Acórdão nº 386/16.5GAVLP.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Março de 2018
Magistrado Responsável | AUSENDA GON |
Data da Resolução | 19 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: No processo supra identificado, do Juízo de Competência Genérica de Valpaços, da Comarca de Vila Real, o arguido J. A.
foi julgado e, por sentença proferida e depositada em 31/10/2017, absolvido da imputação de um crime de descaminho, p. e p. pelo art. 355º do C. Penal, e condenado como autor material de um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. no art. 143º e 145º, nº 1, al. a) e nº 2, com referência à al. b) do nº 2 do art. 132º, do Código Penal, na pena de quatro (4) meses de prisão, substituída por 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 9, no total de € 1.080 (mil e oitenta euros).
O arguido foi, ainda, condenado a pagar à demandante cível E. B. a quantia de € 600 (seiscentos euros), a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos decorrentes da sua conduta, acrescidos de juros de mora desde a data da sentença.
Inconformado com essa decisão, o arguido interpôs recurso cujo objecto delimitou com as conclusões que a seguir se enunciam, sustentando a sua absolvição pela prática do aludido crime: 1. O objecto do presente recurso prende-se, essencialmente, com os seguintes aspectos:
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Entendemos que a M.ma Julgadora a. quo não realizou uma análise correcta e equilibrada da prova produzida.
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Os factos provados (atenta a prova, efectivamente, produzida) não permitem concluir que o arguido/Recorrente praticou o crime de ofensa à integridade física qualificada, 2. O arguido/Recorrente considera que a M.ma Julgadora a quo fez uma apreciação incorrecta e imprudente da prova produzida (dando relevância ao depoimento da assistente) e, em consequência, aplicou de forma deficiente o direito.
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Os vícios que, infra, se invocam resultam do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum; a M.ma Julgadora a quo realiza uma errada interpretação da matéria de facto provada, ocorre contradição insanável da fundamentação e, sobretudo, entre a fundamentação e a decisão e erro notório na apreciação da prova, 4. Não existem elementos probatórios, suficientes ou bastantes, que permitam concluir que o arguido ofendeu o corpo ou a saúde de outra pessoa ... e que o crime tenha sido praticado em circunstâncias que revelem especial perversidade ou censurabilidade do agente ...
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Ninguém presenciou os factos.
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A M.ma Julgadora acreditou na assistente, não obstante a animosidade revelada para com o arguido ... o que não afectou a sua credibilidade.
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No entanto, as declarações da assistente não apresentam qualquer credibilidade, à luz do critério da normalidade das coisas e do bom senso.
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A assistente refere ao minuto 16.50 do seu depoimento que foi atingida com o cabo de um sacho, mais grosso que o cabo de uma vassoura (quase o dobro), "em cheio" e esclarece ao minuto 17.35 que o arguido "não levantou o sacho, foi com o topo do sacho" que a atingiu na testa.
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A douta sentença, não obstante, refere terem resultado provadas "várias pancadas na cabeça, rosto, peito e braços da assistente". Se mais ninguém viu (para além da assistente), como é que o Tribunal chegou a tal conclusão? 10. A douta sentença, quando muito, deveria referir uma, única, pancada na cabeça e "com o topo do sacho". É verdade que esta afirmação não tem qualquer credibilidade, contraria a douta acusação pública, não é coerente com a queixa crime apresentada e não é coincidente com as declarações prestadas pela assistente ao longo do processo; não obstante, a M.ma Julgadora a qua diz-nos que as suas declarações foram credíveis e, por isso, consideradas pelo Tribunal.
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Ao minuto 4.30 do seu depoimento, a assistente refere que foi atingida na cabeça, braço e torax, da forma referida ao minuto 17.35.
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Ou seja, a assistente explica ao Tribunal que mentiu/omitiu ao longo de todo o processo e que só depois de alertada pelo arguido, em sede de contestação, para a falta de razoabilidade da douta acusação pública e para a circunstância de alguém ser atingido "à paulada" e só apresentar escoriações e uma pequena ferida na cabeça, é que a assistente veio modificar o seu discurso e refere que, afinal, "só", foi atingida com o topo do sacho i!! 13. É esta a credibilidade que a assistente patenteia e que o Tribunal a qua, inocentemente, acolheu ?!!! 14. Esta versão dos acontecimentos não pode ter ocorrido (não é razoável, nem lógico, que alguém tenha ido buscar o cabo de um sacho ao andar superior da sua casa, para depois o esconder na carrinha e só ter atingido a assistente, com o seu topo (pasme- se !!!), quando esta lhe referiu eu é que tinha amantes e tu é que andas atrás delas, como explicou a assistente ao minuto 3.06).
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Não é normal que a assistente se tenha apercebido da presença do cabo do sacho no andar superior da casa.
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Não é razoável que o arguido, sem mais, premeditadamente (como refere a assistente), tenha ido buscar o cabo do sacho e que o tenha escondido na carrinha.
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Não é aceitável que o arguido adivinhasse que a assistente lhe ia dirigir palavras 18. E que, nessa sequência, tenha atingido a assistente, com o "topo" do cabo.
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Que após estas bárbaras agressões, a assistente tenha tido a preocupação de fechar o portão para que o arguido não abandonasse o local e alguém o visse ...
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Um comportamento, todo ele, anormal e que confere pouca credibilidade ao testemunho da assistente e da testemunha que, alegadamente, viu o arguido nas proximidades.
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Em todo o caso, as declarações das testemunhas Fernando e José apresentam-se, assim, contraditórias, entre si; sendo de realçar que a testemunha José "não fala" com o arguido e que as testemunhas Fernando e José referem que fizeram o trajecto "Valpaços - Vale de Espinho" e o primeiro "jura" que não se cruzou com o arguido e o segundo afirma que se cruzou com o arguido, a cerca de 100/200 metros do local e que este "Ia devagar" (cfr. minuto 7.40 das suas declarações).
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Este "ir devagar" não é compatível com o comportamento de alguém que acaba de dar umas "pauladas" na ex-mulher, que tem que passar por cima de um portão ou cancela e quer "fugir" do local do crime.
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Uma destas testemunhas, necessariamente, mentiu em Tribunal.
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Entendemos, assim, que terá que resultar não provado que 3. No dia 20.11.2016, pelas 14.30 horas, encontrando-se ambos junto daquela que foi a casa de morada de família, sita no …, em Vale de Espinho, deste concelho de Valpaços e no âmbito de conflitos ainda existentes, o arguido desferiu várias pancadas na cabeça, rosto, peito e braços da assistente, tendo para esse efeito utilizado o cabo de um sacho que transportava no seu veículo automóvel.
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Mercê da conduta do arguido, sofreu a assistente as seguintes lesões físicas: - No crânio: ferida sutura da com três pontos na extremidade externa da região frontal - Na face: escoriação linear medindo 1 cm na região inter supra ciliar, equimose de cor violácea forte medindo 2 cm X 5 cm no lado direito da região metionina, - No tórax: equimose de cor violácea forte, medindo 3cm X 4 cm no terço médio do músculo grande peitoral - no membro superior esquerdo: grupo de duas equimoses de cor violácea forte e forma ovalada, medindo igualmente 2 cm de diâmetro e distanciadas 3 em na face anterior do terço médio do braço.
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E que foram causa directa e necessária de um período de 12 dias de doença, sem afectação da capacidade para o trabalho geral e profissional.
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Ao actuar da forma descrita em 3. e 4., o arguido actuou com a intenção concretizada de molestar a assistente, sua ex-mulher, na sua integridade física e saúde, concretamente de lhe provocar as lesões verificadas e acima descritas.
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Ao agir das formas descritas, agiu sempre o arguido de forma livre, voluntária e consciente e, não obstante saber que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, não se absteve de as prosseguir 24. A "especial censurabilidade ou perversidade do agente", também, não ocorre nos presentes autos.
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Refere a M.ma Julgadora a quo Ora, no caso dos autos, atento o modo de execução dos factos, encontrando-se a assistente sozinha perante o arguido, na casa que foi a de ambos, em conjugação com os demais factos que resultaram assentes, conclui-se que a actuação do arguido preenche a cláusula de especial censurabilidade exigida pelo artigo 145°., nº1, aI. a) do CP.
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Estamos na presença de uma conclusão, incompatível com os factos relatados pela assistente e, por isso, inaceitável e temerária ...
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A douta sentença assenta nas declarações da assistente e na perícia médico-legal.
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Dos factos provados não resulta que a assistente se encontrasse "sozinha com o arguido", 29. E das declarações da assistente resulta que o arguido "não levantou o sacho", que a atingiu com o "topo" do cabo e que perante esta situação a assistente fechou a cancela para o arguido não abandonar o local e que se dirigiu para a via pública a solicitar auxílio ...
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Por outro lado, a assistente refere que o arguido a agrediu na sequência daquela lhe ter dirigido as seguintes palavras: "Eu é que tinha amantes e tu é que andas atrás delas".
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Não se verifica - mesmo pela análise das declarações incoerentes e inconsistentes da assistente - que o agente tenha actuado com especial censurabilidade ou perversidade.
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Em face do exposto, deverá o, aqui, Recorrente, pura e simplesmente, ser absolvido do crime de que vinha acusado.
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O crime, em todo o caso, não pode ser considerado como qualificado, 34. A douta sentença, ora, em recurso, interpreta de forma incorrecta a prova produzida e, em consequência, aplica de modo deficiente o preceituado nos art".s 143°. e 145°., nº. 1, aI. a) e nº. 2 do Cód. Penal, violando estas disposições legais. Os vícios invocados resultam do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugados com as regras da experiência comum; o M.mo Julgador a quo realiza uma errada interpretação da matéria de facto provada, ocorre insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da...
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