Acórdão nº 2951/15.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelEDUARDO AZEVEDO
Data da Resolução18 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães José intentou a presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento contra X, Sa que apresentou articulado de motivação do despedimento alegando, em suma: matéria (enquanto operador de caixa permitindo a saída de mercadoria do estabelecimento sem documento contabilístico e pagamento, nomeadamente), em seu entender, integrante da prática de infracções disciplinares constituintes de justa causa de despedimento; ter havido desobediência, falta de respeito e cuidado causador de prejuízo o que, pela sua gravidade, tornou impossível a manutenção e a subsistência da relação de trabalho existente entre a empregadora e o trabalhador; e oposição à reintegração.

Deduziu-se oposição. Alegou-se, em súmula, a caducidade do procedimento disciplinar, a nulidade do mesmo “em face da percepção das alegadas infracções disciplinares decorrerem da observância de imagens de videovigilância” e a insubsistência de qualquer fundamento legal para o despedimento na medida em que todas as mercadorias foram devidamente registadas.

Pediu: “

  1. Ser julgada procedente por provada a presente acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento e, consequentemente, 1. Ser declarada a ilicitude do despedimento do Autor; 2. Ser condenada a R. a pagar as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da sentença; 3. Ser condenada a R. a pagar a indemnização constante do 392.º, n. 3 do Código de Trabalho, por cada ano antiguidade desde 1 de Fevereiro de 1982, até ao trânsito em julgado da sentença.

  2. Ser julgada procedente por provada a reconvenção e consequentemente ser condenada a R. a pagar €25.000,00 (vinte e cinco mil euros), a título de danos não patrimoniais.”.

    A empregadora respondeu, em síntese, mantendo a sua posição inicial e respondendo à matéria de excepção e da reconvenção.

    Elaborou-se saneador no qual julgou-se improcedente arguição de nulidade do procedimento disciplinar em razão de prova através de imagens de videovigilância e fixou-se o objecto do litígio e os temas de prova.

    Aquela excepção foi decidida nestes termos: “Para além de arguir a ilicitude do despedimento, o Autor veio ainda invocar a nulidade do processo disciplinar em virtude de as alegas infracções disciplinares decorrerem da observância de imagens de videovigilância, por esta constituir uma gravação ilegal do desempenho da sua actividade profissional e violar o princípio constitucional do direito à reserva da sua vida privada.

    A Ré, entidade empregadora, contrapôs que o processo disciplinar não padece dos apontados vícios, uma vez que o uso de imagens captadas pelo sistema de videovigilância no âmbito do procedimento disciplinar e em sede de processo judicial constituiu um meio de prova lícito e não viola qualquer direito do trabalhador protegido constitucionalmente.

    Cumpre, pois, decidir, tendo em conta que os vícios que levam à invalidade do processo disciplinar são apenas os que vêm enumerados taxativamente nas várias alíneas do nº 2 do artigo 382º do Código do Trabalho e não quaisquer outras. Ora, o uso de meios de prova ilícitos – se a ilicitude se vier a verificar –, quando muito, poderá levar à improcedência dos motivos que determinaram o despedimento, isto é, se este se fundamentar em exclusivo naquelas provas. Não mais do que isso.

    Por isso, a apontada nulidade não tem qualquer fundamento.

    Em suma, não se verifica a nulidade do procedimento disciplinar.” Realizou-se audiência de julgamento.

    Proferiu-se sentença absolvendo-se a requerida dos pedidos O A recorreu e concluiu: “1º. O Recorrente não se conforma com a decisão, em crise, mormente quanto a factos que, no seu modesto entender, deveriam ter sido dados como não provados, 2º. Desta decisão não se conforma o Recorrente, pelo erro na apreciação da prova e insuficiência dos meios de prova.

    1. Afirma a Sentença ora em crise, erroneamente, que os factos elencados sob as alíneas q), r), s) t) e u) resultam dos documentos juntos com o procedimento disciplinar e nos autos, a saber: participação do Diretor Geral, comunicação da intenção de despedimento com nota de culpa, resposta do Autor, autos de inquirição, decisão e relatório final. De qualquer forma, esses factos não foram objecto de impugnação.

    2. De facto, o Recorrente começa exatamente no seu artigo 50. da contestação, por impugnar expressa, especificada e rotundamente os factos que instruem e alegados no Articulado da Ré, pela sua imprecisão inverdade e inexatidão.

    3. Com o referido articulado, foram pelo Autor impugnados todos e quaisquer factos, nele se incluindo os documentos.

    4. Ainda assim, e se duvidas restassem, o Autor no seu articulado 54., impugna expressamente por falsa, a comunicação datada de 05 de janeiro de 2015.

    5. Resulta da Sentença ora em crise, que os factos g) h) i) j) k) m) n) o), p), v), w), x), y), z), aa), bb), cc), dd), ee), ff), gg), hh), ii), jj), kk), ll), mm), nn), pp), qq), rr), ss), tt), uu), vv), ww), xx), yy), aaa) e bbb), assentam, fundamentalmente, no depoimento das testemunhas apresentadas pela Ré.

    6. E, a Sentença acrescenta, ser de realçar o depoimento prestado pelo Diretor Geral da Ré, L. G..

    7. O depoimento desta testemunha deveria ter sido valorado de modo diferente, para efeitos de aferição da idoneidade do depoimento, por falta de isenção e independência, ao contrário do que foi pelo Mmo. Juiz a quo.

    8. O Mmo. Juiz a quo, dá como não provado que a Ré teve conhecimento dos factos imputados ao Autor, a 5 de janeiro de 2015, e o Autor aqui Recorrente não pode concordar com tal conclusão.

    9. Contudo, como pode, num único dia, à luz da experiência comum, ter a testemunha Dr. L. G., visionado as imagens do sistema de videovigilância (com várias horas, aliás dias, de imagem), 12º. E ainda, constatar a existência de indícios suficientes para fundamentar o despedimento com justa causa, solicitar a ajuda de um outro trabalhador da Ré, Sr. Pedro e, em conjunto, visionarem novamente as imagens, nesse mesmo dia solicitar o envio de toda a documentação contabilística aos funcionários da Ré, analisar essa informação por forma a aferir se a mesma estava em conformidade, contactar o Sr. Dr. C. C., (Ilustre Advogado da Ré) por forma a agendar uma reunião, reunir com o mesmo na sede da Ré, reunir com os trabalhadores visados, elaborar a comunicação para o conselho de administração, receber ordens do conselho de administração para iniciar o procedimento disciplinar, e, nesse mesmo dia, outorgar a procuração que conferiu ao Sr. Dr. C. C., Ilustre Colega, poderes bastantes para instruir o procedimento disciplinar.

    10. Na verdade, um conjunto de factos, que não se compaginam com a prática comum e real neste tipo de situações.

    11. Como alegou o Autor, ora Recorrente, na sua contestação, a entidade empregadora, Ré, acedeu ao registo informático que guardava as imagens de videovigilância, pelo menos, antes 13 de dezembro de 2014.

    12. Pelo que, contados os 60 (sessenta) dias que a Ré dispunha para iniciar o procedimento disciplinar, desde dia 06 de fevereiro de 2015 (pelo menos) que caducou direito ao procedimento disciplinar! 16º. A Sentença ora em crise, assenta também no visionamento das imagens de videovigilância juntas pela Ré, aqui Recorrida, apesar da sua instalação ter como fim exclusivo a proteção de pessoas e bens em termos genéricos, e ser autorizada pela Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD).

    13. Entende o Recorrente que o procedimento disciplinar é nulo em face da perceção das alegadas infrações disciplinares decorrerem da observância de imagens de videovigilância, por esta constituir uma gravação ilegal do desempenho da sua atividade profissional, e violar o princípio constitucional do direito à reserva da vida privada do Recorrente (Artigo 26º da Constituição da República Portuguesa).

    14. Por outro lado, essa utilização deverá traduzir-se numa forma de vigilância genérica, destinada a detetar factos, situações ou acontecimentos incidentais, e não numa vigilância diretamente dirigida aos postos de trabalho ou ao campo de ação dos trabalhadores; 19º. Na verdade, a prova, não só, não pode ser utilizada como forma de controlar o exercício da atividade profissional do trabalhador, como não pode, por maioria de razão, ser utilizado como meio de prova em sede de procedimento disciplinar.

    15. Mais, atenta a autorização Nº 28/2014, a Ré obteve da CNPD licença para instalação de um sistema de videovigilância, com a finalidade de proteção de pessoas e bens.

    16. A Comissão Nacional de Proteção de Dados definiu já os referidos princípios como limites ao tratamento de dados.

    17. A referida autorização nº 28/2014, determina expressamente, que a comunicação das imagens, só poderá ocorrer, no âmbito de processo judicial, em cumprimento de despacho fundamentado da autoridade judiciária competente.

    18. Não existe nos presentes autos Despacho Judicial fundamentado.

    19. Entende assim, o aqui Recorrente, ser inadmissível por nula, a prova apresentada pela Ré, decorrente das imagens de videovigilância, e admitida pela Mmo. Juiz do Tribunal a quo.

    20. As imagens entregues e disponibilizadas ao aqui Recorrente são impercetíveis, na medida em que, visionadas num qualquer equipamento nada se consegue perceber.

    21. Só mesmo, com a colaboração do Sr Dr. L. G., genro da Presidente do Conselho de Administração, que funciona como “guionista” se consegue visionar as imagens.

    22. A disponibilização das imagens só aquando o julgamento, limita a igualdade das partes, 28º. Na verdade, o sistema de videovigilância, com gravação, das imagens encontra-se nas instalações da Ré, ora Recorrida, e de acesso exclusivo da Administração da mesma.

    23. Mais, o Recorrente apenas pode ter acesso às imagens disponibilizadas pela Ré.

    24. O que implicou uma verdadeira impossibilidade de um real exercício do contraditório e de uma violação do Princípio da Igualdade das Partes – artigo 20º nº4 da Constituição da República Portuguesa.” Em síntese...

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