Acórdão nº 563/17.GBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 20 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE BISPO
Data da Resolução20 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I - RELATÓRIO 1.

No âmbito do processo especial, sob a forma sumária, com o NUIPC 563/17.1GBGMR, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Braga, no Juízo Local Criminal de Guimarães – J1, foi o arguido J. A. submetido a julgamento e condenado por sentença proferida e depositada a 27-09-2017, com o seguinte dispositivo (transcrição) [1]: «Pelo exposto, julga-se a acusação deduzida pelo Ministério Público procedente e, em consequência, decide-se: - Condenar o arguido J. A.

, pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, al. a), 14.º, n.º 1, 26.º, 1.ª parte, e 30.º, n.º 1, do Código Penal, a que se refere a primeira fiscalização, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias; - Condenar o arguido J. A.

, pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, al. a), 14.º, n.º 1, 26.º, 1.ª parte, e 30.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 90 (noventa) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros), e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor pelo período de 5 (cinco) meses; - Condenar o arguido J. A.

, pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de um crime de desobediência qualificada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 348.º, n.º 1, alíneas a) e b), e n.º 2, 14.º, n.º 1, 26.º, 1.ª parte, e 30.º, n.º 1, do Código Penal, com referência ao art.º 154.º, n.º 2, do Código da Estrada, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 6,00 (seis euros); - Em cúmulo jurídico das referidas penas parcelares de multa, condenar o arguido J. A. na pena única de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 6,00, mantendo-se as aplicadas penas acessórias de proibição de conduzir veículos com motor, devendo entregar a sua carta de condução, neste tribunal ou em qualquer posto policial, no prazo de 10 (dez) dias, a contar do trânsito em julgado da sentença, sob pena de incorrer em crime de desobediência (cfr. Acórdão do STJ n.º 2/2013 do DR, I Série, n.º 5, de 08.01.2013).

- Condenar o arguido nas custas, fixando-se em 2 (duas) UC a taxa de justiça;» 2.

Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, com os fundamentos explanados na respetiva motivação, condensados nas conclusões que se transcrevem na parte relevante: «(…) 3- Salvo o devido respeito, o aqui Recorrente discorda da douta sentença recorrida na parte em que o condenou pela prática, em autoria material e em concurso efetivo, de 2 (dois) crimes de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, al. a), 14.º, n.º 1, 26.º, 1.ª parte, e 30.º, n.º 1, do Código Penal, defendendo o aqui Recorrente que deveria ter sido condenado apenas por 1 (um) crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, al. a), 14.º, n.º 1, 26.º, 1.ª parte, e 30.º, n.º 1, do Código Penal e por 1 (um) crime de desobediência qualificada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 348.º, n.º 1, alíneas a) e b), e n.º 2, 14.º, n.º 1, 26.º, 1ª parte, e 30.º, n.º 1, do Código Penal.

(…) 5- O douto Tribunal “a quo” defende que o aqui Recorrente incorreu em 2 (dois) crimes de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 292.º, n.º 1, do Código Penal, ainda que o segundo crime de condução de veículo em estado de embriaguez tenha ocorrido dentro das 12 horas imediatamente seguintes à primeira fiscalização, que desembocou na prática do primeiro crime de condução de veículo em estado de embriaguez. Salvo o devido respeito por tal douto entendimento, o aqui Recorrente não pode concordar com o mesmo.

6- Do rol dos factos provados pelo douto Tribunal “a quo”, consta que no mesmo dia (02-09-2017), o aqui Recorrente foi alvo de 2 (duas) fiscalizações, a primeira às 6:44 horas, na estrada nacional n.º 207, ao km 65.500, no sentido Arosa-Guimarães, tendo sido submetido a exame de pesquisa de álcool no sangue, apresentando uma TAS de 1,587 g/l (já deduzido o valor máximo de erro admissível), ocorrendo a segunda fiscalização nesse mesmo dia, por volta das 08:15 horas, tendo sido novamente submetido a um exame de pesquisa de álcool no sangue, apresentando uma TAS de 1,482 g/l (já deduzido o valor máximo de erro admissível).

7- Ou seja, entre a primeira fiscalização que despoletou a primeira condenação dos presentes autos, a título de crime de condução de veículo em estado de embriaguez, e a segunda fiscalização, a qual despoletou a segunda condenação a título de crime de condução de veículo em estado de embriaguez, apenas decorreu um lapso temporal de, sensivelmente, 1 hora e 30 minutos.

8- Na esteira de entendimento jurisprudencial recente (vide neste sentido o douto aresto proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 03-06-2016, no Processo n.º 810/15.4PFPRT.P1, e ainda, o douto aresto proferido pelo mesmo Tribunal, datado de 11-11-2009, no Processo n.º 516/09.3PTPRT.P1) sobre a questão, defende o aqui Recorrente que o condutor que incorre na prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 292.º, n.º 1, do Código Penal, se voltar a conduzir nas 12 horas imediatamente seguintes, com taxa de álcool igual ou superior a 1,20 g/l, não comete um novo crime de condução de veículo em estado de embriaguez em concurso real com o crime de desobediência qualificada, p. e p. pelos art.ºs 348.º, n.º 2, do Código Penal e 154.º, n.º 2, do Código da Estrada, mas antes, existe somente um concurso aparente, pois que autonomizar o conteúdo de ilícito desta segunda condução com álcool significaria uma dupla valoração do mesmo substrato de facto, em violação do art.º 29° n.º 5 CRP: ou seja, punir o arguido duas vezes mesmo facto.

9- O nosso legislador no artigo 154º n.º 1 do Código da Estrada consagrou o impedimento de conduzir pelo período de 12 horas, após obtenção de resultado positivo no exame de pesquisa de álcool no sangue, sancionando a violação de tal inibição com crime de desobediência qualificada (vide artigo 154º n.º 2 do Código da Estrada).

10- Existe apenas um ato que constitui a génese do crime de condução de veículo em estado de embriaguez, consistindo o mesmo apenas na ingestão de bebidas alcoólicas, sendo consabido, aliás, facto que está mais do que provado pela ciência médica, que os efeitos da ingestão de bebidas alcoólicas prolongam-se no tempo e no mínimo por 12 horas.

11- Pelo que autonomizar o conteúdo de ilícito da segunda condução do veículo, a qual foi alvo da 2ª condenação nos presentes autos, significa uma dupla valoração do mesmo substrato de facto.

12- “Há um único dolo a abranger todas as condutas sucessivamente praticadas e essa unidade de determinação volitiva, a par da manifesta homogeneidade das condutas e da sua proximidade temporal levam-nos a concluir pela unidade no crime de condução de veículo em estado de embriaguez” (neste sentido: o douto aresto proferido pelo Tribunal da Relação do Porto de 03-06-2016, no Processo n.º 810/15.4FPRT.P1); 13- O comportamento global do aqui arguido/Recorrente depois que foi fiscalizado pelos agentes policiais por conduzir o seu veículo automóvel na via pública sob influência do álcool e de ter sido advertido de que não poderia conduzir nas 12 horas imediatamente seguintes, preenche somente o tipo legal de desobediência e 1 (um) crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

14- Ao desacatar a ordem de inibição de condução que lhe foi emitida pelos Órgãos de Polícia Criminal e retomando a marcha em estado de embriaguez, o comportamento do arguido deverá considerar-se norteado somente por um único sentido de desvalor jurídico-social, o qual consiste no não acatamento da inibição da condução pelo período de 12 horas. A retoma da condução do veículo por parte do aqui Recorrente, surge apenas como meio necessário de concretizar a desobediência e nesta se esgota a sua danosidade social.

15- O sentido de ilícito de desobediência é que é absolutamente dominante, enquanto o sentido de ilícito da condução de veículo em estado de embriaguez assume carácter subsidiário.

16- Pelo exposto, subscrevendo integralmente o entendimento vertido no douto aresto supra citado, bem como, no douto aresto proferido pelo mesmo Tribunal da Relação, no Processo nº 516/09.3PTPRT.P1, datado de 11-11-2009, considera o aqui Arguido/ Recorrente, com o devido respeito, que mal andou o douto Tribunal “a quo” ao condená-lo em autoria material, dolo direto e em concurso efetivo, pela prática de 2 (dois) crimes de condução de veículo em estado de embriaguez previsto e punido no artigo 292.º, n.º 1, do C.P, sendo seu modesto entendimento, que deverá ser condenado pela prática de apenas 1 (um) crime de condução de veículo em estado de embriaguez p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.ºs 292.º, n.º 1, e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT