Acórdão nº 2536/18.8T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA JO
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães, sendo Relatora - Maria João Marques Pinto de Matos; 1º Adjunto - José Alberto Martins Moreira Dias; 2º Adjunto - António José Saúde Barroca Penha.

*I – RELATÓRIO 1.1.

Decisão impugnada 1.1.1. Fernanda (aqui Recorrente), residente na Rua …, em Arcozelo, concelho de Barcelos, propôs a presente providência cautelar de arresto, contra Luísa, residente na Rua …, em Barcelos, pedindo que · se procedesse ao arresto do direito que a Requerida tem sobre o prédio urbano, composto de casa de três pavimentos, sito na Rua …, freguesia e concelho de Barcelos, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº …, e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo …- actual artigo … urbano da União de Freguesias de … (incluindo naquele direito o que lhe foi cedido sobre o mesmo prédio por seu filho Manuel).

Alegou para o efeito, em síntese, que tanto ela própria, o então seu marido (Miguel) e uma irmã sua (Maria), como a Requerida, uma irmã desta (Margarida) e dois filhos dela (José e Paulo), foram fiadores num mútuo de € 200.000,00, concedido pela Banco C, S.A. a X - Comércio e Equipamento de Automóveis, Limitada, mercê das relações de parentesco e de afinidade mantidas com os seus dois únicos sócios, Ana (sua irmã, e nora da Requerida) e marido, Pedro (seu cunhado, e filho da Requerida); e constituíram ainda cada uma delas, para garantia do mesmo crédito, uma hipoteca sobre um imóvel de que eram co-titulares, no seu caso uma fracção autónoma adquirida conjuntamente com o então seu marido (Miguel), e no caso da Requerida, Irmã e Filhos referidos, sobre o prédio urbano cujo arresto aqui se pretende.

Mais alegou que, vindo a Sociedade mutuária (X - Comércio e Equipamento de Automóveis, Limitada) a ser declarada insolvente, e deixando de ser cumprido o empréstimo de que beneficiara, foram executadas as suas garantias, em acção executiva movida pela Banco C, S.A. contra todos os fiadores; e, por isso, foram aí penhorados os dois imóveis hipotecados.

Alegou ainda a Requerente que o Sócio da Sociedade insolvente (Manuel) e a Requerida sua mãe (Luísa) acordaram então que aquele cederia a esta o quinhão hereditário que possuía na herança do respectivo pai e marido, por forma a que Requerida o vendesse e liquidasse a totalidade da dívida (neste momento de cerca de € 150.000,00); e, desse modo, permitisse a desoneração dela própria do seu pagamento, bem como o levantamento da penhora incidente sobre a sua fracção autónoma (tudo conforme ambos assumiram perante si, e a Requerida assumiu inclusivamente em declaração escrita).

Contudo, tendo a Requerida procedido, conjuntamente com as suas Irmãs e Filhos, à alienação de vários prédios na cidade de Barcelos, por um valor declarado de € 600.000,00 mas real de € 1.200.000,00, negociou a desoneração das suas responsabilidades bancárias, bem como as dos seus Familiares, com outra Instituição Bancária (Banco P) e com a Banco C, S.A., mas não fez outro tanto quanto a ela própria; e, por isso, a Banco C, S.A. viria a extinguir a acção executiva movida antes contra todos os fiadores apenas quanto à Requerida e seus Familiares directos, prosseguindo a mesma contra si própria, o seu ex-marido (Miguel) e a sua irmã (Maria).

Por fim, a Requerente alegou não pretender a Requerida desonerá-la de qualquer montante, nem da penhora que incide sobre a sua fracção autónoma, já que estaria a desfazer-se de todo o seu património, com a ajuda dos seus Filhos, fazendo-o por valores de venda declarados manifestamente abaixo dos valores reais de alienação e de mercado, e sem proceder ao pagamento que era contrapartida da cedência do quinhão hereditário com que foi beneficiada; e ter como único e remanescente bem o direito a imóvel cujo arresto aqui pediu, para o qual inclusivamente já tem comprador.

Defendeu, por isso, a Requerente deter um crédito sobre a Requerida, resultante precisamente da obrigação assumida por ela perante si (de desoneração respectiva, pelo produto da venda do quinhão hereditário recebido do seu filho Manuel); e encontrar-se a sua futura satisfação em risco, face à vontade manifestada por aquela de o não cumprir (ao não afectar o produto do património vendido à sua desoneração) e à iminente alienação do único bem que possui (nomeadamente, para aquele até agora frustrado efeito).

1.1.2.

Foi proferido despacho liminar, indeferindo o procedimento cautelar de arresto, lendo-se nomeadamente no mesmo: «(…) Não obstante o que vem alegado sobre as diligências realizadas pela Requerida enquanto mãe do sócio e gerente da sociedade afiançada pela Requerente, e também ela como fiadora desta sociedade, a verdade é que a Requerente não detém qualquer crédito sobre a Requerida.

A declaração subscrita pela Requerida, é uma declaração unilateral onde esta assume que ficará com o quinhão hereditário do seu filho e com ele procederá ao pagamento das dívidas e mais afirma que a requerente ficará livre de qualquer ónus e encargos. Sem entrarmos na validade e configuração jurídica desta declaração, que não tem qualquer eficácia para com terceiros, a verdade é que a “obrigação” ali expressa não tem a virtualidade de se converter num crédito da Requerente.

Dito de outro modo, o incumprimento do compromisso assumido pela Requerida, atenta a sua natureza, não transforma a Requerente em credora da Requerida.

O crédito que poderá emergir da relação de fiança (decorrente do incumprimento pelo devedor principal) é alheio a este compromisso assumido pela Requerida, pois que a Requerida nada tem a ver com a relação de fiança estabelecida entre a Requerente, o devedor e o credor.

Donde, não se encontra perfectibilizado o primeiro requisito da providência cautelar de arresto, dado que não se demonstrou como provável a existência de um crédito por parte da Requerente.

(…) Ora, no caso “sub júdice” não alega a Requerente factos reveladores da existência de um crédito, o que implica o indeferimento da presente providência cautelar.

Por outo lado, com vista a fundamentar de facto o necessário receio de perda da garantia patrimonial do crédito, a Requerente alega que sendo manifesta a falta de vontade de cumprir o assumido na "Declaração", a Requerida esta a tratar de levantar os ónus que recaem sobre o imóvel com vista a poder transacioná-lo, perdendo desta forma a Requerente a garantia do seu crédito.

Ora, estes factos e conclusões não são circunstâncias suficientes para preencher a previsão normativa do citado art. 391º nº 1 do C.P.C., dado que não revelam em si mesmos qualquer receio justificado, nem vêm acompanhados de factos concretos que fundamentem esse receio de perda da garantia patrimonial.

Na verdade, não vem alegado pela Requerente um único facto atual e concreto indiciador da vontade da Requerida de alienar o património com vista a furtar-se ao cumprimento do assumido na “Declaração”, e tendente a exonerar a Requerente da “qualquer ónus e encargos”.

A alegada pretensão de venda do imóvel, não configura por si só uma dissipação de bens, sendo até um comportamento normal de quem tem compromissos a saldar.

A Requerente limita-se, no fundo, a invocar que tem justo receio de não ser ressarcida do prejuízo que venha a sofrer por força da fiança prestada.

É certo que toda a providência cautelar visa impedir a lesão grave e irreparável (ou de difícil reparação) de um direito que se receia venha a suceder, assim se combatendo o periculum in mora, ou seja, o perigo da demora inevitável do processo.

No entanto, é necessário que tal receio seja atual, sério e fundado e que não se traduza em meras hipóteses ou conjeturas.

Sem colocarmos em causa que a Requerente receie não conseguir reaver o valor que venha a pagar em consequência da fiança, o certo é que os factos alegados não vêm acompanhados de uma única circunstância concreta que permita considerar fundado ou justificado esse receio, consubstanciando, efetivamente, simples conjeturas, suposições e palpites que não são, obviamente, tutelados pelo direito nesta...

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