Acórdão nº 6651/13.6TBBRG.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | ANABELA TENREIRO |
Data da Resolução | 10 de Maio de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I- RELATÓRIO “X-Aluguer de Automóveis sem Condutor, Lda.
” intentou a presente acção declarativa, com processo comum, contra “Seguradoras Y, S.A.”, antes designada de “Companhia de Seguros T., SA.” melhor identificadas nos autos, pedindo a sua condenação: - A pagar-lhe a quantia de € 15.346,24 (quinze mil trezentos e quarenta e seis euros e vinte e quatro cêntimos), correspondente ao valor comercial da viatura ET (€ 10.653,02) e ao valor das rendas que a Rent., S.A., debitou à autora (€ 4.693,22) acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento, ou a quantia de € 10.653,02 (dez mil seiscentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos), relativamente ao valor comercial da viatura ET, acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento.
Ou, caso assim não se entenda, - a pagar à sociedade comercial “Rent. - Companhia Portuguesa de Aluguer de Viaturas, SA”. a quantia de € 15.346,24 (quinze mil trezentos e quarenta e seis euros e vinte e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento, ou a quantia de € 10.653,02 (dez mil seiscentos e cinquenta e três euros e dois cêntimos), acrescida de juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento.
Para tanto alegou, em suma, que, na sequência de contrato de aluguer operacional celebrado entre a “Rent.–Companhia de Aluguer de Viatura, S.A.” foi-lhe entregue a viatura Renault Megane, com a matrícula ET, razão porque celebrou de seguida a autora um contrato de seguro com a seguradora Ré, o qual incluía as coberturas de responsabilidade ilimitada e danos próprios, com a cobertura de furto, roubo ou mesmo de abuso de confiança.
No âmbito da actividade que desenvolve de aluguer de automóveis sem condutor, a autora obrigou-se a proporcionar, mediante retribuição, o gozo do aludido veículo ET e por determinado período, a pessoa que se apresentou como sendo Joaquim e a quem entregou a viatura ET com a obrigação de a devolver a 27 de Outubro de 2008. Contudo, essa pessoa que se apresentou como sendo Joaquim, não devolveu a viatura TE à Autora, antes a mesma se apropriou e fez coisa sua, ilicitamente, tendo, assim furtado a viatura.
Accionado o seguro outorgado com a Ré e o qual incluía as coberturas de responsabilidade ilimitadas e danos próprios, a Ré recusou-se a indemnizar de todo a Autora, alegando injustificadamente que os factos em causa integravam a práctica de uma crime de abuso de confiança e não de furto ou roubo, sendo que o abuso de confiança não se mostra incluído nas coberturas da apólice.
A Ré contestou alegando a ilegitimidade da Autora relativamente ao pedido de pagamento da quantia corresponde ao valor do veículo que está em discussão nos presentes autos. Em sede de impugnação, veio dizer que o contrato de seguro celebrado não cobre a situação invocada pela autora.
Requereu a intervenção da “Rent.–Companhia Portuguesa de Aluguer de Viaturas, S.A.”, como parte principal associada à Autora, o que veio a ser indeferido.
Foi proferido saneador/sentença, que julgou ser a Autora parte ilegítima relativamente ao pedido de pagamento da quantia corresponde ao valor do veículo que está em discussão nos presentes e conheceu imediatamente de mérito da causa, sendo a acção julgada integralmente improcedente.
Foi interposto recurso pela Autora, o qual foi julgado parcialmente procedente, decidindo-se, além do mais, revogar a sentença no tocante à decisão de absolvição da Ré da instância relativamente ao pedido subsidiário de condenação da Ré no pagamento à “Rent. – Companhia Portuguesa de Aluguer de Viaturas, S.A.” da quantia correspondente ao valor do veículo ET, de € 10.653,02, determinando o prosseguimento dos autos, tendo o objecto do litígio sido circunscrito à referida questão.
*Foi realizada audiência prévia onde, tendo em conta a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães e por acordo das partes, foi enunciada a matéria considerada provada e aquela que deveria ser objecto de prova.
*Proferiu-se sentença que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a Ré do pedido.
*Inconformada com a sentença, a Autora interpôs recurso, terminando com as seguintes Conclusões: I.Por força do Douto Acórdão deste Tribunal proferido em consequência de recurso interposto do saneador-sentença, sobrou para decisão o pedido de condenação da Ré a pagar à RENT. - Companhia Portuguesa de Aluguer de Viaturas, S. A. a quantia de € 10.653,02, relativamente ao valor da viatura ET.
II. O Tribunal a quo enquadra a matéria de facto provada no "crime de abuso de confiança" (cfr. art.º 205 do Código Penal).
III. Efetivamente, dos factos provados 25 a 30, 35 a 37, 39 a 47 resulta que a pessoa que se apresentou a alugar a viatura (e que, assim, lhe foi entregue por título não translativo de propriedade) apropriou-se ilegitimamente da mesma (cfr. art° 205 do Código Penal).
IV. Mas por entender que o risco associado a este tipo de crime não está expressamente previsto na apólice, considerou a sentença que o mesmo não estava coberto, pelo que julgou improcedente a ação.
V. Para alcançar esta conclusão, o Tribunal a quo tomou como premissa o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 21 de Novembro de 2000, invocado pela A., único Acórdão conhecido que se pronunciou nesta matéria, em situação exatamente idêntica à dos autos, o qual, em abono da tese da A., decidiu que, Num contrato de seguro, em que outorgou, por adesão, uma empresa de aluguer de automóveis, a cláusula que responsabiliza a seguradora em caso de roubo, furto e furto de uso do veículo, não deve ser interpretada como abrangente apenas dos factos integrantes destes ilícitos criminais." A actividade da empresa -conhecida da seguradora- e consequente razão de ser do próprio contrato de seguro, permite abranger em tal cláusula os casos -integrantes de abusos de confiança- em que alguém tomou um veículo de aluguer e o fez desaparecer." VI. Em face deste Acórdão da Relação já transitado em julgado, proferido no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito a que se reporta os presentes autos, decisão essa tomada como premissa, a dedução silogística lógica seria a de julgar no mesmo sentido desse Acórdão e condenar a Ré no pedido.
VII.Mas a sentença não faz isso, limitando-se a argumentar sem a correspondente justificação, o contrário do vertido na aludida decisão da Relação, saltando diretamente para o diametralmente oposto, ou seja, afirmando de imediato à citação do sumário do Acórdão que se A ré tinha conhecimento de que a autora/tomadora se dedicava ao aluguer de veículos automóveis sem condutor, sabendo que o veículo se destinava a ser alugado pela Autora a seus clientes, no desenvolvimento da sua atividade comercial de aluguer de automóveis sem condutor, Por isso mesmo, a característica singular desta atividade desenvolvida pela Autora exigiria que o risco de não lhe ser devolvido algum veículo entregue a um cliente estivesse especialmente previsto.
VIII.Resulta para a recorrente como indubitável que as normas que constituem o fundamento jurídico da decisão, designadamente as normas dos artigos 2360 e 2370 do código civil, face à matéria provada e não provada, deviam ter sido interpretadas no sentido plasmado no Acórdão da Relação do Porto de 21/11/2000.
IX.Nessa conformidade, não só não se provou o alegado pela Ré na sua contestação que antes de subscrever e entregar à Ré a proposta de seguro foram lidas, comunicadas e explicadas à A. as cláusulas respeitantes à Condição Especial de "Furto ou Roubo" tendo-lhe sido explicado que apenas desaparecimento do veículo por furto ou roubo e já não por abuso de confiança estaria coberto.
X.Como se provou o seu contrário, ou seja, que nem antes, nem aquando da celebração dessa apólice, alguma vez a seguradora Ré comunicou ou negociou com a Autora a exclusão ou inclusão do abuso de confiança na cobertura dos danos próprios ou esclareceu essa exclusão ou inclusão.
XI. Sendo a atividade da Ré conhecida pela seguradora antes e no momento da elaboração do contrato de seguro (facto provado 23).
XII.Sendo inquestionável que a Autora pretendeu, com a celebração do contrato de seguro, nos moldes em que o "aceitou", cobrir o risco da perda do veículo por apropriação de outrem, sem pensar no tipo legal de crime que a apropriação pudesse assumir.
XIII.Segundo a "teoria da impressão do destinatário", a declaração negocial deve ser interpretada como um declaratário razoável a interpretaria, colocado na posição concreta do declaratário real.
XIV. Sendo que, na combinação das normas dos art°s 237° e 236° do C.Civil e art°s 10° e 11° do DL 446/85, de 27/10 e da teoria da impressão do destinatário, resulta que a interpretação adequada in casu é considerar, ao contrário da posição da decisão recorrida, que o risco da situação dos autos se encontra coberto pela Recorrente seguradora.
XV. Até porque é que o Acórdão da Relação do Porto...
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