Acórdão nº 1423/09.5TBVCT-Q.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Julho de 2018
Magistrado Responsável | PEDRO DAMI |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
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RELATÓRIO.
“X – Indústria Transformadora de Madeira, Lda.
“, instaurou a presente impugnação da resolução em beneficio da massa insolvente, contra Massa insolvente de J. P., Lda., alegando, em síntese, que: por contrato, designado de “Contrato Arrendamento Industrial”, celebrado no dia 28/12/2003, a “J. P., Lda.”, enquanto proprietária e legítima possuidora do imóvel melhor descrito no artigo anterior, deu de arrendamento à Autora parte do dito imóvel, que circunscreveu numa planta junta em anexo ao dito contrato, correspondendo parte das áreas cedidas à Autora, a título de arrendamento para uso exclusivo desta, e outra parte para uso comum com a dita “J. P., Lda.”; por comunicação datada de 25/09/2017 e remetida por correio registado com aviso de recepção nesse mesmo dia, o Administrador de Insolvência da sociedade comercial “J. P., Lda.”, na referida qualidade e em representação desta, comunicou à Autora que, nos termos do art. 119º, nº 3 do CIRE, procedia “à resolução com justa causa do contrato de arrendamento industrial celebrado com” a Autora “em 28/12/2003”.
Termina pedindo a procedência da impugnação e, consequentemente, que se declare inválida e ineficaz a resolução do contrato de arrendamento promovida pelo Administrador de insolvência, na qualidade de representante legal da Ré, por inexistência de fundamento legal para promover a resolução, com fundamento na falta de alegação dos fundamentos necessários à resolução, por inexistência de fundamento fático para a resolução, por inexistir o direito de resolver com base na revogação unilateral, por haver caducado o direito de resolução nos termos do CIRE, por haver caducado o direito de resolução nos termos gerais do direito, ou, em último caso, por inexistir justa causa de resolução.
*Notificada para o efeito, a massa insolvente de “J. P., Lda.“ respondeu, invocando desde logo, erro na forma do processo e impugnando factos alegados pela A., pugnando pela improcedência da acção.
*Por considerar que dos autos constavam já todos os elementos fácticos necessários para o conhecimento da excepção dilatória de erro na forma do processo e da inexistência de fundamento legal para promover a resolução, sem necessidade de produzir provas, pelo que, nos termos do artigo 595º n.º 1, alínea a) do CPC, o Tribunal Recorrido decidiu conhecer, em sede da fase de saneamento do processo, das referidas questões (dispensando a realização da audiência prévia, nos termos do artigo 593º, n.º 1, do CPC).
*Nesta sequência, o Tribunal Recorrido proferiu, de seguida, a seguinte decisão: “V - Decisão: Pelo exposto, e ao abrigo do disposto no artigo 120º, n.º 1, do CIRE, o contrato de arrendamento em questão nos autos, não pode ser resolvido em benefício da massa insolvente, declarando-se tal resolução promovida pelo Administrador de Insolvência inválida e ineficaz.
*Custas a cargo da Ré – artigo 527º, n.º 1, do CPC.”.
*É justamente desta decisão que a Recorrente veio interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “1. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Meritíssimo Tribunal “a quo”, a qual e em suma, entendeu que: “ao abrigo do disposto no artigo 120º, n.º1 do CIRE, o contrato de arrendamento em questão nos autos, não pode ser resolvido em benefício da massa insolvente, tendo declarado tal resolução promovida pelo Administrador de Insolvência inválida e ineficaz”.
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Salvo o devido respeito por melhor entendimento, a Recorrente não pode concordar com os fundamentos que sustentam a douta decisão proferida.
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São duas as questões objecto do presente recurso e que se submetem à Douta sindicância deste Venerando Tribunal da Relação, a saber: • Improcedência da excepção do Erro na Forma de Processo.
• Configuração da Resolução do contrato de arrendamento em litígio como se a mesma se tratasse de uma resolução em benefício da massa insolvente, nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 120.º e 121.º do CIRE.
*I - DO ERRO NA FORMA DO PROCESSO: 4. Entende o Meritíssimo Tribunal “a quo” que o meio próprio para a Recorrida impugnar a resolução com justa causa operada é a constante do art.º 125.º do CIRE – Acção de Impugnação de Resolução de Negócio em Benefício da Massa Insolvente.
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Porém, e salvo o devido respeito por opinião diversa, não pode a Recorrente concordar com tal decisão.
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A Recorrente, e ao contrário do douto entendimento proferido pelo Tribunal “a quo”, não resolveu o contrato de arrendamento em apreço, com recurso ao disposto nos arts. 120.º e/ou 121º do CIRE, para que a Recorrida pudesse, ou devesse, defender os seus interesses ao abrigo da identificada acção.
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Ora, atenta a simples leitura da carta resolutiva – que se acha junta aos autos com a petição inicial e integralmente transcrita no corpo da presente alegação - verifica-se que a Recorrente invocou expressamente o disposto no art.º 119º, n.º 3 do CIRE, para o referido efeito (i. e. resolução do contrato de arrendamento com justa causa).
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Por outro lado, é inequívoco que o referido art.º 119.º n.º 3 do CIRE consubstancia uma excepção ao disposto no art.º 109.º, n.º 1 do CIRE, possibilitando às partes o direito de resolver com justa causa o contrato de arrendamento em vigor, e atenta a própria situação de insolvência, assim como a natureza e conteúdo das prestações contratuais.
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E facto é que nos presentes autos, atento o contrato celebrado e as cláusulas no mesmo plasmadas (contrato de arrendamento de duração indeterminada com convenção de impossibilidade de oposição à sua renovação), a Recorrente encontra-se impossibilitada de fazer operar o disposto no art.º 109.º, n.º 1 do CIRE.
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Apenas lhe restando lançar mão do disposto no art. 119.º n.º 3 do CIRE, como aliás fez.
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E, neste pressuposto, a resolução foi operada nos termos gerais e não ao abrigo dos arts. 120.º e 121.º do CIRE, como , erradamente, ajuizou o Mmo. Tribunal “a quo”.
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Sendo que, e tendo por base tal premissa, entende a Recorrente que a presente acção não é o meio próprio para a Recorrida lograr obter os seus intentos.
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Pelo que, no modesto entendimento da Recorrente, a Recorrida incorreu em manifesto erro na forma do processo, e consequentemente o Meritíssimo Tribunal “a quo” perpetrou o mesmo entendimento, e em consequência julgou improcedente a arguição de tal excepção, violando dessa forma o disposto no art.º 125.º do CIRE e 193.º do Cód. Proc. Civil.
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Em face do exposto, deverá a douta decisão proferida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente a excepção de erro na forma de processo, e que em consequência absolva a Recorrente da instância.
SEM PRESCINDIR, E CASO ASSIM NÃO SE ENTENDA: 15. Por outro lado, entendeu ainda, este douto Tribunal que o Exmo. Sr. Administrador da Insolvência resolveu o contrato de arrendamento nos termos do disposto no art.º 120.º n.º 2 do CIRE, e uma vez que invocou na carta resolutiva que o “contrato de arrendamento não só entardece como até mesmo inviabiliza …pois não existe compradores para um imóvel que se encontra locado…” 16. Ora, salvo o devido respeito pelo referido entendimento, sempre terá de se dizer que o douto Tribunal labora em manifesta lapso.
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Tendo por base a supra transcrita carta de resolução, é latente que a Recorrente não resolveu o contrato tendo por base o art.º 120.º do CIRE, nem o resolveu em benefício da Massa insolvente, mas sim, tendo por base o disposto no artigo 119º/3 do CIRE, e com base nas circunstâncias que infra se descrevem.
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Em 28/12/2003, as sociedades “J. P., LDA.” e a “X – INDÚSTRIA TRANSFORMADORA DE MADEIRAS, LDA.” celebraram entre si um contrato de arrendamento industrial sem estipulação de qualquer prazo.
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No respectivo contrato, verifica-se que a cláusula terceira preceitua que: “O arrendamento terá o seu início a 01/01/2004, e vigorará enquanto não for denunciado pela segunda outorgante pela forma e com a antecedência legais.
PARÁGRAFO ÚNICO: A primeira outorgante renuncia expressamente ao direito de denunciar o presente contrato”.
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Ora, é inequívoco que o supra transcrito parágrafo único se traduziu numa renúncia antecipada, por parte da senhoria, a ora insolvente, a um direito que lhe deveria assistir de se opor à renovação automática do contrato de arrendamento.
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Renúncia que, não obstante a Recorrente ter entendido ser nula, veio o Meritíssimo Tribunal “a quo”, por douta sentença proferida no âmbito do Processo n.º 1766/15.9T8VCT, Juízo Local Cível, Juiz 2, e devidamente transitada em julgado, considerá-la válida. (Cfr. Doc. 11 junto com a Petição Inicial) 22. Assim, e conforme veio a ser doutamente decido, encontra-se a Recorrente impossibilitada de se opor à renovação automática do contrato de arrendamento celebrado.
POR OUTRO LADO: 23. A referida sentença entendeu que o contrato em litígio se trata de um contrato a prazo certo, ao abrigo do disposto no art.º 1110.º, n.º 2 do Cód. Civil, e uma vez que o mesmo é omisso relativamente à estipulação da sua duração e ao facto de não fazer qualquer menção ao termo “duração indeterminada”.
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Pelo que, e sendo o respectivo contrato de arrendamento omisso quanto ao seu prazo, entendeu o douto Tribunal que ao mesmo se aplica o supra referido preceito legal, considerando o contrato em litígio por prazo certo (por um período de 5 anos).
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Em face de tal douta qualificação, a Massa Insolvente encontra-se, de acordo com a referida sentença, na presença de um contrato com prazo certo (5 anos), em relação ao qual a ora insolvente renunciou ao direito de se opor à renovação do contrato podendo, no entanto, proceder à sua denúncia - vista ao abrigo da presente lei, como revogação unilateral do contrato.
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Porém, verifica-se que, das regras gerais aplicáveis à locação para os contratos com prazo certo, ao senhorio não é concedida a possibilidade de proceder à denúncia dos mesmos, mas apenas e tão só de se opor à sua renovação.
ACRESCE: 27. Ao abrigo do art.º 109º, N.º 1...
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