Acórdão nº 2186/15.0T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 08 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães: I- Relatório 1- Manuel intentou a presente ação declarativa de condenação, contra, Seguros X, S.A.

, alegando, em breve resumo, que, no dia 28/09/2009, celebrou um contrato de Seguro do Ramo Vida com esta sociedade, tendo em vista a cobertura do risco de morte e riscos complementares de invalidez e doença, associado a um crédito à habitação.

Sucede que, depois de mais de 30 anos a exercer a profissão de cortador de carnes verdes, na sequência do cansaço, dos problemas nos ossos e articulações e da doença de pele que o afetava (psoríase) – que era objeto de comentários pelos clientes, que sentiam repugnância em serem atendidos por ele -, resolveu cessar esta sua atividade.

E, assim, ano de 2005, foi-lhe atribuída uma pensão da Segurança Social, que enquadrou na categoria “pensão por invalidez”.

Mais tarde, no entanto, concretamente, no ano de 2011, começou a ter sintomas da doença Parkinson, a qual lhe foi diagnosticada em meados do ano de 2012.

Em 2014, esta doença atingiu um estado crítico, de tal modo que passou a ter necessidade de ser acompanhado para efetuar as suas necessidades fisiológicas, para se vestir, para se lavar, para tomar banho, entre outras necessidades quotidianas. E, devido ao agravamento desta doença teve também de deixar de conduzir veículos automóveis.

A tal ponto se manifestaram as consequências dessa doença que foi presente a uma junta médica em março de 2014, a qual lhe atribuiu uma incapacidade permanente global de 70%.

Decidiu, por isso, em abril de 2014, acionar o contrato de seguro que tinha celebrado com a Ré, mas esta resolveu esse contrato, alegando que, no momento em que o assinou, o A. já sabia das patologias que o afetavam.

Ora, isso não é verdade, como explica detalhadamente.

Por isso mesmo, pretende que a Ré seja condenada a cumprir na totalidade o disposto no contrato de seguro efetuado, a título da importância segura, emergente do contrato tutelado pelo regulamento emitido pela Seguros X, titulado de Temporário Anual Renovável, bem como a pagar-lhe a quantia de 29.231,20€.

Além disso, pede também que a Ré seja condenada a pagar-lhe 5.000,00€, a título de indemnização pelos danos não patrimoniais que sofreu e descreve, sendo todos os montantes acrescidos de juros de mora, à taxa de 4%, desde a citação até integral pagamento.

2- Contestou a Ré, reconhecendo a celebração do indicado contrato de seguro, bem como um outro, do ramo vida, celebrado apenas com o A.. Todavia, em ambos, o mesmo, dolosamente, prestou declarações inverídicas sobre a causa da sua reforma e sobre o seu estado de saúde, à época.

Por isso mesmo, entende que nenhuma das prestações peticionadas lhe é devida.

3- O A., em resposta, refutou estas acusações e consequências.

4-Realizada a audiência prévia, foi, depois, realizado exame pericial ao A.

5- O processo prosseguiu para julgamento, após o qual foi proferida sentença que julgou a presente ação improcedente, por não provada, e consequentemente, absolveu a Ré de todos os pedidos.

6- Inconformado com esta sentença, dela recorre o A, terminando as suas alegações recursivas concluindo o seguinte: “I. A douta sentença que absolve a ora Recorrida do pedido contra si formulado enferma de incorreta aplicação dos pressupostos da anulabilidade dos contratos de seguro, com fundamento nas falsas declarações.

  1. Erra também ao decidir que não se verificaram danos não patrimoniais ocorridos no Autor em virtude da recusa da Recorrida em efetuar o pagamento do capital seguro.

  2. Equivocando ainda, ao decidir no sentido de manter as cláusulas contratuais gerais que não foram explicadas, e por conseguinte deveriam ter sido excluídas, implicando a validade do contrato de seguro.

  3. Contrariamente à decisão do Tribunal a quo é pacífico o entendimento da jurisprudência, no sentido de que as declarações falsas ou reticentes apenas invalidam o contrato, quando estejam preenchidos os seguintes pressupostos cumulativos: Dolo ou negligência nas respostas pelo segurado; Existência de nexo de causalidade entre o facto omitido e o evento que da origem a indemnização; A suscetibilidade das omissões influírem na outorga do contrato, competindo a quem pretende beneficiar da anulabilidade o ónus da prova.

  4. Discorda ainda o Recorrente da sentença proferida, quanto aos efeitos da falta de explicação do teor das cláusulas contratuais nos contratos de adesão.

  5. Com recurso à prova testemunhal, entende o Recorrente que decidiu mal o Tribunal quando considera não haver danos não patrimoniais ocorridos no autor decorrentes da recusa da Recorrida no cumprimento do contrato.

  6. No que toca às falsas declarações na douta sentença, não foi valorado pelo Tribunal um quesito de especial relevância no que toca a anulabilidade do contrato com base nas falsas declarações.

  7. Essencialmente a relevância do nexo de causalidade entre o facto omitido/falsas declarações e o evento que desencadeia o “sinistro” que possibilita acionar o seguro.

  8. O Tribunal não se pronuncia sobre este pressuposto, no nosso modesto entendimento, essencial para boa decisão da causa.

  9. Aliás pressuposto que é valorado por grande parte da jurisprudência existente.

  10. Dos factos dados como provados, pode-se verificar que o motivo que fez o recorrente acionar a cobertura do seguro no ano de 2014, foi o elevado estado desenvolvido da síndroma de Parkinson, cujos sintomas inicias foram diagnosticados no ano de 2012, tendo os primeiros sintomas se manifestando no ano de 2011.

  11. Não se pode aceitar que o contrato seja nulo ou anulável, visto também não ter resultado provado dos autos que foi devido ao facto omitido na proposta de adesão, que se deu a causal evento que permitiu ao Recorrente reunir os pressupostos para acionar o seguro por invalidez.

  12. Neste sentido vide alguns acórdãos muito esclarecedores quanto à necessidade da existência do nexo de causalidade para que o contrato de seguro possa ser considerado anulável em virtude das falsas declarações: XIV. “uma vez verificado o sinistro, importa apurar qual a causa do mesmo e, caso se chegue à conclusão que o facto não declarado não possui nenhuma relação com o evento produzido, nem para ele contribuiu por qualquer forma, há lugar a indemnização”. (Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Processo:758/05-2.

  13. Também neste sentido Adriano Antero, in “Comentário ao Código Comercial”, vol. II, pág. 152, “depois do sinistro, para que essa reticência possa anular o contrato para efeito do não pagamento da indemnização, é preciso que tivesse influído no dano...”.

  14. No mesmo seguimento, atento as palavras de José Vasques, in “Contrato de Seguro”, Coimbra Editora, pág. 228. “É defensável no entanto, que a nulidade seja uma sanção desproporcionada, que deve reservar-se para os casos em que exista um nexo de causalidade entre a inexatidão ou omissão e o sinistro”.

  15. Este entendimento tem sido adotado por vários tribunais, inclusive na jurisprudência deste Tribunal nomeadamente Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 29/10/2015 e 10/07/2008.

  16. Assim também entende o Tribunal da Relação do Porto nos Acórdãos de 27/02/84; 27/04/2005; 10/07/2008 e 20/01/2014 para que haja invalidade do contrato de seguro terá de existir nexo de causalidade entre as alegadas declarações inexatas ou factos omitidos e a verificação do risco coberto pelo contrato de seguro.

  17. Não menos importante é referir que o nexo de causalidade não é dispensado na omissão, conforme resulta da conjugação dos artigos 486º e artigo s63º do Código Civil XX. Reportando-se a douta sentença, foi dado como provado que o motivo que originou a incapacidade do Recorrente, obrigando-o a deixar de exercer qualquer atividade profissional e consequentemente em virtude da sua invalidez recorrer ao cumprimento do seguro por verificar-se a invalidez, foi a evolução da doença Síndrome de Parkinson.

  18. Por sua vez, é vertente na matéria provada que a síndrome de Parkinson apenas se manifestou em 2011, decorridos três anos após a assinatura do contrato.

  19. Mais ficou provado na sentença, como também é de conhecimento empírico, a psoríase e doenças ortopédicas (doenças omitidas pelo recorrente) não têm nenhuma relação ou influencia sobre a Síndrome de Parkinson, aliás conceito corroborado pelo depoimento da testemunha Dr. José, que de forma perentória afirma que as doenças que o Recorrente padecia e que foram omitidas nada tem a ver com o Parkinson.

  20. Pelo que, não se verificando o nexo de causalidade entre o sinistro e a declaração omitida, há lugar a indemnização.

  21. Assim entendeu o Acórdão da Relação de Guimarães de 10/07/2008 in www.dgsi.pt/, “uma vez verificado o sinistro importa apurar qual a causa do mesmo e, caso se chegue à conclusão que o facto não declarado nenhuma relação tem com o evento produzido nem para ele contribuiu por qualquer forma, há lugar à indemnização.

  22. O Tribunal a quo decidiu a questão sobre as falsas declarações sem conhecer do nexo de causalidade, que salvo o melhor entendimento, é indispensável para relevar a anulabilidade do contrato.

  23. Como ficou provado nos autos, a psoríase e as doenças ortopédicas “doenças que eram existentes no 2005 não declaradas pelo autor em 2009 na proposta de adesão “em nada concorrem para o desenvolvimento da Síndrome de Parkinson diagnosticada em 2011.

  24. Ainda no que toca ao nexo de causalidade e a sua relevância para determinação da anulabilidade do contrato, a jurisprudência caminha de mãos dadas com a doutrina, para tanto vide “Pires de Lima e Antunes Varela: Significa isto, que existe nexo de causalidade adequada entre o acto omissivo e o dano, quando se prove que este “provavelmente não se teria verificado, se não fosse a omissão”.

  25. Com fundamento no conceito defendido pelos insignes autores, mostra-se claro que, no caso dos autos, compete a recorrida o ónus de alegação e prova que, se não fosse o descrito comportamento omissivo do Recorrente haveria um grau de probabilidade razoável da não ocorrência do dano.

  26. ...

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