Acórdão nº 616/16.3T8VNF-E.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 30 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelEUG
Data da Resolução30 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I.

RELATÓRIO No Incidente de Qualificação de Insolvência de V. P. – Apenso D -, a Sra. Administradora da Insolvência apresentou, em 14 de Junho de 217, “Parecer sobre o incidente de qualificação de insolvência nos termos do nº2, do art. 188º, do CIRE”, pugnando pela qualificação da insolvência como culposa – cfr fls 1 a 20.

O Ministério Público emitiu o parecer de fls 22 a 24 quanto à qualificação da insolvência.

Notificado o insolvente, este deduziu oposição (cfr fls 26 e ss.), onde arguiu a intempestividade da Apresentação do Requerimento/Parecer sobre o Incidente da Qualificação da Insolvência.

Com vista dos Autos, o Ministério pronunciou-se sobre a alegada extemporaneidade do parecer de qualificação da Excelentíssima Senhora administradora da insolvência, promovendo que se indefira a pretensão do afetado pela qualificação da insolvência*Foi proferido despacho saneador, no qual foi decidido não se atender a invocada intempestividade do parecer da Excelentíssima Senhora administradora da insolvência, julgando-se improcedente a invocada exceção, nos seguintes termos: “Da extemporaneidade de apresentação do parecer de qualificação do senhor administrador de insolvência O insolvente veio opor-se à qualificação invocando a apresentação extemporânea do parecer do senhor administrador, por não ter respeitado o prazo do artigo 188º, nº1 CIRE, pugnando pelo seu consequente desentranhamento e arquivamento do incidente de qualificação de insolvência.

Notificado o Ministério Público para se pronunciar sobre a invocada extemporaneidade da junção do parecer da senhora administradora, nos termos do disposto no artigo 3º, nº3 e 593º, nº1, todos do CPC, ex vi artigo 17º CIRE, veio a fls 58 e ss pugnar pelo indeferimento da invocada exceção com os fundamentos que aí apresenta e extensa jurisprudência.

Cumpre decidir.

Efetivamente, a senhora administradora juntou nos presentes autos o parecer de qualificação da insolvência a 14-6-2017, quando a assembleia de credores para apreciação do relatório teve lugar a 29-3-2016.

E o artigo 188º, nº1 CIRE dispõe expressamente que até 15 dias após a realização daquela assembleia o administrador de insolvência ou qualquer interessado pode alegar o que tiver por conveniente para efeito da qualificação da insolvência como culposa e indicar as pessoas que devem ser afetadas por tal qualificação.

Este prazo tem que ser entendido como um prazo peremtório sob pena de violação do disposto no artigo 20º, nº4 da CRP, como entende o oponente? Entendemos que não, uma vez que, como muito bem aponta o senhor Procurador da República, o administrador de insolvência não é parte do processo, mas um órgão da insolvência, nos termos do artigo 52º do CIRE no capítulo intitulado órgãos da insolvência e na seção I, intitulada “Administrador da insolvência”.

A este respeito afirmam Carvalho Fernandes e João Labareda, em Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juris, Lisboa, 2015, página 689: “O parecer do administrador da insolvência, bem como o do Ministério Público constituem, como resulta do disposto nos nº 5 e 6, elementos relevantes na decisão do incidente de qualificação da insolvência- e na sua própria tramitação-, pelo que nenhum deles pode deixar de observar a obrigação que lhe compete sem incorrer em violação dos seus deveres funcionais.

Na omissão da lei não pode ser atribuído valor ao silêncio, cabendo ao juiz, se for o caso, providenciar para que, mesmo tardio, o parecer seja emitido. (…) - entretanto, no sentido de o decurso do prazo concedido ao administrador para apresentar o seu parecer não precludir a possibilidade de o fazer depois, vejam-se o ac. Da Rel. Pto, de 23/FEV/2012, citado na precedente nota nove e os acs da Rel. Guim. De 2/JUN/2011, proferido no processo 881/07.7TBVCT-U.G1, e de 14/ABR/2011, proferido no processo 881/07.7TBVCT-S.G1.

Se, em definitivo, faltar algum dos pareceres, não pode considerar-se preenchida a previsão do nº5”.

Desta forma, por o parecer do senhor administrador sobre a qualificação da insolvência ser essencial para o processo, não sendo sequer o administrador parte, mas um órgão intrínseco ao processo de insolvência, não se lhe aplica a peremtoriedade do prazo previsto no artigo 188º, nº1 do CIRE.

Termos em que indefiro a invocada exceção inominada”.

*Não conformado, veio o insolvente, V. P., interpor recurso de apelação formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1.

O ora recorrente apresentou Oposição ao parecer da senhora administradora de insolvência, no sentido da qualificação da insolvência ser julgada como culposa.

  1. Para tanto, sustentou resumidamente que: (a) “ Prevê o artigo 188.º, n.º 1 do CIRE “Até 15 dias após a assembleia de apreciação do relatório ou, no caso de dispensa da realização desta, após a junção aos autos do relatório a que se refere o artigo 155.º, o administrador da insolvência ou qualquer interessado pode alegar, fundamentadamente, por escrito, em requerimento autuado por apenso, o que tiver por conveniente para efeito da qualificação da insolvência como culposa e indicar as pessoas que devem ser afetadas por tal qualificação, cabendo ao juiz conhecer dos factos alegados e, se o considerar oportuno, declarar aberto o incidente de qualificação da insolvência, nos 10 dias subsequentes.

    (b) Ora, a assembleia de credores, conforme consta dos autos principais, foi realizada 29-03-2016, pelo que o prazo para apresentação requerimento, no âmbito do respectivo incidente, terminaria a 13-04-2016.

    (c) Ora, o incidente de qualificação da insolvência foi aberto a 14-06-2017, cerca de catorze meses após o término do prazo.

    (d) Neste sentido, é clarividente que o prazo para apresentação do mencionado requerimento há muito que tinha sido ultrapassado, ou seja, em clara violação do n.º 1 do artigo 188º do CIRE.

    (e) O prazo previsto no artigo 188º, n.º 1 do CIRE terá de ser entendido como um prazo peremptório.” 3.

    Apreciada pelo digno Tribunal “a quo”, o mesmo indeferiu a exceção invocada, decidindo doutamente que o prazo previsto no artigo 188.º, n.º 1 do CIRE não é perentório, fundamentando tal decisão com o argumento que “o administrador de insolvência não é parte do processo, mas um órgão da insolvência”.

  2. Ora, facto assente é que o mencionado requerimento/parecer foi apresentado 14 meses depois de precludido o prazo referido no artigo 188.º, n.º 1 do CIRE.

  3. De acordo com boa parte da jurisprudência, e como o ora recorrente alega, o prazo deverá ser entendido como sendo um prazo perentório, ou, em último reduto, legal ou resolutivo.

  4. Caso assim não seja, qualquer decisão em sentido contrário deverá ser julgada como inconstitucional, por clara violação do disposto no n.º 4 do artigo 20.º da Constituição da República: “Todos têm direi- to a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo”.

  5. Tal ditame constitucional traduz-se numa expressão directa do acesso à Justiça, que decorre inequivocamente do princípio do Estado de direito e da dignidade da pessoa Humana.

  6. Densifica-se tal o princípio através de outros princípios dele decorrentes, designadamente o direito à igualdade de armas ou direito à identidade de posições no processo, pelo qual se estatuiu que as partes que pedem...

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