Acórdão nº 755/14.5TBFAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Março de 2018
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 01 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
I. RELATÓRIO.
Recorrentes: Manuel e Maria.
Recorrida: Massa Insolvente de V. – Investimentos Imobiliários.
V. – Investimentos Imobiliários, Lda., com sede na Praça … Fafe, instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra José e Ana, residentes na Urbanização … Fafe, Daniel e L. D., residentes na Urbanização … Fafe, A. S. e M. J., residentes na Urbanização … Fafe, e Manuel e Maria, residentes na Urbanização … Fafe, pedindo a condenação: a- dos primeiros Réus a pagar-lhe a quantia de 5.000,00 euros, acrescida de juros de mora, desde a data de vencimento, até efetivo e integral pagamento; b- dos segundos Réus a pagar-lhe a quantia de 6.000,00 euros, acrescida de juros de mora, desde a data de vencimento, até efetivo e integral pagamento; c- dos terceiros Réus a pagar-lhe a quantia de 5.000,00 euros, acrescida de juros de mora, desde a data de vencimento, até efetivo e integral pagamento; d- dos quarto Réus a pagar-lhe a quantia de 7.500,00 euros, acrescida de juros de mora, desde a data de vencimento, até efetivo e integral pagamento.
Para tanto alega, em síntese, que no exercício da sua atividade comercial, com escopo lucrativo, de compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim e de promoção imobiliária, vendeu aos 1ºs Réus, por escritura pública de 15/11/2007, as frações J e P, da urbanização …, freguesia e concelho de Fafe, pelo preço global de 95.550,00 euros; Vendeu aos 2ºs Réus, por escritura pública de 09/11/2007, as frações E e R daquela urbanização, pelo preço global de 95.650,00 euros; Vendeu aos 3ºs Réus, por escritura pública de 19/02/2008, as frações M e O da mesma urbanização, pelo preço global de 75.500,00 euros; E vendeu aos 4ºs Réus, por escritura pública de 30/10/2007, as frações L e Z da identificada urbanização, pelo preço global de 97.500,00 euros; Apesar de nessas escrituras constar que o preço global das vendas já tinha sido recebido, a verdade é que em todas as supra identificadas transacções, todos os Réus ficaram a dever parte do preço convencionado; Os 1ºs Réus não pagaram 5.000,00 euros, conforme declaração de reconhecimento de dívida subscrita a 15/11/2007; Os 2ºs Réus não pagaram 6.000,00 euros, conforme declaração de reconhecimento de dívida subscrita a 09/11/2007; Os 3ºs Réus não pagaram 5.000,00 euros, conforme declaração de reconhecimento de dívida subscrita a 19/02/2008; E os 4ºs Réus não pagaram 7.500,00 euros; O vencimento das referidas obrigações ocorreu já durante o ano de 2008, altura em que os Réus foram notificados, verbalmente, pela Autora da aprovação da certificação elétrica, encontrando-se já colocados o vídeo porteiro, bem como os portões das garagens; Esses valores em dívida venciam-se oito dias após a apresentação por parte da Autora do dito comprovativo de aprovação da certificação eléctrica; Apesar das inúmeras solicitações verbais que lhes têm sido feitas, para liquidarem as quantias em dívida, nenhum dos Réus, embora reconhecendo a existência da dívida, pagou a mesma.
A Autora e os 1ºs, 2ºs e 3ºs Réus transigiram quanto ao objeto da lide nos termos que constam de fls. 51 a 52, tendo essa transação sido homologada por sentença proferida a fls. 80, entretanto transitada em julgado.
Os 4ºs Réus contestaram, aceitando terem celebrado com a Autora a escritura pública de 30/10/2007, através da qual lhe compraram as frações L e Z, pelo preço global de 97.500,00 euros, mas impugnando a restante factualidade por ela alegada, designadamente, que não lhe tivessem pago a totalidade do preço das frações compradas, sustentando que tal como consta do texto da escritura pública de compra e venda, pagaram a totalidade do preço à Autora.
Concluem pela improcedência da ação e pedindo que sejam absolvidos do pedido e se condene a Autora como litigante de má-fé, em quantia nunca inferior a mil euros, sustentando que esta, ao instaurar a presente ação, bem sabe que aqueles nada lhe devem e que a presente ação constitui uma tentativa da Autora para cobrar um valor que sabe não lhe ser devido.
Realizou-se audiência prévia, onde a Autora se pronunciou quanto à litigância de má-fé requerida pelos 4ºs Réus, concluindo pela sua improcedência.
Proferiu-se despacho saneador, fixou-se o valor da ação, o objeto do litígio e os temas da prova, não tendo sido apresentadas reclamações.
Entretanto a Autora foi declarada insolvente, tendo o senhor administrador da massa insolvente constituído mandatário.
Realizada audiência final, foi proferida sentença, julgando a ação integralmente procedente quanto aos 4ºs Réus, únicos contra quem a ação se encontra a correr os seus legais termos, constando a parte dispositiva daquela sentença do seguinte: “Em conformidade com o exposto, decide este tribunal julgar a presente ação integralmente procedente e, em conformidade, condenar os Réus no pagamento à Autora da quantia de 7.500,00 (sete mil e quinhentos) euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal supletiva, desde a citação até efetivo e integral pagamento” Inconformados com o assim decidido, os 4ºs Réus interpuseram o presente recurso de apelação, em que apresentam as seguintes conclusões:
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O presente recurso é interposto da douta sentença proferida a fls. dos autos, que, julgando integralmente procedente a acção, condenou os Réus no pedido, entendendo no entanto os apelantes que, o Tribunal “a quo” não efectuou uma correcta apreciação da prova produzida, tendo feito uma errada subsunção jurídica dos factos dados como provados e por decorrência, errada aplicação do direito, bem como se pronunciou sobre questões que não devia conhecer.
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Entendem os apelantes que a Meritíssima Juiz “a quo” não decidiu bem, pois deu como provado o facto constante do ponto 1.5 “Os Autores não receberam dos Réus a quantia de € 7.500,00”, sem considerar nem valorar correctamente os elementos de prova existentes no processo, e que sempre determinariam uma decisão diversa.
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Assim, entendem os apelantes que existiu erro na apreciação da prova, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 640.° do Código de Processo Civil.
, bem como errada subsunção dos factos ao direito aplicável, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 639.° do Código de Processo Civil.
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Resulta do elenco dos factos provados, nos pontos 1.3. e 1.4., que “através de escritura pública outorgada no dia 30 de Outubro de 2007, (…), a autora declarou vender aos quartos réus que declararam comprar as seguintes fracções, integradas no supra identificado prédio: g. Fracção Autónoma, designada pela letra “L” (…); h. Fracção Autónoma designada pela letra “Z” (…); Os Autores declararam na dita escritura que o preço global já foi recebido”.
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Em seguida, ao arrepio dos factos provados sob pontos 1.3 e 1.4 e de qualquer critério válido de experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica, deu aquele tribunal como provado que “Os Autores não receberam dos quartos Réus a quantia de € 7500,00;”.
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Assim, a questão controvertida nos presentes autos prende-se com a alegada falta de pagamento, por parte dos ora apelantes, de parte do preço das fracções adquiridas por escritura pública outorgada em 30 de Outubro de 2007.
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Conforme resultou provado em audiência de discussão e julgamento, e dos documentos juntos aos autos, a escritura de compra e venda em questão foi celebrada entre Autora e Réus, no Cartório Notarial da Dra. M. C., e perante a mesma, garantindo, pela fé pública de que estava revestida, que os factos que documentou, efetivamente, se passaram.
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Resultou do depoimento daquela Notária Dra. M. C. e ainda da testemunha I. M. que na outorga da referida escritura foram cumpridos todos os formalismos legalmente previstos, tendo a mesma sido lida e explicada em voz alta aos outorgantes, designadamente ao senhor João, aqui testemunha, que declararam confirmar as vontades ali expressas e as declarações prestadas.
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Nos seus depoimentos prestados na audiência de 08 de Maio de 2017, e gravados em CD, confirmaram aquelas testemunhas que o documento – escritura pública – contem, e nele ficaram exaradas, as vontades reais das partes outorgantes, que assim as expressaram e confirmaram perante a sra. Notária, e a colaboradora I. M., que além do mais lhe leu e explicou o conteúdo do documento que então subscreveram.
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A autora foi naquele acto representada pelos sócios gerentes João e H. F., o primeiro dos quais foi a única testemunha da Autora nos presentes autos.
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Tendo declarado a Autora, representada pelo então sócio gerente João, que o preço global já tinha sido recebido, (facto provado - ponto 1.4 na douta sentença).
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Ora, não obstante tal declaração confessória, o Tribunal “a quo” deu como provado, no ponto 1.5 que “Autores não receberam dos Réus a quantia de €7.500,00.”, referente a parte do preço.
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Para fundamentar tal decisão, o douto Tribunal “a quo” teve apenas em consideração o depoimento da única testemunha João, precisamente, o sócio gerente da sociedade que, à data dos factos, interveio como outorgante e declarante na referida escritura junta pelos autores com a petição inicial, e declarou expressamente, perante a Sra. Notária, e assim ficou exarado em documento público, já ter sido recebido o preço, do qual deu a respectiva quitação.
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Valorar o depoimento da única testemunha, João, o qual foi outorgante e declaratário na escritura em causa, em detrimento da fé pública daquele documento, é subverter as regras inerentes à prova.
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Desta forma todas as escrituras públicas (instrumento autêntico com força probatória plena) estariam à mercê da mudança de opinião dos seus declaratários, estando em causa a segurança que tal instrumento visa conferir aos negócios jurídicos e à comunidade em geral, o que é de todo inconcebível.
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Do disposto no artigo 393º n.º 2 do Código Civil resulta que "não é admitida a prova por testemunhas quando o facto estiver plenamente provado por documento ou por outro meio com força...
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