Acórdão nº 221/17.7T8VNC.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 24 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DA PURIFICA
Data da Resolução24 de Maio de 2018
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães- I. RELATÓRIO Ana apresentou-se à insolvência e requereu a exoneração do passivo restante afirmando reunir as condições para tanto exigidas.

O administrador da insolvência pronunciou-se pelo deferimento do requerido.

O credor Fundo de Garantia Automóvel pronunciou-se pelo indeferimento do pedido.

A Segurança Social absteve-se.

Em 11-01-2018 foi junta aos autos, pelo administrador da insolvência, a reclamação de créditos daquele credor FGA, incluindo a sentença que condenou a insolvente no pagamento de uma indemnização (fls. 55 e sgs.).

A insolvente pronunciou-se em 23-01-2018 (fls. 63 e sgs.), pedindo que aquele crédito do FGA seja abrangido pela exoneração, juntando documentos e requerendo diligências de prova.

Por despacho proferido em 30-01-2018, na sequência desse requerimento de diligências de prova apresentado pela insolvente, foi decidido o seguinte: «Com vista à boa decisão da questão relativa aos créditos que devem ser abrangidos/excluídas da exoneração do passivo restante, determino: - Se oficie a ASF, Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, com sede na Av. … Lisboa, a fim de, no prazo de 10 (dez) dias, vir informar por escrito se, à data de 02-04-2010, o veículo automóvel com a matrícula GQ tinha ou não contrato de seguro automóvel em vigor, mais devendo informar qual era a companhia seguradora e o nº de apólice respetiva; - Se oficie a Companhia de Seguros X, S.A., com sede na Rua … Lisboa, a fim de, no prazo de 10 (dez) dias, vir informar: - Se, à data de 02-04-2010, o veículo automóvel com a matrícula GQ tinha ou não contrato de seguro automóvel em vigor e o nº de apólice respetiva; - Em caso de ter essa companhia seguradora declarado a invalidade de tal apólice automóvel, indique o concreto motivo de tal invalidade e junte a este processo todos os documentos relativos a tal invalidade; - Para juntar cópia da Carta Verde em vigor para aquele veículo desde 28-10-2009.

» A ASF e a Companhia de Seguros X foram oficiadas em 05-02-2018, a fim de prestarem nos autos as referidas informações.

Em 12-02-2018, por meio do requerimento com a ref. ª processual nº 1828082, a Companhia de Seguros X, juntando dois documentos, veio prestar a seguinte informação: «Em resposta, informamos que a apólice em referência, que segurava o veículo com a matrícula GQ, se encontra anulada desde 01/04/2010, por falta de pagamento (ver s.f.f. anexo).

Conforme solicitado junta-se imagem da carta verde com validade iniciada em 28/10/2009.

» A insolvente não foi notificada pelo tribunal do mencionado requerimento e documentos juntos aos autos pela Companhia de Seguros X em 12-02-2018.

Em 26-02-2018, por meio do requerimento com a ref. ª processual nº 1845073, a ASF, juntando um documento, veio, por sua vez, prestar a seguinte informação: «De acordo com o solicitado e após consulta, na presente data, ao nosso sistema de informação de matrículas, somos a enviar em anexo a impressão dos elementos de que dispomos, relativos ao veículo com a matrícula GQ, dos quais resulta que nenhuma empresa de seguros disponibilizou à Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF) informação que nos permita concluir pela existência de seguro válido e eficaz na data pretendida.

» A insolvente não foi notificada pelo tribunal do mencionado requerimento e documentos juntos aos autos pela ASF em 26-02-2018.

Após o que em 26-02-2018, veio a ser proferido o despacho ora recorrido no qual analisados os pressupostos enunciados no art.º 238.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (C.I.R.E.), concluiu pela admissão liminar do pedido de concessão do benefício requerido, e fixou o valor de dois salários mínimos nacional (SMN) como o necessário ao sustento minimamente digno da referida Devedora.

Mais se determinou que o crédito do FGA não será abrangido pela exoneração do passivo restante.

A insolvente não se conformando com a decisão na parte em que determinou que o crédito do FGA não será abrangido pela exoneração do passivo restante traz o presente recurso.

A Apelante funda o recurso nas seguintes conclusões (transcrição): 1ª) O presente recurso tem por objecto o DESPACHO proferido nos autos em 26-02-2018, o qual, nos termos do previsto no artigo 239º, nº 1, do CIRE, admitiu liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante formulado pela insolvente, ora recorrente, mas com exclusão do crédito do Fundo de Garantia Automóvel (FGA), ao decidir que «o crédito do FGA não será abrangido pela exoneração do passivo restante» e tendo como base os factos supra elencados pela recorrente, considerados como os mais relevantes no caso dos autos.

  1. ) O credor FGA, e como já referido em tais factos elencados pela recorrente, na assembleia de credores de 08-01-2018 veio deduzir a sua oposição ao pedido de exoneração do passivo restante formulado pela insolvente, alegadamente, no entender do mesmo, “por violação do estatuído no art.º 245.º. n.º 2, al. b) do CIRE”, norma esta que prevê não abranger a exoneração “as indemnizações devidas por factos ilícitos dolosos praticados pelo devedor, que hajam sido reclamadas nessa qualidade”.

  2. ) Por seu lado, na sentença junta aos presentes autos, pelo administrador da insolvência, relativa ao Processo nº 185/13.6TBVNC, consta do relatório de tal sentença, quanto aos fundamentos da respectiva acção invocados pelo FGA, o seguinte: « (...) Sucede, porém, que, os Réus constituídos no dever de realizar contrato de seguro válido e eficaz que cobrisse a sua responsabilidade civil emergente de acidentes de viação, pois não obstante resultar da participação de acidente de viação a identificação de uma apólice na X, a verdade é que, contactada a dita seguradora, a mesma informou a lesada que a apólice encontrava-se anulada à data do acidente.(...) » 4ª) De facto, da respectiva participação de acidente de viação, a competente autoridade policial, na data do acidente, ocorrido no dia 02-04-2010, foi inequívoca ao assinalar em tal participação que o veículo propriedade da aqui insolvente, ANA, com a matrícula GQ, tinha seguro na X, respeitante à apólice automóvel nº 20023028300000 – cf. DOC. Nº 1 junto em anexo ao requerimento da insolvente apresentado nestes autos em 23-01-2018.

  3. ) E isso mesmo foi confirmado pela consulta online de veículos seguros, de acesso público, na página internet da ASF, quanto ao referido veículo com a matrícula GQ, na referida data do acidente de viação em causa, ou seja, à data de 02-04-2010 – cf. DOC. Nº 2 junto em anexo ao requerimento da insolvente apresentado nestes autos em 23-01-2018; e cf., ainda, o documento obtido da mesma forma, pela insolvente, na presente data (18-03-2018), aqui junto em anexo.

  4. ) Sendo essa, como sempre foi, precisamente, a plena convicção da aqui insolvente, Ana, quanto à existência de seguro automóvel válido na referida data do sinistro, em 02-04-2010, referente ao veículo com a matrícula GQ, e não entendendo assim o motivo por que o FGA veio aceitar a responsabilização pelo pagamento da indemnização devida à lesada no dito sinistro, sendo, pois, em seu entender, totalmente incompreensível o motivo de tal aceitação por parte do FGA.

  5. ) Até porque, tratando-se, como se trata, de um seguro de responsabilidade civil obrigatório por lei, concretamente pelo Decreto-Lei nº 291/2007, de 21-08, há e tem de haver, obviamente, um reforço na protecção de terceiros lesados, não sendo viável às seguradoras (apesar de o tentarem fazer muitas vezes, como é sabido por todos) virem alegar e informar, apenas após o acidente ter ocorrido, que o contrato de seguro foi declarado anulado.

  6. ) Sendo certo, de qualquer modo, que, à data de 02-04-2010, data em que ocorreu o sinistro com o veículo matrícula GQ, a aqui insolvente, Ana, tinha, em seu entender, o respectivo contrato de seguro com a X em vigor e plenamente eficaz, como logo resulta dos DOCs. Nºs 1 e 2 juntos em anexo ao requerimento da insolvente apresentado nestes autos em 23-01-2018 e resulta, também, da data constante da respectiva Carta Verde, então válida até 16-04-2010.

  7. ) Assim, se a apólice, como resulta da respectiva Carta Verde, tinha a validade de 16-04-2010, ou seja, uma data posterior ao aludido sinistro, ocorrido em 02-04-2010, como foi ou é possível afirmar, como o faz a Companhia X (cf. requerimento com a ref. ª processual nº 1828082, junto a estes autos em 12-02-2018), «que a apólice em referência, que segurava o veículo com a matrícula GQ, se encontra anulada desde 01/04/2010, por falta de pagamento»? 10ª) O que contraria, por outro lado, o teor do documento junto pela X àquele mesmo requerimento de 12-02-2018, no caso uma cópia de carta enviada à insolvente, datada de 07- 04-2010 [data posterior ao sinistro de 02-04-2010].

  8. ) Ora, foi e é tudo isto, que se encontra verdadeiramente por esclarecer, que pretendia – como pretende – a insolvente seja devidamente clarificada e cabalmente esclarecida nos autos, para, então sim, poder o tribunal proferir criteriosa e ponderada decisão relativa ao seu pedido de exoneração do passivo restante e, concretamente, no que concerne aos créditos não abrangidos pela exoneração.

  9. ) O que ocorre, no entendimento da recorrente, unicamente porque, em violação do princípio fundamental e estruturante do processo civil, o princípio do contraditório, e contrariando o previsto no artigo 3º, nº 3 do CPC, a recorrente não foi notificada pelo tribunal – como obviamente o deveria ter sido – do requerimento e documentos juntos aos autos pela Companhia de Seguros X em 12-02-2018, nem do requerimento e documento junto aos autos pela ASF em 26-02-2018.

  10. ) Desse modo, por falta da notificação à insolvente de tais documentos, e por outro lado porque o Mmo. Juiz logo em 26-02-2018 veio a proferir o despacho recorrido, não pôde ela solicitar os esclarecimentos pretendidos e que se impõem, em sua opinião, para uma avalizada e criteriosa decisão`, como referido, quanto à exoneração do passivo...

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