Acórdão nº 733/18.5T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelRAQUEL TAVARES
Data da Resolução21 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES I. Relatório X CONFEÇÃO DE VESTUÁRIO, LDA, com sede em Guimarães intentou a presente acção de processo comum contra Y, SL com sede em …, Espanha, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe o montante de €149.687,07 acrescido de juros moratórios, vencidos e vincendos.

Alega, para o efeito e em síntese, que a Ré lhe solicitou o fabrico de camisas de modelos e marcas por si criados e comercializados, que a Autora fabricou.

Que Autora e Ré estabeleciam o preço da camisa a pagar pela Ré, o qual englobava tecido, o preço da transformação e dos acessórios e que a Ré encomendava ainda à Autora tecidos iguais aos das camisas produzidas.

A Ré apresentou nos autos requerimento solicitando que o tribunal a quo declarasse não ter competência para conhecer do litigio em face do disposto no artigo 7º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 pois que a mercadoria foi entregue em Espanha e o acordo estabelecido com a Autora foi de compra venda de camisas.

Foi proferida decisão que julgando verificada a excepção dilatória de incompetência absoluta dos Tribunais Portugueses absolveu a Ré da instância.

Não se conformando com a decisão proferida veio a Autora recorrer concluindo as suas alegações da seguinte forma: “1- O contrato celebrado entre A. e R. constitui um verdadeiro contrato de empreitada, na modalidade de prestação de serviços, e não um contrato de compra e venda.

II- A R./Recorrida é uma sociedade que se dedica com o intuito lucrativo ao comércio por grosso de todos os tipos de produtos têxteis, vestuário, calçado e artigos de couro, colocando encomendas para o fabrico dos produtos com as especificidades e marcas dos seus clientes, nomeadamente quanto a prazos de entrega, na fábrica da A./Recorrente.

III- No âmbito das relações comerciais entre A. e R., a recorrente obrigou-se a produzir/fabricar vários artigos de vestuário, com as marcas e especificidades definidas no âmbito das encomendas previamente negociadas e acordadas com a R.

IV - Era também a R. quem dava as instruções à A. sobre as características do produto, modelo, tabela de medidas e materiais necessários à sua confecção.

V - A. A. não vende peças de vestuário a retalho, apenas as produz, ficando a R. obrigada a pagar-lhe uma retribuição em resultado do trabalho manual daquela.

VI- Parecem não existir dúvidas que estamos perante um contrato de empreitada previsto no artigo 1207.° e seguintes do Código Civil.

VII- Contrato de empreitada na modalidade de prestação de serviços, que nos termos do artigo 1154.° do Código Civil, "é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual".

VIII- Estamos, sem margem para dúvidas, no âmbito dum contrato de prestação de serviços.

IX- Nos termos do artigo 7°, n.º 1, alínea b) do Regulamento (EU) n° 1215/2012, de 12 de Dezembro, que entrou em vigor em 10/01/2015, uma pessoa com domicílio no território de um Estado Membro pode ser demandada noutro Estado Membro, em matéria contratual, perante o tribunal do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão.

X- Nos termos daquela alínea b), do n.º 1 do artigo 7.° do Regulamento 1215/2012, o lugar do cumprimento da obrigação no contrato de prestação de serviços corresponde ao local onde os serviços foram ou devam ser prestados.

XI- No caso, a A. produziu peças de vestuário encomendadas nos termos supra expostos pela R. , na sua sede sita na freguesia de Moreira de Cónegos, concelho de Guimarães, não restando dúvidas que o tribunal competente para presente demanda é o Tribunal Judicial da Comarca de Braga - Juízo Central Cível de Guimarães, pois é o local do cumprimento e da execução da obra.

XII- O Tribunal internacionalmente competente para dirimir a questão do eventual incumprimento decorrente de um contrato de empreitada celebrado em Portugal, é o Tribunal Português.

XIII- Também não se pode ser alheio a que a atribuição de jurisdição a um Tribunal em função de uma certa área territorial, tem em vista facilitar o exercício da sua atividade, com o mínimo de custos materiais e humanos, sendo que o propósito das Convenções e Regulamentos Comunitários é, pois, o de tutelar o interesse da justiça, eximindo as partes ao ónus de superar dificuldades práticas à condução de uma lide em país estrangeiro.

XIV- Da leitura do requerimento apresentado pela R. aquando da citação efectuada nos termos do artigo 10° do Regulamento (CE) n° 1393/2007, de 13 de Novembro de 2007, aquela não se limitou a invocar a incompetência do Tribunal a quo, tendo sustentado ainda a sua defesa em questões substanciais como demonstra o facto de ter alegado a existência de defeitos nas mercadorias entregues pela A., querendo em consequência, ver os alegados prejuízos que essa situação lhe causou reflectidos nas facturas emitidas pela Recorrente.

XV- Diz-nos o artigo 26°, n.º 1 do Regulamento (EU) n° 1215/2012 que "para além dos casos em que a competência resulte de outras disposições do presente regulamento, é competente o tribunal de um Estado-Membro no qual o requerido compareça. Esta regra não é aplicável se a comparência tiver como único objetivo arguir a incompetência ou se existir outro tribunal com competência exclusiva por força do artigo 24.°." XVI- A comparência da R. não teve como único objectivo arguir a incompetência dos tribunais portugueses, nem se está perante uma situação de competência exclusiva nos termos do artigo 24° do Regulamento 1215/2012, pelo que, também por aqui, serão os tribunais portugueses internacionalmente competentes para dirimir o presente litígio.

XVII- Se dúvidas ainda existirem quanto à qualificação do contrato celebrado entre A. e R. como sendo um contrato de empreitada (prestação de serviços), veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no processo n.º 143378/15.0YIPRT.G1, datado de 08/06/2017 e disponível para consulta em www.dgsi.pt.

XVIII- Diz-nos o supra mencionado acórdão que: "1- O critério-regra adotado pelo Regulamento (UE) n. °1215/2012, é o de que as pessoas domiciliadas num Estado- membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais desse Estado-Membro.

2- Mas este critério comporta exceções. E entre elas, encontram-se os litígios nos quais se discuta o cumprimento de contratos de prestação de serviços, caso em que as pessoas domiciliadas num Estado-Membro podem ser demandadas noutro Estado- Membro onde, nos termos do contrato, os serviços foram ou devam ser prestados.

3- Assim, sendo alegado que uma sociedade comercial Portuguesa forneceu a outra Espanhola, no âmbito de um contrato que é de qualificar como de empreitada, determinados produtos de vestuário fabricados pela primeira em Portugal, são os tribunais portugueses internacionalmente competentes para julgar o litígio no qual se discuta o alegado incumprimento desse contrato".

XIX- Deixou-se ainda referido naquela Acórdão, quanto à distinção entre o contrato de prestação de serviços e o contrato de compra e venda que: "Começando pelo contrato de compra e venda, verificamos que o mesmo é legalmente definido como o convénio através do "qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço" - artigo 8 7 4.º, do Código Civil.

Já no contrato de empreitada, uma das partes obriga-se "em relação à...

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