Acórdão nº 212/13.7TBMCD.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução10 de Julho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I E. A. instaurou a presente acção declarativa, que corre termos no Juízo Central Cível e Criminal de Bragança, contra Manuel e Maria, formulando os pedidos de: "1)- Declarar e reconhecer que a A. E. A. é a única herdeira legítima do remanescente da Herança aberta e indivisa por óbito de sua irmã, Lurdes; 2)- Declarar a anulabilidade dos contratos de seguro de vida e aplicações financeiras identificados nos arts.º 15.º a 17.º desta P.I.; 3)- A título subsidiário, declarar a nulidade dos contratos de seguro de vida e aplicações financeiras identificados nos arts.º 15.º a 17.º desta P.I., sendo nula a doação, por constituir disposição com efeitos mortis causa, sem constar de disposição testamentária válida e na forma prescrita por lei; 4)- Condenar os RR. a reconhecerem os pedidos formulados em 1) a 3) para todos os efeitos e consequências legais; 5)- Condenar os RR., a entregarem e restituírem à Herança aberta e indivisa por óbito de Lurdes, a quantia de 821.585,76 € (…), acrescida de juros vencidos e vincendos até à sua efectiva entrega e restituição.

".

Alegou, em síntese, que os contratos de seguro de vida, de que junta cópia, não foram subscritos pela sua irmã Lurdes, falecida a 24 de Novembro de 2009, de quem é herdeira. Para além disso, a indicação do réu Manuel como beneficiário em tais contratos não corresponde à sua vontade, havendo, nessa parte, uma divergência entre a vontade declarada e a vontade real. Os réus Manuel e Maria apoderaram-se dos valores aí aplicados e frutos dos gerados, devendo restituí-los ao "acervo e património da sua Herança, aberta e indivisa, com o seu óbito".

Os réus contestaram afirmando, em suma, que os contratos foram subscritos pela falecida Lurdes, que os celebrou conscientemente e neles expressou a sua efectiva vontade.

As autoras, na sequência da posição assumida pelos réus na contestação, requereu a intervenção principal "do Banco X, S.A. e da Companhia de Seguros Y, S.A., (…) para assegurar a legitimidade passiva, e cuja falta constituiria excepção dilatória de ilegitimidade passiva".

Essa intervenção principal foi admitida e as intervenientes apresentaram o seu articulado, ao qual as autoras responderam.

Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença em que se decidiu: "Pelo exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e prejudicado o conhecimento da excepção de caducidade e, em consequência Declaro que a autora E. A. é a única herdeira legítima do remanescente da Herança aberta e indivisa por óbito de sua irmã, Lurdes; e condeno o réu Manuel a entregar ou restituir à Herança aberta e indivisa por óbito de Lurdes, a quantia de € 821 585, 76 (oitocentos e vinte e um mil quinhentos e oitenta e cinco euros e setenta e seis cêntimos), acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos, a contar da citação e até à sua efectiva entrega e restituição.

Absolvo os réus do demais peticionado; e a autora e os réus do pedidos de condenação como litigantes de má fé.

" Inconformado com esta decisão, o réu Manuel dela interpôs recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: 1. A douta sentença recorrida não faz correta aplicação do direito sendo que, também a decisão sobre a matéria de facto merece reparos, impondo-se assim alteração da decisão final designadamente mediante a total improcedência do pedido e consequente absolvição do R..

  1. Por considerar que não foi feita prova sobre a veracidade das assinaturas apostas nos documentos que constituíam as aplicações financeiras em causa nos autos e das quais o R. seria beneficiário, determinou o tribunal a quo, ser desnecessária a apreciação das demais questões levantadas nos autos, por prejudicadas.

  2. Tal como melhor consta da douta sentença, o tribunal imputou ao R. o ónus da prova da veracidade dos documentos outorgados pela falecida Lurdes, incluindo a assinatura desta, não obstante ter indeferido a prova pericial requerida pelo mesmo aquando da junção aos autos dos originais de tais documentos.

  3. Considerou o tribunal que o R. não fez prova da autenticidade dos documentos que a seu ver lhe aproveitariam e, como tal, ao arrepio das mais elementares regras processuais, sem mais, deu como provado o exacto oposto, ou seja, a sua falsidade.

  4. Andou mal o tribunal a quo pois, não obstante não ter considerado que o exame pericial requerido pelo R. fosse dilatório ou impertinente, recusou a sua realização, indevidamente, assim inibindo o R. de provar a autenticidade das assinaturas constantes dos documentos em causa nos autos.

  5. A prova pericial podia e devia ter sido admitida assim se colocando em causa o douto despacho que a indeferiu.

  6. O tribunal não tinha fundamento válido para recusar a prova sendo que, também o poderia ter ordenado oficiosamente para que dúvidas não restassem nos autos.

  7. Andou ainda pior o tribunal ao considerar que o ónus da prova da autenticidade das assinaturas, da autenticidade dos documentos em causa nos autos, seria imputável ao R. para, a partir daí e, só daí, decidir nos autos como fez.

  8. Dispõe o n.º 2 do artigo 374.º do CC que incumbe à parte que apresenta um documento a prova da sua veracidade mas, o R. não apresentou qualquer documento e, nem o apresentou junto da A. com vista a que esta agisse de uma ou outra forma.

  9. Foi a A. que, como facto constitutivo do direito a que se arroga na PI, arguiu a falta de veracidade dos documentos aqui em questão e assinaturas neles apostas e, como tal, era à A. que incumbia a prova de falta de autenticidade e veracidade dos documentos e assinaturas em causa nos autos. Era a ela que tal factualidade aproveitava. Só a ela! 11. Ao contrário do considerado pelo tribunal a quo, não é aplicável o disposto naquele n.º 2 do artigo 374.º do CC, ou seja, não é imputável ao A. o ónus da prova da veracidade daqueles documentos mas, à própria A., o oposto, ou seja, incumbia à A. fazer prova do facto constitutivo do seu alegado direito ou seja, a falta de veracidade dos documentos em questão e assinaturas neles apostas.

  10. A A. nenhuma prova produziu nesse sentido e, da mesma forma, em momento algum provou que os documentos não correspondem à verdade e nem que a assinatura neles aposta não fosse feita pelo punho da falecida Lurdes, facto que apenas a si aproveitaria.

  11. O tribunal respondeu à matéria de facto sem fundamento em qualquer prova produzida em audiência de julgamento, no que toca a estas questões, para além da referida falta de prova por parte do R.

  12. Nem o tribunal podia imputar ao R. o ónus da prova da autenticidade dos documentos e assinaturas porquanto o ónus da prova do facto constitutivo do alegado direito da A. impende sobre a mesma, nem podia dar como provado o oposto, como fez e nos termos em que o fez, ou seja, única e exclusivamente com base na alegada falta de prova por parte do R. relativamente à autenticidade das assinaturas.

  13. A falta de prova de um determinado facto, não implica a prova da realidade factual que lhe é oposta significando apenas e só que os factos constantes do quesito têm de entender-se como não alegados, sequer o que significa não se terem como provados os factos quesitados e não que se tenham como demonstrados os factos contrários (cfr. v.g., Ac. Rel. Porto de 14.04.94, Colo Jur 1994-11-213 e Jur. e Doutrina ali referidas e Acs. STJ de 8.2.66,28.5.68,30.10.70,11.6.71, 23.6.73, 5.6.73, 23.10.73, 4.6.74, in Bol. M.J., respectivamente, 154-304, 177-260, 200-254, 208-159, 218-239, 228-195, 228-239 e 238-211).

  14. Neste mesmo sentido ainda e de forma ainda mais esclarecedora cfr. o Douto Ac. do STJ de 25/11/2008 no processo 3501/08 da 1ª Secção, in www.dgsi.pt.

    que aqui se dá por integralmente reproduzido, destacando-se: (…).

  15. O tribunal a quo deu como provada a factualidade constante dos pontos 15, 16 e 17 única e exclusivamente com base na falta de prova de autenticidade cujo ónus entendeu ser do R. não suportando tal decisão sobre a matéria de facto dada como provada em qualquer outra prova, em nenhum outro documento, em nenhum depoimento testemunhal.

  16. Mostra-se assim incorrectamente julgada a matéria daqueles pontos 15, 16 e, 17 da matéria de facto provada, devendo a mesma passar a não provada.

  17. Mostram-se igualmente incorrectamente julgados os pontos, 20, 21, 23 e, 24, todos da matéria de facto dada como provada, os quais devem passar a ser considerados como não provados.

  18. A autenticidade dos documentos alegadamente emitidos por um hospital e em que o tribunal suporta parte da sua decisão, foi, em devido tempo, colocada em crise pelos R. que impugnaram, na PI, a assinatura e teor dos mesmos. Cfr. artigo 14.º da contestação 21. No que a estes documentos, em momento algum foi feita prova nos autos que corroborasse o seu teor e, ou assinatura, incumbindo à A. tal prova.

  19. Quanto a este ponto, nenhuma das testemunhas depôs nos autos no sentido de confirmar o teor daqueles documentos designadamente no que respeita aos períodos de internamento ali mencionados.

  20. No que respeita ao ponto 23 dos factos provados, considerou o tribunal que tal matéria foi objecto de concordância pelos RR e, como tal deu-a como provada quando efectivamente, a matéria constante do ponto 23 dos factos provados, retracta o alegado pela A. em 70 da PI.

  21. Conforme melhor decorre do artigo 11.º da contestação, esta matéria foi devidamente impugnada por não corresponder à verdade para além de que, nenhum meio de prova foi invocado para fundamentar a resposta a esta matéria devendo, por isso, ser a mesma dada como não provada.

  22. Quanto ao demais, vale aqui o mesmo que se alegou quanto aos pontos 15, 16 e 17 da matéria de facto dada como provada pois, todos os factos que constam dos pontos 20, 21 e 24, são factos constitutivos do alegado direito da A..

  23. Foi a A. que os invocou sendo que, nenhuma prova fez relativamente aos mesmos. Prova alguma foi produzida em audiência de...

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