Acórdão nº 963/16.4T8BCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Maio de 2018
Magistrado Responsável | MARIA JO |
Data da Resolução | 17 de Maio de 2018 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência (após corridos os vistos legais) os Juízes da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*I – RELATÓRIO 1.1.
Decisão impugnada 1.1.1. A. L.
e mulher, Maria (aqui Recorridos), residentes na Rua …, em Barcelos, propuseram a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra X - Companhia de Seguros, S.A.
(aqui Recorrente), com sede no Largo …, em Lisboa, pedindo que · (a título principal) se condenasse a Ré a reparar os prejuízos sofridos numa fracção autónoma sua (discriminados em orçamento que juntaram); · (a título subsidiário) se condenasse a Ré a pagar-lhes a quantia de € 5.453,83, a título de indemnização pelos mesmos prejuízos.
Alegaram para o efeito, em síntese, que, sendo proprietário de uma fracção autónoma, a mesma sofreu no dia 10 de Novembro de 2014 uma infiltração, proveniente do terraço da fracção autónoma superior.
Mais alegaram que, mercê da dita infiltração, o respectivo imóvel sofreu danos, cuja reparação foi então orçamentada em € 2.873,57, tendo-se porém aqueles agravado com o decurso do tempo, ascendendo já o custo da respectiva reparação a € 5.453,83.
Por fim, os Autores alegaram que, tendo celebrado com a Ré um contrato de seguro (prevenindo a indemnização de danos registados na sua fracção, mercê de diversos sinistros), estaria a mesma obrigada a ressarci-los dos aqui invocados.
1.1.2.
Regularmente citada, a Ré (X - Companhia de Seguros, S.A.) contestou, pedindo que se julgasse a acção improcedente.
Alegou para o efeito, em síntese, que, sendo o contrato de seguro de danos, multirriscos habitação, celebrado com os Autores, compostos por Condições Gerais, Condições Especiais e Condições Particulares, todas elas vinculariam as partes nas sua relações imediatas, não podendo a respectiva ignorância ou desconhecimento desculpar quem quer que fosse.
Mais alegou encontrar-se a inundação em causa expressamente excluída da cobertura contratada, uma vez que foi proveniente de um terraço, e se concretizou em paredes e tectos (sendo esse o preciso texto da cláusula de exclusão por si invocada).
Por fim, a Ré impugnou, por alegadamente os desconhecer, os danos invocados pelos Autores.
1.1.3.
Os Autores responderam à excepção invocada pela Ré, pugnando pela sua improcedência; e reiterando o seu pedido inicial.
Alegaram para o efeito, em síntese, que a cláusula de exclusão referida por ela ressalvaria da respectiva aplicação as inundações causadas por «tromba de água ou queda de chuvas torrenciais», o que teria sido o caso do sinistro em causa.
Mais alegaram desconhecerem as condições gerais ou especiais em que a Ré se basearia para alegar que a infiltração em causa estaria excluída da sua responsabilidade, e não lhes ter sido deviamente explicada a concreta cláusula de exclusão por ela invocada.
1.1.4.
Dispensada a realização de uma audiência prévia e «a prolação de despacho destinado a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova», por alegada simplicidade da causa, foi proferido despacho: fixando o valor da acção em € 7.953,83; saneador (certificando a validade e a regularidade da instância); e apreciando os requerimentos probatórios das partes, bem como designando dia para realização da audiência final.
As partes foram ainda expressamente notificadas para, querendo reclamar do então decidido - requererem para o efeito a realização da dispensada audiência prévia (nos termos do art. 593º, nº 3 do C.P.C.) -, o que porém não fizeram.
1.1.5.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, julgando a acção parcialmente procedente, lendo-se nomeadamente na mesma (e no que ora nos interessa): «(…) Face a todo o exposto, nos termos das disposições legais supra indicadas, julga-se a presente ação parcialmente procedente, por provada, e consequentemente, (…) condena-se a R. Companhia de Seguros X a pagar aos AA. a quantia de €5.453,83 (cinco mil quatrocentos e cinquenta e três euros e oitenta e três cêntimos) a título de danos patrimoniais, absolvendo-se no demais peticionado.
*Fixam-se as custas da ação pela R. Companhia de Seguros X, S.A. e pelos AA., na proporção do decaimento, nos termos do artigo 527.º n.º 1 e 2 do Cód. Proc. Civil.
(…)»*1.2. Recurso (da Ré) 1.2.1. Fundamentos Inconformada com esta decisão, a Ré (X - Companhia de Seguros, S.A.) interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que o mesmo fosse julgado procedente, sendo revogada a sentença recorrida e ela própria absolvida do pedido.
Concluiu as suas alegações da seguinte forma (aqui reproduzidas ipsis verbis): 1.
O presente recurso versa, exclusivamente, sobre matéria de direito, tem como objecto o contrato de seguro dos autos, as suas coberturas e a sua interpretação.
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Como resulta da sentença dos autos, «a questão a resolver na presente acção centra-se em saber se os AA têm direito à reparação dos danos sofridos na sua fracção ou a serem indemnizados pelos mesmos e, em caso afirmativo, qual o montante e qual o R. responsável pelo seu pagamento».
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Com interesse para o presente recurso, atente-se a factualidade vertida nos pontos, 2, 3, 8 e 14 da matéria de facto provada.
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Ora, as condições gerais do contrato de seguro celebrado entre os demandantes e esta demandada/recorrente, quanto à cobertura inundações, prevê, entre outras, a seguinte EXCLUSÃO ESPECÍFICA (vd. exclusão específica nº 1, al. b) da cobertura “inundações”, p. 7/29 das Condições Gerais juntas aos autos a fls…, como doc. 3 da contestação da ora recorrente): «esta cobertura não garante danos provocados por infiltrações através de paredes, tetos, portas, janelas, claraboias, terraços ou marquises, bem como por goteiras, humidade, condensação e ou oxidação, exceto quando diretamente resultantes dos riscos previstos na alínea a) do âmbito desta cobertura» (destaque nosso).
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A referida al. a) prevê a seguinte cobertura: «tromba de água ou queda de chuvas torrenciais, como tal se considerando a precipitação atmosférica de intensidade superior a 10 milímetros em 10 minutos no pluviómetro» (destaque nosso).
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Sem outras considerações, fácil é de ver que o sinistro dos autos, tal qual como descrito e configurado pelos demandantes, e como demonstrado pela prova produzida em sede de audiência de julgamento, não está garantido no âmbito da cobertura do contrato de seguro dos autos.
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Ora, o contrato de seguro, designadamente as suas condições gerais, foi junto aos autos e é parte integrante da contestação desta recorrente.
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Por outras palavras, para que se verifique a responsabilidade desta demandada, ora recorrente, o alegado sinistro tem que preencher os requisitos definidos nas cláusulas contratuais.
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E como parte a quem aproveita o facto, é sobre os tomadores do seguro, aqui demandante, que recai o ónus da prova dos factos constitutivos do direito de que se arrogam, isto é, dos requisitos contratualmente definidos e aceites pelas partes – cfr. artº 342º do CC.
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As condições gerais do contrato de seguro celebrado foram juntas aos autos e não foram impugnadas.
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Competia aos demandantes alegar e demonstrar que, naquele mês de Novembro, houve precipitação atmosférica de intensidade superior a 10 milímetros em 10 minutos no pluviómetro, de forma a poderem afastar a exclusão contratualmente prevista, por ambos aceite e não impugnada.
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Da prova produzida apenas resulta que «Em início de Novembro de 2014, esteve muito mau tempo, tendo havido um anormal nível de pluviosidade».
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Com o devido respeito, que é muito, o que é «um anormal nível de pluviosidade» ? Que conceito genérico e que carece de ser preenchido é este que permite, sem mais, estabelecer a responsabilidade da seguradora ? 14.
Para prova dos requisitos contratualmente estabelecidos, ou melhor, para que bem se esclarecesse que «anormal nível de pluviosidade» foi esse, era apenas e só necessário solicitar tal informação ao IPMA (Instituto Português do Mar e da Atmosfera).
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Contudo, tal facto, além de não provado, não foi sequer alegado (!), isto é, não foram sequer alegados os factos constitutivos do direito de que se arrogam os demandantes.
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Como já mencionado, competia aos demandantes alegar e provar a ocorrência daqueles eventos/requisitos previstos no contrato de seguro e de acordo com a definição que dos mesmos ali é feita, já que daí emergiria o direito à indemnização de que se arrogam.
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Em suma: depois de produzida a prova, aferida a origem da inundação dos autos e não verificada a excepção prevista na exclusão específica invocada, é inegável que o sinistro objecto destes autos está excluído da cobertura do contrato de seguro celebrado, exclusão essa que nunca foi impugnada pelos demandantes.
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Relembre-se, apenas se provou que, em Novembro daquele ano, se verificou um «anormal nível de pluviosidade», nada mais ! 19.
Não se alegaram ou demonstraram os requisitos contratualmente estabelecidos e aceites pelas partes para a verificação do risco coberto e da obrigação de indemnização por parte desta recorrente, pelo que, está excluída a sua responsabilidade, devendo a sentença dos autos ser revogada, absolvendo-se a esta demandada/recorrente do pedido.
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A sentença em crise violou, entre outras, as normas previstas nos arts. 5º do Código de Processo Civil, 236º, 238º e 342º do Código Civil e pelos artigos 8º, 10º e 11º do Decreto-Lei nº 446/85, de 25 de Outubro.
*1.2.2. Contra-alegações (dos Autores) Os Autores (A. L. e mulher, Maria) não contra-alegaram.
*II - QUESTÕES QUE IMPORTA DECIDIR 2.1. Objecto do recurso - EM GERAL O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente (arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 2, ambos do C.P.C.), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (art. 608º, nº 2, in fine, aplicável ex vi do art. 663º, nº 2, in fine, ambos do C.P.C.).
*2.2. QUESTÕES CONCRETAS a apreciar Mercê do exposto, 01 única questão foi submetida à apreciação deste Tribunal: · Questão Única - Fez o Tribunal a quo uma...
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