Acórdão nº 1703/15.0T8BCL.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 01 de Fevereiro de 2018
Magistrado Responsável | PEDRO DAMI |
Data da Resolução | 01 de Fevereiro de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Guimarães.
-
RELATÓRIO.
José e mulher, Maria, intentaram a presente acção que segue a forma de processo comum contra Manuel e Joaquina, peticionando que os Réus sejam condenados a proceder a expensas suas à demolição das obras referidas na petição inicial, bem como a deixarem de invadir e abster-se de edificar obras, esbulhar ou turbar o prédio denominado “Bouça A” e a pagar aos Autores, a título de danos não patrimoniais, o montante de € 1.000,00, acrescido de juros de mora, à taxa de 4%, até efectivo e integral pagamento.
Para tanto, alegam, em síntese, que pertence aos Autores o prédio “Bouça A”, sendo os Réus proprietários do prédio “Campo R”, e as partes já celebraram duas transacções, no âmbito dos Processos nº 371/2011, que correu termos no extinto 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos e 777/10.1TBBCL, que correu termos pelo 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Barcelos, tendo as partes, no âmbito do 1º processo, acordado constituir uma servidão de passagem a favor dos Réus, tendo os Réus, em Novembro último, construído uma vedação em Ferro, “portão”, sobre o tranqueiro em pedra colocada pelos Réus na faixa de terreno cedida a título de servidão de passagem, mormente na sua extremidade sul, confinante com caminho público. Mais alegam que os Autores se sentiram humilhados com a atitude dos Réus, encontrando-se impedidos de aceder, de forma livre, ao seu prédio, pela mencionada via, e impossibilitados de vigiar e limpar o seu prédio.
Os Réus contestaram alegando, que no âmbito das transacções supra referidas, os Autores cederam aos Réus uma faixa de terreno, com 4 metros de largura, na extremidade norte do seu prédio, desde o caminho público até ao prédio dos Réus, ficando consignada a constituição de uma servidão de passagem, por aquela faixa de terreno cedida, para o prédio dos Autores. Mais alegam que os Réus vedaram o seu prédio, não ocupando o prédio dos Autores, não tendo os Réus fechado o portão, antes de enviarem uma cópia das chaves aos Autores, que não receberam a carta, não tendo os Réus fechado à chave o referido portão, pelo que os Autores têm livre acesso ao seu prédio. Peticionam ainda a condenação dos Autores como litigantes de má fé.
Os Autores exerceram o contraditório e alegaram que nas transacções em causa nos autos não se transmitiu a propriedade da parcela em questão, que sempre seria inválida, por falta de forma legal, e porque consubstanciaria uma desanexação de uma faixa de terreno integrante do prédio dos Autores sem autorização prévia da entidade competente.
*Convocada uma Audiência prévia, onde se frustrou a conciliação das partes, foi determinado por despacho que os autos fossem concluídos “ a fim de ser proferido despacho saneador”.
*Na sequência, foi proferido despacho saneador sentença, que, na sequência de Recurso interposto, veio a ser revogado.
*Prosseguiram os autos, com a elaboração de despacho saneador e enunciação do objecto do litígio e dos temas da prova.
*Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância de todo o formalismo legal.
* Na sequência, foi proferida a seguinte sentença: “IV- Dispositivo Pelo exposto, julgo a presente acção totalmente improcedente, absolvendo os réus do pedido.”*É justamente desta decisão que os Autores/Recorrentes vieram interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma: “CONCLUSÕES I. Embora fazendo constar o elevado respeito que não deixará de lhes merecer, revela-se de inconformismo, o posicionamento dos ora recorrentes ante a decisão que veio a ser proferida pelo digníssimo Tribunal a quo.
-
Sendo de reportar que, para “mal dos pecados” dos autores, ora recorrentes, há muito que a questão sub judice corre seus termos, sendo o presente – convirá referir: quando nada o faria crer - o terceiro processo judicial que origina.
-
Com a presente demanda, vieram os recorrentes peticionar a condenação dos réus no sentido de proceder à demolição de um portão edificado num prédio da propriedade daqueles, requerendo ainda que estes deixassem de o invadir em termos distintos dos consignados pela transacção homologatória celebrada no âmbito do processo nº 373/2001, já devidamente identificado nos presentes autos, e, bem assim, abster-se de edificar obras, esbulhar ou turvar o referido prédio denominado “Bouça A”.
-
O Tribunal a quo não veio, contudo, considerar assistir razão aos autores, julgando totalmente improcedente a respectiva causa.
-
No entanto, entendem os recorrentes que o fez indevidamente, evidenciando erro notório na apreciação e valoração das provas e erro de julgamento na decisão da matéria de facto e da factualidade não provada, não sopesando devidamente as pretensões em conflito, em particular as que consubstanciavam a causa dos ora recorrentes, não obstante a linha de fundamentação e/ou interpretativa de que se muniu, mesmo incorrecta, permitisse outro alcance que não o que veio a ser dado.
-
Nesta senda, o Tribunal a quo errou, ao considerar como não provado: a) - que o prédio rústico da propriedade dos autores, com a área de 5500 m2, constituído por mato e pinheiros, inscrito na matriz respectiva sob o artigo 555, figurando sob a denominação de “Bouça F”, sito no lugar …, União de freguesias de … (São João e Santo Estevão) e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...8, atribuindo-se-lhe, já aqui, a designação “Bouça A, confronta, de norte, com caminho e limite da freguesia; b) - que o prédio rústico da propriedade dos réus, com área de 12400 m2, inscrito na matriz predial urbana, sob o artigo 111, o prédio sito em …, encontrando-se descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...3, confronta de sul com M. B.
; c) - que os réus, ao agir da forma que agiram, não causaram ilícita e culposamente uma injustificada afronta aos autores, geradora de incómodo e de danos não patrimoniais; VII. Por seu turno, deveria, a Mmª. Juiz a quo ter considerado como provado que: a) - o prédio rústico da propriedade dos autores, com a área de 5500 m2, constituído por mato e pinheiros, inscrito na matriz respectiva sob o artigo 555, figurando sob a denominação de “Bouça F”, sito no lugar de …, União de freguesias de … (São João e Santo Estevão) e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...8, atribuindo-se-lhe, já aqui, a designação “Bouça A, tem por confrontação a norte, com caminho e limite da freguesia; b) - o prédio rústico da propriedade dos réus, com área de 12400 m2, inscrito na matriz predial urbana, sob o artigo 111, o prédio sito em Real, encontrando-se descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...3, confronta de sul com M. B.; c) - por efeito do termo de transacção celebrado no âmbito do processo nº 373/2001, que correu termos no 3º Juízo Cível (extinto) do Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos e do processo número e do processo número 777/10.1TBBCL, que correu termos pelo extinto 4º Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Barcelos, redistribuído posteriormente para a Tribunal da Comarca de Braga – Instância Local de Barcelos – Secção Cível –J3, os autores, ora recorrentes, aceitaram constituir uma servidão de passagem a favor dos ora recorridos, onerando dessa forma o prédio de sua propriedade, já devidamente identificado; d) - que os réus, ao agir da forma que agiram, causaram ilícita e culposamente uma injustificada afronta aos autores, geradora de incómodo e de danos; VIII. Entendendo e decidindo erradamente que, por via da operada “cedência”, ter-se-ia constituído uma servidão de passagem por aquela faixa de terreno, não a favor do prédio dos réus, mas, ao invés, a favor do prédio dos autores.
-
Onerando não o prédio dos autores, mas dos réus, uma vez que, para se utilizar as exactas palavras constantes da sentença "tal faixa de terreno passou a fazer parte do prédio dos réus, que pagaram pela sua aquisição a quantia de € 5.000,00”.
X.
Concluindo, consequente e inequivocamente, arredada de qualquer facto que o possa alicerçar, constatar-se “facilmente que na referida transacção, os autores não constituíram uma servidão de passagem a favor do prédio dos réus, ocorrendo exactamente o inverso, ou seja, que os autores venderam a faixa de terreno em questão aos réus, que por sua vez, constituíram uma servidão de passagem através de tal faixa de terreno a favor do prédio dos aqui autores”.
-
Ignorando in totum, entre outros factos de grande relevância, a evidência de que, após a celebração dos referidos termos de transacção, a realidade fiscal e registral do terreno dos autores/recorrentes, ora colocada em causa pelos réus/recorridos, se mantém intocada.
-
Sem qualquer alteração de áreas e ou confrontações.
-
Não assiste, assim, razão à Mmª. Juiz a quo atento o erro notório evidenciado na apreciação e valoração das provas e, bem assim, erro de julgamento na decisão da matéria de facto e da factualidade dada como provada e não provada, que acabará por se ver reflectida na decisão recorrida por fazer também uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.
-
Evidenciando-o, salvo o devido respeito, ao decidir que, por via da operada “cedência", terão sido constituídas, com formidável economia - pese embora a ambiguidade terminológica utilizada - não só uma alienação de uma “faixa de terreno”, mas ainda a constituição uma servidão de passagem a favor do prédio dos autores, ora recorrentes.
-
E, bem assim, ao desconsiderar o depoimento de parte da ré, fazendo uso, para o efeito, de um argumento de difícil alcance e, para todos os efeitos, contraditório: Joaquina terá evidenciado, no entendimento à Mmª. Juiz a quo, um depoimento de parte "manifestamente interessado". Vide depoimento registado entre as 14:45:47 e as 14:46:30 (minutos 02:16 a 02:49 da gravação) de 08.05.2017, entre as 14:46:30 e as 14:47:28 (minutos 02:50 a 03:45 da gravação), entre as 14:49:49 e 14:59:53 (a minutos 06:08 a 16:12 da gravação) e entre as 15:08:21 e 15:10:25 de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO