Acórdão nº 2122/15.4T8VCT-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução10 de Julho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO A Sociedade “X – Planos, Projetos e Construção, Lda“ foi declarada insolvente, por sentença de 09-08-2016, transitada em julgado, a requerimento de Alexandre.

Entretanto, no âmbito do respectivo processo, foram, por este mesmo credor, apresentadas alegações, para efeito de qualificação da insolvência, nos termos do artigo 188º, n.º 1, do CIRE – cfr. fls. 2 e sgs dos autos – nas quais referiu, resumindo, que: -Apesar de bem saber que se encontrava em situação de insolvência (com dívidas de milhares de euros vencidas aos trabalhadores por violação ou cessação dos respectivos contratos laborais, à Segurança Social e ao Fisco), a devedora não se apresentou em juízo a requerer tal declaração.

-Apresentou um PER apenas com o propósito de entravar, como entravou, o curso do processo de insolvência; -Manuel foi, pelo menos no período de 2007 a 31-08-2016 único sócio e gerente da devedora e, em simultâneo, único sócio e gerente da “Y -Instalação de Caixilharia em PVC, Lda.”, tendo cessado esta qualidade e função em Agosto último.

-Aquele e esta reclamaram créditos “exorbitantes”; -O referido Manuel, com a sua actuação dolosa, agravou a crise económico-financeira da devedora; -Como resulta dos documentos justificativos do crédito da “Y” e da impugnação à reclamação daqueles, os valores aí imputados à insolvente pelo “aluguer e cedência de máquinas” pela Y promanam de facturas a esse título emitidas em apenas oito meses do ano de 2012 no valor total de 268.109,74€; -Desse modo esta “recebia os proveitos” e aquela “pagava as despesas”.

-Tal traduz a existência de uma contabilidade fictícia, criando artificialmente passivos de uma em proveito da outra.

-Conforme se alcança do relatório apresentado pela Senhora Administradora de Insolvência, a Insolvente não apresentou os documentos respeitantes às contas anuais relativas aos exercícios de 2013 a 2015, não indicou a senha das declarações electrónicas da insolvente, não reuniu os livros e restante documentação de suporte da contabilidade dos últimos 10 anos, nem indicou o momento e local para efectuar o seu levantamento para efeitos de apreensão.

-A Insolvente não depositou as suas contas na Conservatória do Registo Comercial, relativas aos anos de 2006 a 2103 e não promoveu o seu depósito dos anos de 2014 e 2015.

-Tanto que a Administradora de Insolvência, no seu relatório, referiu que, dadas as evidentes dificuldades da devedora no cumprimento das suas obrigações (que estão em incumprimento generalizado há sensivelmente um ano), não se predispunha a acompanhar/fiscalizar a sua actividade da requerida nem pretendia cobrar dela qualquer montante a título de despesas e honorários para o efeito.

Este incidente foi declarado aberto por despacho de 09-12-2016 e processado por apenso.

Conforme fls. 11 e sgs, a Administradora Judicial, juntou o seu Parecer (artº 188º, nº 2, do CIRE), de cujo teor se recortam as seguintes passagens relevantes: “[…] 2.1.

A devedora apresentou-se a Processo Especial de Revitalização, em Junho de 2015, […] 2.2.

Não obstante o período negocial decorrido no âmbito do PER e o tempo decorrido desde o seu início a verdade é que a devedora não conseguiu apresentar, dentro do prazo estabelecido para as negociações, o almejado Plano de Recuperação.

2.3.

Consequentemente, o Administrador Judicial Provisório ao abrigo do disposto no artigo 17º-G do CIRE, requereu a extinção do PER e a consequente declaração da insolvência da sociedade.

2.4.

A insolvência foi requerida por Alexandre tendo sido declarada por douta sentença de 09.08.16, com anúncio publicitado no portal citius em 10.08.16.

2.5.

O requerente da insolvência, Alexandre, juntou aos autos com a petição inicial os documentos que fundamentam o pedido de declaração da insolvência.

[…] 3.1.

A requerida é uma sociedade por quotas que se dedicava à organização, planeamento e elaboração de projectos de obras e urbanização de qualquer natureza, construção de obras públicas e civis, mecânicas e eléctricas por empreitadas ou empreendimentos por conta própria.

3.2.

O presente apenso foi despoletado pelo credor “Alexandre”. Segundo é afirmado pelo credor “Alexandre”, a signatária dá por garantido (atento o teor da informação já carreada aos autos) que, de facto: - a requerida sabia e não podia ignorar que o seu passivo não era recuperável, e que atenta a natureza dos valores envolvidos, a requerida deveria ter reconhecido a incapacidade de recuperação, e não o fez.

DA VERDADE DOS FACTOS APURADOS 4.1.

A Requerida nunca aceitou o estado de insolvência, apesar de lhe ter sido demonstrado, desde sempre, que não reunia condições para prosseguir a sua actividade.

4.2.

Era uma realidade, inequívoca, que cada mês de actividade se repercutia num mês de prejuízo a cada um dos credores (a maioria dos quais se encontra sem receber há cerca de um ano).

Posto isto, a Gerência da requerida, terá prosseguido no seu interesse pessoal uma exploração deficitária, causando efectivo prejuízo aos credores, numa altura em que era sabido que com as suas acções e omissões conduziriam a requerida a uma situação de insolvência e incumprimento generalizado, nos termos do disposto na alínea g), do n.º 2, do art.º 186.º do CIRE, sobretudo porque era evidente que a sociedade estava sobreendividada (vide os resultados contabilísticos relativos ao seu “endividamento” melhor identificados no Relatório a que alude o artigo 155.º do CIRE), e em incumprimento generalizado das suas obrigações (a maioria das quais sem que se tenha efectuado qualquer pagamento no ano transacto, vide Relação de Créditos Reconhecidos a que alude o artigo 129.º do CIRE).

4.3.

A gerência, por sua conta e risco, optou por prolongar a actividade, propondo que a empresa fosse viabilizada através de um Plano de Insolvência.

4.4.

Conforme resulta da informação carreada aos presentes autos, a requerida invocou ser titular de um activo manifestamente superior ao que realmente tem em sua posse, facto que até à data, em face dos bens apreendidos não se revela ser verdade.

4.5.

Posto isto, resulta evidente que a gerência, deliberadamente, constrói um Plano de Insolvência com base em resultados contabilísticos que não foram actualizados e que não traduzem, de todo, a realidade da empresa.

4.6.

Desta forma, logrou a devedora “ganhar tempo” e retardar a liquidação do seu activo, tendo ainda obstado a que se demonstrassem os reais resultados que deveriam vir consignados num balancete apresentado à data da insolvência.

4.7.

Da violação com culpa grave do dever de requerer a declaração de insolvência e do dever de elaborar as contas anuais, nos termos do disposto nas alíneas a) e b), do n.º 3, do art.º 186.º do CIRE Mostram-se incumpridos, de forma reiterada, os seus deveres de apresentação à insolvência, facto que em bom rigor deveria ter ocorrido, na sequência do PER.

O retardamento da declaração da insolvência ficou, também, a dever-se ao decurso lento da nossa Justiça, mas a verdade é que a requerida nunca reconheceu estar em situação de insolvência efectiva.

Por outro lado, entre o período que medeia o termo do PER e a Declaração da Insolvência, a gerência estava obrigada a proceder ao abatimento do passivo, facto que não se verificou, de todo, causando efectivo prejuízo aos credores, numa altura em que era sabido que com as suas acções e omissões conduziriam a requerida a uma situação de insolvência e incumprimento generalizado, nos termos do disposto na alínea g), do n.º 2, do art.º 186.º do CIRE Neste sentido, a par dos prejuízos efectivamente causados, a actuação da requerida redunda num incumprimento generalizado das obrigações a que se encontrava adstrita.

LITÍGIO DA REQUERIDA COM O DR. FRANCISCO E ESPOSA O litígio em causa traduzir-se-á num prejuízo sério para a globalidade dos credores porquanto existe a possibilidade de a Massa Insolvente enfrentar constrangimentos na apreensão de parte dos bens móveis pertença da requerida.

Chegou, em 13.01.17, ao conhecimento da signatária que a requerida e o gerente, desta, foram objecto de participação criminal (vide doc.º n.º 1), o que vem corroborar o teor das alegações formalizadas pelo credor “Alexandre”, dando por garantido que, de facto: - a requerida sabia e não podia ignorar que o seu passivo não era recuperável e que, de facto, atenta a natureza dos valores envolvidos, a requerida deveria ter reconhecido a incapacidade de recuperação, e não o fez, facto que tem vindo a causar graves prejuízos aos credores e - neste processo, a Gerência da requerida, terá prosseguido no seu interesse pessoal uma exploração deficitária, causando efectivo prejuízo aos credores, numa altura em que era sabido que com as suas acções e omissões conduziriam a requerida a uma situação de insolvência e incumprimento generalizado, nos termos do disposto na alínea g), do n.º 2, do art.º 186.º do CIRE.

DAS RELAÇÕES ESPECIALMENTE RELACIONADAS Em ordem a definir um nexo de causalidade entre a alegada actuação dolosa do gerente “Manuel” em exercício, paralelo de funções na ora requerida e na sociedade “Y” será necessário apurar-se o desfecho das impugnações apresentadas, revelando-se essencial peritar a contabilidade, em ordem a demonstrar em que termos poderá ter a Y passado de devedor a credor da requerida.

É premente apurar as facturações entre empresas porque, de facto, os saldos credores são exorbitantes e traduzem, com grande probabilidade, a criação artificial de passivos em consequência de um negócio ruinoso em proveito de empresa especialmente relacionada.

Pelo que, em ordem a que seja defensável a existência de nexo de causalidade propõe a signatária a nomeação de perito, em ordem a efectuar uma profunda análise ao estado da contabilidade.

Nesse sentido, a signatária sugere, desde já, a nomeação do Dr. I. R., com domicílio na Av … Viana do Castelo, para que em 15 (quinze) dias apresente um relatório com a análise, profunda das transações efectuadas entre a...

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