Acórdão nº 120/16.0T8EPS.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Janeiro de 2018
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO O autor JOSÉ, intentou, em 17-03-2016, no Tribunal de Esposende, acção declarativa, com processo comum, que veio a prosseguir no de Viana do Castelo, contra a ré MARIA.
Pediu a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 12.570,69€ (e juros).
Alegou, em síntese, na petição inicial, que se divorciou desta, por mútuo consentimento, em 16-11-2004.
Apenas em 06-06-2008, foi partilhado o património comum, que incluía a casa que foi morada de família adquirida com recurso a empréstimo bancário.
Durante aquele período (entre o divórcio e a partilha), pagou as prestações respectivas ao Banco.
É de 8.503,13€ o valor da metade devida pela ré e que esta lhe deverá repor.
No mesmo período, pagou as despesas de água e luz.
É de 4.067,56€ a parte destas devida pela ré.
Juntou documentos e, entre eles, cópia da acta de conferência realizada na acção de divórcio da qual consta que, por acordo, a casa de morada de família foi atribuída ao autor até à partilha e da sentença homologatória desta.
A ré, na contestação (27-05-2016), resumindo, além de excepcionar a incompetência territorial do tribunal, aceitou parte da matéria de facto alegada e impugnou outra, refutando a pretensa obrigação de pagar parte das prestações do empréstimo bancário relativas ao invocado período.
Com efeito, alegou que, em contrapartida do gozo exclusivo do imóvel, o autor aceitou pagar a totalidade dos valores mensais devidos pelo empréstimo ao Banco, o que fez, desde a data do divórcio e até à partilha, sem manifestar contrariedade e nunca tendo exigido qualquer valor à ré, convicto de que assim a compensava da privação, por parte dela, do uso do imóvel. Aliás, se o autor tal não tivesse aceitado, a ré não teria concordado na atribuição ao mesmo da casa ou ter-lhe-ia exigido o pagamento da compensação respectiva. O valor locativo do imóvel seria de 400,00€/mês, próximo do da prestação bancária, tendo, assim, a ré ficado dispensada, em contrapartida, de proceder ao pagamento da sua quota-parte (cerca de €200/mensais) das prestações bancárias, correspondente a metade daquele a que teria direito. Daí que deva ser absolvida do pedido relativo à quantia de 8.503,13€.
Quanto às alegadas despesas, elas respeitam a consumos próprios e são da responsabilidade exclusiva do autor, que as fez gozando o imóvel, pelo que deve também ser absolvida do pedido na parte relativa ao valor de 4.067,56€.
À cautela e sem prescindir do alegado, deduzindo reconvenção, alegou que, dadas as características e valor da casa, os rendimentos auferidos por cada um e porque ela própria teve de pagar renda noutra casa onde ficou a habitar com os filhos do casal, nos termos do artº 1793º, CC, ou segundo as regras do enriquecimento sem causa, sempre teria direito a exigir do autor uma compensação por ter ficado privada do gozo do bem comum e como contrapartida de este ter sido atribuído e fruído exclusivamente por ele. Sendo de 400,00€/mês o valor locativo, deve ser-lhe paga a metade (200,00€) nos 43 meses (entre a data do divórcio e a partilha), no total de 8.600,00€.
Concluiu que “deve: a) a presente acção ser julgada totalmente improcedente e em consequência ser a Ré totalmente absolvida do pedido; b) a litigância de má procedente por provada e por via dela ser o A. condenado a pagar multa e indemnização a favor da Ré no montante de €2.500 e c) sem prescindir, a Reconvenção ser julgada totalmente procedente por provada e por via dela ser o A./reconvindo condenado pagar à R./reconvinte a quantia total de €8.600 a título das rendas devidas pela utilização por parte do A. do imóvel comum durante o período de 43 meses que medeia entre a data do divórcio e a partilha, à razão de €200/mensais. €200/mensais.” Na réplica, o autor, negando ser devida qualquer compensação ou contrapartida, alegou que nunca a ré foi privada de usar e fruir o imóvel, tendo sido esta quem por sua livre e espontânea vontade decidiu abandonar a casa e de facto a abandonou em 04-03-2003. Desde Fevereiro de 2004 e desde Maio de 2004, respectivamente, os filhos Joaquim (maior e por decisão própria) e Manuel (menor e por decisão judicial que, primeiro, o confiou à guarda e cuidados do autor e, depois, regulou assim o exercício das responsabilidades parentais), passaram a habitar com este a casa. A ser devida qualquer renda, ela teria de ser pedida e fixada na sentença homologatória do divórcio, o que não aconteceu, não podendo agora a ré exigi-la, tal como qualquer compensação. Nunca a ré manifestou qualquer intenção de ali habitar, antes sempre vincou a sua posição de ruptura com o núcleo familiar. De resto, o valor reclamado é excessivo.
Por despacho datado de 12-07-2016, foi julgada procedente a excepção de incompetência territorial e ordenada a remessa do processo ao Tribunal de Viana do Castelo.
Procedeu-se à realização da audiência prévia. Nela se proferiu despacho saneador tabelar, admitiu a reconvenção(1), fixou o valor da acção, identificou o objecto do litígio (2), se enunciaram os temas da prova (3), apreciaram os requerimentos probatórios e ordenou-se a realização de perícia ao imóvel.
Entretanto, o autor, alegando que, afinal, foi superior o valor das prestações por si pagas ao Banco no período em causa, ampliou para 14.337,08€ o valor do pedido, o que, sem oposição, foi admitido.
Designou-se e realizou-se a audiência de julgamento, nos termos e com as formalidades descritas nas actas, tendo sido ouvidas as partes e inquiridas testemunhas.
Com data de 17-08-2017, foi proferida a sentença que culminou na seguinte decisão: “Pelo exposto, decide-se: 5.1.
Julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condena-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 10.269,52 (dez mil duzentos e sessenta e nove euros e cinquenta e dois cêntimos), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, a contar da citação até efectivo e integral pagamento.
5.2.
Julgar a reconvenção totalmente procedente e, em consequência, condena-se o Autor a pagar à Ré a quantia de € 8.600,00 (oito mil e seiscentos euros).
Custas da acção pelo Autor e Ré, na proporção do decaimento (art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).
Custas da reconvenção pelo Autor (art.º 527º, nºs 1 e 2 do CPC).
Registe e notifique.” O autor não se conformou e apelou, apresentando-nos, para fundamentar o pedido de alteração da sentença, quanto à reconvenção, fundamentos que sintetizou nas seguintes conclusões: “1. Fundamenta-se este recurso na errada apreciação da prova produzida pelo Tribunal a quo, resultando na omissão de um facto que deveria ter sido dado como provado e, consequentemente, na errada aplicação ínsitas nos artigos 1405º, 1406º e 1793º do Código Civil.
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Das declarações da Recorrida supra transcritas, resulta um facto fundamental para decisão da questão que nos ocupa, a Recorrida saiu voluntariamente da então casa de morada de família, nunca tendo sido privada do seu uso e fruição.
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Trata-se de um facto essencial para a boa decisão da causa, pelo que, deverá ser ampliada a matéria de facto, passando a figurar dos Factos Provados o que ora se enuncia: “r) Nos meses que antecederam o divórcio, a Ré saiu voluntariamente, por ser essa a sua vontade livremente formada, da então casa de morada de família.” 4. Com base na errada interpretação da prova e não consideração do Facto Provado supra enunciado, o Tribunal a quo subsumiu incorretamente os factos ao direito aplicável.
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A atribuição da casa de morada de família ao Recorrente antes deu forma jurídica a uma situação de facto existente, de ser o Recorrente o único a habitar o aludido imóvel, por a Recorrida dele ter voluntariamente saído.
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Por esse motivo, não foram alegados, e muito menos provados, factos demonstrativos de que a Recorrida tenha pretendido exercer os seus direitos sobre o prédio e disso ter sido ilicitamente impedida pelo Recorrente.
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Naquele período, a ambos era lícita a utilização do imóvel, desde que respeitados os princípios decorrentes dos arts. 1405º e 1406º do Código Civil.
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Pelo que, com o devido respeito, mal andou o Tribunal a quo, primeiro, ao dar como adquirido que a Recorrida foi privada de utilizar o seu bem, quando na realidade não foi, e, segundo, ao fixar um valor indemnizatório decorrente dessa alegada privação.
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Ademais, se a ora Recorrida não estava interessada na manutenção da situação, poderia ter requerido no processo de divórcio a atribuição a ela própria da então casa de morada de família, em termos de regime provisório – art. 931º nº 7 do Código de Processo Civil -, ou, após o trânsito em julgado do divórcio, requerer, ao abrigo do disposto no artigo 1793º do Código Civil, o direito ao seu arrendamento.
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Como também seria nesse período que a Recorrida deveria exigir ser de alguma forma compensada, se a isso tivesse direito, mas nunca o fez! 11. Não tendo sido pedida no momento devido, acredita-se, salvo melhor opinião, que não poderá a Recorrida prevalecer-se agora de tal argumentação para exigir algo que sempre considerou não ser de exigir.
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Por força do alegado, deveria o Tribunal a quo ter aplicado os artigos 1405º, 1406º e 1793º do Código Civil, no sentido de considerar não ter ocorrido qualquer privação no direito da Recorrida em utilizar o bem imóvel de que era comproprietária juntamente com o Recorrente e, como tal, não ser de fixar qualquer renda ou valor indemnizatório, não só por não ser devido, mas por não ter sido exigido no tempo e pelo meio devido.
NESTES TERMOS, Deve ser concedido provimento ao presente recurso, proferindo-se douto acórdão que revogue parcialmente a douta sentença proferida e, consequentemente, considere não provada e improcedente a Reconvenção deduzida pela Recorrida.”.
Não houve contra-alegações pela ré.
Foi admitido o recurso como de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Corridos os Vistos legais, cumpre decidir, uma vez que nada a tal obsta.
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QUESTÕES A RESOLVER Pelas conclusões apresentadas pelo...
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