Acórdão nº 556/16.6T8VVD-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelANT
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO.

João intentou a presente ação cautelar de arresto contra Loja Comercial V, Lda., Joaquim e Maria, pedindo que o arresto de bens e créditos dos requeridos, alegando, em síntese, ser titular de crédito sobre estes no montante de € 28.683,90, resultante de fornecimentos de bens à primeira requerida, sendo que os 2º e 3º requeridos assumiram essa mesma dívida, declarando que se responsabilizavam pessoalmente pelos fornecimentos vencidos e futuros, aceitando pagar a dívida com o seu património pessoal caso fosse necessário; sendo que os requeridos tem dívidas para com outros fornecedores, o que já levou alguns a intentarem ações de cobrança nos tribunais e os requeridos estão na iminência de fechar as portas, uma vez que o contrato de arrendamento do estabelecimento da requerida foi denunciado pelo proprietário.

Por decisão de 30 de Junho de 2017 (cfr. fls. 26 a 36), foi deferido o presente procedimento cautelar, decretando-se o arresto dos bens indicados pelo requerente no seu requerimento inicial.

Os requeridos deduziram oposição, impugnando os factos alegados pelo requerente, concluindo, em suma, pelo levantamento (revogação) do arresto e a condenação do requerente, como litigante de má fé, em multa e indemnização.

Na sequência, por decisão de 23 de Outubro de 2017, veio a julgar-se improcedente a oposição, mantendo-se o arresto decretado.

Inconformados com o assim decidido, vieram os requeridos interpor recurso de apelação, nele formulando as seguintes CONCLUSÕES 1. O presente recurso tem por objeto a douta sentença proferida em primeira instância que julgou procedente o procedimento cautelar requerido mantendo o arresto sobre os bens dos ora Apelantes, nomeadamente, saldos das contas bancárias que a 1ª Requerida tem nos Bancos em atividade em Portugal, direito ao trespasse e recheio do estabelecimento, vitrines, balcões, estantes e câmaras frigoríficas, e ainda, os saldos das contas bancárias do segundo requerido e terceira requerida e os prédios urbanos e rústicos que se encontrem registados em seu nome.

  1. De facto, é notória a deficiente apreciação da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, o que, salvo o devido respeito pela opinião do Tribunal recorrido, que é muita, impunha decisão que ordenasse o levantamento do arresto.

  2. Para sufragar entendimento contrário, o Tribunal recorrido alicerçou a sua fundamentação essencialmente em duas razões de ordem: a) Por um lado, considerou suficientemente demonstrado o crédito do Requerente sobre a primeira Requerida julgando ainda que o segundo requerido e a terceira requerida assumiram pessoal e cumulativamente a dívida contraída pela Requerida “Loja Comercial”; b) Por outro lado, verificou preenchido o requisito do justificado receio de perda da garantia patrimonial, dando como assente que a denúncia do contrato de arrendamento impedirá a Loja Comercial V de exercer a sua atividade comercial e que a existência de outras dívidas de montante elevado e subsequente oneração do património dos requeridos que considerou idóneos a causar num credor medianamente cauteloso e prudente o aludido receio de perda de garantia patrimonial.

  3. O Tribunal errou no julgamento da matéria de facto e na subsunção que efetuou dos factos ao Direito.

  4. Quanto à matéria de facto, o Tribunal julgou erradamente os pontos de facto n.ºs 5, 6, 7, 11 e 16 que deviam ter sido julgados não provados.

  5. Revela nessa matéria o depoimento do Requerente João prestado no dia 16 de Outubro de 2017, com início às 15h15m (transcrito no corpo da motivação 25m52s) sendo manifesto que não consegue disfarçar a estranheza quando questionado sobre a inexistência de interpelação para pagamento ao segundo requerido e terceira requerida, assumindo que nunca interpelou porque sempre contratou com a Loja Comercial V – como se fosse uma evidência – que é(!). Dizem-nos as regras da experiência e da normalidade do acontecer que, tivesse o segundo requerido e terceira requerida assumido qualquer dívida a título pessoal e teriam sido igualmente interpelados pelo Requerente o que nunca aconteceu (!).

  6. Também é esclarecedor o depoimento da testemunha Paula, filha do Requerente, prestado no dia 23 de Junho de 2017, com início às 15h:21m, aos 07m45s, sendo evidente a confusão da testemunha relativamente à separação de patrimónios da pessoa coletiva e da pessoa singular, sendo altamente ambígua a sua última afirmação “Ele disse que pagava tudo” que não pode servir para corroborar a tese de que os requeridos se vincularam pessoalmente a dívida da Loja V..

  7. Já a testemunha Susana, filha dos Requeridos, com depoimento prestado no dia 16 de Outubro de 2017, e início às 15h49m, 01m32s e 05m26s, especialmente próxima dos Requeridos e conhecedora da matéria em litígio, não só pela ligação familiar mas também por razões profissionais – dado que em determinada altura trabalhou na Loja V. e foi sempre acompanhando a evolução da empresa – explicou de forma coerente, lógica e verosímil o circunstancialismo em causa, relatando as razões que levaram à criação da sociedade Loja V., assumindo que a Loja V. deve ao Requerente e negando sempre, perentoriamente, que o seu pai alguma vez tenha assumido a título pessoal a dívida da sociedade.

  8. É ainda particularmente relevante a prova documental, nomeadamente, o doc. n.º 50 junto na petição inicial, que demonstra que em momento algum o Requerente interpelou os Requeridos a título pessoal, tendo dirigido sempre as suas missivas à Loja Comercial V.

  9. Ainda que se considerasse que o Requerido Joaquim proferiu a expressão “Eu pago-te tudo” – o que não se admite - se dúvidas houvesse quanto ao conteúdo e sentido da declaração alegadamente feita pelo segundo requerido ao requerente, elas teriam de ser resolvidas tendo em atenção o disposto no artigo 236º n.º 1 do C.C., pois se nos colocarmos na posição de um declaratário normal, colocado na posição do, temos de concluir que quando manifestou ao Requerente e à testemunha Carla vontade de pagar as dívidas objeto dos presentes autos, o que é normal é que apenas lhe tenha querido dizer que era o seu desejo, como gerente da Loja Comercial V, angariar os meios necessários ao pagamento dessas dívidas, pois não havia qualquer motivo razoável que o levasse a assumir pessoalmente tais dívidas, dado que também resultou da audiência de julgamento que o que não falta hoje em dia são fornecedores de carne.

  10. É, quanto basta, para se dizer que o Tribunal valorou erradamente os pontos de facto 4., 5., 6., 7. E 11., devendo os mesmos ser julgados não provados.

  11. Mas, também andou mal o Tribunal, ao julgar provado o ponto 12 do elenco dos factos provados.

  12. Na verdade, não resulta dos autos que o mini-mercado e o respectivo talho tenha as suas estantes vazias.

  13. Tal alegação foi amplamente contraditada pelos fornecedores de carne e frescos da Loja V., nomeadamente, as testemunhas Maria B.

    (início às 15H24m aos 01m21s) e Nuno (início às 15h57m 03m10s), com depoimento prestado no dia 16 de Outubro de 2017.

  14. Estas testemunhas afirmaram que o estabelecimento se encontra em funcionamento regular, que os fornecimentos dos seus respetivos produtos mantêm-se e que nada têm de apontar ao estabelecimento em termos de “anormal” contraditando tudo o que foi afirmado pelo Requerente.

    Atente-se também que já a testemunha Susana tinha corroborado o funcionamento normal do estabelecimento, também reforçado pelas fotografias juntas pelos Requeridos que evidenciam as estantes repletas de produtos.

  15. Não há, por isso, qualquer elemento probatório que permita ao Tribunal afirmar que o minimercado apresenta as suas estantes vazias, devendo, atento a prova produzida, o ponto 12. da matéria de facto merecer juízo probatório negativo.

  16. Acresce ainda que, o Tribunal a quo deu como provado que: “Os Requeridos têm vários imóveis penhorados a favor de Rosa B., para pagamento da quantia de € 68.560,00, na execução n.º 614/17.0T8VNF, pendente no Juízo de Execução de Vila Nova de Famalicão” – Ponto 16 dos factos provados.

  17. O julgamento deste facto como provado está em absoluta contradição com o ponto 26.

    dos factos provados “As partes na execução referida em 16 celebraram um acordo de pagamento que acarretou a extinção do aludido processo executivo” e, também em manifesta contradição com a prova documental – cópia do despacho de extinção da execução e depoimento da Testemunha Susana que confirmou o pagamento da aludida dívida.

  18. Pelo exposto, o ponto 16 deve ser julgado não provado.

    Sem prescindir, 20. Cumpre reafirmar que os autos não contêm elementos para que o Tribunal possa decidir pela verificação do justo receio de perda da garantia patrimonial.

  19. A sentença recorrida considerou os pontos 13, 14 e 15 dos factos provados como suficientes para demonstrar a existência de periculum in mora; 22. Com o devido respeito, estes factos, não preenchem o alegado requisito do justo receio de perda de garantia patrimonial do crédito da requerente no que toca à 1ª Requerida.

  20. É que o artigo 391º n.º 1 do C.P.C. visa conferir ao credor um instrumento que lhe permita proteger-se de uma previsível conduta (censurável) do devedor de ocultação ou dissipação de bens, levada a cabo com a finalidade de impedir ou dificultar a satisfação do crédito daquele.

  21. Ou seja, a perda de garantia patrimonial tem de radicar numa situação deficitária do devedor ou numa sua conduta tendente a prejudicar os direitos do seu credor, não podendo considerar-se abrangidas as situações decorrentes do exercício por outro credor de um direito que lhe assiste.

  22. Assim, não ficou assente que a situação económica da 1ª Requerida é deficitária, nada tendo sido invocado relativamente à insuficiência do seu património para saldar a alegada dívida do Requerente.

  23. A mera oposição à renovação do contrato de arrendamento não é de molde a justificar o receio de perda de garantia patrimonial, porque não é sinónimo de encerramento do...

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