Acórdão nº 5392/17.0T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelJOAQUIM BOAVIDA
Data da Resolução11 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: 1 – RELATÓRIO 1.1. R. M.

intentou contra T. M.

acção declarativa, sob a forma de processo comum, pedindo:

  1. Que seja reconhecido e declarado o estado de união de facto entre ambos no período compreendido entre fins de Setembro de 2010 e 28 de Janeiro de 2016 e que o património existente, identificado na petição inicial, em nome do Réu, foi constituído e enriquecido com o esforço comum da Autora, que nele aplicou ou investiu todos os proventos, esforço e trabalho sempre na proporção de nunca menos de metade desse valor; b) A condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de € 40.000,00 a título de enriquecimento sem causa e uma indemnização de € 15.000,00 pelos danos não patrimoniais sofridos em consequência da ruptura da união de facto a que o Réu deu causa.

    Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, ter vivido em união de facto com o Réu naquele período, residindo inicialmente na habitação dos pais do Réu e, depois, nos Estados Unidos da América, de onde regressaram em Agosto de 2011, voltando a viver na residência dos pais deste último.

    Dessa união de facto resultou a aquisição em 2012 de património comum, nomeadamente dois prédios rústicos comprados com as economias de ambos e através de um empréstimo contraído pela Autora a uma sua familiar, imóveis cujo valor ascende a € 80.000,00 e que se encontram averbados exclusivamente em nome do Réu, que a enganou e se enriqueceu à sua custa no valor correspondente a metade daquela quantia.

    A ruptura da união de facto foi provocada pelo Réu, que traiu a confiança que a Autora nele depositou, deixando que o mesmo averbasse exclusivamente em seu nome tudo quanto iam amealhando, o que lhe causou desgosto, humilhação e necessidade de apoio familiar e médico.

    *Contestou o Réu, pugnando pela total improcedência da acção e a condenação da Autora como litigante de má fé, alegando que nunca existiu economia comum entre ambos, que eram meros namorados, tendo cada um os seus bens próprios.

    *Elaborado despacho saneador, fixou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova.

    Realizou-se a audiência de julgamento e o Mmo. Juiz proferiu sentença a julgar a acção totalmente improcedente, por não provada, com a consequente absolvição do Réu do pedido.

    *1.2.

    Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação da sentença e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1ª A Recorrente não se conforma com a sentença recorrida, pois considera resultar da mesma grave erro de julgamento, não respeitando as mais elementares regras da experiência, da lógica e até do senso comum, bastando para tanto atentar nos documentos constantes dos autos, das declarações de parte, da prova testemunhal e da confissão do recorrido em sede de contestação.

    1. Os factos constantes das alíneas a) a t), da matéria de facto não provada, devem dar-se como provados.

  2. Autora e Réu começaram a viver juntos desde o final de Setembro de 2010.

  3. Nesta data, Autora e Réu passaram a residir na habitação dos pais do Réu, sita na Rua (...), lugar de (...), freguesias de (...), do concelho de Esposende, tomando as refeições, dormindo juntos, apresentando-se aos parentes e amigos, como marido e mulher.

  4. Nos Estados Unidos de América, Autora e Réu passaram a viver na cave da residência da tia deste último, A. C., em ..., Massachusetts, …, Estados Unidos de América.

  5. A Autora começou a trabalhar como funcionária de limpeza e o Réu inicialmente num restaurante e posteriormente em obras de construção civil.

  6. Quando regressaram a Portugal, Autora e Réu voltaram a viver na residência dos pais deste último, onde dormiam e tomavam as refeições.

  7. A partir deste período Autora e Réu trabalhavam em áreas diferentes, a Autora fazendo limpezas e o Réu em obras de construção civil, como pintor.

  8. Nos períodos de presença do réu em Portugal, Autora e réu viviam na casa dos pais do Réu.

  9. Desde que o Réu foi trabalhar para França, o mesmo passou a ter um comportamento controlador relativamente à Autora, motivado pela distância física que os separava, originando frequentes discussões, que mantinham pelo telefone ou quando o Réu se deslocava a Portugal.

  10. No dia 28 de Janeiro de 2016, a Autora cansada do comportamento do Réu, pôs termo ao relacionamento existente entre ambos.

  11. Autora e Réu, desde o primeiro momento da relação que mantiveram, passaram a contribuir com os seus rendimentos para o bem comum do casal, enriquecendo-o e satisfazendo mutuamente as despesas, ou encargos do agregado familiar.

  12. Todas as economias, proventos, rendimentos e ganhos de Autora e Réu foram aplicadas nos bens imóveis identificados em 7º e 8º, sempre no interesse, proveito e fazendo parte do património comum.

  13. A Autora chegou mesmo a contrair um empréstimo a uma familiar para fazer face ao pagamento do preço de um dos imóveis aos vendedores.

  14. Com a aquisição dos referidos prédios Autora e Réu pretendiam edificar no futuro uma moradia para sua habitação própria.

  15. O réu colocou os prédios identificados em 7º e 8º apenas em seu nome pessoal, por ter enganado a Autora.

  16. O valor dos prédios, supra referidos, que se encontram juntos, constituindo uma área apta, para construção urbana, onde a Autora e Ré pretendiam edificar um prédio urbano destinado a habitação, tem um valor não inferior a € 80.000,00.

  17. A Autora, quando passou a viver com o Réu, fê-lo na certeza, esperança, e convencimento de uma relação duradoura e parta a vida, tratando-o como verdadeiro marido, vivendo na sua companhia, dele cuidando, mesmo em relação à sua família.

  18. Procurando cimentar todo o seu futuro na prevenção de uma vida tranquila, sacrificando-se no trabalho e privando-se dos bens de natureza que não fossem de primeira necessidade, com vista a ter uma vida em comum com o Réu e uma habitação própria e permanente, onde pretendiam centralizar as suas vidas.

  19. Deixando que o Réu averbasse em seu nome tudo quanto iam amealhando e por isso não constituindo para si qualquer património autónomo.

  20. O Réu provocou a ruptura da relação, tendo traído a confiança que nele depositou a Autora, que transferiu bens e dinheiro para o Réu.

  21. Com a sua conduta causou-lhe desgosto, humilhação e destruição de tudo quanto a mesma ia projectando em comum com ele, o que a levou já a buscar apoio de vária natureza entre familiares e do foro médico.

    1. A sentença recorrida violou o disposto no nº 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil.

    2. Deve, nos termos do disposto no artigo 662º do Código de Processo Civil, ser alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto, supra referida e por consequência ser julgada procedente a acção».

    *O Réu não apresentou contra-alegações, apenas tendo dito nos autos que o recurso não tem fundamento e é extemporâneo.

    *O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    *Foram colhidos os vistos legais.

    ** 1.3. QUESTÕES A DECIDIR Tendo presente que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635º, nºs 2 a 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, as questões a decidir são: i) – Reexaminar os meios probatórios produzidos, tendo como finalidade verificar se existiu erro no julgamento da matéria de facto e se devem ser considerados como provados os factos que a sentença deu como não provados, atenta a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto; ii) – Verificar se o relacionamento havido entre Autora e Réu pode ser qualificado como união de facto; iii) – Determinar se assiste à Autora o direito de receber as quantias por si peticionadas.

    ***2 – FUNDAMENTOS 2.1. Fundamentos de facto A decisão recorrida considerou provados os seguintes factos: 2.1.1.

    A Autora nasceu em … e é filha de António e de Ana.

    2.1.2.

    O Réu nasceu em … e é filho de Manuel e de Maria.

    2.1.3.

    Autora e Réu conheceram-se na cidade de Esposende e algum tempo depois encetaram um namoro.

    2.1.4.

    Em 09.10.2010, Autora e Réu emigraram para os Estados Unidos de América, tendo regressado a Portugal alguns meses depois.

    2.1.5.

    A Autora matriculou-se no Instituto Superior do Cávado, no curso de solicitadoria, que passou a frequentar em horário pós-laboral.

    2.1.6.

    O Réu decidiu emigrar para França, onde trabalhou na construção civil, deslocando-se a Portugal uma vez por mês, bem como nas férias de Verão e nos períodos da Páscoa e Natal.

    2.1.7.

    Por escritura pública celebrada em 18.05.2012, M. R., José e Manuela declararam vender ao Réu, que por sua vez declarou aceitar, pelo preço de € 1.000,00, o prédio rústico composto de pinhal e mato, no sítio do Campo …, freguesia de (...), do concelho de Esposende, com a área de 378 m2, a confrontar do norte com a Rua (...), de nascente com António, de sul com M. C. e de poente com M. G., não descrito na Conservatória do Registo Predial e inscrito na matriz sob o artigo ....

    2.1.8.

    Por escritura pública celebrada em 08.11.2012, António e mulher Glória declararam vender aos aqui Autora e Réu, que por sua vez declararam aceitar, pelo preço de € 500,00, o prédio rústico composto por pinhal e mato, no sítio do (...), freguesia de (...), do concelho de Esposende, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº (...) e inscrito na matriz sob o artigo (...).

    2.1.9.

    Por escritura pública celebrada em 18.12.2015, a Autora declarou vender ao Réu, que declarou aceitar, pelo preço de € 250,00, metade indivisa do prédio identificado em 2.1.8.

    *Factos não provados: O Tribunal a quo considerou que, dos alegados pelas partes e com relevo para a discussão da causa, não se provaram quaisquer outros factos, nomeadamente os seguintes:

  22. Autora e Réu começaram a viver juntos desde o final de Setembro de 2010.

  23. Nessa data, Autora e Réu passaram a residir na habitação dos pais do Réu, sita na Rua (...), lugar de (...), freguesia de (...), do concelho de Esposende...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT