Acórdão nº 3226/15.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Março de 2018
Magistrado Responsável | SANDRA MELO |
Data da Resolução | 15 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I.
Relatório Os Autores pediram que os Réus sejam condenados a reconhecerem que os Autores gozam do direito de preferência na venda efetuada pelos primeiros Réus aos segundos Réus, por escritura de compra e venda de 20.02.2015, do imóvel nela identificado, declarando-se substituídos os segundos Réus, enquanto compradores, pelos Autores e ordenando-se o cancelamento do registo a favor dos segundos Réus e a sua substituição por registo de aquisição a favor dos Autores.
Alegaram, para tanto e em síntese: são proprietários de um prédio rústico confinante com outo prédio igualmente rústico do qual os 1ºs réus foram proprietários; os autores tiveram conhecimento, em data que indicam, de que o prédio havia sido alienado aos 2ºs réus; nem antes nem depois da realização da escritura de compra e venda os 1ºs réus deram conhecimento aos autores da projetada venda e respetivas cláusulas, pelo que lhes assiste direito de preferência.
Na contestação, em súmula, foi invocado que o prédio rústico vendido não confronta com o prédio rústico dos autores, mas com o curso de água ali existente.
Tendo-se procedido a julgamento, veio a ser proferida sentença com a seguinte decisão: “julgar a presente ação totalmente improcedente, por não provada.” O presente recurso de apelação foi interposto pelos Autores, pugnando pela procedência da ação, com a alteração da matéria de facto provada e diversa aplicação do direito.
Formulam as seguintes conclusões: 1-Os Autores, não se conformando com a douta sentença proferida, vêm interpor recurso de Apelação para o Tribunal da Relação de Guimarães, também com impugnação da decisão quanto à matéria de facto e com reapreciação da prova gravada (artigo 638º, n.º 1 e 7 do CPC ), a subir imediatamente e nos próprios autos.
2-Os Autores intentaram a presente acção formulando o pedido de que lhe fosse reconhecido, nos termos alegados, o direito de preferência na venda efectuada pelos primeiros Réus aos segundos Réus, por escritura de compra e venda de 20.02.2015, do imóvel identificado nos artigos 2º e 7º da petição inicial, sendo reconhecido o direito dos Autores haverem para si o referido imóvel, por já estar depositado o preço e demais legal (8.120,88 €), declarando-se substituídos os segundos Réus, enquanto compradores, pelos Autores e ordenando-se o cancelamento do registo a favor dos segundos Réus e a sua substituição por registo de aquisição a favor dos Autores, tudo com custas pelos Réus, por terem dado causa à acção.
3-Os Réus apresentaram contestação em que, em resumo, negavam o direito dos Autores invocando que os prédios rústicos em questão não seriam confinantes por terem como limites de ambos e a separá-los um curso de água, que a perícia realizada veio a classificar como de “não navegável, nem flutuável”, conhecido por rio Labriosque.
4-Realizado julgamento foi proferida a douta sentença, ora em recurso, em que se elencaram sob o item “ Factos Provados “ os ali discriminados sob os números 1 a 19, e como “Factos Não provados” os ali elencados sob as alíneas a) a f).
5-No essencial, não estando em causa a propriedade dos prédios rústicos, a sua natureza e áreas, bem como os valores e demais condições de venda entre o Réus, questão pacífica entre as partes, “isolou-se” a questão de se apurar quais as confrontações entre os referidos prédios e os seus reais limites e ainda se tais prédios rústicos eram ou não confinantes, para daí se extraírem as necessárias conclusões de direito, face ao disposto nos artigos 1380º e 1387º, ambos do Código Civil.
6-A final, o Tribunal a quo proferiu a douta sentença ora em recurso em que, pelas razões ali apontadas, foi julgada não provada e improcedente a acção, no essencial porque se considerou não provada matéria relativa aos alegados limites dos prédios rústicos e sua confinância e se concluiu que o rio labriosque seria o limite de confrontação entre ambos e, por isso, não estava provada a confinância entre o prédio dos Autores e o prédio rústico objecto da venda entre os Réus.
7-Na apreciação da prova testemunhal gravada o tribunal omitiu a apreciação de partes relevantes dos depoimentos e deixou de considerar aspectos não menos relevantes dos documentos dos autos, incorrendo até em erro na interpretação e valoração desses depoimentos e dos documentos nos autos e da perícia realizada, em clara violação do disposto nos artigos 342º, 1380º e 1387º do Código Civil.
8-Assim, aquela conclusão merece a impugnação dos recorrentes, por entenderem que deve antes ser dada por provada matéria algo diferente da dada por provada nos ns.º 12, 13, 14, 15, 16 e 17 dos factos dados por provados na douta sentença recorrida e no que às confrontações sul do prédio dos Autores e norte do prédio objecto da venda e do pedido de preferência diz respeito, havendo ainda um lapso de escrita a corrigir na resposta 17.
9-Também dos factos dados por não provados entendem os requerentes que devem ser dados por provados os ali elencados sob as alíneas a), b), c), d), e) e f) e ainda que o referido rio é uma corrente não navegável nem flutuável.
10-Na reapreciação da prova gravada e depoimentos de testemunhas e conjugado tudo com o relatório pericial e demais documentação dos autos, devem, assim, ser dados por provados os seguintes factos: 10.1-O prédio vendido pelos primeiros aos segundos Réus confronta do norte com o prédio dos Autores acima identificado, em toda a extensão dessa extrema, em várias dezenas de metros.
10.2-Sendo que, no sentido de poente para nascente e em cerca de metade dessa confrontação existe um ribeiro com largura variável, de 50 cm a 2 metros, a delimitar as extremas ( norte do prédio dos Réus e sul do prédio dos Autores ), - facto dado por provado parcialmente no n.º 12 dos factos provados.
10.03-Na metade mais para nascente, o ribeiro curva para a esquerda (sentido da corrente) e entra pelo prédio dos Autores, havendo, por isso, uma parcela do prédio dos Autores vários metros para sul do referido ribeiro, mas que faz parte integrante do prédio dos Autores e que confronta directamente com o terreno dos Réus, pelo seu lado sul – ALÍNEAS A) , B) e C) DOS FACTOS DADOS POR NÃO PROVADOS.
10.04-E que há um passadiço para passagem dos Autores e caseiro para os dois lados do seu prédio, de uma a outra margem do ribeiro – FACTO DADO POR NÃO PROVADO NA ALÍNEA D).
10.5-O terreno dos Autores se situa sempre ao mesmo nível, enquanto que o prédio rústico dos Réus se desenvolve no sentido norte / sul com forte inclinação ascendente, havendo até um talude, barranco ou desnível de vários metros nessa parte . FACTO DADO POR NÃO PROVADO NAS ALÍNEAS E) E F).
11-Assim, os Autores gozam do direito de preferência na venda do referido imóvel, efectuada pelos primeiros aos segundos Réus, sendo que do exercício do direito de preferência pelos Autores resulta ainda o emparcelamento dos dois prédios confinantes, com benefícios e melhoria das condições técnicas e económicas de exploração agrícola.
12-Pois, nos termos do n.º 4 do artigo 1.380º do C. Civil é aplicável ao direito de preferência, conferido neste artigo, o disposto nos artigos 416º a 418º e 1.410º do C. Civil, com as necessárias adaptações.
13-Sendo questão fundamental e decisiva determinar-se se os prédios dos Autores e o do RR. objecto da venda e da preferência são ou não confinantes entre si.
14-E a resposta, ao contrário da conclusão contida na douta sentença é de que efectivamente confrontam entre si, 15-QUER SE CONSIDERE ESSA CONFRONTAÇÃO O RIO LABRIOSQUE, QUER SE CONSIDERE QUE, ALÉM DESTE O PRÉDIO DOS AUTORES AINDA CONTEM UMA PARCELA PARA SUL DO REFERIDO RIO NO CANTO MAIS A NASCENTE / SUL.
16- E ao contrário do dado por não provado pelo Tribunal ( alínea e) dos factos não provados ) o prédio dos Autores, incluindo aquela parcela “em litígio” se situa ao mesmo nível, como é referido pela testemunha A. R. (depoimento gravado 00:00 a 29:55 ) em que claramente identifica o prédio e declarou ( 01:00 a 05:00 ) que fazia o terreno há mais de 50 anos, como “caseiro” e que cultivava a parcela para sul do ribeiro, declarando no final “ 00:27” que nunca conhecera outro proprietário de tal prédio e parcela a sul.
17-Esse mesmo depoimento foi corroborado pela testemunha A. N. ( depoimento gravado 00:31:33 a 01:02.03 ), filho da anterior e que ali trabalhava com o pai, que igualmente esclareceu que era agricultada por eles a parcela a sul, em causa, referindo até a existência de dois marcos ( 00:01 a 05:00 ).
18-Esclareceram ainda ambos que aquela parcela em litigio tinha cerca de 20 metros de largura e que mais a nascente o prédio rústico daquele A. P., que antigamente formava um só prédio com o dos Autores, também sempre teve e tem uma parcela para sul do ribeiro, concluindo, por isso, que o rio labriosque curva ligeiramente para dentro do prédio hoje dos Autores e que o mesmo acontece no referido prédio mais a nascente acima referido ( 00:10 e 10:00 ).
19-Por último esclarecem que quer o terreno dos Autores, a norte e a sul do “rio” estão ao mesmo nível, assim como o outro situado a nascente, já o mesmo não acontecendo com o prédio vendido entre os RR., que tem um desnível imediato de alguns metros e continua em forte inclinação ascendente para sul ( 00:20 e 00:45 ).
20- E na perícia realizada o senhor Perito não só confirmou a configuração e localização dos prédios e da parcela em litígio, como ainda confirmou os referidos desníveis de vários metros do prédio do RR. e objecto da venda para a referida parcela.
21-E no seu relatório pericial final de 18.04.2017 acaba por descrever esse desnível e a sua real existência, designadamente na parte em que refere as diferenças de cotas ….”a transição se dá por um talude com alguns metros de desnível”… e que “não visualizou no local nenhum caminho de acesso a pessoas, animais ou viaturas” do prédio do RR para a referida e litigiosa parcela.
22-Acabando por esclarecer que a diferença de cotas entre o prédio dos Autores e da...
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