Acórdão nº 71/15.5T8PTL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I José e sua mulher Maria instauraram a presente acção declarativa, que corre termos no Juízo Central Cível de Viana do Castelo, contra Antónioo, formulando os pedidos de: "a) Reconhecer-se que o contrato de compra e venda que incidiu sobre a fracção identificada no item 1. foi culposamente incumprido pelo R., pelo que deverá este ser responsabilizado e condenado pelos prejuízos causados, nomeadamente no pagamento das seguintes quantias: b) A quantia de € 18.762,50, por conta da reparação dos defeitos, dos quais 13.162,16 € (treze mil cento e sessenta e dois euros e dezasseis cêntimos), são respeitantes a danos no interior da fracção e a quantia de 5.600,34 € (cinco mil e seiscentos euros e trinta e quatro cêntimos), referentes a quota-parte do AA. na reparação das partes comuns do prédio; e c) A quantia de € 5.625,00, a título de privação do uso da fracção, acrescida dos montantes mensais, computados à razão de € 375,00, que se vierem a vencer até ao efectivo e integral pagamento da quantia referida na alínea precedente, na media em só nessa altura estarão os AA. dotados das necessárias condições para proceder a tais reparações; e d) A Quantia de € 4.519,95 (quatro mil quinhentos e dezanove euros e noventa e cinco cêntimos), por conta dos prejuízos patrimoniais decorrentes das deslocações e perda de ganho dos AA., correspondendo € 2.519,95 (dois mil quinhentos e dezanove euros e noventa e cinco cêntimos) a despesas que os AA. tiveram de incorrer com deslocações a Portugal por conta do incumprimento contratual que o R. deu causa, e a remanescente quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), a título de perda de ganho que os AA. tiveram com os 8 (oito) dias úteis que despenderam em tais deslocações; e e) A quantia de € 6.000,00 (seis mil euros), a título de danos não patrimoniais que a conduta incumpridora do R. deu causa e cujos efeitos ainda não cessaram; e f) Deve, ainda, o R. ser condenado no pagamento do quantitativo de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros) mensais, a título de cláusula penal, por cada mês de atraso que se verifique na liquidação integral dos montantes referidos nas anteriores alíneas b) a e) do presente petitório, sendo esta devida a partir da data da citação; e, g) Deve, ainda, o R. ser condenado a pagar os correspondentes juros de mora sobre todas as anteriormente individualizadas quantias, calculados à taxa de juro legal, contados desde da citação até efectivo e integral pagamento".

Alegaram, em síntese, que, a 30 de Julho de 2013, compraram ao réu a fracção autónoma designada pelas letras "AT", correspondente ao 3.º andar do bloco A, do prédio urbano sito em ..., da freguesia e concelho de Ponte de Lima. Em que Outubro de 2013 surgiram infiltrações de água na generalidade das divisões, devido a problemas estruturais do prédio, os quais eram do conhecimento do réu, que os ocultou antes da celebração do negócio.

O réu contestou afirmando, em suma, que habitou no imóvel com a sua família, de Outubro de 1998 a Maio de 2013, e que nunca constatou a existência de quaisquer infiltrações de água.

Procedeu-se a julgamento e foi proferida sentença em que se decidiu: "Em face do exposto, julgo a acção proposta por José e Maria contra A. C. improcedente, por não provada.

" Inconformados com esta decisão, os autores dela interpuseram recurso, que foi recebido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo, findando a respectiva motivação, com as seguintes conclusões: I. Vem o presente recurso interposto da sentença que antecede, que julgou improcedente, por não provada, a acção proposta contra o Réu/Recorrido A. C. e, consequentemente, absolveu aquele dos pedidos contra si formulados.

II. A sentença recorrida padece da nulidade prevista na alínea c) do n.º 1, do artigo 615.º, do Código de Processo Civil, estando os fundamentos em oposição com a decisão, pois a factualidade considerada provada, constante da sentença em crise, deveria conduzir, por si só, à procedência da acção, tendo sido ainda violados os artigos 342.º do Código Civil e 414.º do Código de Processo Civil, ambos referentes às regras de repartição do ónus da prova.

III. Resulta da matéria de facto dada como provada na sentença (alíneas g), h), i) e j)), que o imóvel alienado pelo Recorrido aos Recorrentes padece de vícios que o desvalorizam e impedem o fim a que se destina, estando os AA., desde Outubro de 2013, impedidos de usar a fracção devido às condições de salubridade que esta apresenta - vide facto provado sob a alínea w) da sentença.

IV. O n.º 1 do artigo 913.º do Código Civil qualifica como defeituosa a coisa vendida que "sofrer de vício que a desvalorize ou impeça a realização do fim a que é destinada, ou não tiver as qualidades asseguradas pelo vendedor, ou necessárias para a realização daquele fim", resultando do n.º 2, do mesmo artigo que "quando do contrato não resulte o fim a que a coisa vendida se destina, atender-se-á à função normal das coisas da mesma categoria".

V. Compulsada a posição assumida por Recorrentes e Recorridos nos respectivos articulados, mormente petição inicial e contestação, respectivamente, daí resulta que ambas as partes estão de acordo quanto ao facto de, aquando das negociações que conduziram à celebração do contrato de compra e venda de 30.07.2013, o Réu ter assegurado a ausência de qualquer vício ou anomalia na fracção vendida como no edifício a que pertence.

VI. Mais resulta da sentença, mormente dos factos dados como provados sob as alíneas g), h), i) e j), que o imóvel alienado pelo Recorrido aos Recorrentes padece de vícios que o desvalorizam e impedem o fim a que se destina, o que constitui defeitos ou faltas de qualidade do imóvel em questão, nos termos e para os efeitos dos artigos 913.º, n.º 1 e 2, 914.º e 1225.º, todos do Código Civil.

VII. O artigo 914.º do Código Civil ao comprador "o direito de exigir do vendedor a reparação da coisa ou se for necessário e esta tiver a natureza de fungível, a substituição dela K", assiste aos Recorrentes, enquanto compradores, o direito de reivindicar do Recorrido, enquanto vendedor, a reparação do imóvel em causa, de modo a serem eliminados os vícios de que aquele padece, nomeadamente aqueles que resultam provados na sentença - vide alíneas l) a r) dos factos provados.

VIII. O que decorre automaticamente do artigo 913.º, do Código Civil é que o vendedor garante a conformidade ou bom funcionamento da coisa vendida na data da entrega, não sendo necessário o comprador demonstrar ou provar a falta de tais qualidades, bastando-lhe a prova da falta de conformidade ou falta de funcionamento no período de garantia, IX. Impendendo, por sua vez, sobre o vendedor o ónus da prova de que a causa do vício, desconformidade, ou mau funcionamento do bem, é posterior à entrega da coisa e imputável ao comprador ou a terceiro, ou devida a caso fortuito.

X. No sentido de que o ónus da prova da causa dos defeitos no imóvel compete ao vendedor/Recorrido, vejam-se os seguintes acórdãos: Acórdão do STJ de 3/4/1991 (Proc. n.º 079799; Relator: Ricardo da Velha, cujo sumário pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt.; - Ac. da Rel. do Porto de 24/11/2008, proferido no Proc. n.º 0856163 relatado pela Desembargadora Maria Adelaide Domingos (cujo texto integral pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt).; - Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 17/1/2008, proferido no Proc. n.º 2093/07-2 e relatado pelo Desembargador Manuel Marques (cujo texto integral pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt).;- Ac. da Rel. do Porto de 27/3/2006, proferido no Proc. n.º 0650794 e relatado pelo Desembargador Abílio Costa (cujo texto integral pode ser acedido, via Internet, no sítio www.dgsi.pt); - Acórdão o Tribunal da Relação de Lisboa de 8/6/2006 (Proc. n.º 2483/2006-8; Relator – Salazar casanova), cujo texto integral está acessível, via Internet, no sítio www.dgsi.pt.; - Ac. da Relação de Lisboa, de 05.04.2011, Relatado pelo Exmo. Sr. Desembargador Rui Vouga; XI. Aplicando as regras sobre a repartição do ónus da prova, era ao Réu/vendedor a quem incumbia o ónus da prova de que a causa dos vícios do imóvel, provados na sentença - alíneas g) a j) dos factos provados - eram imputáveis a este ou a terceiro ou eram devidas a caso fortuito.

XII. Nada tendo o Réu/Recorrido alegado e provado quanto a tal matéria, limitando-se, em sede de contestação, a negar os vícios e a reiterar de forma genérica a conformidade do bem, subsistindo dúvidas acerca da causa dos vícios provados e constatados quanto ao imóvel vendido pelo Réu aos Autores, essa incerteza acerca da causa ou origem dos defeitos constatados no imóvel resolve-se, nos termos do art. 414.º do CPC, contra a parte onerada com a alegação e prova de que esses vícios tenham resultado de causas imputáveis ao comprador ou a terceiro ou fossem devidas a caso fortuito, ou seja, ao Réu/vendedor.

XIII. O incumprimento desse ónus probatório por parte do Réu/Recorrido decorre expressamente da sentença em crise - vide penúltima página, parágrafo 3.º - da qual consta que "não resulta dos autos que as patologias em causa resultassem de causa anterior ou contemporânea da celebração do negócio, ou seja, inexiste qualquer facto que nos permita afirmar que o que provocou as ocorrências verificadas a partir de Outubro de 2013 na fracção AT existissem antes de 30 de Julho de 2013. Sabemos que o prédio tinha problemas de infiltrações de água, mas não sabemos se os problemas de Outubro de 2013 assentam na mesma causa.".

XIV. O Tribunal "a quo" resolveu a dúvida quanto à causa dos vícios do imóvel contra os AA./Recorrentes, quando nos termos do artigo 913.º do Código Civil, que presume a conformidade ou bom funcionamento da coisa vendida, conjugado com o artigo 342.º do Código Civil e artigo 414.º, do Código de Processo Civil, deveria ter resolvido essa dúvida contra o Réu/Recorrido/vendedor, ao qual competia a alegação e prova de que os...

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