Acórdão nº 134/16.0GAVF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE BISPO
Data da Resolução07 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I.

RELATÓRIO 1.

No processo comum, com intervenção de juiz singular, com o NUIPC 134/16.0GAVFL, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, no Juízo de Competência Genérica de Vila Flor, realizado o julgamento, foi proferida sentença, datada e depositada a 09-11-2017, a absolver o arguido, J. G., da prática de um crime de injúria, previsto e punido pelo art. 181º do Código Penal, e a condená-lo pela prática de um crime de ofensa à integridade física simples, previsto e punido pelo art. 143º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 200 (duzentos) dias de multa, à taxa diária de € 5,00 (cinco), num total de € 1.000,00 (mil), bem como a pagar, a título de indemnização, a quantia de € 2.000,00 (dois mil) ao assistente A. A. e a quantia de € 68,50 (sessenta e oito euros e cinquenta) à Unidade Local de Saúde do Nordeste.

  1. Inconformado com a referida condenação, o arguido recorreu da sentença, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição) [1]: «

    1. O Tribunal recorrido não considerou, como deveria considerar, o facto de o assistente ter provocado o arguido, por duas vezes (no funeral e dentro do estabelecimento comercial deste); B) Este facto é essencial, para a fundamentação da matéria de facto e a sua consideração pelo Tribunal tem grande influência na medida da pena aplicada, bem como na atribuição do pedido Cível; C) O Tribunal à quo, ao não ponderar tal situação esqueceu um elemento essencial à descoberta da verdade e sobretudo à boa e justa decisão da causa; D) O que implicou uma condenação desproporcional, não equitativa e sobretudo injusta; E) Assim, a douta sentença recorrida, deve ser substituída por outra que; F) Condene o arguido pelo crime de ofensas corporais simples, na pena mais justa e adequada de cem dias de multa, à taxa diária de cinco euros, o que perfaz a quantia de quinhentos euros; G) Condene, ainda, o arguido no pedido cível no montante entre setecentos e cinquenta a mil euros; H) Em tudo o mais, deve-se manter a douta sentença recorrida.

    Assim, nestes termos e em todos os outros que Vossas Excelências suprirão, deve a douta sentença recorrida ser substituída por decisão que dê provimento à fundamentada pretensão do arguido ora recorrente.

    ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA.» 3.

    O Exmo. Procurador Adjunto na primeira instância respondeu à motivação do recurso, concluindo pela manutenção da sentença recorrida, nos seus exatos termos e fundamentos, porquanto, no que tange à propugnada alteração da matéria de facto, da análise da respetiva motivação ficam patentes os motivos que levaram o Mº. Juiz a não ter dado como provado que o comportamento do arguido foi motivado por provocação do assistente, uma vez que analisando a prova à luz das regras da experiência e normalidade, atribuiu credibilidade à versão dos factos apresentada pelo assistente em detrimento da versão apresentada pelo arguido. Acresce que, ainda que assim não se considerasse, ponderando essencialmente a atitude do arguido, a forma como agrediu o assistente, a extensão das agressões e a circunstância de ter praticado os factos sobre pessoa de 75 anos, com uma condição física muito inferior à sua, justifica-se plenamente a aplicação de uma pena de 200 dias de multa, pelo que nenhuma censura merece a sentença recorrida.

  2. Também o assistente respondeu à motivação do recurso, sustentando não se afigurar possível a existência de qualquer provocação da sua parte para com o arguido, pois ninguém a presenciou nem descreveu, provocação essa que o recorrente não especifica nem descreve com factos, mais defendendo que a condenação na multa e no pedido cível foi justa e equitativa, devendo o recurso ser julgado totalmente improcedente.

  3. Neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, porquanto, analisando a motivação e as conclusões do mesmo, constata-se que o recorrente não indicou nem os concretos pontos de facto nem as concretas passagens (das gravações) que (obviamente em relação a esses factos que não concretizou minimamente) imporiam decisão diversa, tornando, assim, inviável a modificabilidade da decisão proferida sobre a matéria de facto, sucedendo ainda que a prova foi apreciada segundo as regras do art. 127º do Código de Processo Penal, com respeito pelos limites ali impostos à livre convicção, não só de motivação objetiva segundo as regras da vida e da experiência, e sem que se vislumbre que na apreciação da prova o tribunal tenha incorrido em qualquer erro lógico, grosseiro ou ostensivo, sendo que, por fim, em face da factualidade provada e de acordo com os critérios de determinação da pena estabelecidos no n.º 1 do art. 71º do Código Penal, a pena de multa aplicada pelo tribunal a quo não excede a medida da culpa nem a necessária à satisfação das finalidades da punição, afigurando-se, pois, ser justa, adequada e proporcional, não devendo, por isso, merecer reparo.

  4. No âmbito do disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, apenas o arguido responde a esse parecer, mantendo o referido nas suas alegações e conclusões.

  5. Colhidos os vistos, o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser aí julgado, de harmonia com o preceituado no art. 419º, n.º 3, al. c), do mesmo código.

    II.

    FUNDAMENTAÇÃO 1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO Dispõe o art.º 412º, n.º 1, do Código de Processo Penal que “a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido”.

    É entendimento pacífico que são as conclusões que definem e determinam o âmbito do recurso e os seus fundamentos, delimitando, assim, para o tribunal ad quem, as questões a decidir e as razões por que devem ser decididas em determinado sentido, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que eventualmente existam [2].

    No caso vertente, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a apreciar são as seguintes: a) - A impugnação da matéria de facto.

    1. - A medida da pena.

    2. - O montante da indemnização civil.

  6. DA SENTENÇA RECORRIDA É do seguinte teor a fundamentação de facto da sentença recorrida (transcrição): «a) factos provados a.1) da acusação pública 1. No dia 15/09/2016, pelas 15h30, no logradouro do estabelecimento pertencente ao arguido denominado «C. G., materiais de construção», sito na Av. (…), o arguido aproximou-se do ofendido A. A., empurrou o ofendido, fazendo-o cair ao chão.

  7. Ato seguido, encontrando-se o ofendido prostrado no chão, o arguido desferiu-lhe um número não concretamente apurado de pontapés no tronco.

  8. De seguida, o arguido agarrou as pernas do ofendido e puxou-o até ao passeio da citada Avenida, numa extensão aproximada de dez metros.

  9. Após, o ofendido levantou-se e o arguido desferiu-lhe um murro na face e dois pontapés das nádegas.

  10. A conduta do arguido causou ao ofendido as seguintes lesões: a. Ao nível do tórax: uma escoriação com oito centímetros de comprimento por seis centímetros de largura, localizada na região da coluna dorso lombar, uma escoriação vertical com treze centímetros de comprimento por um centímetro de largura, localizada na região escapular esquerda; b. Ao nível do membro superior direito: duas escoriações, revestidas de crosta cicatricial, com dois centímetros de comprimento por cinco milímetros de largura, cada uma e localizadas na região do cotovelo; c. Ao nível do membro superior esquerdo: uma escoriação, revestida de crosta cicatricial, com dois centímetros de comprimento por um centímetro de largura, localizada na região do cotovelo; d. Ao nível do membro inferior esquerdo: duas escoriações circulares com cinco milímetros de diâmetro cada uma e localizadas na região anterior do terço distal da perna; 6. Tais lesões determinaram para a sua cura um período de doença de dez dias, sendo sete dias com afetação da capacidade para o trabalho geral e profissional.

  11. O arguido agiu de forma livre, com o propósito concretizado de molestar o corpo e a saúde do ofendido e de lhe produzir as lesões verificadas, resultado este que representou.

  12. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.

    Mais se provou que: 9. O arguido é solteiro, sem filhos e reside sozinho, com uma irmã e a mãe.

  13. É funcionário público, trabalhando como guarda noturno na escola de (…) , onde aufere € 476,00/mensais; tem também uma loja onde aufere uma quantia indeterminada.

  14. Não tem antecedentes criminais.

    a.2) da acusação particular 12. No dia 15/09/2016, cerca das 15h30, na Av. (…), em (…), enquanto o ofendido assistia a um funeral e após bocejar, é abordado pelo arguido que lhe diz «nem aqui te conténs».

  15. a.3) do pedido de indemnização civil 14. O assistente é pessoa de bem, ordeira, honesta, pacífica e estimada no meio social onde reside.

  16. O assistente sentiu-se e sente-se profundamente envergonhado em virtude de os factos descritos terem ocorrido no centro da cidade, diante dos que aí se encontravam e passavam.

  17. O arguido causou ferimentos dolorosos ao assistente, tendo estado diversos dias sem conseguir fazer nada.

  18. O assistente teve que ter tratamentos médicos no centro de saúde em consequência da conduta do arguido.

  19. O Centro de Saúde de (…), integrado na Unidade Local de Saúde do Nordeste, EPE, despendeu €68,50 nos tratamentos médicos com o assistente.

    *b) factos não provados b.1) da acusação pública Nenhuns com relevância para a causa.

    b.2) da acusação particular 19. Que o arguido também lhe tenha dito «filho da puta, és um animal».

  20. Que tais palavras tenham sido proferidas de voz alta, em público, de modo a serem ouvidas por quem ali passasse.

  21. Que o arguido, no seu estabelecimento comercial, lhe tenha dito, em tom de voz elevado, «filho da puta, põe-te lá fora».

  22. Que as palavras ditas pelo arguido sejam...

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