Acórdão nº 309/16.1T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA AM
Data da Resolução07 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

* H. F., melhor identificada nos autos, intentou a presente acção declarativa com processo comum contra MARIA, também melhor identificada nos autos, pedindo que a Ré seja: a) Condenada a reconhecer a Autora como proprietária e legítima possuidora do prédio urbano melhor identificado nos artigos 1.º e 2.º da P.I.; b) Condenada a reconhecer a Autora como proprietária do caminho de consortes melhor identificado nos artigos 19.º e 20.º da PI; c) Condenada a reconhecer que o caminho utilizado pela Autora para aceder às traseiras do seu prédio, ao contador da água e ao depósito das botijas de gás, é um caminho de consortes; d) Condenada a demolir o muro que edificou na entrada do caminho sub judice e a retirar os materiais provenientes da demolição, bem como a abster-se da prática de quaisquer atos de apropriação do mesmo em proveito exclusivo, mantendo-o livre e desobstruído na sua totalidade; e) Condenada em sanção pecuniária compulsória, no valor de € 250,00, por cada dia de atraso no cumprimento do ordenado ou por cada vez que venha a violar aquela imposição; e f) Serem declaradas falsas e, por via disso, nulas, as declarações prestadas pela Ré na escritura de justificação junta, com todas as consequências legais; g) Ser ordenado o cancelamento das inscrições resultantes da Ap. 03 de 2006/04/14 feita a favor da Ré no prédio urbano descrito na Conservatória do Registo Predial sob o número …, bem como ordenada a correção da área constante da descrição, por forma a que esta reproduza com exatidão o prédio melhor identificado nos artigos 8.º e 9.º da Petição Inicial.

*Alega para tanto e em síntese que é dona e legítima possuidora de um prédio urbano, sito na Rua …, da União das Freguesias de …, concelho de Vila Real, composto de habitação com dois pisos, com 76 m2 de superfície coberta e 25 m2 de logradouro.

Que a nascente do seu prédio encontra-se um outro prédio urbano, composto de habitação com rés-do-chão e primeiro andar, em pedra coberta a telha, para palheiro, com 60 m2 de superfície coberta e 110 m2 de logradouro, propriedade da ré, que foi, anteriormente e até ao ano de 1989, propriedade dos pais de ambos as partes.

No ano de 1999, a Autora, a Ré e os demais herdeiros fizeram partilhas verbais, tendo aquele prédio, à data composto por um armazém com 60m2 de superfície coberta, sido adjudicado à Ré.

Como o dito prédio não tinha logradouro, foi ainda acordado e aceite por todos os herdeiros que a Ré ficasse com a área descoberta existente entre o armazém edificado e o caminho. No entanto, foi expressamente estipulado entre todos os herdeiros que a Ré se obrigaria a respeitar a existência de um caminho de consortes aí sempre existente.

No ano de 2010, a Ré resolveu, unilateralmente e sem o consentimento dos demais consortes, tapar por completo a entrada daquele caminho de consortes.

*A Ré contestou a ação, arguindo a excepção de ilegitimidade da Autora e impugnando a matéria de facto relativamente ao invocado caminho de consortes.

Concluiu pugnando pela improcedência da acção e pela condenação da Autora como litigante de má-fé.

* Proferiu-se despacho que julgou improcedente a excepção de ilegitimidade activa.

*A autora deduziu incidente de intervenção principal provocada passiva de F. F. e E. M., o qual foi admitido.

Os intervenientes, regularmente citados, não deduziram contestação.

*Tramitados regularmente os autos, foi proferida a seguinte decisão: “Pelo supra exposto, julga-se a acção parcialmente procedente e, consequentemente, decide-se: A) Condenar os Réus a reconhecerem que a Autora H. F. titula o direito de propriedade sobre o prédio urbano descrito nos arts. 1.º) e 2.º) da petição inicial; B) Declarar a ineficácia da escritura pública de justificação notarial outorgada pela Ré MARIA em 21 de Abril de 2004, no Cartório Notarial; C) Decretar o cancelamento do registo de aquisição a favor da Ré MARIA decorrente da ap. 3 de 2006/04/17, com referência ao prédio sito na Freguesia de … e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …; D) Absolver os Réus do demais peticionado; E) Condenar Ré MARIA e a Autora H. F. no pagamento das custas processuais em função do respectivo decaimento, fixando-se a quota-parte da Ré em 9/10 e a da Autora em 1/10; F) Absolver a Autora H. F. do pedido de condenação como litigante de má-fé…”.

*Não se conformando com a decisão proferida, dela veio a ré Maria interpor o presente recurso de Apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1- Não pode a ora Recorrente conformar-se de maneira alguma com a decisão do Tribunal "à quo", quando decidiu: • "Declarar a ineficácia da escritura pública de justificação notarial outorgada pela Ré MARIA em 21 de Abril de 2004, no Cartório Notarial;" • "Decretar o cancelamento do registo de aquisição a favor da Ré MARIA decorrente da ap.3 de 2006/04/17, com referência ao prédio sito na freguesia de ... e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n." ...;" 2- Provado está que a Apelante é dona e legítima proprietária do prédio urbano sito em ..., inscrito na matriz sob o artigo ..1 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ..., com a área coberta de 60m2 e 170 m2 de logradouro.

3- Tal prédio veio à sua posse por doação feita ainda em vida de seu Pai, António por volta do ano de 1985.

4- Porque o prédio doado à Apelante, à data da doação (1985), era um simples palheiro, esta reconstruiu o velho palheiro e legalizou-o a nível registral.

5- Lançou mão de uma escritura de justificação, escritura onde o ora Apelado L. E., consta como declarante.

6- Nessa escritura levada a cabo em 2004, declara-se que a Apelante é dona e legítima possuidora do referido prédio e que tal prédio veio à sua posse por contrato verbal de doação ainda no estado de solteira feita por António e esposa (sua mãe).

7 - Tudo o que naquela escritura se declara corresponde à verdade. Não tendo sido contraditado por nenhuma testemunha do processo.

8- A Apelante, porque teve necessidade de recorrer a crédito hipotecário em 2004, apenas "legaliza" a situação do prédio que já estava na sua posse desde 1985.

9- A usucapião da Apelante/justificante é pois a causa originária da aquisição do imóvel, pois, através de doação que lhe é feita pelo seu Pai, a Apelante sucedeu nos direitos de seu Pai como proprietária.

10- A Apelante tem o prédio registado a seu favor, presunção constante no artigo nº 7° do C.R.P.

11- A Apelante pretendeu através do registo dar a conhecer a terceiros a situação do imóvel garantindo a sua segurança. O registo garante a permanência do direito, registo que nunca foi posto em causa nem impugnado.

A Apelante adquiriu de modo legítimo a propriedade do seu prédio.

12- O direito de propriedade do falecido Pai da Apelante nunca foi colocado em causa, tendo sido reconhecido por todos. Todas as testemunhas afirmaram que todos os prédios pertenciam ao Pai da Apelante, e foi este que ainda em vida doou o respectivo prédio à Apelante.

13-A Apelante esta na posse do prédio desde 1985, ainda no estado de solteira. Tendo procedido ao seu registo em 2004, é a única e exclusiva proprietária do mesmo, tendo a seu favor a presunção estatuída no artigo 7° do C.R.P, que se invoca e não foi ilidida.

14- O direito de propriedade é eterno, imutável e perpétuo.

15- A posse e propriedade da Apelante sobre o prédio foi sempre legitimada.

16- Ora, perante os depoimentos prestados em audiência de discussão e julgamento não poderá haver duvida de que a posse da Apelante é, não só legitimada como de boa fé e a escritura por esta celebrada no ano de 2004 espelha a verdade dos factos; existindo clara contradição entre a prova produzida em audiência e a douta Sentença posta em crise.

17 - O entendimento pacífico da jurisprudência do STJ, é que, "a simples existência do registo a favor da autora é condição bastante e suficiente para a procedência da reivindicação do imóvel sobre que versa o registo não sendo exigível a alegação e prova dos requisitos de que depende a usucapião." (vd. Acórdão de 30/11/2009 do processo nº 2172/06.1 TBGRD.Cl.S1 e Acórdão de 30/09/2010 do processo nº 748/06.6TBPNF.Pl.Sl. e vd. Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra de 3/12/2013 do processo nº 194/09.0TBPBL.C1 ao referir: "VIII - Por isso, nos termos da norma do artigo 350.° nº 1 do Código Civil, compete àqueles que se arrogam proprietários, provar que o detentor não é possuidor. Podendo, assim, adquirir por usucapião, se a presunção de posse não for ilidida, os que exercem o poder de facto sobre uma coisa - é atribuída a propriedade ao possuidor, não propriamente porque o possuidor conseguiu provar que era proprietário, mas antes porque não foi provado que ele não o era...

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