Acórdão nº 3507/16.4T8BRG-J.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Outubro de 2018
Magistrado Responsável | MARIA AM |
Data da Resolução | 11 de Outubro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Na presente Acção de Divórcio sem o consentimento do outro cônjuge interposta por Maria contra A. M.
, ambos melhor identificados nos autos, foi proferido o seguinte despacho: “A presente ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge segue a forma de processo comum, definida por lei como forma única – cfr. artigo 548º do CPC – que contempla a petição inicial, a contestação que, quando acompanhada de reconvenção, pode ser seguida de réplica. Não prevê – e por isso não permite – a lei a apresentação de novo articulado de resposta à réplica (tendo desaparecido a figura da tréplica, anteriormente prevista no artigo 503º do CPC).
Assim, por processualmente inadmissíveis, determino o desentranhamento e devolução aos respetivos apresentantes dos requerimentos de fls. 123 e ss.”*Não se conformando com a decisão proferida, dela veio o R. interpor o presente recurso de Apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1. O despacho recorrido a ordenar a admissão da réplica da A e o desentranhamento da peça processual do Recorrido está duplamente ferido de nulidade dado que viola o direito do contraditório do Reú/Recorrente ( art 3 do CPC).
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E erradamente rotula o requerimento do R de tréplica, fazendo tábua rasa que é um articulado autónomo em que o Recorrente: a) pronuncia–se sobre documentos juntos pela A. a 26.º e 27.º no ultimo articulado desta; b) requer a litigância de má-fé da A. juntando documentos; c) invoca a inadmissibilidade dos artigos que constam da réplica, que deveriam ser dados por não escritos.
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e viola a regra da igualdade substancial das partes (ex vi art. 5 CPC) pois admite O CONTRADITÓRIO da A. aos documentos juntos pelo Reu e aceita os meios de prova por esta juntos, os factos novos que esta adita á PI SEM convite prévio.
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a decisão recorrida viola a regra do artº 195º, nº2, in fine, do CPC [utile per inutile non vitiatur], inspirada no princípio da conservação dos actos jurídicos, ou seja, se o vício de que o acto sofre impedir a produção de determinado efeito (in casu, a resposta a excepções invocadas pela A na Resposta á contestação da Reconvenção), não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o acto se mostre idóneo: o contraditório do Recorrente aos documentos e á alegação de factos novos, a junção de meios de prova do Recorrente e o pedido de litigância de má fé da A.
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O Despacho recorrido cai em contradição ao admitir a réplica da A. á Reconvenção sem admitir esta aos autos! 6. não cumpre o dever de fundamentação das decisões judiciais limitando-se a um silogismo: rotula a peça processual do Reu de tréplica, sem apreciar o conteúdo do mesmo e faz tábua raza de que artº 427º, do CPC actual, na linha do artº 526º, do pretérito CPC, e porque como o obriga o actual artº 415º (tal como já o determinava o artº 517º, do cpc anterior), salvo disposição em contrário, não são admitidas nem produzidas provas sem audiência contraditória da parte a quem hajam de ser opostas, visa “realizar o princípio do contraditório”, explicando v.g. e avisadamente JOSÉ LEBRE DE FREITAS que, quando “o documento é apresentado com o último articulado ou alegação (...) tem lugar a notificação da parte contrária para o fim específico de o impugnar”.
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o que o Tribunal Recorrido omite, ferindo de nulidade o despacho desentranhamento dos autos do articulado do Recorrente - qual medida drástica de gestão processual - e obsta, erradamente, ao exercício do contraditório pelo Reú da prova documental junta no ultimo articulado da A.
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O despacho recorrido carece de total fundamentação com factos motivados e preceitos legais o que se traduz na nulidade prevista no artigo 615.º n.º 1 b), ex vi 613.º n.º 3, e 195.º, do Código de Processo Civil.
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O ordenado desentranhamento do requerimento autónomo do Recorrente, além de cercear o direito deste ao contraditório dos documentos juntos no ultimo articulado da A. viola a regra da proibição de indefesa também por não admitir os meios de prova da igualdade substancial das partes pois enquanto que tudo admitiu à A., a réplica da A., a versão desta dos documentos juntos pelo R. e os meios de prova nela juntos pela A. mas tudo rejeita ao Réu, a impugnação do valor probatório dos docs. juntos pela A. em último articulado desta, os meios probatórios nele juntos pelo R., a oposição á adição de novos factos á PI e impede a apreciação do pedido de condenação da A. como litigante de má-fé, violando a garantia da tutela jurisdicional efectiva consagrado no art 2º do CPC e art. 26 da CRP…”.
Pede, a final, que seja revogado o despacho recorrido e que seja recebido o articulado do Recorrente, com a apreciação do conteúdo do mesmo, nomeadamente o contraditório por ele efectuado aos factos novos aditados pela A. à PI e a junção aos autos dos documentos e mais meios de prova por ele juntos.
*Dos autos não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações a este recurso.
*Tendo em consideração que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente (acima transcritas), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir por este tribunal são as de saber: - se a decisão recorrida é nula por falta de fundamentação; - se era de admitir o articulado do A. de “resposta às exceções” deduzidas no articulado anterior pela A.
*Os factos a considerar para a decisão das questões colocadas são os constantes da decisão recorrida.
*Da nulidade da decisão recorrida por falta de fundamentação: Acusa o recorrente o despacho recorrido de nulidade, dizendo que o mesmo “carece de total fundamentação com factos motivados e preceitos legais…” Mas sem qualquer fundamento, adiantamos já, pois como do mesmo consta (e para cuja leitura remetemos), ele encontra-se motivado, quer de facto, quer de direito, não merecendo ser sancionado com a nulidade invocada pelo recorrente.
*Quanto ao desentranhamento do articulado apresentado pelo A: Ordenou-se no despacho recorrido o desentranhamento do articulado apresentado pelo A. a seguir à réplica da A - que ele apelida de “Resposta do Reconvinte ás excepções da Reconvinda” -, com o fundamento de que a lei não prevê e não permite a apresentação de novo articulado de resposta à réplica (tendo desaparecido a figura da tréplica, anteriormente prevista no artigo 503º do CPC).
Ora, insurge-se o recorrente contra tal decisão, dizendo, além do mais, que não se trata de um novo articulado, mas apenas de um requerimento de resposta a factos novos (inadmissíveis) alegados na réplica; de resposta a documentos apresentados pela A. no articulado anterior; e à dedução de um pedido de condenação da A como litigante de má-fé, com prova oferecida e requerida para essa condenação.
Começamos por dizer que embora o recorrente nas suas alegações de recurso o não considere como tal, trata-se, de facto, de um novo articulado apresentado pelo A. nos autos, por ele apelidado de “Resposta do Reconvinte ás excepções da Reconvinda”, inadmissível face aos novos trâmites processuais.
Aliás, analisado tal articulado, o recorrente termina o mesmo da seguinte forma: “Termos em que se requer: - seja a resposta do Reconvinte ás excepções da Reconvinda admitida e as excepções ora respondidas julgadas improcedentes, declarando-se este Tribunal materialmente competente e a reconvenção admitida seguindo os ulteriores trâmites processuais.
- seja a Resposta da A. considerada inadmissível e como não escrita por ausência de excepções a responder.
-Seja a A/Reconvinda declarada litigante de má fé e condenada em multa e indemnização a favor do Reu Reconvinte em valor não inferior a 5000€ atento a gravidade dos factos, o forte dano moral causado na honra e consideração do Reu,/Reconvinte bem como nas despesas e encargos processuais e com honorários da mandatária forense deste, atenta a notória intensidade ou gravidade da culpa ainda que a título de negligencia grave , da A. Catedrática de Direito e os avultados proventos financeiros aproximados dos 5000€ mensais desta, ex vi artigos 542 nº 1 e 2 b) e d) segunda parte e 543 nº 1 a) e b) do CPC”.
E indica, no final, os meios de prova para a litigância de má Fé da Autora.
* Ora, temos de concordar com a decisão recorrida, de que este novo articulado apresentado pelo A. não é legalmente admissível, podendo o A. responder às exceções invocadas pela A. na Réplica na Audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final (artº 3º nº 4 do CPC).
A igualdade substancial das partes - que o recorrente considera violado com o desentranhamento do seu articulado –, fica assim assegurada, com a possibilidade dada à parte de se pronunciar sobre as exceções invocadas pela parte contrária no último articulado.
Aliás, o recorrente está bem ciente dessa possibilidade, ao referir no início do seu requerimento (desentranhado): “Ainda que á luz do disposto no nº 4 do artigo 3º do CPC se possa julgar ter o Reú/Reconvinte de aguardar pela Audiência para exercer o seu direito de contraditório e defesa às Invocadas excepções pela Reconvinda, sempre ficará consignada a sua posição processual para efeitos, pelo menos, de boa fé e colaboração processual com o tribunal para não vir arguir nulidades processuais ex vi artº 195º do CPC ainda tão ardilosamente usadas numa ultrapassada e indesejada postura processual em processo civil”.
Ou seja, é o próprio recorrente que, adiantadamente, admite a inadmissibilidade legal do seu articulado.
* Claro que poderá sempre admitir-se que nesse articulado venha o recorrente praticar outros atos, legais, para além daqueles que a lei não admite, como seja, exercer o direito do contraditório relativamente a documentos apresentados pela A. na réplica, ou praticar outros atos legalmente admissíveis, caso em que será de aproveitar o articulado para esses efeitos (como se decidiu no Ac desta Relação de Guimarães, de 25.2.2016, disponível em www.dgsi.pt, onde se consagrou a teoria da conservação dos atos jurídicos...
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