Acórdão nº 258/10.7TCGMR-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução18 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: Relator: José Fernando Cardoso Amaral Adjuntos: -Des.ª Dr.ª Helena Maria de C. G. de Melo -Des. Dr. João A. Peres de O. Coelho I. RELATÓRIO O co-réu Manuel requereu, ao abrigo do disposto no nº 7, do artigo 6.º do RCP (Regulamento da Custas Processuais), que a taxa de justiça final devida, na presente acção, em primeira instância e nas instâncias de recurso, seja reduzida como se o valor dela ascendesse a, apenas, € 275.000,00 e, por isso, que as partes sejam dispensadas do pagamento da taxa de justiça na parte excedente àquele valor.

Sobre tal requerimento recaiu a seguinte decisão: “Considero não preenchidos os pressupostos previstos pelo n." 7 do artigo 6° do Regulamento das Custas Judiciais.

Desde logo, porque a decisão da presente causa não revestiu especial simplicidade, já que o julgamento decorreu por várias sessões, a sentença teve que decidir a matéria de facto, analisando a vasta documentação junta pelas partes e os demais meios de prova produzidos em audiência, e teve que apreciar as questões jurídicas que os autos suscitaram, sendo o aspecto central da decisão jurídica pouco tratado na jurisprudência obrigando, por isso, a maior reflexão e esforço de argumentação. Os recursos interpostos nos tribunais superiores também obrigaram ao tratamento das questões, que se não têm por simples, suscitadas pelas partes.

Por outro lado, a conduta processual das partes não deu especial contributo para o célere desfecho da causa, pois não transigiram, total ou parcialmente, quanto ao objecto do pedido, indicaram e produziram vasta prova, e recorreram da decisão final, não apenas para o Tribunal da Relação de Guimarães como para o Supremo Tribunal de Justiça, obrigando portanto à prolação de decisões em todas as instância possíveis.

Também se não afigura ocorrer desproporção no valor da taxa de justiça, violadora do disposto nos artigos 18° e 20° da Constituição da República Portuguesa, na medida em que este, fixado de acordo com o Regulamento de Custas Processuais, é gradual, variando directamente em função do valor específico dos interesses da causa, sendo o montante de custas, no caso, correspondente à significativa expressão patrimonial do acto impugnado, como revela a matéria provada da sentença transitada em julgado, referente ao valor do acervo hereditário do falecido Joaquim.

Termos em que indefiro o pedido, formulado pelo Réu Manuel, de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça devida, calculada sobre valor superior a € 275.000,00.

Sem custas, atenta a simplicidade.” O dito co-réu requerente não se conformou e apelou a esta Relação no sentido de que revogue o decidido e lhe defira o pedido, alegando e concluindo deste modo: “36.1.

Pelas razões invocadas nas secções 1 e 2 das presentes contra-alegações, que aqui se dão por reproduzidas, o ora recorrente foi demandado em virtude de se estar perante um caso de litisconsórcio passivo, não tendo, porém, contestado a acção por estar de acordo com as posições assumidas pela autora, pelo que não deu, em primeira instância, qualquer impulso processual nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais.

36.2.

Por essa razão, e também porque não foi condenado no pagamento das custas da presente acção, não lhe poderá ser imputado qualquer valor a título de taxa de justiça devida em primeira instância – cfr. despacho de 27 de Maio de 2015.

36.3.

O despacho recorrido, apesar de se ter pronunciado, conforme tinha sido requerido pelo apelante, no que diz respeito ao facto de o mesmo não ser responsável pelo pagamento das custas em primeira instância e, consequentemente, do remanescente da taxa de justiça, não “respondeu”, de forma inequívoca, à questão suscitada, razão por que o recorrente não pode deixar de ver cabalmente dilucidado que nada tem a pagar a título de taxa de justiça devida em primeira instância, o que, ao abrigo do disposto no artigo 614.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, desde já requer.

36.4.

Conforme se demonstrou nas secções 5 e 6 das presentes alegações, que aqui se dão por reproduzidas, tendo em conta o valor fixado à acção e o número de sujeitos processuais, o montante global da taxa de justiça que o Estado arrecada com os presentes autos ascende à “astronómica” quantia de, pelo menos, 150.144 Euros, se se considerar que o ora recorrente é responsável pelo pagamento da taxa de justiça em primeira instância, o que apenas por mera hipótese de raciocínio se equaciona.

36.5.

É por demais evidente que o valor da taxa de justiça (150.144 Euros) nenhuma correspondência tem com o serviço prestado pelo tribunal.

36.6.

A ratio do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais é permitir que o tribunal, atendendo ao caso concreto, fixe o valor da taxa de justiça à luz dos princípios da proporcionalidade e do acesso à justiça, no sentido de que tem que haver correspectividade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada.

36.7.

Basta “olhar” para o montante da taxa de justiça devida nos presentes autos (150.144 Euros) para se concluir, sem qualquer dificuldade nem esforço na interpretação da norma, que a intenção do legislador jamais pode ser a que o despacho recorrido entendeu ser a correcta.

36.8.

De resto, a previsão da intervenção moderadora do tribunal, prevista naquela norma, terá sido o expediente encontrado pelo legislador para tentar “atenuar” a inconstitucionalidade material das normas do regulamento conjugadas com a respectiva tabela e que permitem a fixação de tão absurdos valores.

36.9.

E é justamente por essa razão que o valor da taxa de justiça não poderá ser fixado tendo por base uma simples “correspondência matemática” com o valor do pedido - ver Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 421/2013, de 15 de Julho de 2013 e Acórdão do Tribunal Constitucional de 22 de Março de 2017, ambos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Dezembro de 2013, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 21 de Abril de 2015, e Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 13 de Março de 2014, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

36.10.

No caso concreto, o cálculo da taxa de justiça, tendo por base o valor da causa, só por si, viola, flagrantemente, o princípio constitucional da proporcionalidade previsto no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição da Republica Portuguesa: exigir-se mais de 150.000 Euros (!!!) de taxa de justiça não tem qualquer correspondência com o serviço prestado pelo tribunal.

36.11.

Pelas razões invocadas nas secções 12 e 13 das presentes alegações, que aqui se dão por reproduzidas, os princípios constitucionais da proporcionalidade e do acesso ao direito (artigos 2.º e 20.º nº 1 da Constituição da República Portuguesa) sempre conduziriam à imputação de um vício de inconstitucionalidade material à interpretação normativa de qualquer artigo do Regulamento das Custas Judiciais à luz do qual se pudesse sufragar semelhante entendimento.

36.12.

Uma taxa não é um imposto.

36.13.

Interpretar o artigo 6.º, n.º 7, do RCP, no sentido de que o tribunal deve aplicar “de forma cega” e sem qualquer ponderação prévia, a tabela anexa ao Regulamento das Custas Processuais traduz-se, em casos como o sub judice, em fazer uma interpretação que viola o princípio da proporcionalidade consagrado nos artigos 18.º n.º 2 e 266.º n.º 2 da CRP.

36.14.

Por outro lado, pelas razões invocadas nas secções 17 e 18 das presentes alegações, que aqui se dão por reproduzidas, não existe nenhuma norma a autorizar que o valor das custas seja um múltiplo do número de sujeitos processuais, quando uma parte (activa ou passiva) ou as duas partes é plural e se encontra representada por mandatários judiciais distintos e apresenta articulados autónomos. 345 de 355 36.15.

Da conjugação do disposto no artigo 530.º, n.º 2 e do artigo 13.º, n.º 7, alínea a) do RCP conclui-se que o legislador não quis multiplicar a taxa de justiça dos processos pelo número de sujeitos processuais de cada uma das partes ou, melhor dizendo, pelo número de articulados autónomos apresentados por cada uma das partes: se os sujeitos processuais que integram cada uma das partes apresentarem um único articulado (petição inicial ou contestação) só será devida uma taxa de justiça, ao que acresce o facto de o artigo 3.º do Regulamento das Custas Processuais se referir que as custas abrangem a taxa de justiça no singular e não as taxas de justiça no plural.

36.16.

Pelas razões invocadas nas secções 19, 20, 21, 22, 23 e 24 das presentes alegações, que aqui se dão por reproduzidas, impor-se ao ora recorrente que, como se viu, não foi condenado no pagamento de quaisquer custas quer em primeira instância, quer nas instâncias de recurso, o pagamento da totalidade do remanescente da taxa de justiça viola o princípio da proporcionalidade na vertente de responsabilização de cada uma das partes pelas custas de acordo com a causalidade e a sucumbência.

36.17.

A tudo quanto se acabou de alegar, acresce um outro argumento a que o Tribunal a quo não podia ter deixado de ser sensível.

36.18.

A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, a ser deferida, beneficiará igualmente os cofres do Estado atento o benefício de apoio judiciário de que a autora e os demais réus beneficiam e, por conseguinte, ter que ser o Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça, I.P. a reembolsar o ora recorrente da taxa de justiça e das despesas que despendeu ou ainda vier a despender.

36.19.

Os pressupostos invocados no despacho recorrido para que tivesse sido dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça não se verificam: o julgamento não decorreu “por várias sessões” mas apenas e só por duas sessões, apesar do número de intervenientes neste processo (a autora e três réus), a quase totalidade das testemunhas que foram ouvidas eram comuns, tendo sido inquiridas apenas nove testemunhas, que...

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