufrui exclusivamente do imóvel que era casa de morada de família pelo menos desde 12 de Dezembro e até à presente data.
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Desde 01 de Abril de 2011 que a autora habita com o seu filho em casa arrendada na Rua … Braga, pagando de renda aos senhorios a quantia de 250,00€ mensais.
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As contribuições devidas a título de IMI referentes à fracção que constituía a casa de morada de família da autora e do réu são pagas na proporção de metade pelos mesmos, encontrando-se o imóvel averbado na matriz predial urbana no serviço de finanças em nome da autora e do réu naquela mesma proporção.
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Actualmente, a fracção em causa tem o valor patrimonial de 46.340,00€.
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A autora está privada do uso da fracção pelo menos desde 12 de Dezembro de 2012.
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Um prédio de igual tipologia, idade e localização ao referido em D) seria susceptível de gerar um rendimento a título de renda na ordem dos 250,00€ mensais.
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Em 10 de Novembro de 2016, a autora, mediante carta registada com aviso de recepção, interpelou o Reu para que procedesse ao pagamento do valor de 120,00€ (cento e vinte euros) a título de contrapartida monetária pela utilização da meação que lhe pertence na indicada fracção, que o réu se negou a pagar.
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A autora tem a categoria profissional de auxiliar de educação e aufere o vencimento base de 607,00€, com o qual faz face a todas as suas despesas, nomeadamente alimentação, água, luz, vestuário, calçado, despesas médicas e medicamentosas e que paga a renda para ter a sua habitação.
Fundamentação de direito.
Como fundamento da sua pretensão recursória alega a Recorrente que o Réu conhece que a utilização lícita da fracção cessou no momento da partilha do bem imóvel, porquanto o acordo de utilização da casa de morada de família apenas concedia ao Réu essa utilização lícita até à partilha, sendo que, a partir desta data o Réu não usa licitamente a fracção, devendo ser reconhecida à Autora o direito a receber uma compensação por parte do Réu pela utilização exclusiva da fracção.
Mais alega que a gratuitidade...
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