Acórdão nº 151/17.2GAVFL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelJORGE BISPO
Data da Resolução21 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I - RELATÓRIO 1.

No processo especial, sob a forma sumária, com o NUIPC 151/17.2GAVFL, que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, no Juízo de Competência Genérica de Vila Flor, foi o arguido P. G. condenado pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art. 292º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de € 5 (cinco euros), num total de € 600 (seiscentos euros), bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria, por um período de 10 (dez) meses, nos termos do art. 69º, n.º 1, al. a), do mesmo código.

  1. Discordando da aplicação de uma pena de multa, o Ministério Público interpôs o presente recurso, terminando as suas alegações nos seguintes termos (transcrição) [1]: «CONCLUSÕES 1.ª O arguido P. G. foi condenado, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), num total de €600,00 (seiscentos euros), bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor de qualquer categoria por um período de 10 (dez) meses.

    1. Considerando os antecedentes criminais que o arguido apresenta, a indiferença que este demonstra em relação às mesmas e às consideráveis exigências de prevenção geral e especial que no caso se fazem sentir, a aplicação de uma pena de multa é manifestamente insuficiente.

    2. A sentença recorrida violou o disposto nos artigos 70.º e 71.º do Código Penal.

    Termos em que, deverá ser julgado procedente o presente recurso e, em consequência, ser revogada a sentença proferida e, nesta parte, substituída por outra que condene o arguido em pena de prisão nunca inferior a cinco meses, suspensa na sua execução pelo período de um ano, assim fazendo V. Exas., como sempre, JUSTIÇA!» 3.

    O arguido não respondeu à motivação do recurso.

  2. Neste Tribunal da Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de, vendo o quadro fáctico em apreço, em que se vislumbra também um nível de dependência do álcool que o arguido apresenta, a pena de multa, novamente aplicada, não satisfaz adequada e suficientemente as finalidades da punição, pois, correndo o risco de passar a ser encarada como mais um custo módico que o arguido vai aceitando suportar para continuar a conduzir depois de beber, não constitui, outrossim, um sério incentivo e uma consistente advertência para a necessidade de encarar o tratamento ao alcoolismo convicta e produtivamente.

    Assim, considerando que o arguido averba já três condenações pelo mesmo tipo de crime e por outro congénere num curto período, bem como que o crime de condução em estado de embriaguez é um dos de verificação mais frequente, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto entende que a pena preconizada no recurso é ajustada, assim como é adequada a aplicação da pena de substituição, termos em que o recurso deve ser julgado procedente.

  3. Cumprido o disposto no artigo 417º, n.º 2, do Código de Processo Penal, sem que tenha havido resposta a esse parecer, foram colhidos os vistos, após o que o processo foi presente à conferência, por o recurso dever ser aí julgado, de harmonia com o preceituado no art. 419º, n.º 3, al. c) do mesmo diploma.

    II - FUNDAMENTAÇÃO 1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO Dispõe o art.º 412º, n.º 1, do Código de Processo Penal que “a motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido”.

    As conclusões definem e determinam o âmbito do recurso e os seus fundamentos, delimitando, assim, para o tribunal ad quem, as questões a decidir e as razões por que devem ser decididas em determinado sentido, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que eventualmente existam [2].

    No caso vertente, balizadas pelas conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir reconduzem-se a saber se em vez da pena de multa deve ser aplicada ao arguido uma pena de prisão, fixada em medida não inferior a cinco meses e suspensa na sua execução.

  4. DA SENTENÇA RECORRIDA Para a resolução das questões supra enunciadas importa ter presente o que de relevante consta da sentença recorrida.

    2.1 – Nela foram dados como provados os seguintes factos (tal como se ouvem no registo da audiência de julgamento, com numeração agora introduzida): «1. No dia 26 de novembro de 2017, cerca das 14h e 30, o arguido estava a conduzir o veículo de matrícula (…) na Estrada Nacional 102, em Assares, Cruzamento de Assares, em Vila Flor, quando foi submetido a fiscalização, tendo sido submetido a exame de pesquisa de álcool no sangue, tendo acusado uma taxa de álcool no sangue de 1,97 g por litro, correspondente à taxa registada de 1,87 g por litro, após dedução do erro máximo admissível.

  5. Agiu de modo voluntário, livre e conscientemente, sabendo que antes de iniciar a condução daquele veículo havia ingerido bebidas alcoólicas em quantidade superior ao permitido, não se tendo abstido de o conduzir.

  6. Sabia que a condução de veículos na via pública, nas condições em que o fez, é proibida e punida pela lei penal.

  7. O arguido exibe os seguintes antecedentes criminais: - processo 160/15.6GFPRT, condenação pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, tendo sido aplicada pena de 44 dias de multa, mais três meses de inibição de conduzir; - processo 62/16.9GBTMC, condenação pela prática de um crime de violação de imposições, previsto no art. 353º do Código Penal, mais de condução de veículo em estado de embriaguez, tendo sido aplicada em cúmulo jurídico a pena de 150 dias de multa e a pena de 6 meses de inibição de conduzir; - processo 33/16.5GTBGC, condenação pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, tendo sido aplicada a pena de 100 dias de multa e de cinco meses de inibição de conduzir.

  8. O arguido é solteiro, reside em união de facto e tem três filhos, dois menores e um maior.

  9. É agricultor, auferindo € 600, não paga prestação de casa, a esposa está desempregada e encontra-se inscrito em Bragança, numa clínica, para tratamento da sua dependência alcoólica.

    » 2.2 - Por seu lado, da audição da gravação da sentença oralmente proferida, colhe-se que, em termos de fundamentação de direito quanto à escolha e determinação da medida da pena principal, o Mmº. Juiz, sem embargo de reconhecer que já se trata da 4ª condenação do arguido por este tipo de crime, considerando que o mesmo assumiu integralmente e sem reservas os factos, demonstrou-se arrependido e está inscrito para efeito de um tratamento ao álcool, optou ainda pela aplicação de uma pena de multa, que fixou no seu limite máximo (120 dias).

  10. APRECIAÇÃO DO RECURSO Sendo o recurso restrito à matéria de direito e não havendo nulidades a conhecer nem resultando do texto da sentença recorrida qualquer dos vícios enumerados no art. 410º do Código de Processo Penal, inexistem quaisquer razões para alterar o juízo probatório constante da mesma, mantendo-se, em consequência, toda a matéria de facto nela dada como provada.

    Uma vez que, em face dessa factualidade, não se suscitam dúvidas sobre ter-se o arguido constituído autor material do crime de condução de veículo em estado de embriaguez pelo qual foi condenado, importa, então, apreciar se, relativamente à pena principal, a opção do tribunal a quo pela multa se mostra acertada ou se deveria antes ter sido aplicada pena de prisão, como sustenta o recorrente (Ministério Público), pugnando pela sua fixação em medida não inferior a cinco meses.

    3.1 - A tarefa de escolha e determinação da medida da pena envolve diversos tipos de operações, começando o juiz por determinar a moldura penal abstrata e, em seguida, dentro dela, a medida concreta da pena que vai aplicar, para depois escolher a espécie da pena que efetivamente deve ser cumprida.

    Perante a previsão abstrata de uma pena compósita alternativa (de prisão ou multa), o tribunal deve proceder a uma escolha prévia da pena, dando preferência à multa sempre que formule um juízo positivo sobre a sua adequação e suficiência face às finalidades de prevenção geral positiva e de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial de socialização, preterindo-a, a favor da prisão, na hipótese inversa.

    É o que decorre da regra de escolha da pena prevista no art. 70º do Código Penal, diploma a que pertencem todos os artigos citados sem qualquer referência, preceito esse que consagra o princípio da preferência pela pena não privativa de liberdade sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

    Nos termos do art. 40º, essas finalidades reconduzem-se à proteção de bens...

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