Acórdão nº 4805/16.2T8GMR.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelESPINHEIRA BALTAR
Data da Resolução08 de Novembro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam em Conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães X SPORTS, Sociedade Unipessoal Limitada, instaurou a presente ação declarativa comum de condenação contra: 1.Futebol Clube Y; 2- E. A.; E pediu a condenação dos RR a pagarem-lhe a quantia de: a) 53.310,96 €, (sendo 810,96 euros referentes a juros vencidos entre a data da entrega do capital e a data da sua restituição à autora) acrescida ainda dos juros de mora contados sobre a quantia de 50.000,00 €, referidos a cláusula penal, desde o dia 7 de Julho de 2016 até efetivo e integral pagamento, e os juros de mora contados sobre a quantia de 2.500,00 €, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, e b) o montante a liquidar no respetivo incidente, relativo aos prejuízos sofridos pela Autora em consequência da não participação e detenção de 49% do capital social da sociedade anónima desportiva, designadamente decorrentes dos proveitos que resultariam para a Autora dessa mesma participação, quer em termos de distribuição de resultados, quer na valorização dessa sua participação.

Invocou, em síntese, que autora e ré acordaram na constituição de sociedade desportiva.

Que nesse acordo a autora entregou logo 50.000,00 euros como parte da sua participação futura fixada em 100.000,00€. O restante seria a entregar no ato de constituição da escritura.

Que foi fixada cláusula penal para o incumprimento no valor equivalente à entrega tendo a ré já restituído os 50.000,00 euros.

Que teve prejuízos de 2.500,00 euros e terá prejuízos futuros que devem ser ressarcidos pela ré.

Que a ré foi constituir a sociedade com terceiros.

Funda a demanda contra o segundo réu na prestação de fiança.

A ré contestou invocando que a autora se apresentou no clube como querendo ajudar financeiramente o mesmo e que um empresário da construção civil, emigrado no Luxemburgo, estaria interessado em investir no futebol através da autora.

Em maio de 2016 a autora, através dos seus interlocutores com a primeira ré, declarou que o tal empresário já não estava interessado em investir no clube.

E, através dos seus interlocutores, propôs um patrocínio à ré no valor de 120.000 euros dos quais 20.000,00 euros seriam “comissões”.

E um dos interlocutores propôs ainda procurar um investidor francês na ordem dos 1 ou 2 milhões de euros, com repartição de «comissões».

A autora, com estas propostas de «comissões», incorreu perante a ré em ofensa aos bons costumes, excecionando o abuso de direito A ré verificou que a autora tem um capital social de 5.000,00 euros o que a seu ver é manifestamente insuficiente, assumindo assim que foi quebrada a confiança entre as partes, tendo devolvido, por tal razão, à autora, os 50.000,00 euros que recebera desta.

O segundo réu, por seu turno, vem invocar que o acordo dos autos constitui um mútuo nulo por falta de forma, que esta nulidade afeta a fiança que também é nula; que a cláusula penal é excessiva, reiterando o abuso de direito.

Foi proferido saneador sentença que julgou a ação parcialmente procedente.

O réu interpôs recurso para o TRG, que dando acolhimento à pretensão do recorrente, revogou a decisão proferida e ordenou o prosseguimento dos autos com vista ao apuramento da matéria alegada pelos réus configurada como matéria de exceção.

O autor requereu aclaração do acórdão, que não foi apreciada por falta do pagamento da competente taxa de justiça.

Volvidos os autos à primeira instância foi selecionada a matéria de facto, realizada a audiência final, com observância do formalismo legal que lhe é próprio.

Foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos: “Julgo a ação parcialmente procedente por provada e consequentemente condeno os RR no pagamento solidário à autora da quantia de 50.000,00 euros acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e até efetivo pagamento.

Do mais vão os RR absolvidos.

Custas por A e RR na proporção do decaimento”.

Inconformados com o decidido os RR. interpuseram recurso de apelação formulando as seguintes conclusões: “1ª - A sentença recorrida é nula, pois o tribunal a quo não se pronunciou sobre questões que devia apreciar (cfr. artigo 615º, 1, d) CPC).

  1. – Desde logo, no caso concreto, o clube 1º Réu requereu na Contestação, apresentada em 03-10-2016, a fls. 36 V, ponto C, a notificação da Autora para juntar aos autos as Declarações fiscais de IRC e IES, relativas aos anos de 2015 e 2016, para prova dos factos alegados no seu articulado nos artigos 8º, 29º a 31º, 33º, 42º a 47º.

    3º - Apesar de notificada para juntar tais documentos aos autos – e apenas em 26-02-2018 (cfr. folhas 239) - a Autora só os apresentou no processo após os Réus pedirem a sua condenação em multa pela falta e a inversão do ónus da prova (cfr. requerimento de folhas 242 V).

  2. - Tais documentos, sendo as prestações de contas ou as “contas oficiais” da Autora, apresentadas à Autoridade Tributária (ao Estado), na perspetiva dos recorrentes, demonstram a falta de capacidade financeira da Autora para executar o Memorando de fls. 10, alegada pelos recorrentes como causa para a não concretização da parceria entre as partes e a consequente quebra de confiança que tal situação causou ao 1º Réu.

  3. – Tais Declarações de IRS e IES da Autora, relativas aos anos de 2015 e 2016 só foram entregues na Autoridade Tributária em Março de 2018, isto é, após o início do presente julgamento, e após a prestação do depoimento de parte do legal representante da Autora.

  4. - Fácil é concluir que, desde a sua constituição em Agosto de 2015 (cfr. fls. 57V e 58) e até Março de 2018, a sociedade Autora/ora recorrida vivia em clandestinidade ou secretismo fiscal, isto é, não existia fiscalmente, não apresentava contas nem movimentos ao Estado, a terceiros; vivia numa situação irregular.

  5. - A sociedade Autora “não existia fiscalmente” e essa clandestinidade fiscal era o motivo pelo qual a Autora não pretendia concretizar o Memorando de fls.10, andando de reuniões em reuniões, com interlocutores e outros sujeitos que apareciam não se sabe de onde e com que propósitos e que gerou uma enorme falta de confiança na Autora.

  6. - Tendo o Memorando de fls. 10 sido assinado em 8 de Março de 2016 (cfr. factos provados A) já a Autora estava em falta para com as suas obrigações fiscais perante o Estado e assim continuou até Março de 2018.

  7. - Foi intenção óbvia da Autora não juntar as declarações fiscais aos autos, só o fez após intimada para o efeito, temendo a inversão do ónus da prova, conforme pedido dos RR. A Autora escondeu as prestações de contas dos RR e queria esconde-las do tribunal. Este comportamento da Autora não foi sequer apreciado pelo tribunal a quo e merece censura por isso.

    10º - Da análise de tais declarações fiscais identificadas a fls 244 a 302, resulta que a Autora, constituída apenas em Agosto de 2015, não tem visivelmente qualquer atividade de algum significado desde a sua constituição, tendo o volume de negócios em 2015 sido nulo e em 2016 de apenas € 16.500,00, não sendo possível identificar o tipo de serviços prestados.

  8. - Da leitura das IES retira-se que a Autora possuía somente um trabalhador ao seu serviço em 2016, com remunerações e encargos pagos nesse ano de, apenas, € 7.420,00. Por sua vez, do Balanço resulta que a Autora apenas terá efetuado neste período (2015/2016) como facto patrimonial relevante, a obtenção de um empréstimo de € 40.000,00.

  9. - De tais documentos resulta ainda que, em 31 de Dezembro de 2016, o rácio de autonomia financeira da Autora era de apenas 15,6%. Ora, este Balanço e estas “Contas”, associada à falta de história da Autora, não são de molde a, só por si, dar conforto a compromissos relevantes de natureza financeira a assumir pela própria, nomeadamente àqueles a que se obrigou pelo referido “Memorando” de fls.10.

  10. - É assim notória em 2015/2016 a debilidade financeira da Autora e a consequente falta de capacidade financeira para concretizar a parceria com o 1º Réu, como este alegou na Contestação de fls. 30 e na carta de fls. 40.

    14º - Como também o 1º Réu alegou na Contestação (cfr. artigos 8º, 31º, 42º a 47º) a não concretização da parceria entre a Autora e o 1º Réu ficou a dever-se à (1) falta de capacidade financeira da Autora e à (2) consequente quebra de confiança que tal situação causou.

  11. - Aliás, ainda antes da instauração da presente ação judicial, através da carta que o 1º Réu enviou à Autora (cfr. fls. 40) o 1º Réu já tinha dado a conhecer à Autora que o denominado “Memorando de Entendimento” de fls.10 não foi concretizado por única e exclusiva responsabilidade da Autora, invocando-se igualmente a falta de capacidade financeira da Autora e a consequente quebra de confiança que tal situação causou.

  12. - Incumbe ao 1º Réu a prova dos factos alegados nos artigos 26 a 48 da contestação, que aqui se reproduzem, pelo que os documentos apresentados nos autos pela Autora (em 06-04-2018 – ou seja, após o inicio do julgamento – cfr. fls. 244 a 302 ) são assim elementos de prova essenciais para a descoberta da verdade, pois a análise do teor dos mesmos permitiriam ao tribunal, além do mais, aferir se a Autora tinha ou não capacidade financeira para concretizar a parceria com o 1º Réu, facto que a este incumbe provar de modo a ilidir a presunção de culpa, tal como defende nos autos esta Relação de Guimarães no acórdão de fls. 175.

    17º - Até porque o legal representante da Autora, em sede de depoimento, pronunciou-se, a instâncias da Sra. juiz a quo, sobre os negócios da sociedade autora e que não coincidem com as prestações de contas dos citados documentos fiscais referenciados a fls. 244 a 302 – cfr. declarações transcritas em anexo e sobretudo no corpo destas Alegações.

  13. - A prestação de contas identificadas no requerimento de fls. 244 a 302 não refletem minimamente as declarações por este prestadas, pelo contrário, nos anos a que se refere, 2015, 2016 e 2017, não regista fiscalmente qualquer movimento, daí a necessidade destas serem apuradas, conforme perícia requerida nos autos pelos RR a fls...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT