Acórdão nº 458/04.9TBVLN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelFERNANDA PROEN
Data da Resolução04 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório.

Na acção executiva comum para pagamento de quantia certa, que corre termos no Juízo Central Cível de Viana do Castelo – Juiz 3 – do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, sob n.º 458/04.9TBVLN, em que agora é exequente Banco A, S.A. e executada E. D., procedeu-se à venda do imóvel penhorado nos autos.

T. G., alegando ser pai da executada, veio requerer que se anulem os actos praticados pela agente de execução quanto à emissão do título de transmissão do bem imóvel objecto de venda nos presentes autos.

Alega para tal, em síntese, que apesar de ter dado conhecimento à agente de execução de que pretendia exercer o direito de remição, a mesma não aguardou que o mesmo apresentasse a documentação que se encontrava a ser preparada, tendo agido de má-fé ao emitir o título de transmissão do dito imóvel.

Notificada a exequente veio pugnar pela falta de fundamento do requerido.

*Subsequentemente, por despacho de 12/04/2018 foi julgada improcedente a nulidade invocada, indeferindo-se o requerido, nos seguintes termos: “… Nos termos do disposto no artigo 842.º, do NCPC: “Ao cônjuge que não esteja separado judicialmente de pessoas e bens e aos descendentes ou ascendentes do executado é reconhecido o direito de remir todos os bens adjudicados ou vendidos, ou parte deles, pelo preço por que tiver sido feita a adjudicação ou a venda.”.

A faculdade que é concedida ao cônjuge do executado ou aos seus descendentes ou ascendentes, por esta ordem (cfr. art.º 845.º, n.º 1, NCPC), tem em vista a protecção do património da família do devedor, obstando a que dele saiam os bens penhorados, configurando como que um direito especial de preferência, assente numa relação de carácter familiar, constituindo como que uma possibilidade de resgate dos bens penhorados, cfr. entendimento uniforme na doutrina, designadamente Lebre de Freitas, in Acção Executiva, Depois Da Reforma, 4.ª Edição, Coimbra Editora, 2004, p. 334 e 335; Eurico Lopes Cardoso, Manual da Acção Executiva, edição da INCM, p 660 e 661; Remédio Marques, Curso de Processo Executivo Comum, À Face Do Código Revisto, SPB Editores, a p. 357 e Amâncio Ferreira, in Curso de Processo de Execução, 2010. 13.ª Edição, Almedina, p. 392, acrescentando este autor que este direito “Reveste algumas semelhanças com o antigo direito de avoenga, que era um direito de preferência a favor dos irmãos e outros parentes, quanto aos bens herdados dos ascendentes.

Através da concessão deste direito pretende-se proteger o património da família do devedor, obstando a que dele saiam os bens penhorados.

É um benefício ou favor ao executado e seus familiares próximos, por razões de ordem económica e moral, sem que daí resulte qualquer prejuízo para a execução.”.

No caso, importa começar por dizer que, o ora requerente nem sequer comprovou ainda nos autos a qualidade de pai da executada, nem sequer veio requerer ao tribunal prazo razoável para o fazer, como lhe incumbia por força do preceituado no art.º 845º, nº 3, do NCPC.

Por outro lado, e de acordo com o disposto no art.º 843º, nº 1, al. a), do NCPC: “1. O direito de remição pode ser exercido: a) No caso de venda por propostas em carta fechada, até à emissão do título da transmissão dos bens para o proponente ou no prazo e nos termos do nº 3 do artigo 825º.”.

Ora, resulta da própria alegação do ora requerente que este apenas deu conhecimento à agente de execução de que pretendia exercer o direito de remição, não tendo procedido à comprovação do parentesco, nem ao depósito do preço antes de ter sido emitido o título de transmissão do bem em causa. Ou seja, o requerente não se apresentou a exercer em devido tempo o direito de remição.

Mas será que a agente de execução, perante a comunicação de que o ora requerente o pretendia fazer, estava obrigada a aguardar que o ora requerente apresentasse a documentação necessária ao exercício de tal direito? Pensamos que não.

A emissão do título de transmissão, bem como a prática de todos os actos que têm que ver com a venda, adjudicação de bens, pagamentos, liquidação e pagamentos dos créditos exequendos, é da competência do agente de execução, em conformidade com o disposto no art.º 719º, do NCPC – neste sentido, veja-se Rui Pinto, Manual da Execução E Despejo, Coimbra Editora, Agosto de 2013, p. 121.

E, nos termos do art.º 827º, nº 1, do NCPC, mostrando-se integralmente pago o preço e satisfeitas as obrigações fiscais inerentes à transmissão, os bens são adjudicados e entregues ao proponente, emitindo o agente de execução o título de transmissão a seu favor, a que se segue a comunicação da venda ao serviço de registo competente, para que se proceda ao registo do facto e cancelamento das inscrições relativas aos direitos que tenham caducado.

A adjudicação assim efectuada pelo agente de execução é constitutiva dos efeitos materiais da venda e não tem que ser precedida de despacho judicial.

Com efeito, dada a supressão, com a reforma processual de 2003, do despacho de adjudicação, o direito de remição tem de ser exercido, no caso, como o presente, de abertura de propostas em carta fechada, até à adjudicação de bens, a fazer por requerimento dirigido ao agente de execução, cabendo a este informar o terceiro remidor de todas as condições da venda e no caso de proposta em carta fechada, só com a passagem do título de transmissão é que se dão, se verificam, os efeitos da venda executiva, cfr. Rui Pinto e ob. cit., p. 965.

Daqui resulta, pois, que, designadamente, todos os actos relacionados com a venda, pagamentos, emissão do título de transmissão e subsequentes comunicações ao registo, são da incumbência/competência do agente de execução, não sendo este obrigado a informar um terceiro remidor de que vai praticando qualquer destes actos.

Ao invés, é a este que terá de se rodear de todas as cautelas e diligência, no sentido de o exercer tempestivamente.

Como refere Amâncio Ferreira, ob. cit., p. 393 “Diversamente do que ocorre com os titulares do direito de preferência, os titulares do direito de remição não são notificados para o exercer na execução. Dependerão assim para o exercício do seu direito do conhecimento que lhes advirá da publicidade que rodear a venda ou da informação que lhe prestar o executado seu familiar, que é sempre notificado do despacho determinativo da venda.”.

No mesmo sentido propugnam Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, in CPC, Anotado, Vol. 3.º, Coimbra Editora, 2003, p. 624 (em anotação ao art.º 913.º do CPC 1995, equivalente ao art.º 843º do NCPC), quando ali referem que “O titular do direito de remição não é notificado para o exercer. Não é por ele invocável o justo impedimento (…), que implicaria a necessidade de lhe dar conhecimento prévio, tal como ao preferente.”.

A nível jurisprudencial, neste sentido, se decidiu nos acs. do STJ, de 10.12.2009, Processo n.º 321-B-1997.S1 e de 13.09.2012, Processo nº 4595/10.2TBBRG.G1.S1, ambos disponíveis no respectivo sítio da dgsi, em que, no 1.º dos arestos ora citados, se refere o seguinte: “o remidor não é parte na acção executiva, detendo, antes pelo contrário, necessariamente a posição de terceiro relativamente à execução (…). Por outro lado, como titular de um «direito de preferência legal de formação processual», não é notificado para exercer tal direito, como ocorre com o preferente legal (…).

Deste estatuto processual decorre que o interessado na remição, como terceiro, não tem de ser pessoalmente notificado dos actos e diligências que vão ocorrendo na tramitação da causa, presumindo a lei de processo que o seu familiar – executado e, ele sim, notificado nos termos gerais, - lhe dará conhecimento atempado das vicissitudes relevantes para o eventual exercício do seu direito: a concordância de interesses entre os familiares atingidos patrimonialmente pela execução permite compreender a solução legal, particularmente no que se refere à dispensa de notificação pessoal dos possíveis remidores para exercerem, querendo, o seu direito visando a manutenção da integridade do património familiar.

(…) Cabe, deste modo, ao executado e respectivos familiares um ónus de acompanhamento atento e diligente da execução que afecte o património familiar, com vista a exercerem tempestivamente o direito de remição, sem, com isso, porem em causa a legítima confiança que o adquirente dos bens em processo executivo depositou na estabilidade da aquisição patrimonial que realizou.”.

Assim, no caso em apreço, incumbia à executada e seus familiares interessados no exercício do direito de remição, agir de forma a saber quando teria lugar a abertura de propostas e logo que efectuada esta, exercer tal direito, bem sabendo, ou devendo saber, que o mesmo só poderia ser exercido até à emissão do título de transmissão.

Deviam, pois, usar de toda a diligência de forma a fazê-lo antes de este título ser emitido, o que não aconteceu.

Logo que terminado acto de abertura da proposta apresentada, devia o requerente declarar que pretendia exercer o seu direito e juntar a documentação necessária.

É que tendo a preferente pago o restante da quantia e cumprido as suas obrigações fiscais, a agente de execução estava legalmente obrigada a emitir o respectivo título de aquisição e de efectuar as competentes comunicações ao registo para cancelamento dos direitos e ónus que incidiam sobre o bem vendido, como, efectivamente, assim ocorreu.

Assim, só de si se poderá queixar o ora requerente, pelo não exercício atempado do direito de remição, nada havendo a censurar à actuação da agente de execução.

Pelo exposto, julga-se improcedente a nulidade invocada, indeferindo-se o requerido.” *Inconformado com esta decisão, dela interpôs recurso T. G., o qual, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões: “A- O ora recorrente apresentou requerimento, no qual fundadamente pretendia exercer o seu direito á remição num processo executivo em que a casa de uma sua filha foi vendida.

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