Acórdão nº 2010/12.6TBGMR-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. RELATÓRIO.

António e mulher, Ana, residentes na Rua …, Guimarães, instauraram a presente ação declarativa, com processo comum, contra Sociedade MS, com sede na Rua …, Guimarães, e Associação X, com sede na Rua …, Lisboa, pedindo que: a- se declare nulas ou anuladas e de nenhum efeito as disposições constantes do testamento outorgado em 16 de junho de 2005, no Notário Manuel, no que respeita ao legado instituído às Rés – Sociedade MS e Associação X – da totalidade dos prédios identificados nesse testamento e na petição inicial desta ação, pois que constituem uma liberalidade à non domino e de bens alheios, circunstâncias que eram do conhecimento do testador; E da disposição que limita e cerceia de forma ilegal a liberdade dos legatários, proibindo-os de transmitir eventualmente tais prédios aos Autores – António e mulher e familiares, tudo com as consequências legais.

b- declare que os Autores – António e mulher Ana – como os únicos donos e proprietários de todos os prédios descritos no art. 1º desta petição, sendo que são exatamente os mesmos que são identificados no testamento em referência nesta ação e também da sentença proferida nos autos de ação ordinária n.º 302/2002, da 2ª Vara Mista do Tribunal Judicial de Guimarães, com todas as consequências legais.

Para tanto alegam, em síntese, serem os únicos proprietários dos seguintes prédios sitos na freguesia de …, Guimarães: - prédio urbano composto por edifício de rés-do-chão, 1º, 2º e 3º andares, destinado a habitação, sito na Rua …, inscrito na matriz sob o art. … e descrito na Conservatória sob o n.º …; - prédio urbano composto por edifício de cave, rés-do-chão, 1º, 2º e 3º andares, destinado a comércio e habitação, sito na Alameda …, inscrito na matriz sob o art. … e descrito na Conservatória sob o n.º …; e - prédio urbano composto por edifício de rés-do-chão, 1º, 2º e 3º andares, destinado a habitação, sito no Largo …, inscrito na matriz sob o art. … e descrito na Conservatória sob o n.º …; A propriedade destes prédios encontra-se inscrita em nome dos Autores na Conservatória; Por escritura pública de 27/12/2010, E. G. vendeu aos Autores 3/8 daqueles prédios; Por escritura pública de 27/12/2010, Maria, por si e em representação da massa da herança de G. G., Judite e R. G., bem como Ricardo, M. N., esta por si e em representação da massa da herança de G. G., Judite e R. G. e, bem assim, João e E. G. venderam aos Autores 3/8 daqueles prédios; Por escritura pública de 29/07/1993, R. G., vendeu aos Autores 2/8 daqueles prédios; Os Autores por si e antepossuidores, há mais de vinte anos que estão na posse pública, pacífica, ininterrupta, de boa-fé e à vista de toda a gente dos identificados prédios, com animus de verdadeiros donos, tendo, durante todo esse lapso de tempo, usufruído de todos os seus frutos, dando-os de arrendamento, fazendo obras de restauro e de conservação, utilizando-os no seu comércio e habitação, pagando todos os impostos e taxas inerentes à condição de donos; Há cerca de três anos os Autores tiveram conhecimento de um testamento outorgado por E. G., viúvo, falecido em 29/06/2005, em que este declarou ser proprietário de três prédios, que são exatamente os mesmos de que os Autores são proprietários, e declarou doar ¾ partes indivisas dos mesmos à Ré “Sociedade MS e ¼ parte indivisa dos mesmos à Ré “Associação X”; Mais alegam que esses legados eram feitos com o encargo da Ré “Sociedade MS suportar as custas judiciais e demais encargos do processo e que “caso a sentença reconheça o direito a seu favor e os prédios venham a ser efetivamente propriedade da Sociedade MS e da Associação X, por força do presente testamento, que tais prédios nunca venham a ser transmitidos aos referidos locatários, António, mulher ou seus familiares”; Acontece que o falecido E. G. nunca foi dono da totalidade daqueles prédios e sempre soube que apenas era titular de uma muito pequena parte dos mesmos; Acresce que ao impor que as legatárias nunca transmitissem esses prédios aos Réus e seus familiares, o falecido E. G. instituiu uma condição contrária à lei, porque violadora da liberdade individual das pessoas, a qual é consequentemente nula; Por sentença proferida no processo 302/2002, da 2ª Vara Mista deste Tribunal, em que foi Autor o falecido E. G., e Réus os aqui Autores, transitada em julgado, foi julgado que aquele prédios pertenciam: - na proporção de 3/8 e no regime de comunhão hereditária ao testador E. G., Emídio, Fernanda, Alexandra, e em regime de comunhão hereditária por herança aberta por morte de Augusta, Eurico e Eugénio; - na proporção de 3/8 em regime de comunhão hereditária a Judite, Maria, João e M. N., por heranças abertas por morte de A. J. e G. G.; e - os restantes 2/8 aos Autores, por compra a R. G., por escritura pública de compra e venda de 29/07/1993; Desta sentença foi interposto recurso para a Relação e, posteriormente, para o STJ, que manteve o decidido quanto à titularidade da propriedade dos prédios, sendo que E. G. acompanhou estes processos e sabia que quando outorgou o testamento não era proprietário daqueles (cfr. fls. 121 a 125 deste apenso).

As Rés contestaram deduzindo incidente de intervenção principal provocada, na qualidade de comproprietários dos prédios, de: 1- E. G.; 2- Maria, por si e em nome e representação da massa da herança de G. G., Judite e de R. G., bem como o marido desta chamada, Ricardo; 3- M. N., por si e em nome e representação da massa da herança de G. G., Judite e de R. G.; 4- João, em nome e representação da massa da herança aberta por óbito do seu cônjuge G. G.; 5- R. G.; Na qualidade de herdeiros legitimários do testador E. G.: 1- Em representação do filho pré-falecido do testador, Eurico, dos seguintes netos: a- E. G.; b- Rui, e c- M. F.; 2- Em representação do filho pré-falecido do testador, Eugénio, do seguinte neto: a- Alexandre; E na qualidade de beneficiárias do Fundo constituído, a que a Ré “Sociedade MS, tem o encargo de administrar: a) a bisneta do testador, Vanessa, e b) a bisneta do testador, Lúcia: c) a neta do testador, M. F.; e d) o neto do testador, E. G..

Para tanto alegam, em síntese, que os prédios objeto dos autos eram propriedade exclusiva do testador E. G. e inserem-se num ato dispositivo deste que, como contrapartida dos legados a favor das Rés, impôs à Ré “Sociedade MS” o encargo de gerir um Fundo de 159.000,00 euros, destinado a duas bisnetas do testador e a dois netos destes, a cumprir no tempo e até ao ano de 2015; Esses encargos impostos à Ré “Sociedade MS” como contrapartida da deixa testamentária dos três prédios que os Autores reivindicam, no caso de a ação vir a proceder, não poderão deixar também de ser considerados nulos, desonerando-se aquela Ré de os cumprir e com a consequência de ser indemnizada pela administração do Fundo já feita até à declaração da nulidade, com a consequente devolução pelos beneficiários ao Fundo das importâncias pagas; Acresce que mercê do testador E. G. ter pago a todos os co-interessados nos referidos prédios o valor com estes combinados e de ter celebrado com eles um contrato-promessa de partilhas, assegurando a propriedade exclusiva dos prédios, o que garantiu às Rés, caso a ação proceda, terão estas o direito de serem indemnizadas; A provar-se a realidade do negócio feito com os Autores pelos herdeiros legitimários do testador E. G. e que esse negócio integra os prédios postos em causa na ação, terão as Rés o direito a ser ressarcida na medida em que, nessa hipótese, terá sido desrespeitada a vontade do testador e os compromissos assumidos pelos seus herdeiros em relação à promessa de transmissão da propriedade dos prédios para o referido testador.

Deduziram incidente de valor, sustentando que as três compras que vêm invocadas pelos Autores somam o valor de 45.966,34 euros e que, consequentemente, é este o valor a ser atribuído à ação.

Impugnaram parte da factualidade alegada pelos Autores; Alegaram que o testador E. G., recebeu 3/8 partes dos referidos prédios por força de partilha homologada por sentença de 02/07/1960, produzida nos autos de inventário por óbito de seus pais, M. O. e A. J.; Em 03/11/1996, E. G. casou com M. A., no regime da comunhão geral de bens, casamento este que foi dissolvido por óbito da mulher em 12/02/2004; Em 07/11/1986, E. G. fez partilhas verbais com os filhos, pagando-lhes as tornas entre eles convencionadas, e recebendo deles a competente quitação em relação à meação que à mãe caberia no património comum do casal; Em 03/11/1986, por contrato-promessa de compra e venda, nunca reduzido a escritura pública, E. G. prometeu comprar a todos os demais interessados e comproprietários dos referidos prédios os restantes 5/8 que estes eram titulares, pagando a todos o preço convencionado e deles obtendo quitação; A partir de 03/11/1986, o testador E. G. passou a agir e a comportar-se em relação a esses prédios como verdadeiro e único proprietário dos mesmos, contactando diretamente os arrendatários, entre os quais os Autores, pagando as contribuições devidas, usando-os, gozando-os e fruindo-os na sua totalidade, sendo considerado seu proprietário exclusiva por toda a gente, incluindo pelos Autores, e pelos serviços públicos, posse essa que sempre foi por ele exercida de modo ostensivo, mesmo perante as pessoas que lhe transmitiram as demais parcelas da propriedade em questão, sem violência, na convicção de quem não lesava direitos de outrem, de modo contínuo e ininterrupto, à vista de toda a gente e com ânimo de quem usa e frui coisas próprias e sem oposição de ninguém; Os Autores têm perfeito conhecimento e consciência destes factos, não passando as escrituras públicas que invocam de documentos falsos, forjados, representando pretensas e fantasiosas transmissões que nunca ocorreram; Os transmitentes, para além de saberem perfeitamente de que de nada eram donos, limitaram-se a subscrever os textos em causa, sem nunca terem recebido dos Autores...

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