Acórdão nº 70/17.2T8EPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelMARGARIDA SOUSA
Data da Resolução07 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO: MARIA propôs a presente ação declarativa de condenação contra X – CRISTAIS E CERÂMICAS, S.A., pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 33.705,00, a título de indemnização pelos danos por si sofridos (danos patrimoniais no montante de € 28.705,96 e danos não patrimoniais no montante de € 5.000,00) em consequência da sua destituição sem justa causa do cargo de administradora da ré, quantia essa a que acrescem os juros de mora, contados à correspondente taxa legal, desde a data da citação até efetivo e integral pagamento.

Citada, a Ré veio apresentar contestação, excecionando a incompetência material do tribunal, alegando que a destituição ocorreu com justa causa e impugnando todo o demais alegado pela autora.

A Autora veio responder à matéria de exceção, tendo-se decidido no despacho saneador, proferido em sede de audiência prévia, pela competência material do tribunal.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença a julgar a ação parcialmente procedente, e, em consequência, a condenar a ré a pagar à autora as quantias de € 25.497,56 (vinte e cinco mil quatrocentos e noventa e sete euros e cinquenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados da citação até efetivo e integral pagamento, e de € 2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), acrescida de juros contados desde a data da presente decisão até efetivo e integral pagamento.

Inconformada, recorre a Ré, formulando as seguintes conclusões: 1ª. A Mma. Juiz a quo considerou, na sentença sob recurso, ser a ré responsável pelo ressarcimento dos danos reclamados pela autora em consequência da sua destituição do cargo de administradora, por não se verificar justa causa de destituição nem ter havido uma proposta séria de emprego por parte da ré à autora, a esta causando prejuízos que computou nos montantes que constam da condenação.

  1. O conjunto dos factos provados constantes dos pontos 5, 6, 7, 11, 12, 13,14,17 e 18, são plenamente adequados e suficientes a deles se retirar a conclusão jurídica de existir justa causa de destituição da autora de administradora da ré, pelo que ao assim não o declarar na sentença, incorreu a Mma Juiz a quo em erro manifesto na apreciação da prova.

  2. Da factualidade provada no ponto 18. dos factos provados, consta que “As situações de conflito que ocorreram nas instalações da ré foram despoletadas pela autora por causa do mau-estar causado pela situação de conflito conjugal…”, o que, conjugado com a demais prova, nomeadamente documental, fundamenta a decisão de destituição da autora por parte da ré, com justa causa.

  3. Do depoimento da testemunha A. A. gravado sob o ficheiro 20171019144048_5433835_2870579, de 19-10-2017, de 14:40:49 até 15:10:38, (minuto 00:19:16 até ao minuto 00:27:08), transcrito no corpo desta alegação, resulta suficientemente demonstrada factualidade que é relevante para o conhecimento do mérito da causa e que deve constituir matéria de facto considerada provada, a acrescer à demais matéria provada, com o seguinte teor: «A autora disse à técnica oficial de contas da ré: “Eles julgam que fazem de mim o que querem, mas quem lhes vai dar cabo da vida vou ser eu! Vai a empresa e eles vão atrás!», devendo, assim, ser dado por provado o facto constante da alínea a) dos factos não provados.

  4. Ao considerar não provado o facto constante da alínea a) dos factos não provados, a Mma Juiz a quo fez uma incorrecta interpretação do teor do depoimento da testemunha A. A. e do valor do mesmo para efeitos probatórios, quando o depoimento dessa testemunha foi tido como prestado “de forma séria, objectiva, circunstanciada e descomprometida, assim logrando o convencimento do tribunal (tanto mais que não revelou qualquer atitude de hostilidade para com a autora, o que se afiguraria natural uma vez que também foi implicada numa das discussões).” 6ª. Porque se mostra relevante para o mérito da causa, por via do excerto transcrito do depoimento da testemunha A. A., deveria ter sido dado por provado o facto alegado no artº 33º da contestação, ou seja, “O facto de a sociedade R. ter proposto à A. o exercício das funções de relações públicas prendeu-se unicamente com as suas capacidades já anteriormente demonstradas de organizar e promover a orientação de trabalhos de marketing e de organização e decoração das salas de exposições da empresa nas diversas feiras comerciais em que se fez representar.” o qual deve ser acrescido à factualidade provada.

  5. Da acta da deliberação da ré, junta aos autos, bem como da correspondência trocada entre as partes, conjugadas com o excerto transcrito no corpo desta alegação do depoimento da autora gravado sob o ficheiro 20171004101145_5433835_2870579, de 04-10-2017, 10:11:47 até 04-10-2017 11:08:07, do minuto 00:20:15 ao minuto 00:21:00, bem como com o excerto do depoimento da testemunha A. A., supra transcrito e identificado, resulta claro o reconhecimento de ter sido feita à autora uma proposta séria de emprego, que a mesma ponderou e recusou, pelo que nenhum direito indemnizatório lhe assiste.

  6. O facto da ré ter feito transferências salariais durante três meses, após a deliberação da destituição da autora, para a conta desta, só pode ter como explicação lógica que tivesse expectativa de que a autora viesse a aceitar a proposta séria de vínculo laboral que lhe foi apresentada e que essa proposta foi vista de forma séria por parte da ré.

  7. A autora não alegou factos integrativos do prejuízo que alegadamente resultaram da cessação antes do termo das suas funções de administradora, limitando-se a fazer a simples alegação da perda da remuneração devida pelo exercício da administração, pelo que não o tendo feito, não tem direito à indemnização pelos danos alegadamente sofridos, porque não foram alegados, muito menos provados, não sendo, sequer, conhecidos.

  8. Face à prova produzida, a sentença recorrida deveria ter concluído não só existir justa causa de destituição da autora como também ter a mesma recusado, sem motivo válido, exercer outras funções na empresa que lhe foram propostas, pelo que a sua recusa em assumir funções remuneradas ao serviço da ré obsta a que lhe seja arbitrada qualquer indemnização por danos patrimoniais.

  9. Sem arrimo em qualquer fundamento factual e tão-só numa convicção pessoal da autora, a deliberação dos acionistas da ré, de destituição da autora, foi vista como uma atitude séria e juridicamente suficiente e adequada a fundar a sua pretensão nesta acção, ao mesmo tempo que a apresentação, de imediato, da proposta de relação laboral nos termos especificados na matéria de facto provada nos pontos 12 e 13, foi tida como uma proposta não séria.

  10. A adesão à mera convicção da autora, sem fundamento factual que a sustente, não pode merecer a tutela do Direito nem deixar passar incólume a rejeição dessa relação de trabalho por parte da mesma autora, em substituição da relação de administração societária que tinha até à sua destituição, pelo que, para que tivesse merecido a adesão da Mma. Sra. Juiz a quo, deveria encontrar-se alicerçada numa fundamentação factual que justificasse a alegada falta de seriedade de tal proposta de trabalho, o que não se verifica.

  11. Em face da matéria provada nos pontos 5., 6., 7., 18. e 19. dos factos provados, resulta que a razão central da inquietação, tristeza e vergonha alegadamente causados à autora, decorria do conflito conjugal com o seu marido e Presidente do Conselho de Administração da ré, mas não com a ré, pelo que nenhuma indemnização lhe deve ser arbitrada por danos não patrimoniais.

  12. A conclusão jurídica incorrectamente expendida a tal respeito na sentença recorrida, salvo melhor opinião, não tem fundamento legal.

  13. A conduta culposa da autora integra justa causa de destituição, sem direito a qualquer indemnização, quer por danos patrimoniais, quer por danos não patrimoniais.

  14. Ao assim não decidir, foi feita uma inadequada subsunção dos factos ao Direito e uma errada interpretação do artº 403º, nºs 4 e 5 do Código das Sociedades Comerciais.

  15. Resulta de tudo quanto é alegado nenhuma razão assistir à autora, o que fundamenta a consequente procedência deste recurso.

Termina pedindo seja dado provimento ao recurso, procedendo-se à alteração e aditamento da matéria de facto nos termos indicados e à subsunção ao Direito da factualidade que vier a ser tida por provada, com a consequente improcedência do pedido formulado pela autora e absolvição da ré do pedido A Recorrida contra-alegou, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

*II. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO: O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, ressalvadas as questões que sejam do conhecimento oficioso do tribunal (artigos 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do NCPC).

No caso vertente, as questões a decidir que ressaltam das conclusões recursórias são as seguintes: - Saber se a decisão relativa à matéria de facto deve ser alterada, por, para além do mais, ser deficiente, havendo necessidade de a ampliar; - Saber se a destituição da Autora foi efetuada com ou sem justa causa, o que pressupõe a resposta à questão de saber se a justa causa de destituição e os factos que a integram devem constar na ata de deliberação da respetiva destituição ou, por outras palavras, se só os factos constantes da ata podem valer (desde que provados em julgamento) para o aludido efeito; - Saber se, face ao articulado pela Autora, se deve concluir pela ausência de alegação de factos integrativos do prejuízo determinante da obrigação de indemnizar; - Saber se a recusa da Autora no que respeita ao exercício de outras funções na empresa em conformidade com o que...

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