Acórdão nº 1958/15.0T9BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 22 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelCLARISSE GON
Data da Resolução22 de Outubro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO - 1.

No processo comum, com intervenção de Tribunal Singular, com o nº 1958/15.0T9BRG, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, no Juízo Local Criminal de Barcelos, Juiz 2, foi proferido: - DESPACHO, a 2 de Outubro de 2017, onde se decidiu (transcrição): “Nessa medida, depois de tudo visto e sem necessidade de mais considerações, decide-se: i) Declarar juridicamente inexistentes os despachos proferidos pelo Ministério Público a fls. 535/536 e 578 e seguintes dos autos; ii) Rejeitar a acusação pública deduzida a fls. 277 e seguintes, ao abrigo do artigo 311º, nº 2, alínea a) e n.º 3, alínea a), do Código de Processo Penal, por ser manifestamente infundada, no que respeita à sociedade arguida “X – Industria de Perfis, S. A. – Em Liquidação”; iii) Receber a acusação deduzida pelo Ministério Público a fls. 277 e seguintes contra os arguidos D. S.

, J. S., D. M.

e “XX – Comércio, S. A. – Em Liquidação”, todos melhor identificados a fls. 278/279, pelos factos e disposições legais constantes da referida acusação e que aqui se dão por integralmente reproduzidos.

*Para julgamento neste Tribunal designo o dia 29.11.2017, pelas 9.30 horas, e o dia 06.12.2017, pelas 09:30 horas, como segunda data, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 312.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.

*Os arguidos aguardarão os ulteriores termos do processo sujeitos a Termo de Identidade e Residência, já prestados nos autos, atenta a inexistência de exigências cautelares que justifiquem a aplicação de outra medida de coacção.

*Admito liminarmente o pedido de indemnização civil de fls. 612 e seguintes, bem como a prova que o acompanha, mas apenas quanto aos arguidos D. S.

, J. S.

e “XX – Comércio, S. A. – Em Liquidação, rejeitando-o relativamente à demandada “X – Industria de Perfis, S. A. – Em Liquidação”, atento o princípio da adesão plasmado no artigo 71.º, do Código de Processo Penal, e tendo em conta que, no que respeita a esta sociedade, a acusação foi rejeitada por ser manifestamente infundada.

*Cumpra o disposto no artigo 78.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.

*Notifique, sendo ainda os arguidos para, querendo, apresentarem nova contestação, tendo como referência a delimitação do objecto do processo operada pela acusação ora recebida.” (fls. 775 e 776).

e - SENTENÇA, datada, lida e depositada a 18 de Dezembro de 2017 (fls. 887, 895v. e 896), com a seguinte “Decisão” (transcrição): “Parte Crime Pelo exposto, julga-se a acusação procedente e, em consequência, decide-se: a) condenar o arguido D. S.

pela prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido no art.º 107, do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/01, de 5 de Junho e com referência ao art.º 105, n.º 5, do mesmo diploma e art.º 30, do Código Penal, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), no total de € 1.120,00 (mil cento e vinte euros); b) condenar o arguido J. S.

pela prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido no art.º 107, do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/01, de 5 de Junho e com referência ao art.º 105, n.º 5, do mesmo diploma e art.º 30, do Código Penal, na pena de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), no total de € 1.120,00 (mil cento e vinte euros); c) condenar o arguido D. M.

pela prática, em autoria material, de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, na forma continuada, previsto e punido no art.º 107, do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/01, de 5 de Junho e com referência ao art.º 105, n.º 5, do mesmo diploma e art.º 30, do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 7,00 (sete euros), no total de € 1.400,00 (mil e quatrocentos euros); d) condenar a arguida “XX -Indústria de Perfis, S.A. - Em Liquidação” pela autoria de um crime de abuso de confiança em relação à Segurança Social, na forma continuada, por força do estatuído nos artigos 7.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias, na pena de 200 (duzentos) dias de multa dias de multa, à taxa diária de € 10 (dez euros), tudo no valor global de € 2.000,00 (dois mil euros).

*Mais se condenam os arguidos no pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça para cada um deles no mínimo legal e reduzindo-a a metade por força da confissão dos factos realizada pelos arguidos D. S., J. S. e D. M. (por si e enquanto legais representantes da sociedade arguida).

*Parte Civil Julga-se parcialmente procedente a acção cível e, em consequência: i) Declara-se extinta a instância por inutilidade superveniente legal da lide, nos termos artigo 277, alínea e), do Código de Processo Civil, no que respeita à demandada “XX -Indústria de Perfis, S.A. - Em Liquidação”; ii) Condenam-se os demandados D. S.

, J. S. e D. M.

a pagar solidariamente ao Instituto da Segurança Social, I. P. a quantia de € 33.885,83, acrescida de juros de mora à taxa prevista no art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 77/99, de 16 de Março, contados a partir do termo do prazo em que cada uma das quantias referentes às quotizações deduzidas devia ter sido entregue e até efectivo e integral pagamento.

Custas a cargo dos demandados D. S., J. S. e D. M. – art.º 523.º do Código de Processo Penal e artigo 527.º, n.ºs 1 a 3, do Código de Processo Civil.

*Boletins à Direcção dos Serviços de Identificação Criminal.

*Notifique.

*Proceda-se ao depósito.

*Face ao disposto no artigo 78.º, n.º 2, do Código Penal e 472.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, e tendo como referência as anteriores condenações impostas a todos os arguidos, após trânsito, requisite certificados do registo criminal actualizados, abrindo de seguida vista ao Ministério Público.” (fls. 894v. e 895).

- 2.

Inconformados com ambas as decisões (do DESPACHO e da SENTENÇA), o Ministério Público e o arguido J. S.

, interpuseram os respectivos recursos, sendo que da sentença o recurso foi interposto também pelo arguido D. S.

.

- 2. A.) Do DESPACHO - 2. A. 1.) O Ministério Público apresentou as seguintes conclusões (transcrição): “- I.

A acusação de fls. 578 a 586 é válida porque, efetivamente, a acusação de fls. 277 a 282 é nula ao abrigo do disposto no artigo 119.º, al. d) do CPP conforme se refere no douto despacho de fls. 535 e 536 sendo que o MP de forma preventiva e legalmente admissível, reparou essa nulidade repondo a legalidade processual penal.

- II.

Quanto à questão a decidir acompanhamos na integra o entendimento do Ministério Público nas alegações de recurso que foram apreciadas pelo Tribunal Superior no supra referido Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 24 de abril de 2017, proferido no processo n.º 180/07.4 JABRG. G1 relatado pela Exm.º Sr.ª Desembargadora, Dr.ª Fátima Furtado, disponível in www.dgsi.pt. Com efeito, - III.

Não obstante o terminus formal do inquérito, o Ministério Público mantém competência para a prática de atos de índole formal e substancial posteriores, nomeadamente conhecendo de eventuais invalidades anteriormente cometidas, apreciando causas supervenientes que obstem ao exercício da ação penal (v.g.

desistência de queixa, amnistia, prescrição) e promovendo as diligências necessárias à remessa dos autos para julgamento.

- IV.

Os mesmos poderes são ex lege atribuídos ao juiz de instrução criminal, que exerce todas as funções jurisdicionais até à remessa do processo para julgamento, nos termos do artigo 17.º do Código de Processo Penal.

- V.

A declaração de nulidade determina quais os atos que passam a considerar-se inválidos e ordena, sempre que necessário e possível, a sua repetição, pondo as despesas respectivas a cargo do arguido, do assistente ou das partes civis que tenham dado causa, culposamente, à nulidade

(art. 122.º, n.º 2, do CPP; art. 202.º do CPC); - VI.

O princípio da irretratabilidade da acusação significa apenas que o Ministério Público não pode retirar uma acusação/arquivamento por si formulada, não abrangendo a possibilidade da sua correção quando ela, por qualquer motivo, seja inválida.

-VII.

Apenas aquilo que é processualmente válido pode desencadear esse efeito preclusivo: quod nullum est nullum producit effectum; se uma acusação inválida não produz efeitos, então também não produziu esse efeito preclusivo de não poder jamais ser retirada nem, de alguma forma, corrigida.

- VIII.

À semelhança do autor da petição inicial, o Ministério Público pode antes da remessa dos autos para julgamento, por força do princípio da legalidade do exercício da ação penal, consagrado no artigo 219.º da Constituição da República Portuguesa, corrigir uma acusação nula que tenha proferido anteriormente.

- IX.

Os arguidos não devem poder beneficiar de um qualquer erro formal, cometido pelo Ministério Público, nomeadamente quando a renovação do processo importar a renovação da possibilidade de se defender.

- X.

Uma vez que o Ministério Público não é infalível, o interesse punitivo estadual impõe que uma acusação inválida possa ser corrigida até à sua remessa para julgamento e à formação da relação jurídica processual trilateral, sob pena de se afetar o direito de acesso ao direito e aos tribunais (art. 20.º da CRP).

- XI.

Tal como os erros dos outros sujeitos processuais, também os erros do Ministério Público devem poder ser corrigidos, não podendo a pretensão punitiva estadual ficar exclusivamente dependente da bondade da sua atuação.

- XII. A declaração de uma acusação nula e a sua substituição por outra não violou os direitos de defesa dos arguidos, uma vez que estes foram notificados da nova acusação, tendo tido a possibilidade de a impugnar, suscitando a sua comprovação judicial (Aliás, no presentes autos, os arguidos...

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